domingo, 21 de outubro de 2012
A LOUCURA DE TODOS NÓS
Alonso Quijano era chamado pelos vizinhos de “O Bom”. Dono de pequena propriedade, já com idade avançada, levava uma vida pacata e sem aventuras.
Esperava a morte como quem não tem nada mais importante para fazer.
Tinha verdadeira adoração por leitura e terminava seus dias, invariavelmente, debruçado sobre seus livros.
Mas, não eram livros quaisquer. Eram livros de aventuras.
Histórias de heroísmo e de nobreza repletas de cores, as mesmas cores que lhe faltavam na sua vida em preto e branco.
Cavaleiros de espadas sagradas. Donzelas ameaçadas por perversos. A religião agredida por bárbaros. Que mundo violento meu Deus!
Era tamanho seu encantamento que, um belo dia, ninguém sabe exatamente quando, ele viajou para dentro de suas ilusões. Pulou de sua vida miserável mergulhando de cabeça no seu mundo de sonhos.
Para muitos. Alonso enlouqueceu. Para ele próprio, era um despertar.
Assim começa “Dom Quixote de La Mancha” obra imortal do espanhol Miguel de Cervantes, publicada pela primeira vez, em Madri, no ano de 1605.
No livro D. Quixote (nome fictício criado pelo próprio Alonso Quijano) acompanhado pelo vistoso cavalo Rocinante (um pobre e acabado pangaré) e por Sancho Panza, um amigo companheiro de todas as suas aventuras, enfrenta gigantes imaginários investindo contra moinhos, combate um exército inteiro de infiéis (um rebanho de ovelhas) e busca, em todos os momentos, encontrar sua donzela, Dulcinea Del Topozo, jovem “dona” de seu coração.
Enquanto D. Quixote salta de ilusão em ilusão Sancho Panza o acompanha, sendo o lado seguro da realidade, buscando salvar o amigo das enrascadas que se mete.
Sonho e realidade. Ilusão e pé no chão.
No final, momentos antes de morrer e novamente em suas perfeitas faculdades mentais, Alonso Quijano pergunta ao amigo Sancho, afinal, qual deles dois é o mais realista. Se aquele que vive a dura realidade da vida ou o que busca nos sonhos um novo sentido e um novo destino transformando a própria realidade.
Com certeza, todos nós temos em nosso íntimo um D. Quixote. E um Sancho.
E nosso D. Quixote também enfrenta moinhos e exércitos de ovelhas.
O problema é que, cada vez mais querem sonhar em nosso lugar e nos vender até os sonhos.
Sonhos que geralmente acabam quando começa um novo dia, e nosso Sancho Panza atento ao despertar, pula da cama para mais uma jornada de trabalho, de tédio e de toda a previsibilidade que a sociedade nos exige.
Se ousarmos enxergar no bêbado um aliado ferido, nos que sofrem sem teto e sem trabalho um reflexo de nós e de nossa incapacidade de criar uma sociedade mais justa, seremos classificados como loucos.
Se demonstrarmos incerteza, se dermos flores sem que seja aniversário de alguém, se amarmos só por amar sem querer ser proprietário da pessoa amada, nos chamarão de doidos.
Talvez só reste mesmo à esperança de que, em algum lugar, nos espere a nossa Dulcinéia, de braços abertos, olhos cúmplices e repletos de desejos.
Se desapareceram os gigantes, infiéis sanguinários e nobre de coração negro ainda existe o poder surreal da mídia, o neoliberalismo e a ganância para serem combatidos.
Quando próximo da morte, os amigos de D. Quixote queimaram todos os seus livros por considera-los culpados de sua loucura. Queimaram os livros, mas, não acabaram com os sonhos.
De Miguel de Cervantes “D. Quixote de La Mancha”. Obra imortal da Literatura Renascentista.
Leia. Você não perderá seu tempo e talvez encontre nos protagonistas muitas respostas para perguntas balbuciadas na embriagues das festas.
Prof. Péricles
terça-feira, 16 de outubro de 2012
QUEM COM FERRO FERE
A violenta miséria, o abando do poder público e os desmandos dos latifundiários criaram o cangaço, e a figura do cangaceiro varreu o sertão num misto de banditismo e heroísmo na memória nacional.
É a velha Lei da violência que gera violência.
