quarta-feira, 1 de março de 2017

BRASIL, TEATRO DOS HORRORES


Tudo bem, vamos combinar que somos todos, um pouco atores já que desempenhamos vários papéis sendo pais, irmãos, marido/esposa, colega, etc.


Mas, francamente, a atuação anda muito fraca em nosso país.


Para começar estamos representando uma peça cujo argumento não tem nada de inédito, sendo por isso repetitivo. Já vimos esse filme em 1964, por exemplo.


Alguns atores consagrados e campeões de audiência, como os ex-governadores  Leonel Brizola e Miguel Arraes, saíram de cena e não foram substituídos à altura, deixando um enorme vazio no elenco.


Temos alguns senhores togados cujas representações são tão fracas que o que deveria ser drama e sisudez se tornou comédia.


Um grupo inteiro atuando como sabatinadores, quando todos já sabem que o sabatinado já está previamente aprovado, a "cola" totalmente liberada e isso torna-se até monótona a peça montada.


E o que dizer de coadjuvante, no lugar do titular, sem nenhum talento para o “papel”?


Sinceramente, no Brasil há um exagero de representações fracas e diretores confusos.


Atores canastrões sendo levados a sério.


Muita gente exagerando na entonação de voz e, principalmente, na postura.


Homens e mulheres, brancos e de classe média fazendo o discurso da moralidade e anticorrupção, mas apoiando os grupos e pessoas mais corruptos do Brasil, não dá. 


Intitular-se piedosos, mas ser racistas, homofóbicos e odiando pobre, realmente, não dá veracidade aos personagens. 


Se dizer cristão e praticar a hipocrisia, tira do sério até o Papa Francisco.

Gente "de bem" repetindo falas decoradas de que acredita na justiça e que defende a igualdade, mas odiando programas sociais como o Bolsa Família já ultrapassou a linha do suportável.

Na boa, falar de amor e destilar ódio não combina, entende?

Prefeito perfumadinho pegando vassoura de gari e até atriz profissional dizendo que tem medo e revirando os olhinhos...

Já passou da hora de um diretor, um diretor de verdade e talento, grite “corta”.

Esse teatro mambembe de atores medíocres e de interpretações bizarras deveria ser todo refeito.

Para começar, atores eleitos para o papel no lugar que lhe é de direito. Quem foi eleito presidente no lugar de presidente, vice no de vice, policial e imprensa desempenhando suas atividades, deixando aos partidos políticos fazer política.

Não precisa nem ensaiar se cada macaco estiver no seu galho.

Será que é por isso que nenhum filme brasileiro, até hoje, ganhou um Oscar de filme estrangeiro?

De qualquer forma, não precisamos de Oscar no Brasil. Deixa lá essa festa para os norte-americanos. Bastaria que eles não interfirissem nos nossos filmes.

Precisamos é de justiça, de bons roteiros e final felizes.




Prof. Péricles

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

DIGNIDADE


Dignidade é uma coisa que, definitivamente, não se compra na farmácia ou na padaria. É o software de cada um, vem de fábrica. Pode ser burilado pela educação e outras influências, mas está lá, nasceu com o sujeito e será seu chip inviolável para toda a vida.

Existem mendigos abandonados nas calçadas que possuem olhar mais digno do que juízes de Direito.

A pessoa pode ser formalmente elegante e bem vestida, frequentar os melhores restaurantes, ter uma gorda conta corrente, mas no íntimo das quatro paredes bater na esposa. É um indigno, por mais que engane os outros.

Conheci uma moça, prostituta, que era capaz de chorar ao ver a dor de alguém e isso a tornava mais digna do que a imensa maioria dos seus fregueses. Não é a função nem a remuneração que torna o sujeito digno.

Por isso, se faz necessário um pouco de paciência. Aquela pessoa de vocábulos ricos pode ser uma ameba moral.

Existe um depósito oculto na alma de cada um onde se armazenam essas coisas que não podem ser mensuradas quantitativamente, e que se destacam apenas pela vivencia.

É como um almoxarifado.

Num escaninho da mente temos solidariedade, noutro fraternidade, respeito, ética, enfim, aquele rol de valores que compõe a dignidade humana. Na medida que vivemos vamos usando cada um desses “materiais” e quanto mais velhos ficamos mais rapidamente reabastecemos nossos escaninhos da alma. Mas, os que não têm essa matéria prima estão sempre desabastecidos e confundindo amor próprio com dignidade.

Por mais enganador que seja, ninguém consegue demonstrar ter o que realmente não tem, e quando insiste acaba caindo em contradição.

Por exemplo: é impossível amar o Brasil sem amar seu povo, amar a democracia e defender golpismos e golpistas ou defender a igualdade entre as pessoas sendo preconceituoso e racista.

O pior mal caráter é aquele que não assume seus desejos e busca enganar as pessoas com defesas ambíguas de valores pontuais.

Para não assumir seu antipetismo afirmar que todos os partidos são iguais. Para não assumir seu fascismo ressaltar o pretenso ataque aos valores tradicionais que estariam sendo violados e aí arrola Deus, pátria, família, ordem e progresso.

Coisas assim que explicam, por exemplo, como pode um político que, num passado recente, representou seu papel de candidato à presidência pelo PCB com enorme dignidade, demonstrar agora uma agressividade injustificada numa solenidade pública, agredindo com palavras ácidas um intelectual que aos ser homenageado pronunciou palavras contrárias aos seus instintos de superioridade governista.

Embora sejam diferentes personagens de um mesmo ator, dá para apostar que o verdadeiro é esse, sem a dignidade que um dia representou ter.

Toda máscara tende a cair um dia.

Seria extraordinariamente mais fácil viver se cada um assumisse o que realmente sente e os valores que realmente lhe interessam defender.

Mas, aí, voltamos ao início desse texto... dignidade é algo que não se compra, nem se conquista com um curso superior... é seu chip de fábrica.



Prof. Péricles





domingo, 26 de fevereiro de 2017

TRUMP AJUDA THERESA, QUE AJUDA LE PEN



Faltando dois meses para o primeiro turno da eleição presidencial francesa, uma pesquisa divulgada esta semana mostra o crescimento da candidatura de Marine Le Pen, que alcança 26% das intenções de voto, contra 19% do principal adversário, o ex-ministro da Economia Emannuel Macron.



A líder da extrema-direita, filha de Jean-Marie Le Pen, deve causar dores de cabeça aos políticos de centro e de centro-esquerda franceses e aos defensores da União Europeia (UE), além de solavancos nos mercados.



Muito antes da vitória de Donald Trump do lado de cá do Atlântico, o continente europeu vive uma onda conservadora: a saída do Reino Unido da UE, capitaneada pelo primeira-ministra britânica, Theresa May, mostrou que, ao menos em tese, há vida fora do sonho da integração.



Atentados em Paris, Nice, Bruxelas e Berlim conquistam, dia após dia, mais adeptos da ideia de reerguer as fronteiras nacionais, anulando o Espaço Schengen da livre-circulação.



Partidos populistas têm crescido, como a Alternativa para a Alemanha (AfD), desbancando legendas de centro-esquerda, como o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE).



Políticas isolacionistas e, em alguns casos, xenófobas, nos EUA reforçam discursos de Thereza no Reino Unido e de Le Pen na França.



O último dos rompantes da líder da extrema-direita francesa foi ter desistido de encontrar o xeque Abdul Latif Derian, autoridade sunita do Líbano, na porta do gabinete. Isso porque lhe ofereceram o véu islâmico para a reunião. Le Pen é uma das principais defensoras da proibição da vestimenta em espaços públicos – o véu já não é permitido em escolas de ensino médio e serviço público na França.



Na quarta-feira (22/02), o centrista François Bayrou, líder do Movimento Democrático, fechou apoio a Macron, como alternativa a Le Pen.



Não será suficiente. Ela deve vencer em 23 de abril, mas não levará no segundo turno, em 7 de maio, quando os perdedores do primeiro turno se juntarão contra o inimigo comum. Essa costuma ser a lógica histórica da política francesa.



O problema é que, como o Brexit e Trump já mostraram, nem sempre a política tem seguido a lógica.




Por Rodrigo Lopes, colunista do Jornal Zero Hora de Porto Alegre



sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

MULHER BONITA


O homem se tornou dominante nas sociedades primitivas, não exatamente por ser o mais forte, mas por usar a força para se apropriar dos meios de produção.

Sendo ele mais capacitado fisicamente para a caça e depois, para as atividades da colheita, acabou por se tornar proprietário, relegando a mulher, progressivamente, a um papel secundário.

Com a evolução das sociedades, a importância da relação afetiva foi crescendo, e à mulher foi colocada na condição de atração entre os sexos, assim, enquanto o homem predominava na economia, a mulher deveria atrai-lo afetivamente, sendo atraente para merecer compartilhar de sua propriedade.

