O governo federal está mobilizando suas forças para conseguir aprovar até o fim deste mês o projeto de lei que cria a Comissão Nacional da Verdade. O esforço é capitaneado pelo ministro da Defesa, Celso Amorim. Nos últimos dias ele fez várias ligações para os líderes dos partidos de oposição na Câmara pedindo apoio à proposta.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, também está em campo. Ex-deputado, com trânsito fácil no meio parlamentar, ele já se reuniu com os líderes do PSDB, DEM, PPS e PV. A presidente Dilma Rousseff, que na sexta-feira, na abertura do Congresso do PT, prometeu à militância que a comissão será instalada, também mobilizou a ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário, para o trabalho de vencer resistências à proposta.
O objetivo é aprovar o projeto por meio de um acordo entre líderes partidários, em caráter de urgência. A votação ocorreria numa sessão extraordinária, convocada especialmente para isso. Na conversa com a oposição, a maior preocupação dos três ministros é deixar claro que a comissão não terá caráter revanchista, nem abrirá debates sobre uma possível revisão da Lei da Anistia.
O governo diz entender que o assunto se encerrou no ano passado, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) negou à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) o pedido para que policiais e militares acusados de violações de direitos humanos nos anos da ditadura fossem excluídos da anistia. Na avaliação da corte, eles também foram beneficiados pela lei de 1979.
"A comissão terá apenas preocupações históricas, de esclarecimento de fatos ocorridos naquele período", afirma José Genoino, assessor especial do ministro da Defesa. "Não
existem preocupações revanchistas nem punitivas."
Agência Estado
Publicação: 04/09/2011 10:54 Atualização: 04/09/2011 14:26
segunda-feira, 5 de setembro de 2011
domingo, 28 de agosto de 2011
BRASIL MENOS CATÓLICO EM 20 ANOS
O Brasil pode deixar de ser o país mais católico do mundo nos próximos 20 anos, de acordo com o Novo Mapa das Religiões, divulgado pela Fundação Getulio Vargas (FGV).
“É um ritmo forte de transformação. As mudanças que aconteceram em 100 anos agora estão acontecendo em dez [anos]. Se continuar essa perda de 1 ponto de porcentagem [de católicos] por ano, em 20 anos você teria menos de metade da população”, calcula Marcelo Neri, coordenador do levantamento.
O relatório mostra que atualmente o percentual de mulheres católicas (71,3%) é menor do que o de homens (75,3%). “Acima de tudo, acho que seja a chamada revolução feminina. Poucas coisas mudaram mais no cotidiano das pessoas do que questões como trabalho e anticoncepção entre as mulheres. O fato é que, embora as mulheres sejam bem mais religiosas do que os homens, elas são menos católicas, talvez por uma questão de afinidade”, disse Neri.
O Novo Mapa das Religiões revela que o sexo feminino representa a maioria entre adeptos de 23 das 25 religiões listadas como as mais populares pela pesquisa, como a católica, a evangélica pentecostal, a evangélica tradicional, a espírita kardecista, a luterana e a umbanda. Segundo o documento, enquanto os homens abandonaram crenças, elas mudaram de religião. “O catolicismo, o candomblé e o budismo são religiões masculinas. Todas as outras são basicamente femininas”, acrescentou o coordenador.
Outro dado do levantamento é que a taxa de catolicismo no Nordeste é a mais alta do Brasil (74%) e no Sudeste é a mais baixa (64%). “No entanto, no Nordeste [a taxa] tem crescido em velocidade 2,5 vezes maior do que no Sudeste”, ressaltou o coordenador da pesquisa.
Entre os estados, o Piauí é o que concentra o maior número de católicos. Na outra ponta, está Roraima, com a menor população adepta ao catolicismo e que também apresenta a menor religiosidade.
O catolicismo está mais presente entre os mais ricos, da classe AB (69,07%), e entre os mais pobres, da classe E (72,76%).
Entre as outras religiões, os evangélicos tradicionais estão concentrados, principalmente, nas classes AB (8,35%) e C (8,72%), reduzindo a participação nas camadas mais baixas, chegando a representar 4,69% da classe E.
Seitas espíritas e espiritualistas representam 5,52% da população na classe AB. Entre as faixas de renda, a classe E foi a que se mostrou como a menos religiosa de todas (7,72% não têm religião).