Na década de 70, em determinado momento, sentindo-se à vontade na “guerra” que empreendia contra as organizações de luta armada, a Ditadura Militar resolveu que os presos políticos deveriam ficar detidos junto com os presos autores de crimes comuns. Julgavam que, dessa forma estariam impondo uma certa humilhação ao inimigo, acabando com qualquer “privilégio”.
Conforme declaração dos fundadores do Comando Vermelho foi a partir daí que nasceu o crime organizado no Brasil. Não que os prisioneiros políticos tivessem dado a idéia e feito cursinho, mas pela observação e imitação que eles, ditos criminosos comuns, fizeram da organização e da inteligência dos grupos políticos.
Diz o dito popular que “quem com ferro fere, com ferro será ferido”. Dentro dessa lógica, tentando humilhar a Ditadura criou um monstro.
Mas, parece que o Estado demora a aprender com seus erros, ou não se importa.
Vinte anos depois do massacre do Carandiru (outubro/1992), especialistas no assunto ouvidos pela BBC Brasil concluíram que foi essa tragédia humana inominável que resultou na morte de 111 homens sob a tutela do estado, um dos mais importantes nascedouros do PCC (Primeiro Comando da Capital) a mais estruturada facção criminosa de São Paulo.
O PCC foi criado por um grupo de presos em 31 de agosto de 1993 na Casa de Custódia de Taubaté pouco menos de um ano depois do massacre do Carandiru.
Os principais objetivos da facção eram combater os maus tratos no sistema prisional e evitar novos massacres como o de 1992, segundo o jornalista Josmar Jozino, autor de três livros sobre o PCC, entre eles “Xeque-mate, o Tribunal do Crime e os Letais Boinas Pretas” (Ed. Letras do Brasil).
Cobrando mensalidades de seus “associados”, a organização criou uma rede de apoio aos criminosos, que inclui contratação de advogados e apoio financeiro às suas famílias.
A facção também expandiu suas ações para fora dos presídios. Passou a controlar parte do tráfico de drogas em São Paulo, fazer parcerias com facções de outros Estados, alugar armas para ações criminosas e até assumiu o controle de rotas internacionais de entrada de entorpecentes no país.
No momento em que a violência urbana assusta a todos e, em que sobre a temática se debruça a sociedade civil buscando soluções, seria interessante a reflexão sobre a ação e a reação, sobre o ferir com o ferro e por ele ser ferido.
Parece evidente que o preço de uma sociedade mais humana e menos violenta seja ações do poder público mais humanas e menos violentas, que inclui o entendimento da violência como um fenômeno social inserido no elenco das consequências das desigualdades e das várias formas de violência contra a cidadania.
Enquanto isso não acontecer e as autoridades entenderem que a violência se resolve com violência, continuaremos reféns do crime e vivendo como assustados sobreviventes, cada vez mais protegidos sobre grades, no lugar dos criminosos. As empresas de segurança privada continuarão faturando alto e os meio de comunicação tendo farto material para as suas indignações diárias.
Prof. Péricles
domingo, 14 de outubro de 2012
O LUGAR DE GENOÍNO
Nossos crocodilos ficaram sentimentais. Em toda parte vejo lágrimas que acompanham os votos que condenam José Genoino.
Na imprensa, em conversas com amigos, ouço o comentário, em tom de solidariedade. Parece consciência pesada, em alguns casos.
Não estamos diante de um melodrama, mas de uma tragédia.
Genoino está sendo condenado num julgamento marcado por incongruências, denuncias incompletas e presunções de culpa que começam a incomodar estudiosos e acadêmicos.
Foi isso que explicou Margarida Lacombe, professora de Direito da UFRJ, em comentário na Globo News. Sem perder suavidade na voz, a professora falou sobre necessidade de provas contundentes quando se pretende privar a liberdade de uma pessoa. Não falou de casos concretos, não criticou. Fez o melhor: informou. Lembrou como esse ponto – a liberdade – é importante.
O STF que está condenando Genoino absolveu Fernando Collor com o argumento de “falta de provas.”
É o mesmo STF que, em tempos muito mais recentes, impediu que o país apurasse, investigasse e punisse a tortura ocorrida no regime militar.
Então ficamos assim. José Genoino, vítima da tortura que o STF impediu que fosse apurada, será condenado por corrupção, ao contrário de Fernando Collor.
