quinta-feira, 27 de outubro de 2011

PCB ou PC do B?

O Partido Comunista Brasileiro (PCB) foi fundado em plena República Velha, em 1922.

Naquele momento histórico de euforia pela revolução bolchevique na Rússia (1917), predominava a idéia da internacionalização do comunismo, já que todos os trabalhadores do mundo deveriam se unir para enfrentar as contradições do capitalismo e realizar a revolução comunista internacional.

Entretanto, temos no Brasil dois Partidos Comunistas. Por que isso acontece? Qual a diferença entre ambos? Há diferença?

A divergência começou após a morte de Stalin em 1953. Seu sucessor, Nikita Krushev liderou, em 1956, o XX Congresso do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) o qual acorreram partidos Comunistas de todas as nacionalidades. Nesse Congresso os crimes de Stálin foram, pela primeira vez, denunciados (pelo próprio Kreshev), assim como os descaminhos do partido que havia se afastado da ideologia e adotado um verdadeiro culto à personalidade de Stalin (coisa tristemente comum aos ditadores).

Das várias alterações emanadas daquele congresso estavam uma revisão de estratégias que afetavam a todos os comunistas militantes e simpatizantes, bem como seus respectivos partidos.

No Brasil essas mudanças foram discutidas no V Congresso do Partido. Foi então que um grupo de militantes, minoria no Congresso brasileiro, não aceitou suas deliberações inspiradas naquele XX Congresso do PCUS e liderado por João Amazonas abandonou o partido, fundando um novo PC e readotando o nome PC do B.

Portando o PCB foi fundado em 1922 (fará 90 anos ano que vem) e o PC do B foi fundado em 1962 (fará 50 anos ano que vem).

Luis Carlos Prestes, Olga Benário, são figuras ligadas ao PCB e não ao PC do B.

Desde que se afastou do PCB o PC do B foi cada vez mais se afastando da URSS.

Adotou a visão da revolução que começa no campo e tomava as cidades, valorizando a guerrilha rural como forma de luta.

Ligou-se inicialmente a China reconhecendo seu líder Mao Tse Tung como o grande timoneiro. Depois o timão passou para Enver Hoxha, líder da pequena Albânia.

O PC do B era a favor da luta armada contra a ditadura militar e organizou uma das mais belas páginas de resistência, a Guerrilha do Araguaia. O PCB era contra a luta armada e pregava a luta política para desgastar a ditadura e liderar a volta à democracia, mas nem por isso foi menos torturado e massacrado. Vide a “Operação Radar”.

O PC do B sempre criticou a expansão da revolução cubana, liderada por Ernesto Tche Guevara, esse sim, um mito do PCB.

Após a reabertura política essas diferenças se acentuaram mais.

Enquanto o PCB manteve sua visão estratégica original de denúncia e enfrentamento do imperialismo e do capitalismo, o PC do B adotou novas idéias de chegada ao poder através de alianças e de compromissos cada vez mais estranhos.

Infelizmente o PC do B hoje, é muito mais parecido com outro partido oficialista do que com um partido verdadeiramente comunista.

Enquanto o PC do B “ficou grandinho” tendo inclusive ministério no governo do PT (embora já tenha feito alianças aqui no RS até com o PDT de Alceu Colares), o PCB continua pequeno, mas na mesma trilha e na mesma esperança que embalou corações idealistas do passado. Talvez lhe falte as fortes lideranças mortas em combate.

Nos dias atuais, quando a mídia oficial aproveita os escândalos para dizer que todos os que chegam ao poder são corruptos e busca fazer crer que todo comunista é farinha do mesmo saco, é mais importante do que nunca, ratificar claramente essas diferenças para as novas gerações.

Prof. Péricles

domingo, 23 de outubro de 2011

A ELEGÂNCIA DA OTAN

Segundo Yahoo - Notícias o alto comissariado da ONU pediu uma investigação completa sobre a morte de Kadafi e a possibilidade de que o ditador tenha sofrido uma execução sumária.

Segundo Mohamed Sayeh, autoridade de alto escalão do CNT (a turma da transição até cair na real), o corpo de Kadafi continua em Misrata, para onde foi levado após sua morte, e será enterrado seguindo a tradição muçulmana, seu corpo será lavado e tratado com dignidade.

“Espero que ele seja enterrado em um cemitério muçulmano dentro de 24 horas” acrescentou.

Qualquer um que assistiu ao vídeo exibido no mundo todo via internet, sabe muito bem, o que aconteceu e como Kadafi foi morto.

Mas, é digno de nota e emoção o respeito que a ONU tem pela vida.

Que comportamento maravilhoso! Como são éticos os ocidentais!

Nós, os mocinhos vencemos mais uma, e aquele bandido desalmado do Kadafi teve o desplante de morrer só de sacanagem.

“Deve ser mais um truque desses muçulmanos sujos Bill”.

Só não entendi por que a ONU “pediu” uma investigação...

Desde quando a OTAN/ONU/Estados Unidos, tem que pedir algo?

Será que entre um míssel e outro eles pedem licença?
“Foi mal aí criançada, quem manda vocês brincarem onde caem nossas bombas?”

É por isso que eu digo, gente educada e elegante essa aí: mata, incendeia, inutiliza, tortura, destrói, mas tudo com educação e fino trato.

Coisas de civilizados, com certeza.

Nada de novo pra quem já jogou duas bombas nucleares em cidades repletas de habitantes, matando, só na explosão 180 mil pessoas.

E a Síria, que se ligue, mas isso deve ser só para o ano que vem, quando outro lote de armas caríssimas ameaçar ultrapassar a data de validade.

Prof. Péricles

domingo, 16 de outubro de 2011

AS CRIANÇAS DOS OUTROS - DIA DA CRIANÇA NO PARAGUAI

Campos de Acosta (Acosta Ñu, em guarani), 16 de agosto de 1869.

Assunção caiu e as tropas da Tríplice Aliança (praticamente apenas brasileiros) avançam pelo território paraguaio.

Angustiado, o general paraguaio, Bernardino Caballero recebe relatos do deslocamento de 20 mil inimigos, sob o comando do genro do imperador do Brasil, o Conde D’eu, em direção ao interior de seu país.

Caballero bate em retirada com sua tropa, mas, como toda retirada, sua retaguarda fica a descoberto.

Então, o oficial teve uma idéia: recrutar meninos de 6 a 12 anos e fantasiá-los como militares, com fardas, bonés, barba pintada com carvão e pedaços de pau simulando rifles.

Talvez, pensa ele, os brasileiros, julgando serem as crianças, realmente soldados adultos, percam tempo preparando um ataque, ou procurando negociar. Talvez, ainda, percebendo serem crianças, esquálidas e maltratadas pela guerra, providenciassem socorro, retardando a marcha.

Mas... não foi o que ocorreu.

Por ordem direta do Conde D’eu (um criminoso de guerra que beirava o sadismo), os meninos foram massacrados sem piedade. Centenas de mães, desesperadas, foram também decapitadas pelos oficiais da cavalaria brasileira.

Ao cair da noite, as trincheiras e as matas ao redor do campo de batalha foram incendiadas. Impávidos, o Alto Comando aliado assistiu o doentio espetáculo de gritos agoniados, choro infantil e corpos em chamas, como verdadeiras tochas humanas.

Poucos resistiram ao massacre.

Meses mais tarde, com a morte de Solano López, a Guerra do Paraguai, foi dada por encerrada. Em seu retorno ao Brasil, o Conde D’Eu foi aclamado como herói pelas ruas do Rio de Janeiro.

Na década de 1930, cinzas recolhidas no campo de batalha foram depositadas em uma urna coletiva no Panteão dos Heróis, onde são reverenciadas até hoje.

No Paraguai, em memória dos mártires de Acosta Ñu, o dia 16 de agosto foi eternizado como o Dia das Crianças.

Feliz Dia das Crianças!


Prof. péricles

NOSSAS CRIANÇAS 02

Na década de 60, antes do golpe militar, ocorre ampliação do número de organizações da sociedade civil, especialmente no âmbito sindical. Começa a haver a reivindicação de políticas sociais redistributivas, embora ainda não haja registro histórico de movimento organizado pela infância e pela adolescência.

Em 1964, já no primeiro governo militar foi criada a Funabem (Fundação Nacional do Bem Estar do Menor) que foi um marco da transição entre a concepção repressiva e punitiva para a concepção assistencialista.

Surge em 1979, ainda nos governos militares, o Segundo Código de Menores que incorpora a nova concepção assistencialista à população infanto-juvenil.

Com o retorno do país ao estado de direito, fervilhou em todos os setores o desejo de acrescentar avanços à nova Constituição que se elaboraria. Assim, é criado em 1985 o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, que, com a força de mais de um milhão de assinaturas impõem a discução da criança e do adolescente como sujeitos participativos.

O resultado foi a campanha "Criança Prioridade Nacional"e a formulação do artigo 227 da Constitução Nacional, promulgada em outubro de 1988, base para a elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente), considerado um documento exemplar de direitos humanos..

Destaca-se ainda, a sanção da Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB que define e regulariza o sistema de educação brasileiro com base nos princípios presentes na Constituição, em 1996 e a aprovação do Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente em 2003, entre outros avanços.

A criança, finalmente, não será mais vista como uma espécie de deficiente e sim como uma pessoa em situação peculiar de desenvolvimento.

O jovem deixa de ser uma espécie de propriedade dos pais desaparecendo a expressão jurídica "patrio poder" e trocando expressões perversas como crime e cumprimento de pena por ato infracional e medidas sócio-educativas.

Pela primeira vez, torna-se prioridade das políticas públicas e reconhecida como um cidadão, e não mais como um mini-adulto, um malfeitor em potencial.

Claro que tudo isso não significa apenas mudanças conceituais, mas em seus 267 artigos são delineados novos conceitos e procedimentos profundamente diversos das visões anteriores, punitivas e assistencialistas.

Essa nova visão ainda está se processando em nosso país.

Como toda mudança de concepção, necessita que as pessoas, em especial, as mais conservadoras, se adaptem, e entendam o novo.

Mas, as bases foram criadas. O caminho nós todos, temos o dever de trilhar.

NOSSAS CRIANÇAS

Na semana da criança, nada mais procedente do que refletir um pouco sobre o que já foi feito e o que se deve fazer em relação aos nossos pequenos.

A história de nossas crianças, reflete a nossa própria história de cidadania.

Até bem pouco tempo existiam no brasil “dois tipos de crianças”.

Os filhos dos ricos, considerados verdadeiramente crianças, e os filhos dos pobres, vistos como pequenos marginais em formação.

A esse segundo grupo as políticas públicas sempre se preocuparam com a prevenção contra o crime, com a punibilidade, onde os orfanatos viraram confortáveis soluções.

Durante o século XVI crianças e adolescentes abandonadas e marginalizadas, em Portugal, são trazidas para o Brasil para colaborar na aproximação com os índios e na catequese.

Mesmo na Europa, nessa época, criança era vista como mini-adulto e adolescência era uma coisa que simplesmente “não existia”.

No século XVIII surgem as primeiras escolas no Brasil. Praticamente todas administradas pelos padres jesuítas e vistas como espaço de disciplina, voltadas diretamente às crianças da elite.

Também no século XVIII surgem as “Rodas dos Expostos”, instrumento em que as mães depositavam seus filhos e faziam girar, como uma roda, fazendo que os pequenos ficassem para o lado dentro dos muros que cercavam alguma instituição (geralmente hospitais). Em seguida batiam num sino que serviam como alerta e desapareciam para sempre, enquanto alguma irmã de caridade recolhia o pequeno abandonado.

No século XIX, a partir de 1886 e da Lei Visconde do Rio Branco, multiplica-se o número de crianças abandonadas pelas ruas do país, fruto da “bondosa” Lei, também chamada de Lei do Ventre Livre, que torna livre os filhos, e apenas os filhos, não os pais, de escravos a partir dos sete anos de idade.

Já no século XX, em 1924, é criado o Tribunal de Menores, uma estrutura Jurídica muito mais preocupada com a punição às infrações cometidas por jovens, do que qualquer outra coisa.

Em 1927 é promulgado o primeiro Código de menores, conhecido como Código Mello Mattos, como um prolongamento do Tribunal de Menores.

A Era Vargas (1930-1945) trouxe algumas mudanças como, a criação do Ministério da Educação e da obrigatoriedade do Ensino Fundamental.

Mas, as mudanças realmente significativas surgem no final da década de 40, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada pela ONU e a criação do Fundo das Naçoes Unidas para a Infância (UNICEF).