“Religiões orientais e afro-brasileiras estão mais presentes no topo [considerando a renda]. Quanto mais a renda aumenta, existe mais diversidade religiosa. Nos últimos anos no Brasil, houve uma queda acelerada do catolicismo, mas não em direção aos evangélicos pentecostais, como nas chamadas décadas perdidas, e mais em direção aos evangélicos tradicionais e todas as religiões alternativas ao catolicismo e aos grupos evangélicos”,
Novo Mapa das Religiões, divulgado pela Fundação Getulio Vargas (FGV):
http://www.fgv.br/cps/religiao/
http://www.fgv.br/cps/bd/rel3/REN_texto_FGV_CPS_Neri.pdf
“É um ritmo forte de transformação. As mudanças que aconteceram em 100 anos agora estão acontecendo em dez [anos]. Se continuar essa perda de 1 ponto de porcentagem [de católicos] por ano, em 20 anos você teria menos de metade da população”, calcula Marcelo Neri, coordenador do levantamento.
O relatório mostra que atualmente o percentual de mulheres católicas (71,3%) é menor do que o de homens (75,3%). “Acima de tudo, acho que seja a chamada revolução feminina. Poucas coisas mudaram mais no cotidiano das pessoas do que questões como trabalho e anticoncepção entre as mulheres. O fato é que, embora as mulheres sejam bem mais religiosas do que os homens, elas são menos católicas, talvez por uma questão de afinidade”, disse Neri.
O Novo Mapa das Religiões revela que o sexo feminino representa a maioria entre adeptos de 23 das 25 religiões listadas como as mais populares pela pesquisa, como a católica, a evangélica pentecostal, a evangélica tradicional, a espírita kardecista, a luterana e a umbanda. Segundo o documento, enquanto os homens abandonaram crenças, elas mudaram de religião. “O catolicismo, o candomblé e o budismo são religiões masculinas. Todas as outras são basicamente femininas”, acrescentou o coordenador.
Outro dado do levantamento é que a taxa de catolicismo no Nordeste é a mais alta do Brasil (74%) e no Sudeste é a mais baixa (64%). “No entanto, no Nordeste [a taxa] tem crescido em velocidade 2,5 vezes maior do que no Sudeste”, ressaltou o coordenador da pesquisa.
Entre os estados, o Piauí é o que concentra o maior número de católicos. Na outra ponta, está Roraima, com a menor população adepta ao catolicismo e que também apresenta a menor religiosidade.
O catolicismo está mais presente entre os mais ricos, da classe AB (69,07%), e entre os mais pobres, da classe E (72,76%).
Entre as outras religiões, os evangélicos tradicionais estão concentrados, principalmente, nas classes AB (8,35%) e C (8,72%), reduzindo a participação nas camadas mais baixas, chegando a representar 4,69% da classe E.
Seitas espíritas e espiritualistas representam 5,52% da população na classe AB. Entre as faixas de renda, a classe E foi a que se mostrou como a menos religiosa de todas (7,72% não têm religião).
“Religiões orientais e afro-brasileiras estão mais presentes no topo [considerando a renda]. Quanto mais a renda aumenta, existe mais diversidade religiosa. Nos últimos anos no Brasil, houve uma queda acelerada do catolicismo, mas não em direção aos evangélicos pentecostais, como nas chamadas décadas perdidas, e mais em direção aos evangélicos tradicionais e todas as religiões alternativas ao catolicismo e aos grupos evangélicos”,
Novo Mapa das Religiões, divulgado pela Fundação Getulio Vargas (FGV):
http://www.fgv.br/cps/religiao/
http://www.fgv.br/cps/bd/rel3/REN_texto_FGV_CPS_Neri.pdf
quarta-feira, 24 de agosto de 2011
JÂNIO QUADROS, 50 ANOS DA RENÚNCIA
Jânio Quadros não se limita ao hilário. Sua atuação na história do Brasil está muito mais para o trágico do que para o cômico.
Mais que tudo isso, uma lição. Um exemplo. Uma história contada e recontada que deveria nos servir de alerta e reflexão.
Jânio Quadros foi eleito presidente do Brasil com uma votação extraordinária, verdadeiro fenômeno eleitoral.
Naqueles tempos de fervura (desde o suicídio de Vargas em 1954 pairava sobre o país a sombra de um golpe, tentando os conspiradores até mesmo impedir a posse de JK), pela primeira vez as forças conservadoras chegavam ao poder. Pela primeira vez alguém apoiado pela UDN (União Democrática Nacional, anti-getulista e anti-comunista) chegava lá.
Mas o que fizera a direita para vencer com mais de 6 milhões de votos derrotando forças identificadas com Getúlio, encarnadas na figura honrada do Mal. Teixeira Lott?
Apresentaram propostas, durante a campanha eleitoral, de desenvolvimento e geração de emprego? Defenderam medidas de ajustes diminuindo as enormes distâncias sociais que separavam brasileiros? Propuseram um modelo de sociedade mais justa?