De certa forma, a mulher tornou-se uma propriedade.

Mas, o que é ser bela?

A beleza é formada por padrões subjetivos e variáveis, tanto no tempo, quanto no espaço, por isso, uma mulher pode ser considerada bonita num lugar e não bonita no outro, ou, antigamente mais ou menos bonita que hoje.

E o que move, classifica, define, esses padrões de beleza?

A economia.

Na antiguidade clássica, mulher bonita deveria ter a pele e os olhos mais escuros, sendo as “bárbaras” de olhos claros e loiras padrão de feiura, ao menos para os latinos, e isso porque o seu padrão de beleza era inato ao povo vencedor (eles mesmos) enquanto os germânicos (bárbaros) eram identificados como subespécie derrotada.

O que atraia os gregos era a mulher baixinha e a capacidade de ouvir, enquanto seu entendimento de amor era totalmente ligado ao aspecto tempo, por isso os gregos não casavam. Viviam juntos enquanto sentissem paixão. Quem inventou o casamento foram os latinos.

Para os espartanos a mulher era bonita quando demonstrava força e capacidade de conter suas lágrimas diante da perda de um filho mesmo em idade prematura, já que aos seis anos a criança esparciata já era propriedade do estado. A força de Esparta estava no peito de seus soldados e na força de suas mulheres, como eles mesmos definiam.

Na Idade Média mulher bonita era a gordinha, pois era sinal de que se alimentavam bem e naquele período de fome e miséria, se alimentar bem fazia qualquer mulher ser linda.

Por isso, no período medieval, mulher magra era horrorosa.

Com o advento da Revolução Industrial e a sociedade por ela criada, a gordinha deixou de ser considerada bonita passando a ser admirada a mulher magra, já que essa era muito mais apta ao trabalho nas máquinas. Surgiu o estilo que perdura até hoje.

Sendo os conceitos de beleza movidos e alterados pela economia, é desesperador ver tantas moças sofrendo por se acharem gordas e fora dos padrões. 

Diante do aumento sistemático de pessoas deprimidas e do número anual de suicídios é de se perguntar, afinal, o que torna realmente a mulher bonita. 

Certamente não é esse modelo vendido pela indústria de cosméticos, ampliado pelo marketing que tudo remunera e embalado, por exemplo, pela mídia e indústria cinematográfica. 

Ser enquadrado a esse modelo criado.  Será esse um ideal de felicidade legítimo?

Acreditamos que não.

Mulher bonita, bonita mesmo, daquela beleza que não é temporal ou geográfica é a mulher de luta. A mulher que se expressa e defende seus direitos de expressão e razão.

Mulher bonita é a mulher cujos valores estão acima dos padrões de uma indústria perversa que cria mitos e mentiras em profusão para dominar as mentes e vender tudo aquilo que possa gerar lucro.

É aquela que é capaz de sofrer o sofrimento alheio e combater o combate dos mais frágeis e as perversidades de uma sociedade que teima enquadra-la como objeto, como se ainda vivêssemos na pré-história moral.

Mulheres lindas como Tereza, aquela de Calcutá, ou Rosa que era de Luxemburgo, Olga que não temia os nazistas e todas as outras, de todos os lugares, que não entraram para os livros de história, mas que fazem a história, todo dia, com seu talento, trabalho e dedicação.

Mulher bonita é aquela que não tem medo de mostrar que ama, que quer amor e que exija boa parceria. Que demonstra coragem diante do fascismo e da violência.

Não, as mulheres não vieram enfeitar o mundo, isso é a visão machista que reduz a história feminina a um papel periférico.

Mulher é protagonista e revolucionária pela própria natureza pois nenhum outro segmento humano foi tão explorado ao longo da história.

Cosméticos são ilusões pois não transformam a natureza física de alguém e servem apenas para enriquecer as “indústrias da beleza”. O verdadeiro e real cosmético é a prática do bem e a participação na luta por um mundo melhor.

Mulher bonita são todas as mulheres, conforme seu engajamento perante a vida.




Prof. Péricles

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

ERA UMA VEZ


Por Robson Sávio Reis Souza


Num país de faz-de-conta um bando tomou de assalto o poder. Retiraram do governo uma mulher honesta e entronaram no seu lugar um bode-velho (casado com uma donzela arranjada), cercado por uma camarilha de ladrões. Inquisidores midiáticos e nos tribunais abençoaram o golpe, regado por dinheiro de empresas de patos amarelos. O tio dos bandoleiros, conhecido como "tio-sam", ajudou (e muito) nas estratégias da empreitada...

A corja, com farta representação nos três poderes, tem milhares de bobos da corte: alguns, que se autointitulam do "movimento do país livre", gostam de bater panelas para defender seus heróis-bandidos; outros promovem passeatas contra os direitos sociais; detestam a ideia de justiça e igualdade e pregam o ódio em relação ao outro, porque se acham superiores, acima do bem e do mal, cidadãos de ben$.

Não percebem que cavam para si um precipício; acham que o buraco é para os outros.

Usando da velha política do "panis et circenses", os golpistas entopem a mídia com dinheiro público para entreter o povo. Até cientistas da academia dos escolarizados dizem em programas globais que as instituições funcionam plenamente.

O bando imprime uma política recessiva: de propósito, provocam o desemprego em massa para atender ao clamor das empresas do século 19 com o objetivo de derrubar a massa salarial e criar as condições objetivas para estuprarem a constituição que garante direitos. Dizem que precisam fazer "reformas".

De fato querem derrubar a casa para construir uma choupana. Afinal, entendem que são os donos do pedaço e que pobre existe para mendicar ou viver de favores. Isso agrada o espírito cristão dos golpistas.

Aliás, com o apoio da teologia da prosperidade, que prega um deus que abençoa os endinheirados, os golpistas também têm as bênçãos de religiões-mercado. Por isso, não parece um escândalo o fato de líderes religiosos fazerem selfies com o bode-velho.

O país de faz-de conta está em convulsão: as polícias, os presídios, o sistema de seguridade social estão à beira de um colapso. Mas o rei e seu ministro plagiador, que gosta de uma barco intitulado de "boate do amor", acham que resolvem tudo com o báculo militar.

No país de faz-de-conta não há limites morais e éticos: bandoleiros são altas autoridades e governantes; juízes são deuses; mídia é tribunal; sonegadores e corruptos de carteirinha são conselheiros do rei. Tudo funciona normalmente...

Agora, quando de aproxima a "festa da carne" só sobrará ao povo o recurso da velha ironia para zombar da corja. Afinal, no país de faz-de-conta a educação, cumprindo sua missão docilizadora de mentes e corações, sempre ensinou o povo a se limitar à ironia momesca e nunca questionar sua condição de vida com vistas a transformar a realidade...


Robson Sávio Reis Souza, doutor em Ciências Sociais e professor da PUC Minas.


terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

TEVE GOLPE, CADÊ A LUTA?


Numa histórica reunião no aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, no dia 2 de abril de 1964, o ex-governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, o general chefe da III Exército, Ladário Pereira Telles, o Prefeito de Porto Alegre, Sereno Chaise e o Presidente da República João Goulart, ficou decidido, por imposição do presidente, que não haveria resistência armada contra o golpe militar que estava em andamento.



Brizola e o General Ladário defenderam a ideia da resistência, sendo que, naquele momento, só poderia ser ali, no Rio Grande do Sul que se poderia reverter o golpe deflagrado no dia 31 de março.


Jango, entretanto, foi inflexível, desautorizou qualquer resistência em seu nome e, às 11:45 daquele mesmo dia, partiu para o exílio, no Uruguai.


Sem o presidente que estava sendo deposto tornou-se impossível para Brizola e o General Ladário resistir.


Ainda hoje essa decisão provoca debates.


Deveria Jango ter lutado contra o golpe? Foi correta sua decisão de desistir sem luta?


Os que defendem a posição do presidente afirmam que ele sabia, mais do que qualquer outro, as consequências de sua decisão. Que ele tinha enorme receio de quanto sangue correria numa luta de brasileiros contra brasileiros.


Os Estados Unidos haviam enviado navios com marines prontos para “ajudar” os golpistas em caso de resistência na chamada Operação Brother San, que isso deveria ser do conhecimento de Jango, que temia, a presença militar estrangeira no país e suas implicações futuras.


E, finalmente, poderia se argumentar ainda que, o comando de Ladário não era aceito pela totalidade do III Exército, havendo discordâncias em Santa Maria, Alegrete e todo o Estado do Paraná.


Já os que acreditam que Brizola e Ladário estavam corretos, afirmam que, a falta de luta não trouxe reconhecimento algum por parte dos golpistas e até tornou a repressão futura contra os adversários da Ditadura mais sangrenta, pelo desprezo dos “vencedores” diante da apatia dos “derrotados”.


Membros do exército já afirmaram que os militares respeitariam muito mais uma resistência armada e heroica do que uma desistência sem luta.