Em 1950 a UNICEF se instala no Brasil, no estado da Paraíba, trazendo programas de proteção à saúde da criança e da gestante. Uma absoluta novidade em nossas terras.

Em 1959 é aprovada pela Assembléia Geral da ONU a Declaração Universal dos Direitos da Criança.

O mundo, e o Brasil, começavam a mudar seus olhar e a descobrir a criança e o adolescente.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

STEVE JOBS - MENSAGEM

"Lembrar que logo eu vou estar morto é a ferramenta mais importante que eu já encontrei para me ajudar a fazer as grandes escolhas na vida.
Porque quase tudo, toda a expectativa exterior, todo o orgulho, todo o medo de dificuldades ou falhas, essas coisas simplesmente somem em face da morte deixando apenas o que é realmente importante.

Lembrar que você vai morrer é a melhor maneira que eu conheço para evitar a armadilha de achar que você tem algo a perder.

Você já está nu. Não há razão para não seguir o seu coração.

Seu tempo é limitado, então não gaste vivendo a vida de outra pessoa.Não caia no dogma que é viver com o resultado do pensamento de outra pessoa.

Não deixe o ruído da opinião alheia sufocar a sua voz interior e mais importante tenha coragem de seguir seu coração e sua intuição, eles de alguma forma já sabem o que você realmente quer se tornar. TUDO MAIS É SECUNDÁRIO.”

Steve Jobs
(parte do discurso na formatura da turma da universidade de Stanford, em 2005, pouco após a descoberta do seu cancer no pâncreas)

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

VITIMAS DA DITADURA 03: ITAIR VELOSO O TERROR É GELADO

Itair José Veloso, afrodescendete nasceu na pequena cidade mineira de Faria Lemos, bem na divisa tríplice com o Rio de Janeiro e Espírito Santo. Trabalhou como montador de calçados e apontador de obras, profissão esta em que se tornaria importante sindicalista.

Seu engajamento político remonta a 1953, período em que passou a integrar a Juventude do Partido Comunista. Em 1961, foi eleito para a direção do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Niterói e Nova Iguaçu, alçando em seguida o posto de secretário-geral da Federação dos Trabalhadores da Construção Civil.

Durante o governo João Goulart, Itair chegou a liderar uma delegação sindical brasileira que viajou para um encontro internacional de sindicalistas em Moscou.

Era casado com Ivanilda da Silva Veloso, com quem teve quatro filhas. Após abril de 1964, Itair sofreu perseguições e teve sua residência invadida pelo DOPS de Niterói, que, não o encontrando, saquearam o domicílio.

Passou a ser processado pela Justiça Militar, o que o obrigou à militância política clandestina.

O pouco que se sabe a respeito de seu desaparecimento, aos 45 anos, é que, no dia 25/05/1975, às 7h30min, ele saiu de casa para encontrar companheiros do PCB e disse à sua mulher que voltaria ao meio-dia, para ir ao médico com ela. Desde então está desaparecido.

Em entrevista à revista Veja, em 18/11/1992, o sargento Marival Chaves, testemunhou que pelo menos oito integrantes do PCB tiveram seus corpos atirados nas águas do Rio Novo, em Avaré, São Paulo. Marival disse também que Itair foi preso por agentes do DOI-CODI/SP, no Rio de Janeiro, durante a Operação Radar, acusado de integrar o Comitê Central do PCB. Na entrevista a Veja, o sargento Marival também afirma que Itair morreu de choque térmico, sob tortura, imerso em água gelada, numa casa de Itapevi, na Grande São Paulo. Seu corpo sem vida teria sido jogado da ponte, nas imediações de Avaré, a 260 quilômetros de São Paulo.

Na revista, as palavras textuais do ex-agente do DOI-CODI/SP foram:

“O corpo de Itair José Veloso também foi jogado da ponte. Ele foi preso no Rio, pelo DOI de São Paulo. Era o inverno de 1975 e o que o levou à morte foi banho de água gelada. Morreu de choque térmico”.

Como no caso dos demais desaparecidos políticos, a esposa de Itair, Ivanilda Veloso sustentou uma longa peregrinação buscando denunciar a prisão de seu marido, recorrendo à CNBB, a Dom Eugênio Sales, aos advogados Modesto da Silveira e Heleno Fragoso, a todas as portas
possíveis.

O documentário Memória para uso diário, realizado por Beth Formaggini para registrar os 21 anos de atividade do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, inclui imagens sobre a saga de Ivanilda pesquisando documentos dos arquivos policiais em busca de informações, há 32 anos, sobre o marido desaparecido.

Em Belo Horizonte, existe hoje uma avenida, no Bairro das Indústrias, com o nome de Itair José Veloso, sendo que em 2004 ele foi um dos homenageados com a entrega da Medalha Tributo à Utopia, criada pela Câmara Municipal da capital mineira no ano anterior.

Adaptações do Jornal "O Berro"

OPERAÇÃO RADAR

No Brasil dos negros tempos da Ditadura Militar, nem todas as organizações de resistência optaram pela luta armada. Uma dessas organizações, com largo histórico de lutas, mas que preferia a resistência política, apostando nas organizações populares acelerando o desgaste e fim natural da ditadura foi o PCB (Partido Comunista Brasileiro) carinhosamente apelidado de “Partidão”.

Na metade da década de 70, organismos que escolheram a luta armada estavam, praticamente, extintos, massacrados pelo aparato assassino da repressão. Como não participara da luta armada, o PCB estava praticamente inteiro em sua estrutura dirigente, e articulado em praticamente todo o território nacional.

Disso tinham consciência as aves de rapina do sistema, como comprova o, hoje conhecido, relatório do general Ednardo D’Avila Mello que afirma a necessidade de “passar a operar para desmantelar o PCB, conhecido também como Partidão, que pôde se fortalecer, pois, além de não se ver fustigado, conseguiu provar perante toda a esquerda do país, que a tomada do poder deveria ser feita por via pacífica’’.

A essa criminosa operação, planejada para matar os dirigentes e membros do PCB, foram dados vários nomes, sendo o mais conhecido “Operação Radar”.

Para militares como o general Ednardo, os tempos de abertura política e de retorno à normalidade democrática, se aproximavam, sendo importante, antes disso, aniquilar aquela organização de esquerda capaz de se articular e liderar as classes trabalhadoras pós ditadura.

Dirigentes do Partidão foram espionados, seqüestrados e mortos antes das prisões em massa em todo o país. Só em São Paulo foram presos no Doi-Codi 2.408 militantes da legenda até então clandestina.

A morte de Vladimir Herzog, em 25 de outubro de 1975, foi o auge de operação de ‘‘cerco e aniquilamento’’ do Partido Comunista Brasileiro (PCB), concentrada em São Paulo, mas que se estendeu a todo o país. Além do jornalista, foram mortos no Doi-Codi em São Paulo o professor Jean Leszek Dulemba, da Universidade de Campinas (Unicamp), o tenente reformado José Ferreira de Almeida, o Piracaia, em 8 de agosto, e o operário Manoel Fiel Filho, em 18 de janeiro de 1976.

No final de outubro, o general Ednardo D’Ávila Mello, que liderou a operação, em seu relatório, contabilizava resultados: 2.409 prisões efetuadas pelo Doi-Codi; 908 ,prisioneiros detidos em outros estados e encaminhados para sua jurisdição, em São Paulo. Segundo o general, a crise política provocada pela morte de Herzog, ‘‘que parecia tomar rumos imprevisíveis, de repente esvaziou’’.

A repressão ao PCB resultou na prisão de 14 membros efetivos e 16 suplentes da direção nacional, dos quais foram seqüestrados e mortos Luiz Maranhão Filho (jornalista), Walter Ribeiro (militar), Davi Capistrano (militar), Elson Costa (funcionário público), Orlando Bonfim (jornalista), João Massena Melo (metalúrgico), Jaime Miranda de Amorim (comerciário), Hiram Pereira de Lima (estivador), Itair José Veloso (carpinteiro), Nestor Veras (jornalista) e José Montenegro de Lima (estudante), encarregado da juventude comunista.

Seus corpos jamais foram encontrados.

sábado, 8 de outubro de 2011

CATEGORIA DE IMBECIL POLÍTICO

A seguir temos uma interessante classificação de Imbecis políticos.
Eu ousaria somar um item ao texto abaixo:

4 - O “Simpatizante Fictício”. É aquele cara conservador que nunca votou nem jamais votará em qualquer partido de esquerda, mas que, para dar tom de veracidades aos seus desgastados argumentos, adora começar seus discursos com “eu já votei no PT”. Como o voto é secreto e nunca se poderá contestar sua afirmação e ainda, por educação, ninguém irá chama-lo de mentirosos, sente-se à vontade para vestir a capa de um “esquerdista decepcionado” e defender sua visão direitista, conservadora, preconceituosa e radical.

Leiam abaixo as definições da jornalista Cynara Menezes.

...........

Em 1996, três jornalistas, entre eles o filho do Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa, Álvaro, lançaram com estardalhaço o “Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano”. Com suas críticas às idéias de esquerda, o livro se tornaria uma espécie de bíblia do pensamento conservador no continente. Vivia-se o auge do deus mercado e a obra tinha como alvo o pensamento de esquerda, o protecionismo econômico e a crença no Estado como agente da justiça social. Quinze anos e duas crises econômicas mundiais depois, vemos quem de fato era o perfeito idiota.

Mas, quem diria, apesar de derrotado pela história, o Manual continua sendo não só a única referência intelectual do conservadorismo latino-americano, como gerou filhos.

No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião que, no fundo, disfarça sua real ideologia e as lacunas em sua formação.

Como de fato a obra de Álvaro e companhia marcou época, até como homenagem vamos chamá-los de “perfeitos imbecis politicamente incorretos”. Eles se dividem em três grupos:

1. O pensador imbecil politicamente incorreto: ataca líderes LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trânsgeneros) e defende homofóbicos sob o pretexto de salvaguardar a liberdade de expressão. Ataca a política de cotas baseado na idéia que propaga de que não existe racismo no Brasil. Além disso, ações afirmativas seriam “privilégios” que não condizem com uma sociedade em que há “oportunidades iguais para todos”. Defende as posições da Igreja Católica contra a legalização do aborto e ignora as denúncias de pedofilia entre o clero. Adora chamar socialistas de “anacrônicos” e os guerrilheiros que lutaram contra a ditadura de “terroristas”, mas apóia golpes de Estado “constitucionais”. Um torturado? “Apenas um idiota que se deixou apanhar.” Foge do debate de idéias como o diabo da cruz, optando por ridicularizar os adversários com apelidos tolos. Seu mote favorito é o combate à corrupção, mas os corruptos sempre estão do lado oposto ao seu.
Prega o voto nulo para ocultar seu direitismo atávico. Em vez de se ocupar em escrever livros elogiando os próprios ídolos, prefere a fórmula dos guias que detonam os ídolos alheios –os de esquerda, claro. Sua principal característica é confundir inteligência com escrever e falar corretamente o português.

2. O comediante imbecil politicamente incorreto: sua visão de humor é a do bullying. Para ele não existe o humor físico de um Charles Chaplin ou Buster Keaton, ou o humor nonsense do Monty Python: o único humor possível é o que ri do próximo. Por “próximo”, leia-se pobres, negros, feios, gays, desdentados, gordos, deficientes mentais, tudo em nome da “liberdade de fazer rir.” Prega que não há limites para o humor, mas é uma falácia. O limite para este tipo de comediante é o bolso: só é admoestado pelos empregadores quando incomoda quem tem dinheiro e pode processá-los. Não é à toa que seus personagens sempre estão no ônibus ou no metrô, nunca num 4X4. Ri do office-boy e da doméstica, jamais do patrão. Iguala a classe política por baixo e não tem nenhum respeito pelas instituições: o Congresso? “Melhor seria atear fogo”. Diz-se defensor da democracia, mas adora repetir a “piada” de que sente saudades da ditadura. Sua principal característica é não ser engraçado.

3. O cidadão imbecil politicamente incorreto: não se sabe se é a causa ou o resultados dos dois anteriores, mas é, sem dúvida, o que dá mais tristeza entre os três. Sua visão de mundo pode ser resumida na frase “primeiro eu”. Não lhe importa a desigualdade social desde que ele esteja bem. O pobre para o cidadão imbecil é, antes de tudo, um incompetente. Portanto, que mal haveria em rir dele? Com a mulher e o negro é a mesma coisa: quem ganha menos é porque não fez por merecer. Gordos e feios, então, era melhor que nem existissem. Considera normal contar piadas racistas, principalmente diante de “amigos” negros, e fazer gozação com os subordinados, porque, afinal, é tudo brincadeira. É radicalmente contra o bolsa-família porque estimula uma “preguiça” que, segundo ele, todo pobre (sobretudo se for nordestino) possui correndo em seu sangue. Também é contrário a qualquer tipo de ação afirmativa: se a pessoa não conseguiu chegar lá, problema dela, não é ele que tem de “pagar o prejuízo”. Sua principal característica é não possuir idéias além das que propagam os “pensadores” e os comediantes imbecis politicamente incorretos.