Não. As propostas de Jânio e seu alto comando, da UDN e de Carlos Lacerda, eram vazias como um porongo.
Então, por que a vitória estrondosa?
Porque usaram o mais seguro dos caminhos até os corações da maioria dos brasileiros: o discurso moralista e conservador. A identificação de Jânio como o homem que combateria a corrupção, que varreria a roubalheira, que defenderia a moral e a família brasileira, ameaçada pelos comunistas, esses “seres ateus, que odeiam os valores da família, os valores cristãos”.
Quando faltam argumentos, o anticomunismo tupiniquim se apodera da corrupção como algo recente e exclusivo às ações de seus adversários políticos.
Reparem que, pouca coisa mudou em relação ao último candidato derrotado para a Presidência, José Serra, que em desespero para evitar uma derrota ainda no primeiro turno, usou o discurso do bem (ele era o bem) contra sua oponente acusando-a de defender o aborto ou de ser a madrinha política de uma ministra que permitira o tráfico de influência em seu ministério.
Interessante notar como um povo que não conhece sua história repete os erros do passado e cai no mesmo truque dos estelionatários eleitorais.
Mostrando um Jânio de terno amorrotado, que comia sanduíches de mortadela tirados do próprio bolso, que mostrava uma vassoura como símbolo de limpeza contra a corrupção, a direita fez de Jânio Quadros um mito. Uma figura singular, pura, do povo, combatendo os monstros da corrupção e do mal.
Eleito, Jânio levou o Brasil para mares repletos de tempestades e em sete meses confundiu, iludiu, se perdeu e perdeu o país, pois acima de tudo, lhe faltavam idéias e ideais.
Ao renunciar em 25 agosto de 1961 jogou o país na mais grave crise de sua história, não ocorrendo uma guerra civil por detalhes muito pequenos.
Jânio Quadros faleceu em 1992, aos 75 anos. Dizem que, antes de fechar os olhos, segredou a um sobrinho que este teria sido seu maior erro em toda vida.
Para nós, hoje, ao atingirmos 50 anos da renúncia, seria importante se, em sua celebração nos comprometêssemos a nunca mais permitir que o falso moralismo oportunista prevaleça sobre a razão.
Mais que tudo isso, uma lição. Um exemplo. Uma história contada e recontada que deveria nos servir de alerta e reflexão.
Jânio Quadros foi eleito presidente do Brasil com uma votação extraordinária, verdadeiro fenômeno eleitoral.
Naqueles tempos de fervura (desde o suicídio de Vargas em 1954 pairava sobre o país a sombra de um golpe, tentando os conspiradores até mesmo impedir a posse de JK), pela primeira vez as forças conservadoras chegavam ao poder. Pela primeira vez alguém apoiado pela UDN (União Democrática Nacional, anti-getulista e anti-comunista) chegava lá.
Mas o que fizera a direita para vencer com mais de 6 milhões de votos derrotando forças identificadas com Getúlio, encarnadas na figura honrada do Mal. Teixeira Lott?
Apresentaram propostas, durante a campanha eleitoral, de desenvolvimento e geração de emprego? Defenderam medidas de ajustes diminuindo as enormes distâncias sociais que separavam brasileiros? Propuseram um modelo de sociedade mais justa?
Não. As propostas de Jânio e seu alto comando, da UDN e de Carlos Lacerda, eram vazias como um porongo.
Então, por que a vitória estrondosa?
Porque usaram o mais seguro dos caminhos até os corações da maioria dos brasileiros: o discurso moralista e conservador. A identificação de Jânio como o homem que combateria a corrupção, que varreria a roubalheira, que defenderia a moral e a família brasileira, ameaçada pelos comunistas, esses “seres ateus, que odeiam os valores da família, os valores cristãos”.
Quando faltam argumentos, o anticomunismo tupiniquim se apodera da corrupção como algo recente e exclusivo às ações de seus adversários políticos.
Reparem que, pouca coisa mudou em relação ao último candidato derrotado para a Presidência, José Serra, que em desespero para evitar uma derrota ainda no primeiro turno, usou o discurso do bem (ele era o bem) contra sua oponente acusando-a de defender o aborto ou de ser a madrinha política de uma ministra que permitira o tráfico de influência em seu ministério.
Interessante notar como um povo que não conhece sua história repete os erros do passado e cai no mesmo truque dos estelionatários eleitorais.
Mostrando um Jânio de terno amorrotado, que comia sanduíches de mortadela tirados do próprio bolso, que mostrava uma vassoura como símbolo de limpeza contra a corrupção, a direita fez de Jânio Quadros um mito. Uma figura singular, pura, do povo, combatendo os monstros da corrupção e do mal.