Refletindo essa discussão nos tempos atuais, deve causar espanto para os elementos da esquerda militante, a apatia e falta de luta por parte do governo do PT deposto com Dilma em agosto passado.


O discurso politicamente correto de defesa da democracia e da ordem não se encaixa diante das inúmeras demonstrações de desrespeito praticado pelos que defendem o uso de qualquer arma para derrubar a presidenta.


O ministro da Justiça do governo Dilma variou entre a passividade e a mediocridade diante dos desmandos de uma Polícia Federal que deveria estar subordinada a ele.


Hoje, o presidente ilegítimo convida um advogado de Aécio Neves para o cargo de Ministro.


No governo Lula-Dilma as indicações para ministro do STF, uma obrigação constitucional da presidência, eram movidas por critérios técnicos, colocando no maior Tribunal do país verdadeiros agentes inimigos, em nome da ética.


Hoje, o governo Temer indica, segundo alguns, um ex-advogado do PCC e seu próprio ministro da Justiça para ocupar a função, sem nenhuma vergonha e nenhuma preocupação com a ética ou critérios técnicos.


Para o discurso democrático pregado por Lula-Dilma, a democracia foi atacada e a ordem constitucional agredida, mas, cadê a resistência?


Onde estão as forças populares capazes de fazer ver aos golpistas, que a verdadeira maioria não aceitará passivamente uma infâmia como a cometida?


Alegam alguns que o pessoal da esquerda teme confrontos de rua e suas consequências inesperadas. Entretanto, os agentes do golpe convocam multidões com a maior facilidade e falta de escrúpulos.


Observa-se uma intensa revolta, entre boa parte da população, divulgada através das redes sociais. Mas trazer essa revolta para as ruas é tarefa das lideranças políticas, sindicais, comunitárias. Onde estão essas lideranças?


Talvez a mais importante lição deixada pelos momentos decisivos do golpe de 64 seja exatamente essa: sem luta a democracia é espezinhada e a minoria passa a se considerar maioria, invertendo a verdade dos fatos.


Não existe remorso por parte de nenhum setor que hoje agride a verdade sem a menor cerimônia.


Seria interessante não misturar respeito à ética com covardia, até porque, como vimos depois de 1964, a direita costuma considerar covardes, e não democratas, aqueles que não lutam.



Prof. Péricles

domingo, 19 de fevereiro de 2017

MUITOS AJUDARAM TRUMP A VENCER



Por Antonio Tozzi


A eleição presidencial americana teve interferência externa, segundo fontes da CIA – a principal agência de espionagem dos EUA. De acordo com as informações recolhidas pelo órgão do governo federal, hackers baseados na Rússia entraram no website do DNC (Comitê Nacional Democrata) e pegaram emails do partido para detonar a candidatura de Hillary Clinton denunciando esquemas internos, dedurando doadores, enfim, produzindo todo tipo de informações negativas para prejudicar a ex-secretária de Estado do governo Barack Obama.

A tática funcionou. Para surpresa da maioria dos especialistas e institutos de pesquisas, Donald Trump acabou prevalecendo no Colégio Eleitoral, apesar de Hillary Clinton ter recebido mais votos. Ou seja, fosse eleição direta, ela teria vencido a eleição.

A reação do presidente Barack Obama à interferência indevida dos russos foi a expulsão de alguns diplomatas e espiãos russos durante as festas de final de ano. O presidente russo Valdimir Putin demonstrou seu desagrado, porém preferiu não exercer o direito de reciprocidade e manteve o pessoal do corpo diplomático dos EUA na Rússia.

Putin, que vem se transformando em um dos homens fortes do planeta, prefere apostar no bom relacionamento entre ele e Trump. Os dois governantes não escondem a admiração mútua. Na verdade, mais do que admiração, há vários interesses em jogo. E isto pode ser bom ou ruim para o mundo, dependendo do ponto de vista.

Um exemplo claro é a nomeacão de Rex Tillerson, ex CEO da Exxon Mobil, para o importante cargo de secretário Estado. Todos sabem que a Exxon teve os bens congelados por causa da invasão da Crimeia por parte das tropas russas, em consequências de embargos. O atual governo americano manifestou estar alinhado à Ucrânia – região onde está localizada a Crimeia – e consequentemente gerou descontentamento de Putin e dos membros de seu gabinete.

A guerra na Síria também colocou EUA e Rússia em lados antagônicos. Enquanto o governo americano passou a fornecer armamentos para os rebeldes sírios que lutam pela deposição de Bashar Al Assad, o governo russo decidiu apoiar integralmente o ditador sírio e suas forças armadas entraram com tudo no conflito para dizimar os guerrilheiros rebeldes e, de quebra, destruíram completamente a cidade de Aleppo.

Para o mundo, ter Putin e Trump à frente das duas potências não é bom presságio. Putin é frio, calculista e não mede esforços para conseguir seus objetivos. E ele não esconde de ninguém que pretende fazer da Rússia novamente uma potência temida, após o desmantelamento da antiga União Soviética. Se necessário for, ele colocará tropas para reconquistar territórios que julga pertencerem à Rússia como Ucrânia, Letônia, Lituânia e outros vizinhos que hoje constituíram-se em países independentes. Além disto, aliar-se à Síria e ao Irã garante o acesso a países fornecedores de petróleo.

Trump, por sua vez, aliou-se à alt right (direita alternativa) que repudia todo esforço empreendido por Obama em busca de energias alternativas baseadas em fontes renováveis. Tanto que seu governo está recheado de simpatizantes de fontes poluidoras como petróleo e carvão mineral.

Além disso, Trump prefere manter com Putin um relacionamento de respeito mútuo, ou seja, não quer interferir nos planos expansionistas do governante russo e pretende concentrar seus esforços no plano doméstico. Entretanto, este tipo de atitude não funciona para os EUA, pois a condição de maior potência do mundo exige sua presença em locais onde as pessoas estão sendo dominadas e, claro, os interesses americanos estejam ameaçados.

Portanto, por enquanto, Putin e Trump estão afinados no discurso de que Obama, Clinton e os democratas estão apenas buscando um bode expiatório pela derrota. Todavia, não se pode esquecer os papéis criticáveis desempenhados por Edward Snowden, Glenn Greenwald e sobretudo Julian Assange neste tabuleiro.

Eles que são – ou eram – exaltados por representantes da esquerda norte-americana contribuíram decisivamente para a derrota de Hillary Clinton e para a vitória de Donald Trump, que reúne o que há de mais abjeto em termos de direita raivosa.

Só nos resta aguardar como será o mundo sob controle de uma pessoa que não parece cultivar a temperança.




Antonio Tozzi revisor, repórter e redator do extinto Jornal da Tarde. Free lancers para diversas publicações. Nos Estados Unidos, foi editor chefe de publicações como Florida Review e AcheiUSA,.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

LÁGRIMAS E SORRISOS DE DEMÉTER



Deméter, deusa da agricultura e da fertilidade que os latinos chamavam de Ceres, teve uma filha com o poderoso Zeus.

A filha de Deméter e Zeus chamava-se Perséfone, uma jovem linda como uma aurora ensolarada, tornou-se deusa das ervas e frutos.

Sua beleza provocou a paixão ardente de Hades, irmão de Zeus e senhor do mundo inferior e dos mortos.

Hades era um deus que sofria enorme complexo de rejeição, pois, ao contrário dos irmãos Zeus e Posseidon, que eram amados pelo povo, ele se sentia esquecido e muito mais temido do que venerado.

Loucamente apaixonado e achando que não suportaria um “não” da linda Perséfone, deixou a conquista de lado e partiu para o sequestro mesmo, levando a amada para o seu reino das sombras, onde seria, por toda eternidade, sua rainha.

Deméter e Perséfone, mãe e filha, eram extremamente ligadas e a deusa da agricultura, não podendo desafiar o poder de Hades, entrou em profunda depressão, motivada pelas saudades.

Triste, chorava incontrolavelmente. Lentamente, o mundo ficou frio e sombrio. Suas lágrimas provocam enchentes. Era o outono e o inverno aos olhos dos gregos.

Os homens passaram a fazer oferendas e a orar para Deméter e para o próprio Zeus, rogando por melhoras no tempo, por mais calor e chuvas regulares.

Preocupado, Zeus buscou ser diplomático, intermediando a inconformidade de Deméter e os interesses de seu irmão sequestrador, com quem não queria briga, de jeito nenhum.

Hades concedeu que sua amada esposa voltasse ao mundo exterior para ver a mãe, mas, apenas por um tempo determinado, ou seja, Perséfone passaria seis meses com a mãe e os outros seis meses com ele, o marido.

Feliz com a presença da filha amada, Deméter voltou a sorrir, o sol a brilhar mais intensamente, e a terra a dar flores e frutos. Era a primavera e o verão, segundo os gregos.