Cynara Menezes é jornalista. Atuou no extinto "Jornal da Bahia", em Salvador, onde morava. Em 1989, de Brasília, atuava para diversos órgãos da imprensa. Morou dois anos na Espanha e outros dez em São Paulo, quando colaborou para a "Folha de S. Paulo", "Estadão", "Veja" e para a revista
"VIP". Está de volta a Brasília há dois anos e meio, de onde escreve para a CartaCapital.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

DROGAS SINTÉTICAS E MERCADOS

Cudidado com o consumo de inibidores de apetite, rebites e pílulas para tudo (dormir,manter-se acordado, etc). Você pode estar alimentando, sem saber, uma dolorosa disputa de mercado.

As drogas sintéticas superaram a cocaína e a heroína e passaram a ocupar o segundo lugar na lista de droga mais consumidas no mundo, atrás apenas da maconha, anuncia a Organização as Nações Unidas contra as Drogas e o Crime (ONUDC) em seu relatório anual.

"O mercado das ATS evoluiu de uma indústria de fabricação doméstica em pequena escala para um mercado do tipo cocaína e heroína, com um nível mais forte de integração e com grupos do crime organizado envolvidos ao longo da cadeia de produção e de distribuição", explicou o diretor executivo da ONUDC, Yuri Fedotov.

O relatório ressalta que as ATS são fáceis de produzir e precisam de um investimento relativamente pequeno, com um grande rendimento, ao contrário das drogas a base de plantas, como a cocaína e os opiáceos.

Na Ásia sul-oriental, a região mais afetada pelas anfetaminas, o número de pílulas de ATS confiscadas passou de 32 milhões em 2008 a 93 milhões em 2009 e alcançou 133 milhões ano passado.

Na América Latina e África Ocidental foram registrados recentemente as primeiras descobertas de laboratórios de ATS.

O relatório também aponta a emergência de novos componentes sintéticos não regulados, imitando os efeitos das substâncias ilícitas e que escapam do controle das leis internacionais.

"Muito perigosas e, no entanto, ainda consideradas legais em muitos países, estas drogas são facilmente encontradas pela internet", afirma ONUDC.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

PERGUNTAS DE MAHMOUD AHMADINEJAD

"...Quem arrancou à força dezenas de milhões de pessoas de seus lares na África e em outras regiões do mundo, durante o sombrio período da escravidão, fazendo daquelas pessoas vítimas da mais cega ganância materialista?



Quem ocupou terras e massivamente assaltou recursos naturais que eram patrimônio de outros povos, quem destruiu talentos e empurrou para a destruição os idiomas, as culturas e as identidades de tantos povos?


Quem deflagrou a primeira e a segunda guerras mundiais, que fizeram 70 milhões de mortos e centenas de milhões de feridos, de mutilados e de sem-tetos?



Quem criou a guerra na península da Coréia e no Vietnã?



Quem impôs e apoiou durante décadas ditaduras militares e regimes totalitários em países da Ásia, da África e da América Latina?



Quem atacou com armas atômicas população indefesa e desarmada e guarda milhares de ogivas nucleares em seus arsenais?



Quais são as economias que dependem, para crescer, de criar guerras e vender armas?


Quem provocou e estimulou Saddam Hussein a invadir e impor guerra de oito anos contra o Irã?

Quem usou os misteriosos incidentes de 11 de setembro como pretexto para atacar o Afeganistão e o Iraque – matando, ferindo, deslocando milhões de seres humanos de seus locais tradicionais de vida nos dois países –, exclusivamente para alcançar a ambição de controlar o Oriente Médio e seus recursos de petróleo?



Qual o país cujos gastos militares superam anualmente uma centena de bilhões de dólares, mais que todos os orçamentos militares de todos os povos do mundo, somados?



Quem domina o Conselho de Segurança da ONU, ao qual caberia zelar pela segurança internacional?

Se os EUA e seus aliados da OTAN cortassem pela metade seus gastos militares e usassem esses valores para ajudar a resolver os problemas econômicos em seus próprios países, estariam aqueles povos padecendo os sofrimentos da atual crise econômica mundial?



Que mundo teríamos, se a mesma quantidade de recursos fossem alocados nas nações mais pobres?...”





Trechos do discurso do Presidente do Irã na Assembléia Geral das Nações Unidas

VÍTIMAS DA DITADURA 2: SOLANGE GOMES E A DOR QUE PERSEGUE

Paulista de Campinas, Solange Lourenço Gomes vivia no Rio de Janeiro e fez o curso clássico no Colégio Andrews e começou a estudar Psicologia na UFRJ em 1966.

Manteve por algum tempo ligações com o PCBR. Em 1968 vinculou-se à Dissidência da Guanabara, que posteriormente adotaria o nome MR-8, tendo de passar à clandestinidade por volta de setembro ou outubro de 1969.

Morava com Daniel Aarão Reis Filho, dirigente daquela organização, e após o seqüestro do embaixador norte-americano, foi identificada pelos órgãos de segurança a fiadora do imóvel em que o casal residia. Documentos policiais informam que Solange participou de várias ações armadas entre 1969 e 1970. No final de 1970 foi deslocada para a Bahia.

Nos primeiros dias de março de 1971, depois de participar de uma panfletagem no jogo de reinauguração do estádio da Fonte Nova, em Salvador, quando ocorreu uma perigosa correria entre a multidão, Solange parece ter sofrido um grave surto psicótico e teria se apresentado a uma dependência policial afirmando ser subversiva e fornecendo informações sobre o MR-8. Há documentos comprovando que ela foi interrogada pelo DOI-CODI do Rio e também em Salvador, sendo barbaramente torturada.

Em julho, a grande imprensa divulgou amplas matérias preparadas pelo aparelho de repressão do regime, apresentando-a como arrependida. Adotando a postura de cumplicidade com o regime militar que pautou boa parte da imprensa naquele período, um grande diário carioca de circulação nacional, em 28/07/1971, estampou com estardalhaço a manchete: Sexo é arma para atrair jovens à subversão.

Um ano depois, em 06/07/1972 foi julgada pela Justiça Militar, na 2ª Auditoria do Exército, no Rio, que determinou sua internação no manicômio judiciário pelo prazo mínimo de dois anos.

Depois de solta, em 1973, cursou Medicina e se casou em 1980 com Celso Pohlmann Livi. O marido informou que ela se manteve em tratamento psiquiátrico desde que saiu da prisão.

O Psiquiatra, Dr. Alberto Quielli Ambrósio, CRM 52 1830-3, relata: Durante anos pude testemunhar seu enorme esforço para recuperar-se do grave quadro psiquiátrico, psicótico, conseqüência de sua prisão em 1971. As torturas físicas e mentais a que foi submetida enquanto presa fizeram-na revelar nomes de companheiros de movimentos políticos, bem como esse depoimento no qual se dizia arrependida e renegava sua militância, foi amplamente divulgado em jornais, denegrindo sua moral enquanto mulher. Estes fatos fizeram-na sentir-se sempre culpada pela desgraça e morte das pessoas. Ajudada por nossos esforços, de sua família e marido, Solange obteve muitas e significativas melhoras, mas não conseguiu conviver com tantas marcas – insuperáveis.

Em 1o de agosto de 1982, Solange atirou-se da janela de seu apartamento, no terceiro andar da rua Barão da Torre, no Rio, vindo a falecer no hospital Miguel Couto. Tinha 34 anos.

Embora a data de sua morte seja muito posterior ao episódio da prisão e dos maus-tratos sofridos nos órgãos de segurança do regime militar, considera-se comprovado que o suicídio decorreu dos traumas irreversíveis sofridos em 1971.

Livremente adaptado do Jornal "O BERRO"

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

TORTURADORES E CONSCIÊNCIAS

O advogado João Lucena Leal, radicado em Rondônia há trinta anos, chocou o Brasil, em rede nacional de televisão, com um depoimento frio sobre mortes e torturas durante o regime militar.

Lucena, que é considerado um dos maiores torturadores ainda vivos, falou ao jornalista Roberto Cabrini, do programa Conexão Repórter, do SBT.

Agente da repressão a serviço dos militares que tomaram o poder no País com o golpe de março de 1964, João Lucena Leal foi descrito como o típico homem dos porões da ditadura. Na entrevista, Lucena descreveu, com tranqüilidade e frieza, o que viu e o que fez com os adversários políticos do regime. "O sujetio amarrado, algemado e o executor puxava o gatilho e matava", disse ele ao narrar uma das cenas entre as inúmeras das quais presenciou e participou.

Para Lucena, a tortura se justifica "para extrair uma informação ardente".

Fazia parte de seu trabalho extrair tais informações dos ativistas políticos. "Eu executava com nobreza", acrescentou. Ex-delegado da Polícia Federal, mesmo acusado de cometer atrocidades, Lucena disse estar orgulhoso de tudo o que fez.

Com a saúde severamente abalada após um ataque cardíaco e acusado de ser um torturador impiedoso, mesmo assim o homem da repressão diz ter a consciência e um sono tranqüilos.

Na entrevista, informou ter apenas um remorso. Foi quando viu o corpo de uma moça de 17 anos morta pelos militares. "Peguei no corpo dela e ainda estava quente. A moça não tinha ideologia nenhuma".

Em Rondônia, Lucena ficou rico como advogado de traficantes e de notórios assassinos, como o fazendeiro Darli Alves, que matou a tiros, no Acre, o líder seringueiro Chico Mendes.

Mostrando profundo conhecimento no assunto, o advogado disse que, na sua época, o método mais utilizado era o pau de arara, nas suas palavras , "um instrumento cruel, devastador, que deixa seqüelas. Tem muita gente que não resiste meia hora e conta tudo. Às vezes, é só mostrar o instrumento e ele (a vítima) abre".

O hoje professor José Auri Pinheiro, professor na época, foi torturado barbaramente por dois dias. Ele reconheceu Lucena durante a entrevista a Roberto Cabrini, que lhe mostrou uma foto do advogado quando ainda era mais novo. "O Lucena é um torturador conhecido aqui no Ceará. Em 1973 fui torturado por ele, que é um sujetio explosivo, impulsivo e malvado, que só falava em matar, em destruir as pessoas", contou Auri. Segundo ele, Lucena torturava as vítimas ” com sadismo, com convicção”.

Lucena afirmou ter visto de dez a 15 execuções de guerrilheiros do PC do B no Araguaia, entre elas, a morte de uma jovem identificada por ele como Sônia, que foi assassinada pelo hoje major reformado do Exército Sebastião Curió.

No meio da entrevista, João Lucena disse que, no Araguaia, foi preso o então estudante José Genoíno, que viria a ser presidente do Partido dos Trabalhadores e atualmente é assessor do Ministério da Defesa.

Segundo Lucena, Genoíno não foi torturado e fez um acordo para delatar os companheiros de guerrilha. O major Sebastião Curió confirma a afirmação de Lucena sobre o ex-dirigente petista. "O Genoíno não foi torturado e entregou todo mundo".

Tanto Curió quanto Lucena participaram das investigações e prisão da hoje presidente Dilma Rousseff, então militante política. "Ela (Dilma) era uma menina de 17 ou 18 anos de idade que foi presa e levada para a Operação Bandeirantes e entregue ao delegado Fleury (Sérgio Paranhos Fleury, notório torturador".


Por Nilva de Souza
Do Pragmatismo Político

sábado, 17 de setembro de 2011

O QUE O BRASIL ESCONDE

Revista IstoÉ
Edição nº 2184 | 16.Set.11

O que se sabe é que perduram pelo menos quatro grandes vertentes de mistérios a ser desvendados na história recente do País:

O primeiro desses grupos refere-se à fase inicial da revolução (sic), de 1964 até o sequestro do embaixador suíço Giovanni Butcher, em 1970, quando a matança de inimigos ainda não havia se constituído propriamente numa clara política de governo. Mesmo assim, o aparelho de repressão produziu uma série de vítimas. Os episódios foram pontuais e não há documentos oficiais conhecidos capazes de esclarecê-los. Entre os mais emblemáticos está a morte do ex-sargento Manoel Raimundo Soares, cujo cadáver foi encontrado boiando no rio Jacuí, em Porto Alegre, no que ficou conhecido como “caso das mãos amarradas”, de 1966. Também é dessa fase o assassinato do ex-deputado Rubens Paiva. Sequestrado em 20 de janeiro de 1971 dentro de sua própria casa, no Rio de Janeiro, Paiva foi morto após dois dias de tortura no Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi). A ocultação da morte envolveu esforços da cúpula do governo e até hoje pouco se sabe dela. O assassinato do jornalista Vladimir Herzog, embora tenha ocorrido um pouco depois, em 1974, também pode ser incluído entre casos pontuais ainda sem explicação.