Eleito, Jânio levou o Brasil para mares repletos de tempestades e em sete meses confundiu, iludiu, se perdeu e perdeu o país, pois acima de tudo, lhe faltavam idéias e ideais.
Ao renunciar em 25 agosto de 1961 jogou o país na mais grave crise de sua história, não ocorrendo uma guerra civil por detalhes muito pequenos.
Jânio Quadros faleceu em 1992, aos 75 anos. Dizem que, antes de fechar os olhos, segredou a um sobrinho que este teria sido seu maior erro em toda vida.
Para nós, hoje, ao atingirmos 50 anos da renúncia, seria importante se, em sua celebração nos comprometêssemos a nunca mais permitir que o falso moralismo oportunista prevaleça sobre a razão.
terça-feira, 23 de agosto de 2011
LUTA, SUBSTANTIVO FEMININO
As mulheres torturadas pela repressão no Regime militar sofreram, além dos martírios físicos comuns aos homens, as torturas psicológicas e agressões a sua própria condição feminina.
Além das dores dilacerantes do corpo, as dores inomináveis na alma e na dignidade.
A seguir, alguns relatos, dessas mártires da luta contra a ditadura militar:
ROSE NOGUEIRA - jornalista, presa em 1969, em São Paulo, onde vive hoje.
“Sobe depressa, Miss Brasil’, dizia o torturador enquanto me empurrava e beliscava minhas nádegas escada acima no Dops. Eu sangrava e não tinha absorvente. Eram os ‘40 dias’ do parto. Riram mais ainda quando ele veio para cima de mim e abriu meu vestido. Segurei os seios, o leite escorreu. Eu sabia que estava com um cheiro de suor, de sangue, de leite azedo. Ele (delegado Fleury) ria, zombava do cheiro horrível e mexia em seu sexo por cima da calça com um olhar de louco. O torturador zombava: ‘Esse leitinho o nenê não vai ter mais’”.
IZABEL FÁVERO - professora, presa em 1970, em Nova Aurora (PR). Hoje, vive no Recife, onde é docente universitária.
"Eu, meu companheiro e os pais dele fomos torturados a noite toda ali, um na frente do outro. Foi pau de arara, choques elétricos, jogo de empurrar e ameaças de estupro. Eu estava grávida de dois meses, e eles estavam sabendo. No quinto dia, eu abortei. Quando melhorei, voltaram a me torturar”.
HECILDA FONTELLES VEIGA - estudante de Ciências Sociais, presa em 1971, em Brasília. Hoje, vive em Belém, onde é professora da Universidade Federal do Pará.
“Quando fui presa, minha barriga de cinco meses de gravidez já estava bem visível. Fui levada à delegacia da Polícia Federal, onde, diante da minha recusa em dar informações a respeito de meu marido, Paulo Fontelles, comecei a ouvir, sob socos e pontapés: ‘Filho dessa raça não deve nascer’.
Me colocaram na cadeira do dragão. Da cadeira em que sentávamos saíam uns fios, que subiam pelas pernas e eram amarrados nos seios. As sensações que aquilo provocava eram indescritíveis: calor, frio, asfixia.
Aí, levaram-me ao hospital da Guarnição de Brasília, onde fiquei até o nascimento do Paulo. Nesse dia, para apressar as coisas, o médico, irritadíssimo, induziu o parto e fez o corte sem anestesia”.
IGNES MARIA RAMINGER - estudante de Medicina Veterinária presa em 1970, em
Porto Alegre, onde trabalha atualmente como técnica da Secretaria de Saúde.
“Fui levada para o Dops, onde me submeteram a torturas como cadeira do dragão e pau de arara. Davam choques em várias partes do corpo, inclusive nos genitais. De violência sexual, só não houve cópula, mas metiam os dedos na minha vagina, enfiavam cassetete no ânus. Isso, além das obscenidades que falavam. Havia muita humilhação. E eu fui muito torturada, juntamente com o Gustavo [Buarque Schiller], porque descobriram que era meu companheiro”.
DILEA FRATE - estudante de Jornalismo presa em 1975, em São Paulo. Hoje, vive no Rio de Janeiro, onde é jornalista e escritora.
“Dois homens entraram em casa e me seqüestraram, juntamente com meu marido, o jornalista Paulo Markun. No DOI-Codi de São Paulo, levei choques nas mãos, nos pés e nas orelhas, alguns tapas e socos. Num determinado momento, eles, rindo, puseram fogo nos meus cabelos, que passavam da cintura”.
CECILIA COIMBRA - estudante de Psicologia presa em 1970, no Rio. Hoje, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais e professora de Psicologia da Universidade Federal Fluminense.