Assim, era a tristeza da separação e a alegria do reencontro da deusa com sua filha que explicava as estações do ano, para esse povo extraordinário.

Penso nisso quando vejo tantas pessoas reclamando que as estações do ano estão confusas, que os invernos estão mais curtos e amenos, o calor mais intenso, etc.

Fala-se em enchentes na América do Sul e Ásia, Tsunamis no Japão, nevascas recordes na América do Norte e desgelo do Ártico e Antártida.

Parece que o acordo entre os deuses foi rompido e Perséfone fugindo dos infernos convive mais com a mãe do que com o marido, fato que deve estar enfurecendo o poderoso senhor das sombras.

Não podemos confirmar se rolou esse barraco entre as divindades, mas que as coisas nos parecem, estranhamente diferentes, parecem.

Roguemos todos nós, pela paz entre todas as criaturas e que as colheitas não sejam as mais sacrificadas castigando justamente os despossuídos, nem as águas cada vez mais raras, nos tornando a vida um intenso inverno.

Ah... pelo menos de minha parte, obrigado poderosa Deméter por teu bom humor. O verão de 2017 está dos deuses!



Prof. Péricles

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

REFORMA TRABALHISTA RIDÍCULA


Por Tarcísio Lage.


12 horas é pouco quando se nada contra a corrente. 24 horas, quem sabe, avança-se meio metro. O mais provável, quase certo, no entanto, é que se morra de cansaço na jornada.

A reforma trabalhista de Temer vai nesse sentido. É incrível que não se possa enxergar o que está acontecendo nas últimas décadas, não só no Brasil, mas no mundo inteiro. E, infelizmente, medidas esdrúxulas como essa reforma trabalhista do governo são aplicas Planeta afora.

Na Europa, por exemplo, muitos países estão modificando as leis de aposentadoria aumentando a idade para 70 ou mais anos, quando não há trabalho, sequer, para os jovens recém lançados no mercado.

Também não é à toa que a maior parte dos empresários e dos sindicatos picaretas esteja batendo palmas para a reforma. Afinal, eles andam há muito tempo de mãos dadas para atingir seus objetivos: lucro máximo para os primeiros, não importa o que aconteça com o conjunto da sociedade, e privilégios para uma parte da categoria que representam, para os segundos.

A verdade é essa: a civilização do trabalho está morrendo. As tarefas manuais estão ficando restritas a um pequeno número de pessoas, umas especializadas, pequena minoria, e as outras classificas de pau para toda obra com salários de merda.

Engels, o amigo capitalista de Marx, já dizia que a mão humanizou o macaco. A mão, com os cinco dedos, um deles o polegar, o diferencial humano, é o melhor instrumento de trabalho que se conhece na natureza. Pelo menos na porção do Universo conhecido.

O engenho humano, nascido das mãos, desembocou no correr dos séculos em avanços extraordinários. No século passado, o avanço foi extraordinário, época do automóvel, do avião, da cadeia de montagem e, se quiserem dar um grau de patético nesse avanço, da bomba atômica. Mas é no correr deste século que as transformações entraram numa espiral potencializada e que tende a abolir definitivamente o trabalho manual que ficará, quem sabe, reservado a artistas que possam conceber formas fora do alcance das máquinas. Quem sabe?

Quando cheguei pela primeira vez a Europa, no final de 1970, era incrível a força dos sindicatos. Na Grã-Bretanha, onde morei quatro anos, por qualquer reivindicação se paralisavam trens, interrompiam-se serviços públicos e os operários cruzavam os braços nas fábricas. Mais do que isso, pela força dos sindicatos desenvolveram-se partidos sociais democratas fortes como os trabalhistas na Grã-Bretanha, na Alemanha, França (no caso o Partido Socialista), na Holanda, na Bélgica e, não vamos esquecer, o Partido Comunista Italiano. Ainda se acreditava que a classe operária ia ao Paraíso e quem já pensava que seu caminho era a extinção calava o bico.

Na Holanda, onde resido, ainda nos anos 80, falava-se continente afora de uma doença que os conservadores deram o nome de holanditis. A holanditis era a febre de protestos que grassava pelo país. Por qualquer coisa as ruas se enchiam de manifestações embandeiradas com a aderência de sindicatos e organizações sociais diversas.

De repente, no decorrer da última década do século passado, a Holanditis desapareceu, foi extinta, ao mesmo tempo que os sindicatos iam perdendo força. Foi por essa época que teve início, não só na Holanda, mas em quase toda a Comunidade Europeia, a liquidação de grandes conquistas dos trabalhadores, entre elas – talvez a mais importante – a estabilidade no emprego. Criou-se a ideia da flexibilização do trabalho com as reorganizações das empresas.

Segundo a legislação em vigor na época, na Holanda, por exemplo, o trabalhador depois do período de experiência, só podia ser demitido por justa causa. Com as reorganizações, as funções de muita gente foram extintas e, aí, as novas leis flexibilizaram as demissões. Em escala europeia, as dispensas foram de milhões com indenizações precárias e a imensa maioria não conseguiu novos empregos e ficou na rua da amargura na dependência de salários desempregos que tendem a diminuir.

Para o mau dos pecados, a sociedade do bem-estar social – bandeira dos partidos trabalhistas e socialistas – foi para o brejo. Ainda que a ultraconservadora Margareth Thatcher tenha contribuído muito para isso, foram os novos partidos trabalhistas, notadamente com o britânico com Tony Blair, que enterraram definitivamente o sistema. A nova social democracia entrou nos eixos capitalistas talvez porque não tenha mais de contrapor com medidas sociais a propaganda da extinta União Soviética.

A perversidade de tudo isso, a criação de batalhões de desempregados vivendo de migalhas, a produção de riqueza, de bens de consumo, não diminuiu. Pelo contrário, aumentou tanto ao ponto de produzir a crise de 2008, uma crise de superprodução e não de escassez. Nos Estados Unidos vimos o espetáculo surrealista de milhões de casas vazias sem ter a quem alugar ou vender ao lado de milhões atirados nas ruas.

Ora, pois, a reforma trabalhista do governo Temer segue quase ao pé da letra a receita europeia. A flexibilização das horas de trabalho, permitindo que uma pessoa possa ir até 12 horas diárias, é um contrassenso numa sociedade de desemprego crescente. E desumano do ponto de vista pessoal. 12 horas diárias só, e olhe lá, só em tempo de guerra. Ah, mas o trabalhador pode decidir. Mentira. Em caso de necessidade e conveniência a empresa vai exigir e, certamente, conseguirá. Os pelegos, atrás do projeto, estão aí para garantir isso.

Essa reforma das leis trabalhistas é tão ou mais ridícula que a pretensão de congelar, via constitucional, as despesas governamentais por 20 anos.



Tarcísio Lage, jornalista e escritor.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

DELENDA ESPHAERA EST


No século III a.C. Roma, que surgira como um simples agrupamento de camponeses já dominava toda a península itálica. Chegara então, o grande momento que deveria definir o seu futuro como um grande Império: a conquista das rotas comerciais do mar Mediterrâneo.

Acontece que essas rotas já eram dominadas por outro povo em crescimento, os cartagineses, habitantes do norte da África.

Seguiram-se então as chamadas “Guerras Púnicas” assim chamadas porque os habitantes de Roma, os latinos, chamavam os cartagineses de púnicos, ou seja, fenícios já que a cidade de Cartago havia sido fundada pelos fenícios.

Essas guerras (foram três ao longo dos séculos III e II a.C.) definiram não só o destino dos povos diretamente envolvidos como da própria civilização ocidental, pois, o vencedor iria pintar com suas cores culturais o futuro do mundo.

Roma venceu as primeiras duas guerras, e depois de sua vitória na batalha decisiva de Zama, em 202 a.C., impôs duras condições aos Cartagineses que, dessa forma, perderam muito de sua importância política e econômica, embora mantivessem a independência.

Lenta e silenciosamente, porém, começou a se reerguer dos escombros e, utilizando-se de sua experiência recente de grande potência local passou a cicatrizar suas feridas.

Tornou-se um inimigo em crescimento, silencioso e astuto, na espera do momento da revanche.

Aparentemente, apenas um homem percebeu esse reerguimento e o perigo que Cartago poderia representar no futuro ao poder de Roma: Catão, também chamado de Catão, o Velho.

Esse político foi embaixador romano em Cartago no ano de 153 a.C. e se impressionou pelo renascimento econômico cartaginês. De volta a Roma passou a denunciar obsessivamente esse renascimento que considerava ser o maior perigo para o seu país.

Ficou tão obcecado em fazer seus conterrâneos entenderem o perigo representado por Cartago que, acabava todos os seus discursos, independente do assunto tratado, com a expressão “centerum censeo Carthaginem esse delendam” que significa “quanto ao resto, penso que Cartago deve ser destruída”.