Não há provas materiais contra Genoino e tudo que se pode alegar contra ele é menos consistente do que se poderia alegar contra Collor. Mas as provas da tortura são abundantes. Estão nos arquivos do Brasil Nunca Mais e em outros trabalhos. Foram arrancadas na dor, no sofrimento, na porrada, no sangue e, algumas vezes, na morte.
Em plena ditadura, 1918 vítimas da tortura deixaram registros dessa violência nos arquivos da Justiça Militar. Nenhuma foi apurada e, se depender da decisão do STF, nunca será.
Collor foi beneficiado porque provas muito contundentes contra ele foram anuladas. Considerou-se, na época, que a privacidade do tesoureiro PC Farias havia sido violada quando a Polícia Federal quebrou o sigilo de um computador que servia ao esquema. Essa decisão – em nome da privacidade — salvou Collor.
Você pode dizer que os tempos eram outros e que agora não se aceita mais tanta impunidade. Aceita-se. Basta lembrar que, na mesma época, o mensalão do PSDB-MG virou fumaça na Justiça Comum. E quando Márcio Thomaz Bastos tentou mudar o julgamento do mensalão federal, alegou-se que era no STF que os crimes graves são punidos.
Genoino está sendo condenado porque “não é plausível” que não soubesse do esquema. “Plausível”, informa o Houaiss, é sinônimo de aceitável, razoável. Olha o tamanho da subjetividade, da incerteza.
Isso porque ele assinou o pedido de empréstimo de R$ 3,5 milhões para o Banco Rural e por dez vezes refez o pedido. Não é plausível imaginar que um presidente do PT fizesse tudo isso sem saber de nada, acreditam três ministros do Supremo.
Mas fatos que são líquidos e certos não comoveram a acusação com a mesma clareza.
O empresário Daniel Dantas deu R$ 3,5 milhões para amolecer Delúbio Soares e Marcos Valério e cair nas graças do esquema. Não foram R$ 3,5 milhões subjetivos mas inteiramente objetivos.
Um pouco mais tarde, seu braço direito Carla Cicco assinou um contrato de R$ 50 milhões com as agências de Marcos Valério para transformar a turma do PT em geléia. Chegaram tarde. Depois de pagar a primeira prestação, a casa caiu e eles suspenderam o pagamento.
O esquema privado do mensalão, informa a CPMI, chegou a R$ 200 milhões. Quantos empresários foram lá, dar explicações? Nenhum.
Alguém acha plausível, aceitável, razoável, que fossem inocentados por antecipação?
Não há nada “plausível” que se possa fazer com R$ 200 milhões?
Só a Telemig, que pertencia ao grupo Opportunity, de Daniel Dantas, entregou mais dinheiro às agências de Valério do que o Visanet, que jogou o petista Henrique Pizzolato na vala dos condenados logo nos primeiros dias.
O que é plausível, neste caso?
Nós sabemos – e ninguém duvida disso – que Genoino fazia política o tempo inteiro. Fez isso a vida toda, com tamanha inquietação que, numa fase andou pela guerrilha do Araguaia e, em outra, ficou tão moderado que parecia que ia preencher ficha de ingresso no PSDB.
Chegou a liderar um partido revolucionário à esquerda do PC do B e depois integrou as correntes mais à direita do PT.
Então vamos lá. É plausível imaginar que Genoino tenha ido atrás de recursos de campanha? Sim. É plausível e até natural. Basta deixar de ser hipócrita para compreender. Política se faz com quadros, imprensa, propaganda, funcionários. Isso custa dinheiro.
Isso fez dele um dirigente que subornava adversários para convencê-los a mudar de lado, como quer a acusação? Não.
Eu não acho plausível, nem aceitável nem razoável. Duvido inteiramente, aliás.
E se eu tiver errado, quero que me provem – de forma clara, contundente. Sem essas suposições, sem um quebra-cabeças que joga com a liberdade humana.
Sem fogueira de tantas vaidades.
Alegou-se que a tortura não poderia ser apurada para preservar a transicão democrática.
A democracia avançou, as conquistas foram imensas. Mas os perseguidos, no fundo, bem no fundo, são os mesmos.