“Os guardas que me levavam, frequentemente encapuzada, percebiam minha fragilidade e constantemente praticavam vários abusos sexuais contra mim. Os choques elétricos no meu corpo nu e molhado eram cada vez mais intensos. Me senti desintegrar: a bexiga e os esfíncteres sem nenhum controle. ‘Isso não pode estar acontecendo: é um pesadelo… Eu não estou aqui…’, pensei. Vi meus três irmãos no DOI-Codi/RJ. Sem nenhuma militância política, foram seqüestrados em suas casas, presos e torturados”.
MARIA AMÉLIA DE ALMEIDA TELES - professora de educação artística presa em
1972, em São Paulo. Hoje é diretora da União de Mulheres de São Paulo.
“Fomos levados diretamente para a Oban. Eu vi que quem comandava a operação do alto da escada era o coronel Ustra. Subi dois degraus e disse: ‘Isso que vocês estão fazendo é um absurdo’. Ele disse: ‘Foda-se, sua terrorista’, e bateu no meu rosto. Eu rolei no pátio. Aí, fui agarrada e arrastada para dentro. Me amarraram na cadeira do dragão, nua, e me deram choque no ânus, na vagina, no umbigo, no seio, na boca, no ouvido. Fiquei nessa cadeira, nua, e os caras se esfregavam em mim, se masturbavam em cima de mim. Mas com certeza a pior tortura foi ver meus filhos entrando na sala quando eu estava na cadeira do dragão. Eu estava nua, toda urinada por conta dos choques”.
São apenas alguns de mais de 500 relatos que você encontra no livro “LUTA, SUBSTANTIVO FEMININO”, coordenado pelo professor José Ribamar Bessa Freire.
Além das dores dilacerantes do corpo, as dores inomináveis na alma e na dignidade.
A seguir, alguns relatos, dessas mártires da luta contra a ditadura militar:
ROSE NOGUEIRA - jornalista, presa em 1969, em São Paulo, onde vive hoje.
“Sobe depressa, Miss Brasil’, dizia o torturador enquanto me empurrava e beliscava minhas nádegas escada acima no Dops. Eu sangrava e não tinha absorvente. Eram os ‘40 dias’ do parto. Riram mais ainda quando ele veio para cima de mim e abriu meu vestido. Segurei os seios, o leite escorreu. Eu sabia que estava com um cheiro de suor, de sangue, de leite azedo. Ele (delegado Fleury) ria, zombava do cheiro horrível e mexia em seu sexo por cima da calça com um olhar de louco. O torturador zombava: ‘Esse leitinho o nenê não vai ter mais’”.
IZABEL FÁVERO - professora, presa em 1970, em Nova Aurora (PR). Hoje, vive no Recife, onde é docente universitária.
"Eu, meu companheiro e os pais dele fomos torturados a noite toda ali, um na frente do outro. Foi pau de arara, choques elétricos, jogo de empurrar e ameaças de estupro. Eu estava grávida de dois meses, e eles estavam sabendo. No quinto dia, eu abortei. Quando melhorei, voltaram a me torturar”.
HECILDA FONTELLES VEIGA - estudante de Ciências Sociais, presa em 1971, em Brasília. Hoje, vive em Belém, onde é professora da Universidade Federal do Pará.
“Quando fui presa, minha barriga de cinco meses de gravidez já estava bem visível. Fui levada à delegacia da Polícia Federal, onde, diante da minha recusa em dar informações a respeito de meu marido, Paulo Fontelles, comecei a ouvir, sob socos e pontapés: ‘Filho dessa raça não deve nascer’.
Me colocaram na cadeira do dragão. Da cadeira em que sentávamos saíam uns fios, que subiam pelas pernas e eram amarrados nos seios. As sensações que aquilo provocava eram indescritíveis: calor, frio, asfixia.
Aí, levaram-me ao hospital da Guarnição de Brasília, onde fiquei até o nascimento do Paulo. Nesse dia, para apressar as coisas, o médico, irritadíssimo, induziu o parto e fez o corte sem anestesia”.
IGNES MARIA RAMINGER - estudante de Medicina Veterinária presa em 1970, em
Porto Alegre, onde trabalha atualmente como técnica da Secretaria de Saúde.
“Fui levada para o Dops, onde me submeteram a torturas como cadeira do dragão e pau de arara. Davam choques em várias partes do corpo, inclusive nos genitais. De violência sexual, só não houve cópula, mas metiam os dedos na minha vagina, enfiavam cassetete no ânus. Isso, além das obscenidades que falavam. Havia muita humilhação. E eu fui muito torturada, juntamente com o Gustavo [Buarque Schiller], porque descobriram que era meu companheiro”.