A outra vertente de mistério pertence à fase da chamada política de extermínio urbano, que vitimou militantes que retornaram de Cuba, banidos pelo regime militar e dirigentes de organizações de esquerda. É o momento em que começa a ficar claro que a repressão e a tortura fazem parte de uma política de Estado e não são apenas obras de agentes descontrolados dos porões da tortura. Uma das vítimas famosas do período é o estudante Frederico Eduardo Mayr, morto sob tortura. Os documentos conhecidos sobre sua prisão são típicos daqueles anos de chumbo: contraditórios e inconclusivos.

O terceiro grupo de episódios pendentes de esclarecimento refere-se aos fatos ocorridos a partir de outubro de 1973 durante a Guerrilha do Araguaia, quando todos os que estavam em batalha morreram. Integrante do grupo de trabalho criado pelo Ministério da Defesa para reconstituir o conflito, Myrian Alves sustenta que é no movimento organizado pelo PCdoB que estão os principais “esqueletos” escondidos tanto pela ditadura quanto pelo próprio partido. Entre eles, o sumiço do soldado Valdir de Paula, que pertencia ao comando militar do Pará.

O quarto e último grande grupo de mistérios do período da repressão remete já ao fim da ditadura militar, quando são exterminados dirigentes do PCB, durante a chamada Operação Radar. São casos como o de Orlando Bonfim Júnior, um dos “desaparecidos” do perío¬do. Não há sinais de Bonfim desde que ele foi levado por agentes da repressão ao presídio Castelo Branco, em outubro de 1975. “A resposta que buscamos é única: a verdade, o que aconteceu, onde estão os desaparecidos. Vamos esclarecer e virar essa página”, diz o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Para Paulo Abrão, secretário nacional de Justiça, a Comissão chega num instante em que o efeito do tempo é benéfico, “porque a distância dos fatos permite que hoje eles possam ser administrados de forma menos apaixonada”.

Pelo acordo fechado com o colégio de líderes pelos ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Celso Amorim (Defesa) e Maria do Rosário (Direitos Humanos), é provável que o projeto que cria a Comissão da Verdade seja aprovado na íntegra, como quer o governo. Por ele, a Comissão terá dois anos de vigência, seus sete integrantes serão insubstituíveis e terão ainda completa autonomia para revirar a história em busca da verdade. Ex-militante do PCdoB, preso na Guerrilha do Araguaia, torturado e condenado pela Justiça Militar, o ex-deputado José Genoino, assessor especial do Ministério da Defesa, afirma que não há riscos de a investigação descambar para o revanchismo nem de recolocar na agenda a lei de anistia ou a punição dos torturadores. Ele diz que o que foi pactuado pacifica o País, repõe a verdade histórica e afasta as animosidades que alimentaram a “guerra fria” entre esquerda e direita nos últimos 50 anos. “A comissão não será palanque e nem discutirá o que já foi resolvido pela anistia”, garante Genoino.

A TERRA SE DEFENDE

Por Leonardo Boff

Hoje é vastamente aceita e entrou já nos manuais de ecologia mais recentes (cf.R. Barbault, Ecologia Geral, Vozes 2011) a ideia de que a Terra é viva.

Primeiramente, ela foi proposta pelo geoquímico russo W. Vernadsky na década de 1920 e retomada, nos anos de 1970, com mais profundidade por J. Lovelock e entre nós por J. Lutzenberger, chamando-a de Gaia. Com isso se quer significar que a Terra é um gigantesco superorganismo que se autorregula, fazendo com que todos os seres se interconectem e cooperem entre si. Nada está à parte, pois tudo é expressão da vida de Gaia, inclusive as sociedades humanas, seus projetos culturais e suas formas de produção e consumo.

Ao gerar o ser humano, consciente e livre, a própria Gaia se pôs em risco. Ele é chamado a viver em harmonia com ela mas pode também o romper o laço de pertença. Ela é tolerante, mas quando a ruptura se torna danosa para o todo, ela nos dá amargas lições.

Todos estão lamentando o baixo crescimento mundial, especialmente nos países centrais. As razões aduzidas são múltiplas. Mas para uma visão da ecologia radical, não se deveria excluir a interpretação de que tal fato resulte de uma reação da própria Terra face à excessiva exploração pelo sistema produtivista e consumista que tomou conta do mundo. Ele levou tão longe a agressão ao sistema-Terra a ponto de, como afirmam alguns cientistas, inauguramos uma nova era geológica: o antropoceno, o ser humano como uma força geológica destrutiva, acelerando a sexta extinção em massa que já há milênios está em curso.

Gaia estaria se defendendo, debilitando as condições do arraigado mito de todas as sociedades atuais, inclusive a do Brasil: do crescimento, o maior possível, com consumo ilimitado.

Já em 1972 o Clube de Roma se dava conta dos limites do crescimento, este não sendo mais suportável pela Terra. Ela precisa de um ano e meio para repor o que extraímos dela num ano. Portanto, o crescimento é hostil à vida e fere a resiliência da Mãe Terra. Mas não sabemos nem queremos interpretar os sinais que ela nos dá. Queremos continuar a crescer mais e mais e, consequentemente, a consumir à tripa forra. O relatório “Perspectivas Econômicas Mundiais” do FMI, prevê para 2012 um crescimento mundial de 4,3%. Vale dizer, vamos tirar mais riquezas da Terra, desequilibrando-a como se mostra pelo aquecimento global.

A “Avaliação Sistêmica do Milênio” realizada entre 2001 e 2005 pela ONU, ao constatar a degradação dos principais itens que sustentam a vida advertiu: ou mudamos de rota ou pomos em risco o futuro de nossa civilização.

A crise econômico-financeira de 2008 e retornada agora em 2011 refuta o mito do crescimento. Há uma cegueira generalizada que não poupa sequer os 17 Nobeis da economia, como se viu recentemente no seu encontro no lago Lindau no sul da Alemanha. À exceção de J. Stiglitz, todos eram concordes em sustentar que o marco teórico da atual economia não teve nenhuma responsabilidade pela crise atual (Página 12, B. Aires, 28/08/2011). Por isso, ingenuamente postularam seguir a mesma rota de crescimento, com correções, sem se dar conta de que estão sendo maus conselheiros.

Mas importa reconhecer um dilema de difícil solução: há regiões do planeta que precisam crescer para atender demandas de pobres, obviamente, cuidando da natureza e evitando a incorporação da cultura do consumismo; e outras regiões já superdesenvolvidas precisam ser solidárias com as pobres, controlar seu crescimento, tomar apenas o que é natural e renovável, restaurar o que devastaram e devolver mais do que retiraram para que as futuras gerações também possam viver com dignidade, junto com a comunidade de vida.

A redução atual do crescimento representaria uma reação sábia da própria Terra que nos passa este recado: “parem com a idéia tresloucada de um crescimento ilimitado, pois ele é como um câncer que vai comendo todas as células sãs; busquem o desenvolvimento humano, dos bens intangíveis que, este sim, pode crescer sem limites como o amor, o cuidado, a solidariedade, a compaixão, a criação artística e espiritual”.

Não incorro em erro na crença de que está havendo ouvidos atentos para essa mensagem e que faremos a travessia ansiada.

Leonardo Boff é teólogo, filósofo e escritor.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

VÍTIMAS DA DITADURA: STUART EDGAR ANGEL JONES

Stuart Edgar Angel Jones era filho da estilista de alta costura Zuzu Angel com o norte-americano Norman Angel Jones. Nasceu em Salvador, em 11/01/1945 e cresceu no Rio de Janeiro. Era estudante de Economia na Universidade Federal do Rio de Janeiro, tendo trabalhado também como professor. Em 18/08/1968, havia casado com Sonia Maria Lopes de Moraes e Moravam na Tijuca.

Era militante do Militante do MR-8

Foi preso por volta das 9h da manhã do dia 14 de maio de 1971, na avenida 28 de Setembro, em Vila Isabel, zona norte do Rio de Janeiro.

As circunstâncias de sua morte sob torturas foram narradas, em carta à sua mãe, Zuzu, pelo preso político Alex Polari de Alverga, que esteve com ele, preso na unidade da Aeronáutica, na Base Aérea do Galeão.

“Em um momento retiraram o capuz e pude vê-lo sendo espancado depois de descido do pau-de-arara. Antes, à tarde, ouvi durante muito tempo um alvoroço no pátio. Havia barulho de carros sendo ligados, acelerações, gritos, e uma tosse constante de engasgo e que pude notar que se sucedia sempre às acelerações. Consegui com muito esforço olhar pela janela que ficava a uns dois metros do chão e me deparei com algo difícil de esquecer: junto a um sem número de torturadores, oficiais e soldados, Stuart, já com a pele semi-esfolada, era arrastado de um lado para outro do pátio, amarrado a uma viatura e, de quando em quando, obrigado, com a boca quase colada a uma descarga aberta, a aspirar gases tóxicos que eram expelidos.”

Presume-se que os militares o torturaram com tamanha brutalidade porque pretendiam, através dele, chegar a Carlos Lamarca, recentemente integrado à organização.

Zuzu Angel procurou o filho infatigavelmente, abordando autoridades nacionais e internacionais e concedendo entrevistas a quantos veículos de imprensa tivessem a coragem de publicá-las. Conseguiu fazer chegar sua denúncia ao então senador Edward Kennedy, que levou o caso à tribuna do Senado dos Estados Unidos.

Pessoalmente, conseguiu entregar ao secretário de Estado Henry Kissinger, em visita ao Brasil em fevereiro de 1976, uma carta com a denúncia e um exemplar do livro de Hélio Silva, onde era relatada a morte de Stuart. Todos os principais jornais estrangeiros registraram o fato, em especial o Washington Post e Le Monde.

Zuzu foi morta, em março de 1976, sem nunca descobrir qualquer indício do paradeiro do filho. O desaparecimento de Stuart e a luta de Zuzu foram evocados por Chico Buarque e Miltinho na canção Angélica, de 1977, e levados ao cinema, em 2006, pelo diretor Sérgio Rezende, tendo a atriz Patrícia Pilar atuado como a mãe de Stuart.

No livro “Desaparecidos Políticos”, Reinaldo Cabral e Ronaldo Lapa escrevem:

“Para o desaparecimento do corpo existem duas versões. A primeira é de que teria sido transportado por um helicóptero da Marinha para uma área militar localizada na restinga de Marambaia, na Barra de Guaratiba, próximo à zona rural do Rio, e jogado em alto-mar pelo mesmo helicóptero. Mas, de acordo com outras informações, o corpo de Stuart teria sido enterrado como indigente, com o nome trocado, num cemitério de um subúrbio carioca, provavelmente Inhaúma.”

Muito mais que um exemplo de coragem, a estilista Zuleika Angel Jones, mais conhecida como Zuzu Angel, foi uma mãe determinada a dizer ao mundo como é cruel ter um filho assassinado sob torturas e não ter o direito de sepultá-lo com dignidade.

Longe de ser uma ativista política, Zuzu Angel era apenas uma estilista reconhecida do Brasil e no exterior preocupada em fazer o seu trabalho.
Zuzu Angel gostava de mostrar aos amigos a última carta que recebera de seu filho:
“Mãe,
Você me pergunta se eu acredito em Deus e eu te pergunto, que Deus? Tem sido minha missão te mostrar Deus dentro do homem, pois, somente no homem ele pode existir.
Não há homem pobre ou insignificante que pareça ser, que não tenha uma missão. Todo homem por si só influencia a natureza do futuro. Através de nossas vidas nós criamos ações que resultam na multiplicação de reações.
Esse poder, que todos nós possuímos, esse poder de mudar o curso da história, é o poder de Deus. Confrontado com essa responsabilidade divina eu me curvo diante do Deus dentro de mim.

Adaptado do Jornal "O Berro"

domingo, 11 de setembro de 2011

DÍVIDA PÚBLICA

Ultimamente estão escrevendo e falando muito sobre Dívida Pública.

Mas, você sabe o que é dívida pública?