Não é um melodrama. É uma tragédia.
por Paulo Moreira Leite
sábado, 13 de outubro de 2012
NÚMEROS DA ELEIÇÃO MUNICIPAL 2012
Os analistas têm o hábito de considerar que as eleições locais são uma ante-sala das presidenciais. Em função desse cacoete, olham os resultados como se fossem o primeiro round da disputa pelo Palácio do Planalto em 2014.
Trata-se de um equívoco, como mostram as evidências. Desde a redemocratização, não houve sequer uma eleição presidencial que tivesse sido “antecipada” pelo ocorrido na disputa pelas prefeituras.
O que acontece nela pode ter efeito na sucessão dos governos de alguns estados, especialmente os menores e aqueles onde a capital tem grande proeminência na estrutura urbana. Nesses casos, a eleição dos prefeitos costuma fornecer um bom indício do que vai acontecer dois anos depois e estabelece de imediato o vencedor na capital como concorrente de peso.
Na verdade, para a política nacional, as eleições municipais são relevantes muito mais por suas consequências na composição do Congresso, especialmente da Câmara. Na vida política dos estados, por seu impacto nas Assembléias.
Quem leu o que nossa grande imprensa andou falando nas últimas semanas terá tomado um susto com o que aconteceu domingo.
Jornalistas e comentaristas são livres, como qualquer cidadão, para ter opiniões e preferências políticas. É perfeitamente natural que gostem mais de um partido que de outro.
Também são compreensíveis as implicâncias que têm com algumas lideranças.
Costuma-se, no entanto, cobrar de todos o compromisso com a informação. Que evitem deixar que seus sentimentos os impeçam de fornecer a leitores e espectadores a notícia correta.
Se houve um tema predominante na cobertura das eleições deste ano foi a “queda do PT”. Quase diariamente, saíam matérias ressaltando o mau desempenho que o partido teria em todo o País e, em particular, nas capitais.
Misturando análise apressada das pesquisas com muita torcida, a tese central era que o julgamento do “mensalão” prejudicaria os candidatos petistas e dos partidos da base do governo. Prenunciava-se, de acordo com essa suposição, um quadro de diminuição do PT e crescimento dos partidos de oposição.
Para quem acreditou nisso, o resultado das eleições deve ter sido uma surpresa.
Considerando os cinco partidos que mais venceram em 2008, o PT foi o único que aumentou o número de prefeituras ganhas. PMDB, PSDB, PP e DEM encolheram - os tucanos em seus principais redutos, São Paulo, Minas Gerais e Ceará.
Em queda semelhante à que aconteceu em 2010 nas eleições para o Legislativo, as três principais legendas oposicionistas - PSDB, DEM e PPS - diminuíram em 25% o total de prefeituras conquistadas, indo de 1418 para 1077 (sem considerar as cidades onde haverá segundo turno).
Faz sentido dizer que o PSB é a estrela em ascensão?
Cresceu como o PT, indo de 314 para 435 prefeituras. A grande vitória no Recife compensou a inesperada derrota em Curitiba. Manteve Belo Horizonte. Disputa algumas capitais importantes no segundo turno.
A eleição foi certamente positiva para o partido. Daí, no entanto, a imaginar que é o “grande vitorioso” vai uma vasta distância.
Por estranho que pareça a algumas pessoas, o partido que mais cresceu em número de prefeitos e vereadores, que melhor performance teve nas cidades médias, que está mais bem posicionado nas capitais, é o PT.
Pode-se gostar ou não disso. Mas é um fato.
por Marcos Coimbra
quinta-feira, 11 de outubro de 2012
A CAUSA DO PT
De saída quero dizer que nunca fui filiado ao PT. Interesso-me pela causa que ele representa, pois a Igreja da Libertação colaborou na sua formulação e na sua realização nos meios populares.
Há um provérbio popular alemão que reza: “você bate no saco mas pensa no animal que carrega o saco”. Ele se aplica ao PT com referência ao processo do “Mensalão”. Você bate nos acusados, mas tem a intenção de bater no PT. A relevância espalhafatosa que o grosso da mídia está dando à questão mostra que o grande interesse não se concentra na condenação dos acusados, mas através de sua condenação, atingir de morte o PT.
Por que muitos resistem e tentam ferir letalmente o PT? Há muitas razões. Ressalto apenas duas decisivas. A primeira tem a ver com uma questão de classe social.