DILEA FRATE - estudante de Jornalismo presa em 1975, em São Paulo. Hoje, vive no Rio de Janeiro, onde é jornalista e escritora.
“Dois homens entraram em casa e me seqüestraram, juntamente com meu marido, o jornalista Paulo Markun. No DOI-Codi de São Paulo, levei choques nas mãos, nos pés e nas orelhas, alguns tapas e socos. Num determinado momento, eles, rindo, puseram fogo nos meus cabelos, que passavam da cintura”.
CECILIA COIMBRA - estudante de Psicologia presa em 1970, no Rio. Hoje, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais e professora de Psicologia da Universidade Federal Fluminense.
“Os guardas que me levavam, frequentemente encapuzada, percebiam minha fragilidade e constantemente praticavam vários abusos sexuais contra mim. Os choques elétricos no meu corpo nu e molhado eram cada vez mais intensos. Me senti desintegrar: a bexiga e os esfíncteres sem nenhum controle. ‘Isso não pode estar acontecendo: é um pesadelo… Eu não estou aqui…’, pensei. Vi meus três irmãos no DOI-Codi/RJ. Sem nenhuma militância política, foram seqüestrados em suas casas, presos e torturados”.
MARIA AMÉLIA DE ALMEIDA TELES - professora de educação artística presa em
1972, em São Paulo. Hoje é diretora da União de Mulheres de São Paulo.
“Fomos levados diretamente para a Oban. Eu vi que quem comandava a operação do alto da escada era o coronel Ustra. Subi dois degraus e disse: ‘Isso que vocês estão fazendo é um absurdo’. Ele disse: ‘Foda-se, sua terrorista’, e bateu no meu rosto. Eu rolei no pátio. Aí, fui agarrada e arrastada para dentro. Me amarraram na cadeira do dragão, nua, e me deram choque no ânus, na vagina, no umbigo, no seio, na boca, no ouvido. Fiquei nessa cadeira, nua, e os caras se esfregavam em mim, se masturbavam em cima de mim. Mas com certeza a pior tortura foi ver meus filhos entrando na sala quando eu estava na cadeira do dragão. Eu estava nua, toda urinada por conta dos choques”.
São apenas alguns de mais de 500 relatos que você encontra no livro “LUTA, SUBSTANTIVO FEMININO”, coordenado pelo professor José Ribamar Bessa Freire.
sábado, 20 de agosto de 2011
FREI TITO 03: UM SILÊNCIO DE DEUS
Banido do país, Frei Tito, deixou uma carta ao companheiro Vanderley Caixe, também na prisão: "companheiro, aqui ou no exterior estaremos sempre lutando pela liberdade e o socialismo."
Na prisão, ele escreveu sobre a sua tortura e o documento correu pelo mundo e se transformou em símbolo de luta pelos direitos humanos.
Em 1971 foi deportado para o Chile e, sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. Em Roma, não encontrou apoio da Igreja Católica, por ser considerado um “frade terrorista”. De Roma foi para Paris, onde recebeu apoio dos dominicanos.
Traumatizado pela tortura que sofreu, Frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico. Seu estado era instável, vivendo uma agoniada alternância entre prisão e liberdade diante do passado.
Para se ter idéia de como o seu trauma era terrível, saiba de uma história ocorrida em sua vida: Uma vez, em pânico, recusou-se a entrar no convento e os frades chamaram o frei Xavier Plassat. Ao encontrar Tito, no meio da chuva, assustado e escondido atrás de uma árvore, dizia que Fleury não o deixava entrar no convento. Xavier então pediu a Tito para tomar café com a "autorização de Fleury" (segundo a visão de Tito). Ao entrar no carro, Xavier pediu para Tito esperar no carro enquanto buscava alguns agasalhos. Quando Xavier voltou para o veículo, Tito estava fora do carro (escondido na mesma árvore) e assustado, como se Fleury tivesse entrado no automóvel.
No dia 10 de agosto de 1974, um morador dos arredores de Lyon, encontrou o corpo de Frei Tito, suspenso por uma corda.
Foi enterrado no cemitério dominicano Sainte Marie de La Tourette, em Éveux.
Em 25 de março de 1983, o corpo de Frei Tito chegou ao Brasil. Antes de chegar a Fortaleza, passou por São Paulo, onde foi realizada uma celebração litúrgica em memória dos mortos pela ditadura de 1964: o próprio Frei Tito e Alexandre Vannucchi.
A missa foi celebrada por D. Paulo Evaristo Arns em trajes vermelhos, trajes usados em celebrações de Mártires, acompanhada por mais de quatro mil pessoas.
É necessário e urgente contar essa história para os jovens. Mas falar da Ditadura Militar brasileira, da tortura e morte dos militantes, é sem dúvida um desafio para pais e educadores.