A Dívida pública acontece quando todos os recursos arrecadados pelo Estado com impostos, não é suficiente para cobrir os gastos (do Estado) com as políticas públicas que incluem saúde, obras, aposentadorias, entre outras.

Então, para cumprir suas metas, o governo assume dívidas. É parecido com o orçamento doméstico: se não temos dinheiro para fazer uma reforma na casa, podemos pedir emprestado ao banco.

Essas dívidas são contraídas por meio de emissão de títulos públicos. O título é uma garantia de que o valor investido naquele país (emprestado) por bancos, empresas, particulares ou outro estado, será ressarcido com juros.

Em algumas circunstâncias, o endividamento pode atingir o patamar previsto no orçamento. Foi o que aconteceu nos Estados Unidos. Os gastos militares com as guerras do Iraque e do Afeganistão, somados à crise financeira de 2008, fizeram com que o limite (US$ 14,3 trilhões ou cerca de R$ 22,2 trilhões), fosse atingido em 16 de maio. Uma manobra do Executivo permitiu estender esse prazo-limite para 2 de agosto, mas algo precisava ser feito.

Então, tivemos os debates no Congresso.

O Partido Democrata, do Presidente, defende que, para conter o déficit público é necessário cortar os gastos de guerra, e talvez aumentar os impostos.

O Partido Republicano, que é oposição ao presidente, mas tem a maioria no Congresso é contra o aumento dos impostos e defende o corte nos gastos públicos (saúde, aposentadoria, etc.).

Agora, preste atenção como está sendo tratado esse assunto pela mídia nacional. De repente as dívidas dos estados tornaram-se as explicações únicas para a crise financeira internacional. Não é o sistema capitalista que atravessa uma crise estrutural – é a dívida do estado.

Provavelmente a idéia seja desviar o foco da necessária reforma fiscal (no Brasil os mais ricos pagam muito menos do que deveriam) e culpar os custos com aposentadoria e saúde (o Brasil possui um dos melhores sistemas mundiais, que inclui saúde universal e aposentarias e pensões para grupos antes esquecidos como o trabalhador rural e empregada doméstica, mas claro, que isso tem preço).

Ou seja, a culpa da crise é a dívida. Mas não a dívida com guerras, com negociatas e favorecimentos, mas a dívida com o povo (a pública).

Não são as falências fraudulentas, as especulações irresponsáveis, os investimentos e trocas de favores os responsáveis pelas dificuldades atuais. São os benefícios, na maioria de um salário mínimo, os medicamentos gratuítos, as pensões...essas são as causas da crise.

Entendeu?

Não concorda? Então, observe os noticiários e depois me diga.

Prof. Péricles

MARCHAS E MARCHANTES

As passeatas promovidas, inicialmente em redes sociais (?), e depois com hora e trajeto intensamente divulgados pela mídia, chamaram a atenção nos últimos dias.

Inicialmente, todo mundo é contra a corrupção. Qual cidadão brasileiro a defenderia?

Fazer passeata contra a corrupção é como fazer passeata contra o câncer. Bonitinho, mas inócuo.

Mas, junto com a aparente unanimidade de um movimento assim constituído, podemos ter inúmeras segundas intenções, que, claro, é próprio da política e da politicagem.

O maior perigo de movimentos assim são seus desdobramenos conforme o interesse de quem os organiza.

A Marcha da Família com Deus pela Liberdade foi um movimento que nasceu dessa forma.

Auto denominando-se defensores da moral e dos bons costumes elegeram o governo do presidente João Goulart o responsável pela secular corrupção brasileira. De passagem, e não menos ímpeto, acusaram o presidente e seus auxiliares de comunistas. Assim, os defensores da moral uniram a corrupção à ideologia e a um governo. Tornaram-se proprietários puritanos da moral exigindo um golpe que derrubasse o poder constituído e salvasse a família brasileira.

A marcha, promovida pelas mulheres mineiras e que depois se alastrou por vários estados, clamou pelo golpe militar de 64. Segundo muitos foi ela que fez optar pelo golpe até militares que, inicialmente, eram contra ele, como o General Castelo Branco.

Pois deu-se o golpe e a corrupção não desapareceu.

Seguiram-se 20 anos de trevas e autoritarismo. Foram-se os antigos corruptos e novos tomaram seu lugar. Aliás, esse é o procedimento de todas as ditaduras: afastar os corruptos inimigos e colocar no lugar os corruptos amigos.

Não se pode partidarizar a corrupção. Ela é tão antiga quanto o Brasil e mais global do que o sistema financeiro. Não se pode permitir essa partidarização, pois isso é burro, injusto e desconhece a história do Brasil.

Na verdade, a corrupção começa na própria forma com que nosso sistema político está organizado, principalmente, nas questões de financiamento das campanhas eleitorais. É aí que os conchavos, acordos e alianças de interesses fazem nascer compromissos que mais tarde realimentarão o processo da corrupção.

Em vez de passeatas vazias deveríamos sair às ruas exigindo uma reforma política profunda, que torne absolutamente claro os investimentos de campanha. Que criasse o sistema unicameral extinguindo o senado que nunca serviu pra nada maior em nosso país já que nunca fomos realmente uma federação. Isso, por si só já traria um controle relativo que atualmente é impossível.

Em vez de passeatas contra o óbvio faria melhor o cidadão brasileiro sair às ruas quando elementos de um partido ameaçassem a presidenta de uma derrota no Congresso se continuasse a “limpa” em seu ministério.

Além disso, deveríamos trabalhar solução desse problema da corrupção no mesmo lugar onde nascem todos os nossos problemas e suas soluções: o nosso íntimo.
Não podemos exigir um sistema político e uma máquina administrativa menos corrupta enquanto nós mesmos não nos reformarmos no exercício da cidadania.

Não pode um povo que fura fila, que estaciona em fila dupla, que burla a Lei sempre que possível, que busca vantagem em tudo, que oferece propina à autoridade para obter vantagens, querer um congresso límpido como um coral de anjos.

Na verdade, cada congresso espelha fielmente seu próprio povo.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

AJUDA HUMANITÁRIA NA LÍBIA

Mas, era preciso tanta ajuda humanitária assim?

Segundo a própria OTAN, nos últimos cinco meses foram realizadas 20.121 missões aéreas, incluindo 7.597 bombardeios.

Esqueceram de anunciar o número de pessoas mortas nesses ataques, incluindo civis, homens, mulheres e crianças, mas nem tudo pode ser perfeito nesses serviços de informações, oras. Detalhes, apenas detalhes...

Para a OTAN foi uma festa. Criada em 1949 no auge da crise de Berlim, ela
jamais entrou em operação real durante a “Guerra Fria”. E depois que a Guerra Fria acabou seus generais devem ter pensado “Oh Shit... o que fazemos com todo esse arsenal com data de validade tão próxima? (sim, porque o progresso da tecnologia de matar é muito rápido e em pouco tempo as armas estão ultrapassadas).

Uma parte eles despejaram na Sérvia durante a crise do Kosovo nos anos 90. Outra parte nessas guerrinhas menores e aborrecidas. E agora... que maravilha...um país inteirinho para bombardear e poder gastar suas ogivas para justificar a fabricação e compra de novo lote, pois é disso que vivem os industriais da guerra, é nisso que reside o lucro da morte.

Ok baby, entre a ajuda humanitária e o Ditador Kadafi existe o povo líbio, tudo bem. Mas quem liga pra isso? É um povinho terceiro-mundista de crianças remelentas e de gente com turbante na cabeça.

A nossa mídia cuida disso divulgando baboseiras de heroísmo e solidariedade dos europeus e americanos bonzinhos executando seu papel de polícia do mundo e perseguindo mais um bandido (o da moda é o Kadafi já que o Sadan e o Osama sacanearam e morreram).

Toda a infra-estrutura da Líbia está destruída. Colégios, hospitais, hidrelétricas, aeroportos, estradas, tubulações. Um país que não tinha desemprego, cujo governo pagava os estudos de seus jovens, de qualquer classe social, e que nos últimos 30 anos diminuiu drasticamente as distâncias entre ricos e miseráveis agora não terá dinheiro nem para sua mortalha.

Em breve arderá em chamas e se contorcerá em lutas de clãs rivais. Os fundamentalistas do norte já avisaram que não aceitam o governo do leste e assim eles compram mais armas e vão se matando e morrendo crianças remelentas e gente de turbante em cenas exibidas pelas TVs ocidentais arrancando suspiros de piedade hipócrita.

“Você viu no telejornal de ontem? Pobres crianças... fiquei tão chocado...”

Mas... não se aflijam queridos líbios. As construtoras e indústrias petrolíferas do ocidente estão aí para mais uma ajuda humanitária. Agora reconstruindo o país que eles mesmos destruíram (claro que tudo pago pelo novo governo livre e democrático, lógico). Também irão explorar e exportar seu petróleo, e eles são tão bacanas que vão descontar o valor do produto da imensa dívida que o país assumiu com a OTAN para obter sua ajuda militar, quer dizer, humanitária.

A mídia mais uma vez fez o favor de nos dizer pra quem torcer e o que pensar.

Podemos dormir tranqüilos aqui na terra tupiniquim já que não precisamos da ajuda da OTAN.

Quantos aos mortos... não são problema nosso, e, por favor, troque de canal pra mim.

Prof. Péricles

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE

O governo federal está mobilizando suas forças para conseguir aprovar até o fim deste mês o projeto de lei que cria a Comissão Nacional da Verdade. O esforço é capitaneado pelo ministro da Defesa, Celso Amorim. Nos últimos dias ele fez várias ligações para os líderes dos partidos de oposição na Câmara pedindo apoio à proposta.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, também está em campo. Ex-deputado, com trânsito fácil no meio parlamentar, ele já se reuniu com os líderes do PSDB, DEM, PPS e PV. A presidente Dilma Rousseff, que na sexta-feira, na abertura do Congresso do PT, prometeu à militância que a comissão será instalada, também mobilizou a ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário, para o trabalho de vencer resistências à proposta.

O objetivo é aprovar o projeto por meio de um acordo entre líderes partidários, em caráter de urgência. A votação ocorreria numa sessão extraordinária, convocada especialmente para isso. Na conversa com a oposição, a maior preocupação dos três ministros é deixar claro que a comissão não terá caráter revanchista, nem abrirá debates sobre uma possível revisão da Lei da Anistia.

O governo diz entender que o assunto se encerrou no ano passado, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) negou à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) o pedido para que policiais e militares acusados de violações de direitos humanos nos anos da ditadura fossem excluídos da anistia. Na avaliação da corte, eles também foram beneficiados pela lei de 1979.

"A comissão terá apenas preocupações históricas, de esclarecimento de fatos ocorridos naquele período", afirma José Genoino, assessor especial do ministro da Defesa. "Não
existem preocupações revanchistas nem punitivas."

Agência Estado
Publicação: 04/09/2011 10:54 Atualização: 04/09/2011 14:26

domingo, 28 de agosto de 2011

BRASIL MENOS CATÓLICO EM 20 ANOS

O Brasil pode deixar de ser o país mais católico do mundo nos próximos 20 anos, de acordo com o Novo Mapa das Religiões, divulgado pela Fundação Getulio Vargas (FGV).

“É um ritmo forte de transformação. As mudanças que aconteceram em 100 anos agora estão acontecendo em dez [anos]. Se continuar essa perda de 1 ponto de porcentagem [de católicos] por ano, em 20 anos você teria menos de metade da população”, calcula Marcelo Neri, coordenador do levantamento.

O relatório mostra que atualmente o percentual de mulheres católicas (71,3%) é menor do que o de homens (75,3%). “Acima de tudo, acho que seja a chamada revolução feminina. Poucas coisas mudaram mais no cotidiano das pessoas do que questões como trabalho e anticoncepção entre as mulheres. O fato é que, embora as mulheres sejam bem mais religiosas do que os homens, elas são menos católicas, talvez por uma questão de afinidade”, disse Neri.

O Novo Mapa das Religiões revela que o sexo feminino representa a maioria entre adeptos de 23 das 25 religiões listadas como as mais populares pela pesquisa, como a católica, a evangélica pentecostal, a evangélica tradicional, a espírita kardecista, a luterana e a umbanda. Segundo o documento, enquanto os homens abandonaram crenças, elas mudaram de religião. “O catolicismo, o candomblé e o budismo são religiões masculinas. Todas as outras são basicamente femininas”, acrescentou o coordenador.

Outro dado do levantamento é que a taxa de catolicismo no Nordeste é a mais alta do Brasil (74%) e no Sudeste é a mais baixa (64%). “No entanto, no Nordeste [a taxa] tem crescido em velocidade 2,5 vezes maior do que no Sudeste”, ressaltou o coordenador da pesquisa.