Além disso, era comum iniciar qualquer conversa com “delenda Carthago est”, ou, “é preciso destruir Cartago”.

O Brasil precisa urgentemente de um Catão.

Alguém que de forma obcecada lembre às forças progressistas o tamanho do poder, não de um inimigo externo, mas de um império que reside em suas próprias entranhas.

Alguém que inicie e termine todo o discurso lembrando da necessidade de destruir a Rede Globo.

Não... nada de destruição material, de não ficar pedra sobre pedra como dizia o embaixador romano sobre Cartago, e sim, destruir a imagem de imparcialidade, de instituição interessada no jogo mas que apenas o transmite e não joga.

A Globo joga sim, e joga sujo, sem respeito às regras que, no entanto, utiliza para se defender.

O nosso Catão é necessário diante da enorme dificuldade que ainda temos de superar traumas criados no período militar quando a defesa do direito à informação e a luta contra a censura originaram tabus.

O militante da esquerda se inibe quando pensa em lutar contra uma organização cuja finalidade teórica é a informação independente. É como se lutasse contra algo que defendeu a vida inteira.

Além disso, quase todos alimentam no seu inconsciente uma imagem que mistura lembranças de infância. Pensar na Globo muitas vezes é lembrar as mais doces recordações de tempos antigos, e por isso, muitos recusam-se, consciente ou inconscientemente acreditar em tudo de mal que essa marca representa.

O nosso Catão deve lembrar a todos que essa organização é muito mais do que apenas uma rede de televisão.

É uma rede autoritária de múltiplos tentáculos que vai do jornal impresso ao rádio, da televisão ao mundo da informática. Que seu poder econômico originário de parcerias com os poderosos lhe permitiu a virtual monopolização de um setor tão crucial que já foi denominado de quarto poder, a imprensa.

A maior sabedoria do inimigo é se parecer amigo para confundir e dividir seus adversários.

Essa rede imensamente poderosa foi gestada pela própria Ditadura Militar e apoiou o autoritarismo, elegeu um político até então desconhecido em 1989, presidente da república, interfere diretamente em todas as eleições em todos os níveis desde 1985, e foi fundamental na criação de fraudes como a manutenção do Plano Cruzado para vencer a eleição constituinte de 1986 e, agora, é a maior responsável pelo golpe que derrubou da presidência uma mulher inocente e eleita por mais de 54 milhões de votos.

O que falta para entendermos o que realmente representa a Rede Globo?

É uma missão árdua e espinhosa, mas que alguém da esquerda brasileira terá que assumir.

Uma missão já desempenhada por Leonel Brizola num passado recente e que precisa ter continuidade. Algo que esteja claramente presente em seu discurso político, sem concessões, sem acordos, sem tolerância, como nos discursos de Catão, o Velho.

Para quem acha a missão impossível é importante lembrar que em 146 a.C., na terceira Guerra Púnica, Cartago foi totalmente destruída, deixando de ser a maior ameaça à expansão romana.

Catão tinha razão.







Prof. Péricles

sábado, 11 de fevereiro de 2017

A BESTEIRA É UMA DEFESA


Se nossas vidas fossem movidas apenas por coisas sérias e assuntos úteis, seria uma aflição maior do que já é.

Deveria constar lá na Declaração dos Direitos Humanos – Todo homem tem direito de gastar seu tempo com bobagem quando assim o quiser.

A bobagem, o trivial, a famosa “conversa fora” é o que mantém saúde mental, aliás, tão ameaçada nos últimos tempos.

Sabe aquele momento em que você simplesmente não quer falar nada de assunto sério?

E é bem por isso que, envergonhados, fugimos daquele amigo que, sabemos, irá nos trazer informações úteis, porém preocupantes, no ambiente de trabalho.

Alguns personagens históricos tornaram-se conhecidos por não utilizarem o expediente do “assunto sem importância”.

Napoleão Bonaparte, por exemplo. Dizem que o grande general jamais foi visto fazendo qualquer comentário menos sério, ou numa roda de amigos de como aquela guria era gostosa.

Mas isso foi bom pra ele?

Napoleão era um obstinado em seus objetivos de conquistar a Europa e unifica-la sob seu reinado.

Como o restante da Europa não concordava com ele, sofria de uma gastrite que jamais o deixou em paz, nem nas grandes batalhas, nem quando morreu vítima de câncer (adivinha) no estômago, esse órgão que sofre mais do que os outros com o mau humor.

É linda a imagem que se faz dele contemplando as distâncias sob as pirâmides de um Egito conquistado, mas, confesso que preferia vê-lo falando que “o calor nesse verão egípcio é um saco!”.

Hitler também, nunca foi visto numa postura menor do que a que julgava própria a um Fuhrer, mas esse, todos nós sabemos como terminou.

Hoje em dia, falar bobagens e rir de piadas sem graça não só é aconselhável como uma boa estratégia para suportar a avalanche de besteiras que se pretendem sérias que temos que ouvir, ou ler.

Tipo assim, falar mal do treinador do nosso time ou do juiz, mesmo sabendo que ele tinha razão ao não marcar pênalti a nosso favor, ou por ter marcado, contra.

Salve as besteiras e os assuntos amenos! São eles que impedem a superlotação dos hospícios.

É uma espécie de defesa contra os absurdos a que estamos sujeitos.

Bom fim de semana a todos. Que possamos jogar bastante conversa fora para voltar afiados e dispostos à guerra, na segunda-feira.


Prof. Péricles

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

QUERO SABER


Por Maria Fernanda Arruda


Não estou interessada na peruca do Eike ou no rivotril do Cabral ou na depressão da mulher dele.

Quero saber da morte do Teori.

Da delação da Odebrecht (950 depoimentos de 77 executivos - pronta há meses).

Da delação do Cunha (rasparam a cabeça dele?) e daqueles 200 milhões que disseram ser dele.

Da liberdade de Cláudia Cunha e filhos.

Dos 23 milhões do Serra depositados no exterior.

Do enriquecimento meteórico da filha de Serra.

Das 43 menções ao golpista Temer nas delações e seu cheque propina nominal.

Do terço de Aécio em Furnas - e tudo mais.

Do suicido do policial Lucas Arcanjo em BH.

Da prisão do jornalista Marco Aurélio Carone por 9 meses em BH.

Da liberdade da irmã de Aécio.

Da propriedade de quase meia tonelada de pasta de cocaina voando num helicóptero da família Parrella.

Da propriedade do jatinho que vitimou Eduardo Campos.

Da propina do filho legítimo de FHC.

Do sustento da amante de FHC com dinheiro público.

Dos milhões recebidos por Alckmin.

Das provas contra Lula.

Das provas contra o filho de Lula.

Dos bens bloqueados do Eliseu Padilha.

Das propinas do Moreira Franco.

Das menções do nome Dilma nas delações.

Do roubo da merenda de SP.

Dos desvios no metro de SP.

Do terreno roubado por Doria em Campos do Jordão.

Da sonegação fiscal do vice prefeito do Rio.

Da sonegação milionária das Organizações Globo.

Da propriedade daquela mansão de praia que os Marinhos negam ser os donos.

Da sonegação dos membros da FIESP.

Do bloqueio dos bens de Eduardo Paes.

Do empresariado carioca que chupou mais de 180 bilhões do RJ em isenções fiscais duvidosas em 9 anos.

Dos privilégios absurdos do nosso judiciário.

Etc... e põe etc nisso. E só pra ficarmos nos últimos anos.

Faço questão de não fazer coro com a pauta ditada e imposta por esta mídia canalha por pura conveniência.



quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

O GALO DESAFINADO



Um amigo, nos tenebrosos anos da ditadura militar, passou por momentos terríveis.

Logo após a decretação do “Pacote de Abril”, em 1977, no governo pendular do General Geisel (pendular porque oscilava entre medidas de abertura política e retrocessos) ele foi, literalmente sequestrado, quando saía do colégio onde fazia o segundo grau e era líder do grêmio estudantil, lá pelas 23 hs de uma quarta-feira.

Jogado ao solo de um carro, foi imobilizado sob a mira de um trezoitão, como se dizia naquela época, sendo levado para algum ponto da periferia de Porto Alegre. Durante o trajeto não pode levantar a cabeça e foi ameaçado de morte o tempo todo.

Quando o carro finalmente parou, foi jogado para dentro de uma pequena casa de material, com telhadinho clássico, onde passou imediatamente a ser brutalmente agredido por três e às vezes quatro agressores simultaneamente, enquanto outros dois apenas assistiam. Quando as agressões paravam, um dos “assistentes” fazia perguntas que ele não sabia e outras que ele não queria responder.

Sofreu uns cem números de socos, tapas e telefones, que eram golpes dados com as mãos espalmadas ao mesmo tempo em ambos os ouvidos que davam uma sensação difícil de definir de tão angustiantes (às vezes com saco na cabeça que não lhe permitia ver nada, nem se “encolher” ante o golpe iminente).