Como falar para nossos alunos e filhos que muitos brasileiros foram torturados até morrer, simplesmente porque não tinham o direito de falar contra o seu governo? Como explicar que alguns destes torturadores estão entre nós, trabalhando, candidatando-se a cargos políticos, vivendo sem lembrar do rastro de sangue que deixaram para trás? Como explicar que Frei Tito foi preso e sofreu tanto nas mãos dos seus algozes somente por ter conseguido um sítio para uma reunião de estudantes?
Professores e pais cearenses têm a sorte de contar com o Memorial Frei Tito, no Museu do Ceará. Idealizado e montado por Régis Lopes, historiador e diretor do Museu, e Lúcia Alencar, sobrinha de Frei Tito, o Memorial expõe documentos, fotos e objetos pessoais de Frei Tito, trazendo sua presença para perto de nós. Uma das fotos em exposição mostra os jovens presos no Congresso de Ibiúna, São Paulo, quando a Ditadura Militar não permitia nenhum tipo de reunião ou agremiação, justamente o momento que determinou a prisão e o começo do sofrimento de Frei Tito.
Passear pelas paredes vermelhas do Memorial Frei Tito com um grupo de adolescentes é despertar uma série de perguntas que eles precisam elaborar e responder, compreendendo o passado do país. Precisamos deixar essa história registrada, para que os jovens de hoje e de amanhã conheçam os passos deste homem, que acreditava no Evangelho, nas mudanças da sociedade, mas que tinha plena consciência de que nada aconteceria sem o esforço de cada um, desde cedo, vendo, julgando e agindo.
Poucos dias antes de morrer, Frei Tito escreveu na sua agenda:
"São noites de silêncio
Vozes que clamam num espaço infinito
Um silêncio do homem e um silêncio de Deus."
Socorro Acioli é jornalista e escritora, autora do livro Frei Tito da Coleção Terra Bárbara, Edições Demócrito Rocha.
Na prisão, ele escreveu sobre a sua tortura e o documento correu pelo mundo e se transformou em símbolo de luta pelos direitos humanos.
Em 1971 foi deportado para o Chile e, sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. Em Roma, não encontrou apoio da Igreja Católica, por ser considerado um “frade terrorista”. De Roma foi para Paris, onde recebeu apoio dos dominicanos.
Traumatizado pela tortura que sofreu, Frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico. Seu estado era instável, vivendo uma agoniada alternância entre prisão e liberdade diante do passado.
Para se ter idéia de como o seu trauma era terrível, saiba de uma história ocorrida em sua vida: Uma vez, em pânico, recusou-se a entrar no convento e os frades chamaram o frei Xavier Plassat. Ao encontrar Tito, no meio da chuva, assustado e escondido atrás de uma árvore, dizia que Fleury não o deixava entrar no convento. Xavier então pediu a Tito para tomar café com a "autorização de Fleury" (segundo a visão de Tito). Ao entrar no carro, Xavier pediu para Tito esperar no carro enquanto buscava alguns agasalhos. Quando Xavier voltou para o veículo, Tito estava fora do carro (escondido na mesma árvore) e assustado, como se Fleury tivesse entrado no automóvel.
No dia 10 de agosto de 1974, um morador dos arredores de Lyon, encontrou o corpo de Frei Tito, suspenso por uma corda.
Foi enterrado no cemitério dominicano Sainte Marie de La Tourette, em Éveux.
Em 25 de março de 1983, o corpo de Frei Tito chegou ao Brasil. Antes de chegar a Fortaleza, passou por São Paulo, onde foi realizada uma celebração litúrgica em memória dos mortos pela ditadura de 1964: o próprio Frei Tito e Alexandre Vannucchi.
A missa foi celebrada por D. Paulo Evaristo Arns em trajes vermelhos, trajes usados em celebrações de Mártires, acompanhada por mais de quatro mil pessoas.
É necessário e urgente contar essa história para os jovens. Mas falar da Ditadura Militar brasileira, da tortura e morte dos militantes, é sem dúvida um desafio para pais e educadores.
Como falar para nossos alunos e filhos que muitos brasileiros foram torturados até morrer, simplesmente porque não tinham o direito de falar contra o seu governo? Como explicar que alguns destes torturadores estão entre nós, trabalhando, candidatando-se a cargos políticos, vivendo sem lembrar do rastro de sangue que deixaram para trás? Como explicar que Frei Tito foi preso e sofreu tanto nas mãos dos seus algozes somente por ter conseguido um sítio para uma reunião de estudantes?