Sabidamente temos elites econômicas e intelectuais das mais atrasadas do mundo, como soia repetir Darcy Ribeiro. Estão mais interessadas em defender privilégios do que garantir direitos para todos. Elas nunca se reconciliaram com o povo. Como escreveu o historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma no Brasil 1965,14) elas “negaram seus direitos, arrasaram sua vida e logo que o viram crescer, lhe negaram, pouco a pouco, a sua aprovação, conspiraram para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que continuam achando que lhe pertence”.
Ora, o PT e Lula vem desta periferia. Chegaram democraticamente ao centro do poder. Essas elites tolerariam Lula no Planalto, apenas como serviçal, mas jamais como Presidente. Não conseguem digerir este dado inapagável. Lula Presidente representa uma virada de magnitude histórica. Essas elites perderam. E nada aprenderam. Seu tempo passou. Continuam conspirando, especialmente, através de uma mídia e de seus analistas, amargurados por sucessivas derrotas como se nota nestes dias, a propósito de uma entrevista montada de Veja contra Lula. Estes grupos se propõem apear o PT do poder e liquidar com seus líderes.
A segunda razão está em seu arraigado conservadorismo. Não quererem mudar, nem se ajustar ao novo tempo. Internalizaram a dialética do senhor e do ervo. Saudosistas, preferem se alinhar de forma agregada e subalterna, como servos, ao senhor que hegemoniza a atual fase planetária: os USA e seus aliados, hoje todos em crise de degeneração. Difamaram a coragem de um Presidente que mostrou a auto-estima e a autonomia do país, decisivo para o futuro ecológico e econômico do mundo, orgulhoso de seu ensaio civilizatório racialmente ecumênico e pacífico. Querem um Brasil menor do que eles para continuarem a ter vantagens.
Por fim, temos esperança. Segundo Ignace Sachs, o Brasil, na esteira das políticas republicanas inauguradas pelo PT e que devem ser ainda aprofundadas, pode ser a Terra da Boa Esperança, quer dizer, uma pequena antecipação do que poderá ser a Terra revitalizada, baixada da cruz e ressuscitada. Muitos jovens empresários, com outra cabeça, não se deixam mais iludir pela macroeconomia neoliberal globalizada. Procuram seguir o novo caminho aberto pelo PT e pelos aliados de causa. Querem produzir autonomamente para o mercado interno, abastecendo os milhões de brasileiros que buscam um consumo necessário, suficiente e responsável e assim poderem viver um desafogo com dignidade e decência.
Essa utopia mínima é factível. O PT se esforça por realizá-la. Essa causa não pode ser perdida em razão da férrea resistência de opositores superados porque é sagrada demais pelo tanto de suor e de sangue que custou.
Por Leonardo Boff - teólogo e escritor.
terça-feira, 9 de outubro de 2012
NUNCA FALTARÃO ARGUMENTOS
Poderíamos dizer que a sociedade se divide em 3 grupos: A - os ricos, muito ricos e quase ricos; B – os medianos pra cima, os medianos pra baixo e os que se acham medianos e C – os pobres e miseráveis.
Já os partidos se dividem em 1 – Os que representam declaradamente os da A; 2 – Os que representam os da A, mas não assumem, adotando discurso do “momento político” e os ouvidos a atingir e 3 – os que desejam, realmente, representar os pobres e miseráveis, do seu jeito.
Claro que existem variações, pois “a política é dinâmica” e nada impede que um partido que comece sendo da categoria 3 sofra uma metamorfose e jogue o jogo do pessoal da categoria 2. Isso, aliás, é bem comum.
Mas, dentro desse jogo político e social as coisas decorrem de certa forma, muito simples. Assim:
- Os partidos ideológicos, aqueles, dos mais pobres já foram fortes em nosso país, mas suas lideranças foram assassinadas, desaparecidas e dizimadas. Hoje são chamados de nanico e são mesmo. Ninguém lembra que eles foram fortes, entusiasmaram e acalentaram os sonhos de milhões de pessoas porque isso nunca foi ensinado nas escolas, nunca apareceu em novelas e nenhum “formador de opinião” fala disso. Dessa forma, os jovens acham que isso nunca aconteceu e os velhos escondem essas memórias entre os seus fantasmas trancados no armário. Quando esses partidos não aceitam alianças com os partidos grandes, são chamados de sectários, radicais e que jamais terão governabilidade, pois, ninguém poderá governar sozinho. Quando eles fazem alianças são chamados de traidores, caricatos e que perderam a “pureza ideológica” e, na verdade, perdem mesmo.