A boca ficou tão inchada que adormeceu de forma que ele achava que estava com todos os dentes quebrados, mas não conseguia verificar se era verdade.

Os rins foram tão atingidos por chutes e pisões com o salto de botas que até hoje carregam sequelas.

Seu padecimento durou dias. As pancadarias eram realizadas a qualquer hora e quando ele não estava apanhando era trancado num cubículo totalmente vazio e sem luz onde ficava por um tempo indefinido, imaginando quando seria a próxima sessão de torturas.

Certa feita, lá pela terceira madrugada, sua atenção foi despertada pelo cantar de um galo. Ele lembrou do galo vermelho cantador de sua vó e riu por entender que esse, cantava algo que desafinado. Ficou pensando quem era ela para ser crítico do canto dos galos.

Estabeleceu-se, então, uma estranha relação entre ele e aquele galo desafinado de quem só ouvia o canto. De certa forma, tornou-se seu amigo invisível, como definem as crianças os seus amigos imaginários.

Aquele cantador da madrugada era o único elo de sua razão que ameaçava abandona-lo com o mundo além daquelas paredes lúgubres que, naquele momento, pareciam ser seu túmulo.

A partir de então, até mesmo quando estava apanhando pensava no “seu amigo” e que, mais tarde, ouviria o seu canto novamente e então poderia julgar se estava afinado ou não.

Foi a forma que encontrou para distrair a mente, manter-se calado e não enlouquecer.

Finalmente, sem aviso, foi carregado, já que não conseguia caminhar, até o mesmo veículo que o trouxera, e novamente circulou sem que soubesse para onde iria. Imaginou que seria fuzilado em algum lugar ermo.

Mas, não foi isso que aconteceu. O carro freou em determinado ponto de uma Porto Alegre adormecida na madrugada, e foi jogado na calçada, onde permaneceu semiconsciente, sonhando embolado com a mãe, com o galo, com a avó, a namorada, o mar e outras coisas confusas, sentindo gosto de sangue na boca, até o sol despontar, quando foi visto por transeuntes e alguma alma piedosa pediu socorro, sendo, então, levado para o hospital.

Hoje ele já esqueceu a cara dos agressores e até mesmo o tom maligno de suas vozes, mas não esqueceu o cantar do galo amigo.

Diz que foi sua âncora que o prendeu a realidade e salvou sua lucidez.

Atualmente, predomina uma ciranda de cretinices espalhadas pelos meios reais e virtuais que transformou-se em uma inédita tortura aos que acreditam na justiça social, na solidariedade e no respeito às dores alheias.

São tantos os cânticos de ódio, os hinos ao preconceito, tão absurdas as agressões aos valores mais fraternos e democráticos que necessita-se, urgentemente, de elos e âncoras que finquem as relações saudáveis ao terreno da lucidez política.

Num mundo em que a morte de alguém é comemorada com escárnio é vital renovar a interação com o que é certo e errado e lembrar que o ódio pode enlouquecer.

A fé de que o homem seja majoritariamente bom e que os imbecis são minoria, deve ser a âncora que assegure a sobrevivência da razão sobre o sentimento de vingança.

Todos, os que acreditam no poder do bem, estão precisando de um galo desafinado, para suportar os golpes da prepotência e da covardia e para não esquecer que os que agridem hoje são, os mesmos que agrediram ontem.

Quanto ao galo desafinado, ainda aparece nos sonhos do meu amigo e seu canto enternece como fonte de coragem e esperança.

Muito obrigado, galo desafinado.





Prof. Péricles

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

PRECISAMOS FALAR SOBRE A MISS CANADÁ




Por Nathali Macedo


No século da diversidade, há alguma coisa mais antiquada do que concursos de beleza? Pior: Há algo que faça menos sentido do que eleger apenas uma mulher que represente uma “beleza universal” que simplesmente não existe?

O Miss Universo, maior deles, é mais obsoleto que aparelho de fax. Mais cafona que os quadros de Romero Britto. Mais desnecessário que os tweets de Janaína Paschoal.

Mas a indústria da moda insiste, e esses concursos atravessam os anos, invictos, e se mantêm como um pedaço horrendo de tempos que já deveriam estar superados: Os tempos em que promover a futilidade, a competição feminina e a ditadura da beleza não é só aceito – é lucrativo.

Este ano, o vexame não poderia ter sido maior: A Miss Canadá Siera Bearchell foi duramente criticada nas redes – e pelos apresentadores da Band, Cássio Reis e Renata Fan, é bom ressaltar – por estar supostamente acima do peso. “Ela não tem corpo de miss”, repetiam insistentemente.

Que os concursos de beleza não dão visibilidade a mulheres gordas de verdade nós já sabemos, mas dizer, em pleno século XXI, que uma mulher indiscutivelmente magra está acima do peso é um golpe na jugular. Beira o insano. (Um parêntese: meu manequim é 44 e eu me sinto maravilhosa).

Ter “corpo de miss”, lamento, está fora de moda. A ressignificação da beleza é um sintoma do empoderamento feminino, quer queira a indústria da moda, quer não.

A indústria da moda e a indústria da beleza são, aliás, unha e carne, são quase uma coisa só. Uma colabora com a outra e ninguém sai perdendo – ninguém além de todas nós, é claro.

Quanto, em números, vale a nossa autoestima para a indústria da beleza?

Quantos bilhões ela deixaria de lucrar se todas as mulheres acordassem amanhã se sentindo fabulosas? Quantos shakes milagrosos seriam jogados no lixo, quantas cintas modeladoras teriam de ser incineradas, quantos centros de estética iriam à falência?

Penso, não sem algum pesar, que é esta a lógica cruel da indústria da beleza: Quanto mais nos sentirmos gordas, feias e insuficientes, mais seremos lucrativas. Não importa se isso custa vidas de mulheres anoréxicas/bulímicas, ou das que morrem em procedimentos estéticos mal feitos. Não importa se isso custa a felicidade de quem vive todos os seus anos buscando uma beleza fictícia.

Permitam-me repetir o óbvio: O padrão de beleza não existe na realidade – é criado na mídia, retocado no photoshop e endossado pelos concursos de beleza e blogueiras fitness.

A beleza plástica reverenciada por estes concursos é uma fraude: As mulheres reais – que pagam contas, vão ao supermercado, buscam o filho na creche – nunca chegarão lá, não importa o quanto se esforcem, e não importa o quanto a indústria da beleza procure convencê-las de quem basta que se esforcem. Não basta.

Não basta ser linda, tem que ter barriga de tanquinho e espaço entre as pernas. Concursos de beleza são cruéis demais para aceitarem menos que a perfeição. São verdadeiras máquinas de opressões – que o digam Melissa Gurgel, Miss Brasil 2014, linchada nas redes por ser nordestina, ou Lupita Nyong, vítima de ataques racistas ao ser eleita a mulher mais bonita do mundo pela Revista People no mesmo ano, e, agora, Siera Bearchell.

Quando acordarmos para o fato de que podemos simplesmente recusar este lugar de bibelôs que desde sempre nos impuseram, quando nos convencermos de que beleza não se resume a barrigas chapadas e rostos perfeitos, talvez a “indústria da beleza” compreenda finalmente que somos mais que uma casca.

Comece uma revolução: Ame o seu corpo.

sábado, 4 de fevereiro de 2017

O ESCÂNDALO DO MASSACRE DOS PRESOS


Por José Ribamar Bessa Freire


Mais uma “pérola” acaba de ser atirada aos “porcos”, após o massacre de 56 presos, mortos durante a rebelião que eclodiu no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, 1º de janeiro, Dia da Fraternidade Universal. 

O escândalo comoveu o mundo inteiro, até o papa Francisco, em Roma, manifestou sua dor. Mas o governador do Amazonas José Mello Merenda achou a preocupação exagerada, afinal entre os mortos “não tinha nenhum santo. Eram estupradores, matadores”, minimizou o governador em declaração à mídia.

Essa justificativa implícita do massacre foi suficiente para empoderar os “porcos”, que começaram a chafurdar sobre a “pérola” em chiqueiros das redes sociais. Um deles aplaudiu o governador Melo-Merenda, acrescentando que “são 60 bandidos a menos, fora de circulação, o que com certeza, traz mais segurança para a cidade“. Uma jovem “porca”, embora dizendo ser contrária às mortes, curtiu e compartilhou, confessando que “cada criminoso preso ou morto diminui os riscos que correm nossos filhos, porque são menos marginais soltos nas ruas”. Será?

A retórica nauseabunda do melo-merendismo joga todo seu peso epistemológico na aparência das coisas. O raciocínio – digamos assim – pretende ser convincente, mas é bem simplório: se não houvesse nenhum assassino, ninguém seria assassinado. Numa sociedade que tem cem assassinos, se sessenta deles morrem, reduz em 60% a possibilidade de homicídios. Os bandidos mortos, afinal, colheram o que plantaram. “É melhor que morram eles, que têm culpa no cartório, do que os nossos filhos, que são inocentes” – postou uma auxiliar de enfermagem.