Entre os estados, o Piauí é o que concentra o maior número de católicos. Na outra ponta, está Roraima, com a menor população adepta ao catolicismo e que também apresenta a menor religiosidade.

O catolicismo está mais presente entre os mais ricos, da classe AB (69,07%), e entre os mais pobres, da classe E (72,76%).

Entre as outras religiões, os evangélicos tradicionais estão concentrados, principalmente, nas classes AB (8,35%) e C (8,72%), reduzindo a participação nas camadas mais baixas, chegando a representar 4,69% da classe E.

Seitas espíritas e espiritualistas representam 5,52% da população na classe AB. Entre as faixas de renda, a classe E foi a que se mostrou como a menos religiosa de todas (7,72% não têm religião).

“Religiões orientais e afro-brasileiras estão mais presentes no topo [considerando a renda]. Quanto mais a renda aumenta, existe mais diversidade religiosa. Nos últimos anos no Brasil, houve uma queda acelerada do catolicismo, mas não em direção aos evangélicos pentecostais, como nas chamadas décadas perdidas, e mais em direção aos evangélicos tradicionais e todas as religiões alternativas ao catolicismo e aos grupos evangélicos”,


Novo Mapa das Religiões, divulgado pela Fundação Getulio Vargas (FGV):
http://www.fgv.br/cps/religiao/
http://www.fgv.br/cps/bd/rel3/REN_texto_FGV_CPS_Neri.pdf

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

JÂNIO QUADROS, 50 ANOS DA RENÚNCIA

Jânio Quadros não se limita ao hilário. Sua atuação na história do Brasil está muito mais para o trágico do que para o cômico.

Mais que tudo isso, uma lição. Um exemplo. Uma história contada e recontada que deveria nos servir de alerta e reflexão.

Jânio Quadros foi eleito presidente do Brasil com uma votação extraordinária, verdadeiro fenômeno eleitoral.

Naqueles tempos de fervura (desde o suicídio de Vargas em 1954 pairava sobre o país a sombra de um golpe, tentando os conspiradores até mesmo impedir a posse de JK), pela primeira vez as forças conservadoras chegavam ao poder. Pela primeira vez alguém apoiado pela UDN (União Democrática Nacional, anti-getulista e anti-comunista) chegava lá.

Mas o que fizera a direita para vencer com mais de 6 milhões de votos derrotando forças identificadas com Getúlio, encarnadas na figura honrada do Mal. Teixeira Lott?

Apresentaram propostas, durante a campanha eleitoral, de desenvolvimento e geração de emprego? Defenderam medidas de ajustes diminuindo as enormes distâncias sociais que separavam brasileiros? Propuseram um modelo de sociedade mais justa?

Não. As propostas de Jânio e seu alto comando, da UDN e de Carlos Lacerda, eram vazias como um porongo.

Então, por que a vitória estrondosa?

Porque usaram o mais seguro dos caminhos até os corações da maioria dos brasileiros: o discurso moralista e conservador. A identificação de Jânio como o homem que combateria a corrupção, que varreria a roubalheira, que defenderia a moral e a família brasileira, ameaçada pelos comunistas, esses “seres ateus, que odeiam os valores da família, os valores cristãos”.

Quando faltam argumentos, o anticomunismo tupiniquim se apodera da corrupção como algo recente e exclusivo às ações de seus adversários políticos.

Reparem que, pouca coisa mudou em relação ao último candidato derrotado para a Presidência, José Serra, que em desespero para evitar uma derrota ainda no primeiro turno, usou o discurso do bem (ele era o bem) contra sua oponente acusando-a de defender o aborto ou de ser a madrinha política de uma ministra que permitira o tráfico de influência em seu ministério.

Interessante notar como um povo que não conhece sua história repete os erros do passado e cai no mesmo truque dos estelionatários eleitorais.

Mostrando um Jânio de terno amorrotado, que comia sanduíches de mortadela tirados do próprio bolso, que mostrava uma vassoura como símbolo de limpeza contra a corrupção, a direita fez de Jânio Quadros um mito. Uma figura singular, pura, do povo, combatendo os monstros da corrupção e do mal.

Eleito, Jânio levou o Brasil para mares repletos de tempestades e em sete meses confundiu, iludiu, se perdeu e perdeu o país, pois acima de tudo, lhe faltavam idéias e ideais.

Ao renunciar em 25 agosto de 1961 jogou o país na mais grave crise de sua história, não ocorrendo uma guerra civil por detalhes muito pequenos.



Jânio Quadros faleceu em 1992, aos 75 anos. Dizem que, antes de fechar os olhos, segredou a um sobrinho que este teria sido seu maior erro em toda vida.

Para nós, hoje, ao atingirmos 50 anos da renúncia, seria importante se, em sua celebração nos comprometêssemos a nunca mais permitir que o falso moralismo oportunista prevaleça sobre a razão.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

LUTA, SUBSTANTIVO FEMININO

As mulheres torturadas pela repressão no Regime militar sofreram, além dos martírios físicos comuns aos homens, as torturas psicológicas e agressões a sua própria condição feminina.

Além das dores dilacerantes do corpo, as dores inomináveis na alma e na dignidade.

A seguir, alguns relatos, dessas mártires da luta contra a ditadura militar:

ROSE NOGUEIRA - jornalista, presa em 1969, em São Paulo, onde vive hoje.

“Sobe depressa, Miss Brasil’, dizia o torturador enquanto me empurrava e beliscava minhas nádegas escada acima no Dops. Eu sangrava e não tinha absorvente. Eram os ‘40 dias’ do parto. Riram mais ainda quando ele veio para cima de mim e abriu meu vestido. Segurei os seios, o leite escorreu. Eu sabia que estava com um cheiro de suor, de sangue, de leite azedo. Ele (delegado Fleury) ria, zombava do cheiro horrível e mexia em seu sexo por cima da calça com um olhar de louco. O torturador zombava: ‘Esse leitinho o nenê não vai ter mais’”.

IZABEL FÁVERO - professora, presa em 1970, em Nova Aurora (PR). Hoje, vive no Recife, onde é docente universitária.

"Eu, meu companheiro e os pais dele fomos torturados a noite toda ali, um na frente do outro. Foi pau de arara, choques elétricos, jogo de empurrar e ameaças de estupro. Eu estava grávida de dois meses, e eles estavam sabendo. No quinto dia, eu abortei. Quando melhorei, voltaram a me torturar”.

HECILDA FONTELLES VEIGA - estudante de Ciências Sociais, presa em 1971, em Brasília. Hoje, vive em Belém, onde é professora da Universidade Federal do Pará.

“Quando fui presa, minha barriga de cinco meses de gravidez já estava bem visível. Fui levada à delegacia da Polícia Federal, onde, diante da minha recusa em dar informações a respeito de meu marido, Paulo Fontelles, comecei a ouvir, sob socos e pontapés: ‘Filho dessa raça não deve nascer’.
Me colocaram na cadeira do dragão. Da cadeira em que sentávamos saíam uns fios, que subiam pelas pernas e eram amarrados nos seios. As sensações que aquilo provocava eram indescritíveis: calor, frio, asfixia.
Aí, levaram-me ao hospital da Guarnição de Brasília, onde fiquei até o nascimento do Paulo. Nesse dia, para apressar as coisas, o médico, irritadíssimo, induziu o parto e fez o corte sem anestesia”.

IGNES MARIA RAMINGER - estudante de Medicina Veterinária presa em 1970, em
Porto Alegre, onde trabalha atualmente como técnica da Secretaria de Saúde.

“Fui levada para o Dops, onde me submeteram a torturas como cadeira do dragão e pau de arara. Davam choques em várias partes do corpo, inclusive nos genitais. De violência sexual, só não houve cópula, mas metiam os dedos na minha vagina, enfiavam cassetete no ânus. Isso, além das obscenidades que falavam. Havia muita humilhação. E eu fui muito torturada, juntamente com o Gustavo [Buarque Schiller], porque descobriram que era meu companheiro”.

DILEA FRATE - estudante de Jornalismo presa em 1975, em São Paulo. Hoje, vive no Rio de Janeiro, onde é jornalista e escritora.

“Dois homens entraram em casa e me seqüestraram, juntamente com meu marido, o jornalista Paulo Markun. No DOI-Codi de São Paulo, levei choques nas mãos, nos pés e nas orelhas, alguns tapas e socos. Num determinado momento, eles, rindo, puseram fogo nos meus cabelos, que passavam da cintura”.

CECILIA COIMBRA - estudante de Psicologia presa em 1970, no Rio. Hoje, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais e professora de Psicologia da Universidade Federal Fluminense.

“Os guardas que me levavam, frequentemente encapuzada, percebiam minha fragilidade e constantemente praticavam vários abusos sexuais contra mim. Os choques elétricos no meu corpo nu e molhado eram cada vez mais intensos. Me senti desintegrar: a bexiga e os esfíncteres sem nenhum controle. ‘Isso não pode estar acontecendo: é um pesadelo… Eu não estou aqui…’, pensei. Vi meus três irmãos no DOI-Codi/RJ. Sem nenhuma militância política, foram seqüestrados em suas casas, presos e torturados”.

MARIA AMÉLIA DE ALMEIDA TELES - professora de educação artística presa em
1972, em São Paulo. Hoje é diretora da União de Mulheres de São Paulo.

“Fomos levados diretamente para a Oban. Eu vi que quem comandava a operação do alto da escada era o coronel Ustra. Subi dois degraus e disse: ‘Isso que vocês estão fazendo é um absurdo’. Ele disse: ‘Foda-se, sua terrorista’, e bateu no meu rosto. Eu rolei no pátio. Aí, fui agarrada e arrastada para dentro. Me amarraram na cadeira do dragão, nua, e me deram choque no ânus, na vagina, no umbigo, no seio, na boca, no ouvido. Fiquei nessa cadeira, nua, e os caras se esfregavam em mim, se masturbavam em cima de mim. Mas com certeza a pior tortura foi ver meus filhos entrando na sala quando eu estava na cadeira do dragão. Eu estava nua, toda urinada por conta dos choques”.


São apenas alguns de mais de 500 relatos que você encontra no livro “LUTA, SUBSTANTIVO FEMININO”, coordenado pelo professor José Ribamar Bessa Freire.

sábado, 20 de agosto de 2011

FREI TITO 03: UM SILÊNCIO DE DEUS

Banido do país, Frei Tito, deixou uma carta ao companheiro Vanderley Caixe, também na prisão: "companheiro, aqui ou no exterior estaremos sempre lutando pela liberdade e o socialismo."

Na prisão, ele escreveu sobre a sua tortura e o documento correu pelo mundo e se transformou em símbolo de luta pelos direitos humanos.

Em 1971 foi deportado para o Chile e, sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. Em Roma, não encontrou apoio da Igreja Católica, por ser considerado um “frade terrorista”. De Roma foi para Paris, onde recebeu apoio dos dominicanos.

Traumatizado pela tortura que sofreu, Frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico. Seu estado era instável, vivendo uma agoniada alternância entre prisão e liberdade diante do passado.

Para se ter idéia de como o seu trauma era terrível, saiba de uma história ocorrida em sua vida: Uma vez, em pânico, recusou-se a entrar no convento e os frades chamaram o frei Xavier Plassat. Ao encontrar Tito, no meio da chuva, assustado e escondido atrás de uma árvore, dizia que Fleury não o deixava entrar no convento. Xavier então pediu a Tito para tomar café com a "autorização de Fleury" (segundo a visão de Tito). Ao entrar no carro, Xavier pediu para Tito esperar no carro enquanto buscava alguns agasalhos. Quando Xavier voltou para o veículo, Tito estava fora do carro (escondido na mesma árvore) e assustado, como se Fleury tivesse entrado no automóvel.

No dia 10 de agosto de 1974, um morador dos arredores de Lyon, encontrou o corpo de Frei Tito, suspenso por uma corda.

Foi enterrado no cemitério dominicano Sainte Marie de La Tourette, em Éveux.

Em 25 de março de 1983, o corpo de Frei Tito chegou ao Brasil. Antes de chegar a Fortaleza, passou por São Paulo, onde foi realizada uma celebração litúrgica em memória dos mortos pela ditadura de 1964: o próprio Frei Tito e Alexandre Vannucchi.

A missa foi celebrada por D. Paulo Evaristo Arns em trajes vermelhos, trajes usados em celebrações de Mártires, acompanhada por mais de quatro mil pessoas.

É necessário e urgente contar essa história para os jovens. Mas falar da Ditadura Militar brasileira, da tortura e morte dos militantes, é sem dúvida um desafio para pais e educadores.