- Os partidos maiores se dividem em siglas que afirmam representar todos a mesma coisa que na verdade é coisa nenhuma que não seja manter seus privilégios, seja como membro do andar de cima, seja como aliado dos interesses do pessoal do andar de cima de outros países, ditos, imperialistas.
O mais interessante é quando surge uma idéia nova, uma proposta mais popular.
Os medianos, por um dever moral, quase religioso, já que juram se preocupar com os pobres (coitadinhos, tão famintos), no início aceitam a idéia. Alguns até se entusiasmam e compram bandeiras e usam bótum e se filiam ao partido. É tão bonito ver a classe média com ares de pobre, com fotos de Tche, que, aliás, são chiquérrimas.
O problema é quando essas idéias ganham forma e pior, quando ganham espaços na vida política.
Quando os medianos vêem os pobres e miseráveis serem prioridade bate um arrepio em suas espinhas sociais. Longe de querer subir o que o mediano quer mesmo, como projeto oculto de vida, é não descer e se o pessoal de baixo sobe, isso de certa forma, acontece.
Então o desconforto origina as mais variadas justificativas para abandonar os "planos progressistas" e uma guinada para o conservadorismo.
Há os que dizem que eram daquele partido de esquerda e agora não são porque se decepcionaram (?) com suas alianças (e esse discurso é dos bons porque deixa no ar uma idéia de que é o verdadeiro revolucionário)ou então com suas lideranças. Mas tem também aqueles que só esperavam a oportunidade para bradar sua extraordinária cultura política dizendo que jamais foram enganados e que nunca caíram naquele conto do vigário porque, eles, logicamente, são mais inteligentes do que a maioria, ou são mais velhos e experientes e inclusive votaram no Jânios Quadros, pra tu ver como são avançados.
E, claro, tem os indignados que consideram toda vantagem aos miseráveis, uma medida populista e eleitoreira.
Escondem de si mesmo que ver pobre tendo um carro ou fazendo plano privado de saúde os ofende como uma bofetada.
Pergunte a uma mãe que dá sopa de papelão a seu filho faminto o que ela acha do populismo.
Pergunte a um pai que agora pode comprar remédios pra sua prole quando necessário e antes mendigava com a receita na mão, o que ele acha das medidas populistas.
Se era tão simples e tão barato cooptar o apoio dessa gente por que eles não o fizeram quando estavam no poder? Por que combater a miséria é medida demagógica? Mas que extraordinário senso de moral tem nossa gente!
Furar fila é malandragem, não observar leis de trânsito básicas é ser esperto, desobedecer regras de civilidade é jeitinho, tudo isso pode. Criar Bolsa Família não pode. É imoral.
Chaves, na Venezuela que alterou a Constituição do seu país forçando um investimento direto dos lucros da exportação do petróleo em atenção aos mais pobres, como construção da casa própria é chamado de populista.
Lula e seus programas sociais são populistas.
O conceito é falso, mas faz bem. Porque justifica a injustificável contrariedade dos medianos à algo que eles não conseguem assumir, o seu egoísmo.
Por que não se buscam justificativas para o fato de que, no país do 8º PIB do mundo, 10% da população concentre 48% da riqueza? Não será essa a maior imoralidade?
Quer saber, viva a demagogia e o populismo se ela secar uma só lágrima dos abandonados desse país!
Quem tem fome tem pressa.
Já, os medianos precisam de argumentos para humanizar seus preconceitos.
Diante de uma criança de barriga inchada ser contra o Fome Zero não é politicamente correto.
Sobre os olhos de quem nunca teve esperança, num país onde educação sempre foi para as elites, ser contra o Bolsa Escola exige argumentos.
Mas, que fiquem tranqüilos os medianos.
No mundo do capital que divide as criaturas em classes, nesse mundo que ter é mais importante que ser, nunca faltarão famintos, nem espoliados, mas também, jamais faltarão argumentos.
Até porque os críticos escrevem muito bem, e os conceitos, tal qual roupas elegantes e da moda, podem ser adaptados a qualquer necessidade.
Podemos dormir em paz com nossas consciências.
Prof. Péricles
Assinar:
Postagens (Atom)