O Secretário Nacional da Juventude, um tal de Bruno Júlio (PMDB) escolhido para o cargo por Michel Temer, escancarou, aloprou e declarou em sua página pessoal do Facebook aquilo que Temer, Melo Merenda e Alexandre Moraes pensam, mas por enquanto ainda têm vergonha de assumir publicamente: “Tinham que ter matado mais presos, deveria haver uma chacina por semana”. Menos bandidos, mais segurança.

É terrível ser desgovernado nacionalmente e estadualmente por duas figuras execráveis, que investem na aparência das coisas quando garantem que construir mais penitenciárias aumentará a segurança do “cidadão de bem”, que – coitadinho! – acredita naquilo que vê: o sol dando volta em redor da terra. 

Não divulgam as estatísticas que os presídios abrigam cerca de 10% de homicidas e que o restante é formado por ladrão de galinha, vendedores de maconha e outros delitos equivalentes. Só ficam de fora os que desviam recursos da merenda escolar e da saúde.

Por isso, é conveniente destacar a conclusão do desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Verani. Numa postagem, escreveu:

“Por uma Sociedade Sem Prisões! O massacre no presídio de Manaus não será o último. Outras mortes virão, pois a finalidade da pena privativa de liberdade é exatamente a produção da degradação humana, até o aniquilamento da pessoa. A prisão é irreformável e inumanizável, é uma instituição incompatível com a condição humana. Enquanto não ocorrer a sua abolição, o Poder Judiciário e o Ministério Público poderiam contribuir para reduzir esse grande encarceramento”.

“A maior parte das condenações à pena privativa de liberdade poderia ser evitada, sem mencionar as prisões preventivas decretadas sem qualquer fundamentação jurídica. Os juízes e promotores poderiam despojar-se da sua ideologia punitivista, além de garantir os direitos dos presos. Se a prisão não cumpre as garantias da Constituição Federal, do Código Penal, do Código de Processo Penal, da Lei de Execução Penal, torna-se ilegal a prisão, e o preso deve ser solto. Abaixo a ideologia da repressão! Por uma sociedade sem prisões!”.

Dois dias após a postagem do desembargador Sergio Verani e horas após Michel Fora Temer declarar que “não há chances de novas rebeliões em presídios”, ocorreu dia 6, Dia dos Reis Magos, outro “acidente”, outra chacina na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Roraima, com 31 mortos, entre os quais presos provisórios que não haviam sido condenados em instância final de julgamento.

Tal como desejado pelo Secretário Nacional da Juventude, o tal do Bruno Júlio, investigado por agredir a mulher em Belo Horizonte. 

O país pode, no entanto, ficar tranquilo, porque o ministro Alexandre de Moraes jura que “a situação nos presídios não saiu do controle”. Não explicou do controle de quem. 

É esse lixo que governa hoje o país.



José Ribamar Bessa Freire, professor da Pós-Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNI-Rio).

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

IRREVERSÍVEL



Sinto uma profunda tristeza ao ler que o estado de D. Marisa é gravíssimo e irreversível.

Irreversível.

Isso quer dizer, sem volta, sem retorno. Não é possível reverter.

Ou, sem esperança de voltar.

Lembro de sua história humilde e de seu sorriso simples nas poucas vezes que apareceu publicamente como primeira-dama, até porque, a mídia detestava divulgar a sua imagem.

Uma mulher do povo que como o seu povo não se sentia inteiramente à vontade circulando nos palácios do poder, nas luzes da ribalta.

Lembro da frase de Lula quando do episódio da sua quase prisão ao dizer inconformado “um pedalinho que ela comprou porque queria dar para os netos”.

Um pedalinho para os netos, no centro do poder, com seu próprio dinheiro. Coisas típicas do nosso povo.

Irreversível. Não volta. Como os pingos da chuva que já caiu. Chuva já chovida.

É tão doloroso quando nos tiram a esperança.

Eu me pego pensando quantas coisas são irreversíveis nesse país.

Por exemplo, o ódio fruto da intolerância, pois, toma conta de todo o ser e se reflete de múltiplas formas em todas as ações do sujeito, sempre criando justificativas para o injustificável. Será irreversível?

Talvez irreversível seja a consciência adquirida pelo povo depois desses 14 anos. Nenhum golpe conseguirá apagar da memória das pessoas que elas possuem direito à felicidade, à educação, à vida digna. Essa consciência tal qual aconteceu no Araguaia depois da guerrilha, jamais poderá ser extirpada por decreto.

E será irreversível o preconceito estampado no olhar daquele deputado racista e homofóbico e de seus seguidores que acham engraçado perseguir pessoas por suas escolhas e origens?

Ou a hipocrisia dos que dizem seguir a doutrina de um homem que foi perseguido e condenado sem provas em Jerusalém e hoje repetem seus carrascos.

Prefiro acreditar que o quadro de D. Marisa não é irreversível e sim, irretocável.

Poucas coisas são realmente irreversíveis...

Humanamente tudo o que acontece agora se reverterá sim, um dia, em poesia, flores e cantos em nome daqueles que dedicaram à vida pela causa dos mais frágeis.

Até mesmo os pingos da chuva evaporam e sobem aos céus para se tornarem chuva novamente. Chuva que será chovida.

A memória de D. Marisa, um dia, quando o golpismo for apenas páginas nos livros de história, se reverterá sim, em canções de luta e na multiplicação de lendas populares.

Se reverterá em gotas de luz na passagem dos espíritos que se preocupam com a dor alheia, para a outra dimensão da existência.

Irreversível, mesmo, só o sentimento de perda e de injustiça que deve preencher os corações de todas as pessoas de bem desse país, com a perda de uma grande mulher do povo.



Prof. Péricles

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

O SEGREDO DE LULA



O segredo da força de Sansão, conforme as antigas escrituras, estava em seus cabelos. Num belo dia, sua guria, Dalila, indignada zaaap... cortou seus cabelos e o pobre Sansão virou Sansinho.

A força do deus nórdico Thor estava em seu martelo, do Popeye no espinafre e do He-Man na sua espada mágica.

Parece que todos os fortes possuem um ponto específio, algo mágico em que resida sua força. Pelo menos é assim que se costuma pensar quando não se entende a força alheia.

Lula é um forte. Mas que isso, Luis Inácio é um campeão de carisma e votos, e parece que a turma da "Ponte para o Futuro", por não entender sua força, se pergunta onde afinal está o seu segredo.

Como entender que depois do maior massacre público já organizado contra a figura política de alguém, após centenas e centenas e centenas de capas de revistas e reportagens "bombásticas" dirigidas e francamente contrárias e milhares de horas televisivas, além de  incontáveis boatos e acusações sem provas, Lula ainda apareça na liderança da intenção de votos em todas as pesquisas eleitorais?

Isso supera qualquer lógica. Onde está afinal  força desse homem que já deveria estar execrado e coma prisão pedida pelo próprio povo, que, ao contrário, impede sua prisão?

Parece que não é nos cabelos, nem no espinafre ou em qualquer espada mágica.

Uma boa dica para o entendimento desse mistério pela turma da "Ponte do Futuro" é a origem do objeto.

Martelo, espinafre, espada, são, digamos assim, objetos exteriores ao indivíduo. Despojado o indivíduo dessas exterioridades ele enfraquece.

Mas, a força do sindicalista pernambucano que se tornou presidente não está na exteriorização, e se assim o fosse já estaria despojado pelo STF.

A força de Lula está em algo além dele mesmo, anterior e interior à sua personagem.

Vem dos ideais de fraternidade e na crença da construção de uma sociedade mais justa e esses ideais não são propriedade ou exclusividade dele, ao contrário, são utopias acalentadas por milhões.

Quando algo reside no exterior é mais fácil, afasta-se o indivíduo desse algo e acabou, mas, como afastar Lula do imaginário de igualdade de milhões de miseráveis que com ele descobriram que também são cidadãos e que seus filhos também merecem e podem estudar?

Era nisso que residia a força de Getúlio Vargas, de Jango, de Brizola, de Fidel Castro, de Hugo Chaves, de Mandela.

O segredo de Lula está no povo, e, infelizmente para os autoritários que precisam manter as aparências de uma democracia, é o povo que decide uma eleição presidencial.

Parece que depois de tantas esforços a galera golpista começa a entender isso e é justamente isso que faz que aumente sensivelmente o perigo em torno de Lula, pois, geralmente os donos do poder se equivocam achando que eliminando a pessoa conseguirão eliminar as idéias.


Prof. Péricles

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

O MINISTRO MORTO E O AVISO


Assassinatos políticos são muito complicados, e perigosos.