Como falar para nossos alunos e filhos que muitos brasileiros foram torturados até morrer, simplesmente porque não tinham o direito de falar contra o seu governo? Como explicar que alguns destes torturadores estão entre nós, trabalhando, candidatando-se a cargos políticos, vivendo sem lembrar do rastro de sangue que deixaram para trás? Como explicar que Frei Tito foi preso e sofreu tanto nas mãos dos seus algozes somente por ter conseguido um sítio para uma reunião de estudantes?

Professores e pais cearenses têm a sorte de contar com o Memorial Frei Tito, no Museu do Ceará. Idealizado e montado por Régis Lopes, historiador e diretor do Museu, e Lúcia Alencar, sobrinha de Frei Tito, o Memorial expõe documentos, fotos e objetos pessoais de Frei Tito, trazendo sua presença para perto de nós. Uma das fotos em exposição mostra os jovens presos no Congresso de Ibiúna, São Paulo, quando a Ditadura Militar não permitia nenhum tipo de reunião ou agremiação, justamente o momento que determinou a prisão e o começo do sofrimento de Frei Tito.

Passear pelas paredes vermelhas do Memorial Frei Tito com um grupo de adolescentes é despertar uma série de perguntas que eles precisam elaborar e responder, compreendendo o passado do país. Precisamos deixar essa história registrada, para que os jovens de hoje e de amanhã conheçam os passos deste homem, que acreditava no Evangelho, nas mudanças da sociedade, mas que tinha plena consciência de que nada aconteceria sem o esforço de cada um, desde cedo, vendo, julgando e agindo.

Poucos dias antes de morrer, Frei Tito escreveu na sua agenda:
"São noites de silêncio
Vozes que clamam num espaço infinito
Um silêncio do homem e um silêncio de Deus."

Socorro Acioli é jornalista e escritora, autora do livro Frei Tito da Coleção Terra Bárbara, Edições Demócrito Rocha.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

19 de agosto - DIA DO HISTORIADOR

A Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) deu parecer favorável, recentemente (09/09/2008) ao projeto de lei que institui o Dia Nacional do Historiador. A proposta que homenageia os historiadores é de autoria do senador Cristovam Buarque (PDT-DF).
Originalmente, o texto estabelecia que a data seria celebrada no dia 12 de setembro.


Mas o relator da proposição na CE, senador Augusto Botelho (PT-RR), propôs uma emenda - aprovada pela comissão - que altera a comemoração para o dia 19 de agosto. A nova data foi escolhida para homenagear Joaquim Nabuco, que nasceu em 19 de agosto de 1849 e também foi historiador.



JUSTIFICAÇÃO (por Cristovam Buarque)


Um povo sem história é um povo sem memória. Essa afirmação, mais que um dito já popular, é também uma verdade histórica, pois todos os agrupamentos humanos que não preservaram sua memória - em histórias, documentos, objetos de arte e arquitetura -
acabaram sucumbindo a ditaduras e até acabaram por desaparecer da face da Terra. Por essa razão, não apenas a disciplina que trata das histórias dos povos deve merecer nossa atenção, mas também os cientistas que se dedicam a essa tarefa tão nobre. Obviamente, a história se faz por seus protagonistas: lideranças políticas, religiosas e econômicas, por um lado; grupos populares, lutas contra a opressão e pela libertação, por outro. E para registrar tudo, o historiador. E de tal modo é importante o papel dos historiadores que,
por vezes, eles ajudam, também, a reconfigurar a história de um País.Ao lado da Filosofia e da Literatura, a História está presente desde os primeiros momentos da nossa tradição ocidental, constituindo um dos saberes mais antigos de nossa civilização. (...)


Fonte: café história

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

FREI TITO 02: AS PRÓPRIAS PEDRAS GRITARÃO

O texto é intenso, mas peço, encarecidamente, que o leiam até o final.

Foi escrito pelo próprio Frei Tito em fevereiro de 1970 e saiu clandestinamente da prisão sendo publicado, entre outros, pelas revistas Look e Europeo sob o título “As Próprias Pedras Gritarão”.

Leiam em nome de todas as vítimas. Em nome de Frei Tito.



Fui levado do presídio Tiradentes para a "Operação Bandeirantes", no dia 17 de fevereiro de 1970, 3ª feira, às 14 horas. O capitão Maurício veio buscar-me em companhia de dois policiais e disse: "Você agora vai conhecer a sucursal do inferno". Algemaram minhas mãos, jogaram me no porta-malas da perua. No caminho as torturas tiveram início: cutiladas na cabeça e no pescoço, apontavam-me seus revólveres.

Preso desde novembro de 1969, eu já havia sido torturado no DOPS. Em dezembro, tive minha prisão preventiva decretada pela 2ª auditoria de guerra da 2ª região militar. Fiquei sob responsabilidade do juiz auditor dr Nelson Guimarães. Soube posteriormente que este juiz autorizara minha ida para a OB sob “garantias de integridade física”.

Ao chegar à OB fui conduzido à sala de interrogatórios. A equipe do capitão Maurício passou a acarear-me com duas pessoas. O assunto era o Congresso da UNE em Ibiúna, em outubro de 1968. Queriam que eu esclarecesse fatos ocorridos naquela época. Apesar de declarar nada saber, insistiam para que eu “confessasse”.

Pouco depois levaram me para o “pau-de-arara”. Dependurado nu, com mãos e pés amarrados, recebi choques elétricos, de pilha seca, nos tendões dos pés e na cabeça. Eram seis os torturadores, comandados pelo capitão Maurício. Davam-me "telefones" (tapas nos ouvidos) e berravam impropérios. Isto durou cerca de uma hora. Descansei quinze minutos ao ser retirado do "pau-de-arara".

O interrogatório reiniciou. As mesmas perguntas, sob cutiladas e ameaças. Quanto mais eu negava mais fortes as pancadas. A tortura, alternada de perguntas, prosseguiu até às 20 horas. Ao sair da sala, tinha o corpo marcado de hematomas, o rosto inchado, a cabeça pe sada e dolorida. Um soldado, carregou-me até a cela 3, onde fiquei sozinho. Era uma cela de 3 x 2,5 m, cheia de pulgas e baratas. Terrível mau cheiro, sem colchão e cobertor. Dormi de barriga vazia sobre o cimento frio e sujo.

Na quarta-feira fui acordado às 8 h. Subi para a sala de interrogatórios onde a equipe do capitão Homero esperava-me. Repetiram as mesmas perguntas do dia anterior. A cada resposta negativa, eu recebia cutiladas na cabeça, nos braços e no peito. Nesse ritmo prosseguiram até o início da noite, quando serviram a primeira refeição naquelas 48 horas: arroz, feijão e um pedaço de carne. Um preso, na cela ao lado da minha, ofereceu-me copo, água e cobertor. Fui dormir com a advertência do capitão Homero de que no dia seguinte enfrentaria a “equipe da pesada”.

Na quinta-feira três policiais acordaram-me à mesma hora do dia anterior. De estômago vazio, fui para a sala de interrogatórios. Um capitão cercado por sua equipe, voltou às mesmas perguntas. "Vai ter que falar senão só sai morto daqui", gritou. Logo depois vi que isto não era apenas uma ameaça, era quase uma certeza. Sentaram-me na "cadeira do dragão" (com chapas metálicas e fios), descarregaram choques nas mãos, nos pés, nos ouvidos e na cabeça. Dois fios foram amarrados em minhas mãos e um na orelha esquerda. A cada descarga, eu estremecia todo, como se o organismo fosse se decompor.

Da sessão de choques passaram-me ao "pau-de-arara". Mais choques, pauladas no peito e nas pernas a cada vez que elas se curvavam para aliviar a dor. Uma hora depois, com o corpo todo ferido e sangrando, desmaiei. Fui desamarrado e reanimado. Conduziram-me a outra sala dizendo que passariam a carga elétrica para 230 volts a fim de que eu falasse "antes de morrer". Não chegaram a fazê-lo.

Voltaram às perguntas, batiam em minhas mãos com palmatória. As mãos ficaram roxas e inchadas, a ponto de não ser possível fechá-las. Novas pauladas. Era impossível saber qual parte do corpo doía mais; tudo parecia massacrado. Mesmo que quisesse, não poderia responder às perguntas: o raciocínio não se ordenava mais, restava apenas o desejo de perder novamente os sentidos. Isto durou até às 10 h quando chegou o capitão Albernaz.

"Nosso assunto agora é especial", disse o capitão Albernaz, ligou os fios em meus membros. "Quando venho para a OB - disse - deixo o coração em casa. Tenho verdadeiro pavor a padre e para matar terrorista nada me impede... Guerra é guerra, ou se mata ou se morre. Você deve conhecer fulano e sicrano (citou os nomes de dois presos políticos que foram barbaramente torturados por ele), darei a você o mesmo tratamento que dei a eles: choques o dia todo. Todo "não" que você disser, maior a descarga elétrica que vai receber".

Eram três militares na sala. Um deles gritou: "Quero nomes e aparelhos (endereços de pessoas)". Quando respondi: "não sei" recebi uma descarga elétrica tão forte, diretamente ligada à tomada, que houve um descontrole em minhas funções fisiológicas. O capitão Albernaz queria que eu dissesse onde estava o Frei Ratton. Como não soubesse, levei choques durante quarenta minutos.

Queria os nomes de outros padres de São Paulo, Rio e Belo Horizonte "metidos na subversão". Partiu para a ofensa moral: "Quais os padres que têm amantes? Por que a Igreja não expulsou vocês? Quem são os outros padres terroristas?". Declarou que o interrogatório dos dominicanos feito pele DEOPS tinha sido "a toque de caixa" e que todos os religiosos presos iriam à OB prestar novos depoimentos. Receberiam também o mesmo "tratamento". Disse que a "Igreja é corrupta, pratica agiotagem, o Vaticano é dono das maiores empresas do mundo".

Diante de minhas negativas, aplicavam-me choques, davam-me socos, pontapés e pauladas nas costas. À certa altura, o capitão Albernaz mandou que eu abrisse a boca "para receber a hóstia sagrada". Introduziu um fio elétrico. Fiquei com a boca toda inchada, sem poder falar direito. Gritaram difamações contra a Igreja, berraram que os padres são homossexuais porque não se casam. Às 14 horas encerraram a sessão. Carregado, voltei à cela onde fiquei estirado no chão.

Às 18 horas serviram jantar, mas não consegui comer. Minha boca era uma ferida só. Pouco depois levaram-me para uma "explicação". Encontrei a mesma equipe do capitão Albernaz. Voltaram às mesmas perguntas. Repetiram as difamações. Disse que, em vista de minha resistência à tortura, concluíram que eu era um guerrilheiro e devia estar escondendo minha participação em assaltos a bancos. O "interrogatório" reiniciou para que eu confessasse os assaltos: choques, pontapés nos órgãos genitais e no estomago palmatórias, pontas de cigarro no meu corpo. Durante cinco horas apanhei como um cachorro. No fim, fizeram-me passar pelo "corredor polonês". Avisaram que aquilo era a estréia do que iria ocorrer com os outros dominicanos.

Quiseram me deixar dependurado toda a noite no "pau-de-arara". Mas o capitão Albernaz objetou: "não é preciso, vamos ficar com ele aqui mais dias. Se não falar, será quebrado por dentro, pois sabemos fazer as coisas sem deixar marcas visíveis". "Se sobreviver, jamais esquecerá o preço de sua valentia".

Na cela eu não conseguia dormir. A dor crescia a cada momento. Sentia a cabeça dez vezes maior do que o corpo. Angustiava-me a possibilidade de os outros padres sofrerem o mesmo. Era preciso pôr um fim àquilo. Sentia que não iria aguentar mais o sofrimento prolongado. Só havia uma solução: matar-me.

Na cela cheia de lixo, encontrei uma lata vazia. Comecei a amolar sua ponta no cimento. O preso ao lado pressentiu minha decisão e pediu que eu me acalmasse. Havia sofrido mais do que eu (teve os testículos esmagados) e não chegara ao desespero. Mas no meu caso, tratava-se de impedir que outros viessem a ser torturados e de denunciar à opinião pública e à Igreja o que se passa nos cárceres brasileiros. Só com o sacrifício de minha vida isto seria possível, pensei.

Como havia um Novo Testamento na cela, li a Paixão segundo São Mateus. O Pai havia exigido o sacrifício do Filho como prova de amor aos homens. Desmaiei envolto em dor e febre.