Professores e pais cearenses têm a sorte de contar com o Memorial Frei Tito, no Museu do Ceará. Idealizado e montado por Régis Lopes, historiador e diretor do Museu, e Lúcia Alencar, sobrinha de Frei Tito, o Memorial expõe documentos, fotos e objetos pessoais de Frei Tito, trazendo sua presença para perto de nós. Uma das fotos em exposição mostra os jovens presos no Congresso de Ibiúna, São Paulo, quando a Ditadura Militar não permitia nenhum tipo de reunião ou agremiação, justamente o momento que determinou a prisão e o começo do sofrimento de Frei Tito.
Passear pelas paredes vermelhas do Memorial Frei Tito com um grupo de adolescentes é despertar uma série de perguntas que eles precisam elaborar e responder, compreendendo o passado do país. Precisamos deixar essa história registrada, para que os jovens de hoje e de amanhã conheçam os passos deste homem, que acreditava no Evangelho, nas mudanças da sociedade, mas que tinha plena consciência de que nada aconteceria sem o esforço de cada um, desde cedo, vendo, julgando e agindo.
Poucos dias antes de morrer, Frei Tito escreveu na sua agenda:
"São noites de silêncio
Vozes que clamam num espaço infinito
Um silêncio do homem e um silêncio de Deus."
Socorro Acioli é jornalista e escritora, autora do livro Frei Tito da Coleção Terra Bárbara, Edições Demócrito Rocha.
sexta-feira, 19 de agosto de 2011
19 de agosto - DIA DO HISTORIADOR
A Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) deu parecer favorável, recentemente (09/09/2008) ao projeto de lei que institui o Dia Nacional do Historiador. A proposta que homenageia os historiadores é de autoria do senador Cristovam Buarque (PDT-DF).
Originalmente, o texto estabelecia que a data seria celebrada no dia 12 de setembro.
Mas o relator da proposição na CE, senador Augusto Botelho (PT-RR), propôs uma emenda - aprovada pela comissão - que altera a comemoração para o dia 19 de agosto. A nova data foi escolhida para homenagear Joaquim Nabuco, que nasceu em 19 de agosto de 1849 e também foi historiador.
JUSTIFICAÇÃO (por Cristovam Buarque)
Um povo sem história é um povo sem memória. Essa afirmação, mais que um dito já popular, é também uma verdade histórica, pois todos os agrupamentos humanos que não preservaram sua memória - em histórias, documentos, objetos de arte e arquitetura -
acabaram sucumbindo a ditaduras e até acabaram por desaparecer da face da Terra. Por essa razão, não apenas a disciplina que trata das histórias dos povos deve merecer nossa atenção, mas também os cientistas que se dedicam a essa tarefa tão nobre. Obviamente, a história se faz por seus protagonistas: lideranças políticas, religiosas e econômicas, por um lado; grupos populares, lutas contra a opressão e pela libertação, por outro. E para registrar tudo, o historiador. E de tal modo é importante o papel dos historiadores que,
por vezes, eles ajudam, também, a reconfigurar a história de um País.Ao lado da Filosofia e da Literatura, a História está presente desde os primeiros momentos da nossa tradição ocidental, constituindo um dos saberes mais antigos de nossa civilização. (...)
Fonte: café história
Originalmente, o texto estabelecia que a data seria celebrada no dia 12 de setembro.
Mas o relator da proposição na CE, senador Augusto Botelho (PT-RR), propôs uma emenda - aprovada pela comissão - que altera a comemoração para o dia 19 de agosto. A nova data foi escolhida para homenagear Joaquim Nabuco, que nasceu em 19 de agosto de 1849 e também foi historiador.
JUSTIFICAÇÃO (por Cristovam Buarque)
Um povo sem história é um povo sem memória. Essa afirmação, mais que um dito já popular, é também uma verdade histórica, pois todos os agrupamentos humanos que não preservaram sua memória - em histórias, documentos, objetos de arte e arquitetura -
acabaram sucumbindo a ditaduras e até acabaram por desaparecer da face da Terra. Por essa razão, não apenas a disciplina que trata das histórias dos povos deve merecer nossa atenção, mas também os cientistas que se dedicam a essa tarefa tão nobre. Obviamente, a história se faz por seus protagonistas: lideranças políticas, religiosas e econômicas, por um lado; grupos populares, lutas contra a opressão e pela libertação, por outro. E para registrar tudo, o historiador. E de tal modo é importante o papel dos historiadores que,
por vezes, eles ajudam, também, a reconfigurar a história de um País.Ao lado da Filosofia e da Literatura, a História está presente desde os primeiros momentos da nossa tradição ocidental, constituindo um dos saberes mais antigos de nossa civilização. (...)
Fonte: café história
Assinar:
Postagens (Atom)