Na sexta-feira fui acordado por um policial. Havia ao meu lado um novo preso: um rapaz português que chorava pelas torturas sofridas durante a madrugada. O policial advertiu-me: "o senhor tem hoje e amanhã para decidir falar. Senão a turma da pesada repete o mesmo pau. Já perderam a paciência e estão dispostos a matá-lo aos pouquinhos".

Voltei aos meus pensamentos da noite anterior. Nos pulsos, eu havia marcado o lugar dos cortes. Continuei amolando a lata. Ao meio-dia tiraram-me para fazer a barba. Disseram que eu iria para a penitenciária. Raspei mal a barba, voltei à cela. Passou um soldado. Pedi que me emprestasse a "gillete" para terminar a barba. O português dormia. Tomei a gillete. Enfiei-a com força na dobra interna do cotovelo, no braço esquerdo. O corte fundo atingiu a artéria. O jato de sangue manchou o chão da cela. Aproximei-me da privada, apertei o braço para que o sangue jorrasse mais depressa.

Mais tarde recobrei os sentidos num leito do pronto-socorro do Hospital das Clínicas. No mesmo dia transferiram-me para um leito do Hospital Militar. O Exército temia a repercussão, não avisaram a ninguém do que ocorrera comigo. No corredor do Hospital Militar, o capitão Maurício dizia desesperado aos médicos: "Doutor, ele não pode morrer de jeito nenhum. Temos que fazer tudo, senão estamos perdidos". No meu quarto a OB deixou seis soldados de guarda.

No sábado teve início a tortura psicológica. Diziam: "A situação agora vai piorar para você, que é um padre suicida e terrorista. A Igreja vai expulsá-lo". Não deixavam que eu repousasse. Falavam o tempo todo, jogavam, contavam-me estranhas histórias. Percebi logo que, a fim de fugirem à responsabilidade de meu ato e o justificarem, queriam que eu enlouquecesse.

Na segunda noite recebi a visita do juiz auditor acompanhado de um padre do Convento e um bispo auxiliar de São Paulo. Haviam sido avisados pelos presos políticos do presídio Tiradentes. Um médico do hospital examinou-me à frente deles mostrando os hematomas e cicatrizes, os pontos recebidos no hospital das Clínicas e as marcas de tortura. O juiz declarou que aquilo era "uma estupidez" e que iria apurar responsabilidades. Pedi a ele garantias de vida e que eu não voltaria à OB, o que prometeu.

De fato fui bem tratado pelos militares do Hospital Militar, exceto os da OB que montavam guarda em meu quarto. As irmãs vicentinas deram-me toda a assistência necessária Mas não se cumpriu a promessa do juiz. Na sexta-feira, dia 27, fui levado de manhã para a OB. Fiquei numa cela até o fim da tarde sem comer. Sentia-me tonto e fraco, pois havia perdido muito sangue e os ferimentos começavam a cicatrizar-se. À noite entregaram-me de volta ao Presídio Tiradentes.

É preciso dizer que o que ocorreu comigo não é exceção, é regra. Raros os presos políticos brasileiros que não sofreram torturas. Muitos, como Schael Schneiber e Virgílio Gomes da Silva, morreram na sala de torturas. Outros ficaram surdos, estéreis ou com outros defeitos físicos. A esperança desses presos coloca-se na Igreja, única instituição brasileira fora do controle estatal-militar. Sua missão é: defender e promover a dignidade humana. Onde houver um homem sofrendo, é o Mestre que sofre. É hora de nossos bispos dizerem um BASTA às torturas e injustiças promovidas pelo regime, antes que seja tarde.

A Igreja não pode omitir-se. As provas das torturas trazemos no corpo. Se a Igreja não se manifestar contra essa situação, quem o fará? Ou seria necessário que eu morresse para que alguma atitude fosse tomada? Num momento como este o silêncio é omissão. Se falar é um risco, é muito mais um testemunho. A Igreja existe como sinal e sacramento da justiça de Deus no mundo. "Não queremos, irmãos, que ignoreis a tribulação que nos sobreveio.

Fomos maltratados desmedidamente, além das nossas forças, a ponto de termos perdido a esperança de sairmos com vida. Sentíamos dentro de nós mesmos a sentença de morte: deu-se isso para que saibamos pôr a nossa confiança, não em nós, mas em Deus, que ressuscita os mortos" (2Cor, 8-9).

Faço esta denúncia e este apelo a fim de que se evite amanhã a triste notícia de mais um morto pelas torturas.

Frei Tito de Alencar Lima, OP
Fevereiro de 1970

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

FREI TITO: EM CAMPO SANTO

Como falar de uma pessoa como Frei Tito sem se emocionar? Como contar sua história sem sentir a alma presa a uma tempestade?
Conheça nesse Blog a história de Frei Tito em 3 Atos:

ATO 01: EM CAMPO SANTO
Tito de Alencar Lima nasceu em Fortaleza (CE) em 14/05/1945.

Estudou em Fortaleza, sua terra natal, com os padres jesuítas e, mais tarde, foi aluno de Filosofia da USP, em São Paulo. Atuou como dirigente regional e nacional da Juventude Estudantil Católica (JEC).

Em 1965, ingressou na Ordem dos Dominicanos, sendo ordenado sacerdote em 1967.
Foi preso em 1968, sob a acusação de ter alugado o sítio onde se realizou o famoso 30º Congresso da UNE, em lbiúna (SP).

Foi preso novamente em 04/11/1969, em companhia de outros frades dominicanos acusados de manterem ligações com a ALN e seu líder Carlos Marighella.

Frei Tito foi torturado durante 40 dias pela equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury e, em seguida, transferido para o Presídio Tiradentes, onde permaneceu até 17 de dezembro. Nesse dia, foi levado para a sede da OBAN (Operação Bandeirantes), onde o conhecido torturador capitão Maurício Lopes Lima lhe disse: “Agora você vai conhecer a sucursal do inferno”.

Depois de mais dois dias de intensa tortura, tentou o suicídio com uma gilete, sendo conduzido às pressas para o Hospital Central do Exército, no Cambuci, onde ficou cerca de uma semana sob tratamento médico. No entanto, em nenhum momento os agentes pararam de torturá-lo psicologicamente.

Banido do país em 13/01/1971, em troca do embaixador suíço no Brasil, viajou para o Chile, seguindo depois para a Itália e França. Após algum tempo, instalou-se na comunidade dominicana de Arbresle, onde lutou desesperadamente contra os crescentes tormentos de sua mente, abalada pela tortura.

Até junho de 1973, Frei Tito viveu no convento S. Jacques, em Paris, onde retomou seus estudos na Universidade de Sorbonne. A tortura deixara nele seqüelas profundas e rompeu definitivamente seu equilíbrio psíquico.

Apesar dos cuidadosos tratamentos a que se submeteu na França, sua unidade interior havia se partido. Foi mandado para o convento dominicano de Sainte Marie de la Tourette, em Eveux, província de Lyon, onde poderia encontrar um clima mais calmo para estudar Teologia. Nada adiantou, pois os torturadores
haviam tomado conta de seu próprio psiquismo.

No dia 07/08/1974, com 31 anos, Frei Tito enforcou-se em uma árvore de um bosque ao redor do convento, conforme bem retratado no filme Batismo de Sangue, do diretor Helvécio Ratton, exibido em todo o Brasil em 2006 e 2007.

A morte foi seu último ato de coragem e protesto. Foi enterrado no cemitério de Sainte Marie de la Tourette. Registre-se que os Frades Dominicanos, que não enterram suicidas em "Campo Santo", o enterraram, colocando em sua lápide, como data de sua morte o dia da prisão, e não o dia do suicídio. Para eles, Frei Tito já estava morto, assassinado pela ditadura brasileira, quando se suicidou.

Em 25/03/1983, seus restos mortais foram trasladados para o Brasil e acolhidos solenemente na igreja dos Dominicanos, em Perdizes, na capital paulista, onde, ao lado dos restos mortais de Alexandre Vannucchi Leme, morto em 17/03/1973 e enterrado como indigente no cemitério de Perus, recebeu homenagens e manifestações de saudade.

Dom Paulo Evaristo Arns, símbolo da defesa dos Direitos Humanos no Brasil, coordenou a celebração litúrgica, sendo que em seguida os ossos de Frei Tito foram trasladados a Fortaleza.



Adaptado da Revista “O Berro”.

sábado, 13 de agosto de 2011

HERÓIS DO POVO

Cidade de Rio Grande, no Rio Grande do Sul.
Domingo, 1º de Maio de 1950. Dia do Trabalhador.
Barraquinhas coloridas e bandas de música animam a festa popular.
Gente animada, homens, mulheres, crianças.
E discursos, muitos discursos que não poderiam faltar numa festa organizada pelos comunistas para comemorar a data.

Criticavam a opção do governo brasileiro, do Presidente Eurico Gaspar Dutra, em se atrelar ao bloco capitalista liderado pelos Estados Unidos na Guerra Fria. Protestavam também contra a ameaça nuclear, o arrocho salarial e pela falta de liberdade.

Tentando esvaziar a festa, as autoridades locais organizaram uma partida de futebol entre o Esporte Clube Rio Grande, uma paixão local e o C.R. Vasco da Gama, do Rio de Janeiro. É claro que uma multidão preferiu prestigiar a partida.

No meio da pequena multidão, sorridente, estava a jovem tecelã Angelina Gonçalves, sempre acompanhada de sua filhinha Shirley de 10 anos. Uma mulher feliz, no limite do que era permitido ser feliz a uma mulher trabalhadora em 1950.

Após os festejos os trabalhadores resolveram terminar as comemorações de seu dia com uma passeata que se dispersaria em frente à sede da União Operária, que havia sido fechada pelo governo que acusava a entidade de ser um “antro de comunistas”.

Punhos fechados a passeata seguiu seu rumo. Angelina carregava numa das mãos, uma enorme bandeira do Brasil, enquanto com a outra segurava Shirley.

"A Bandeira na frente, companheiros" gritou alguém, e abriu-se o espaço para que Angelina pudesse expor o estandarte nacional à frente dos companheiros.

Já próximo de seu destino um delegado do DOPS interceptou a marcha. Acompanhado de vários agentes armados da Brigada Militar, exigiu que dispersassem. Houve discussão, empurrões e o dia festivo virou dia de guerra.

Tiros, gemidos, gritos desesperados. Uma batalha campal.

Após um tempo que ninguém sabe determinar com precisão, um soldado da Brigada Militar estava caído no chão, gravemente ferido (morreria pouco depois no Hospital). Do outro lado, quatro operários jaziam mortos, atingidos por balas covardes. Ao lado de um dos corpos ensangüentados uma pequena menina, chorava copiosamente.

Segundo testemunhas, Angelina resistira bravamente, quando tentaram lhe tirar a bandeira de sua mão, e por isso foi mortalmente atingida.

No outro dia, enquanto muitos ainda convalesciam nos hospitais e as lideranças dos trabalhadores era perseguida, os jornais mancheteavam o enterro do soldado, morto pelos comunistas.

Sobre Angelina, Shirley e os outros três operários mortos, nenhum comentário.

Aos mortos pela repressão sempre pesa a condenação ao anonimato nos livros da história oficial.

A Angelina Gonçalves, heroína do povo, um túmulo com o nome mal rabiscado.
Uma filha, de nome Shirley, pra contar sua história.
E os versos, publicados em 1954, pela poetisa comunista Lila Ripoli:


Foi num primeiro de maio,
na cidade de Rio Grande.
O céu estava sem nuvens.
O mês das flores nascia.
O vento lembrava as flores
no perfume que trazia.

O povo reuniu-se em festa
pois a festa era do povo.

Crianças, homens, mulheres,
o povo unido cantava.
O povo simples da rua,
comovido se abraçava.

Foi num primeiro de maio,
de pensamento profundo.
"Uni-vos, ó proletários,
ó povos de todo o mundo".
(...)

A tecelã Angelina,
vivaz e alegre cantava,
Recchia - o líder operário
ria e confraternizava.

Era primeiro de maio,
dia de festa do mundo.
(...)

"Amigos, a rua é larga.
Unidos vamos partir.
A nossa 'União Operária'
nós hoje vamos abrir."
(...)

Alguém arrebata
das mãos de Angelina
a verde Bandeira
que ondula no ar.


O rosto em tormento,
cabelos ao vento,
retorna Angelina,
mais alta e mais fina.

"A nossa Bandeira,
nas mãos da polícia?"
E à luta regressa,
com febre no olhar.
(...)

A grande alegria caindo dos olhos,
Das vozes, das flores, do dia sem nuvens:
"Poder Popular!"
Num dia, tão perto, tão claro, tão certo,
Meus olhos verão.
Não morre a semente lançada na terra.
Os frutos virão!