O atentado que não dá certo pode denunciar seus autores e não apenas destrui quem o organizou mas afetar diretamente os interesses políticos e econômicos que lhe deram causa.

Por isso, apesar das teorias da conspiração, o assassinato político, é um recurso extremo, usado apenas por grupos que têm tanto a perder com a atuação de seus alvo que até vale à pena arriscar e isso, em política, onde inúmeros são os corredores que podem ligar amanhã os que hoje são rivais, é relativamente raro.

O suicídio de Vargas até hoje tem crentes em um assassinato.

Mas, politicamente isso seria totalmente improvável.

Vargas estava isolado, sem apoios significativos, sofrendo até ultimato dos militares para renunciar. Matar Vargas seria como gastar pólvora em caça morta. Arriscar tudo num jogo que já estava ganho.

Já o assassinato por briga na prisão de seu secretário e amigo particular, Gregório Fortunato, alguns anos depois, sim, tem as cores fortes de uma queima de arquivo, já que sua delação poderia arruinar muita gente que havia participado da farsa da Rua Toneleros e não tinha outra maneira de impedir o “Anjo Negro” de falar.

O assassinato político não é um assassinato de bandidos que brigam no botequim. Não é um ato impulsivo.

Interessante mesmo é a morte de João Goulart no exterior.

Jango estava numa situação complexo que justificaria um assassinato assim como não justificaria o risco.

Os donos do Brasil preparavam-se para escancarar o projeto inevitável de abertura política pondo fim à execrável ditadura militar. Jango, voltando, seria uma pedra no sapato dos que buscavam controlar essa abertura, mas, na ocasião não se poderia arriscar até onde essa pedra no sapato poderia ferir ou ser insignificante.

Mistério.

Agora, com a morte do ministro do STF novamente se discute se o acidente fatal foi mesmo um acidente ou se foi um atentado premeditado.

Além de fazer força para levar a sério as investigações que virão as perguntas que se devem formular é: havia algo que o ministro pudesse fazer que atingisse o interesse direto de grupos e que esses grupos não pudessem evitar de outra maneira?

Quem, no meio político poderia se sentir ameaçado pelo ministro? Havia nos processos de que era relator potencial para atingir interesses maiores, digamos mesmo, internacionais? Quais? Ele poderia levar adiante esse potencial ou era “negociável”?

No caso da morte do Ministro, a sociedade deve exigir uma investigação rigorosa, pois há elementos de potência para um crime político.

E se toda a aparência for de um acidente comum é bom lembrar Marx quando dizia “Se a aparência e a essência das coisas coincidissem, a ciência seria desnecessária”.

Para inviabilizar um governo e derrubar uma presidenta eleita, forças poderosas usaram de recursos imensos que prejudicaram até aliados, arruinaram grupos econômicos poderosos como o das construtoras e fabricaram uma crise econômica que teve a colaboração de muita gente.

Talvez o acidente seja apenas e tão somente, um aviso.

Correntes silenciosas movem-se no mar de lama que a política brasileira tem se transformado e vozes silenciosas as vezes gritam, mas é preciso ouvidos apurados para ouvi-las.

Ressentidas por 14 anos sem o poder, que consideraam uma propriedade sua, elas nos avisam: Não esqueçam de quem manda nessa maloca.





Prof. Péricles



sábado, 28 de janeiro de 2017

A PIOR DAS DROGAS


O primeiro sintoma foi quase imperceptível... uma risadinha, meio de lado e escondida. Mas, ele percebeu e se preocupou. Fora uma piada infame e racista, porque aquela risadinha?

Mas, no segundo sinal ele se assustou de verdade. Foi quando numa noite qualquer ele se percebeu assistindo uma partida de basquete da NBA. Ele nunca gostou de basquete... o que estaria acontecendo?

Depois disso ele teve a primeira crise. Foi num domingo que ele jamais esquecerá.

Assistiu à partida de futebol e mergulhou direto no programa do âncora gordo e sem graça. Até hoje se arrepia ao lembrar sua passividade em permanecer sentado na poltrona enquanto seus olhos, e, pior, sua audição, eram agredidas de maneira tão desumana.

Teve que se arrastar para chegar até o controle remoto em cima da estante para impedir que o programa do final de domingo concluísse a tragédia.

Passou a sentir um misto de vergonha e de medo.

Pensou em pedir ajuda, mas temia os olhares de compaixão que poderia receber.

Um médico, talvez um médico pudesse auxilia-lo. Ele não sabia.

Enquanto temia ser descoberto, uma segunda crise quase acabou com sua sanidade. Num dia da semana que sua memória se recusa a detalhar ele assistiu todo o jornal noturno, que ele lembra bem, ficava entre novelas... oh Deus!.

Tentando evitar o pânico, encheu-se de coragem e, num rompante que lhe custou toneladas de suor, contou tudo para a namorada, uma estudante de psicologia da PUC.

A moça ouviu tudo de boca aberta, nem Freud, nem Jung a prepararam para aquele relato, mas, quando ele terminou, tentou mostrar calma e lucidez. Disse que deveria existir alguma terapia, uma simpatia ou uma boa mãe de santo que pudesse ajudar. O importante era ele assumir que precisava de ajuda e ela, sua namorada, não iria lhe faltar.

Ele nunca mais a viu.

Mas não a culpa, não é qualquer amor que sobrevive às expiações desse tipo.

Porém, ele lutaria, e muito, por sua vida.

Buscou grupos de autoajuda. Confessou entre lágrimas que fazia duas semanas que começara a acreditar no que aquele canal televiso dizia. Foi abraçado pelos companheiros emocionados e voltou pra casa se sentindo melhor.

Hoje ele já está há dois meses “limpo”. Não assistiu mais, nesse período, aquele canal, nem mesmo uma espiadinha. Mas teme as sequelas. As vezes se surpreende chamando alguém de viadinho e sabe que isso talvez nunca saia de sua mente.

Voltou a ler bons livros, discutir sobre política, voltou a conversar com amigos de esquerda e até a namorada tentou voltar, mas ele, achou melhor deixar assim, pois time que está ganhando não se mexe.

Ele sabe que não está curado. A midiotia não tem cura. Mas tem controle, ô se tem.

Toda vez que lembra da intolerância que repetiu sem perceber, dos preconceitos e da homofobia subliminares que disseminou, sente-se infeliz. Mas, já fez uma listinha de todos com quem conversou naquela fase e prejudicou com as besteiras que disse e prometeu pra si mesmo procurar um a um para pedir perdão.

Para os mais jovens que o procuram para saber de sua experiência, ele não nega que foi e está sendo difícil retornar ao mundo dos que pensam por si mesmos e geralmente termina suas horripilantes narrativas com uma frase que se tornou seu mantra:

A alienação enferruja o coração, meninos, enferruja sim, e concluiu com um olhar de que muito sofreu: não experimentem... evitem as olhadinhas ligeiras quando atravessa a sala. A midioia é a pior das drogas, ela mata os neurônios, polui os ideais e atinge nosso sistema imunológico contra a estupidez.


Prof. Péricles









quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

O AVC MAIS LETAL

Nunca na história desse país, um ex-presidente foi tão perseguido, como se governar o país tivesse sido um ato criminoso, imperdoável.

Nunca, na história desse país, um ex-presidente foi tão odiado e tratado como nem mesmo bandidos o são nas esferas do poder.

Houve um presidente, Prudente de Moraes, que ordenou uma ação militar que matou 25 mil brasileiros no Arraial de Canudos, mas esse presidente, era advogado, doutor, jamais foi tão odiado.

Teve um outro que prometeu no exterior pagar a dívida externa, criou um plano econômico chamado “funding Loan” (língua da metrópole, claro) e promoveu um arrocho insuportável aos brasileiros mais pobres, mas esse, Campos Sales, também era advogado, representante da elite cafeeira e, claro, nunca foi odiado além de um apelido irritadiço, Campos Selos.

Depois dele teve mais um advogado, Nilo Peçanha, que criou um órgão de terror chamado SPI (Serviço de Proteção ao Índio) que exterminou quem deveria proteger além de roubar suas terras, mas Nilo, oras, jamais foi odiado por ninguém além dos mortos.

Já seu sucessor, Hermes da Fonseca, perseguiu os sertanejos do Padre “santo” Cícero Romão Batista, criou uma estrada de ferro às custas da morte de dezenas de trabalhadores que ligava o nada para lugar nenhum, mas, era marechal, e ninguém odeia um militar no Brasil.

No nosso país, teve um governador da elite paulista cujo slogan era “esse rouba mas faz”, um ministro da ditadura militar famoso no exterior por contrabandear pedras preciosas nativas para lá, um outro governador da elite paulista cuja fortuna em seu nome ele apenas dizia não lhe pertencer, um presidente eleito pela mídia que pagava até gastos domésticos com “sobras de campanha”, mas nunca se percebeu a existência da corrupção como agora, simplesmente para perseguir pessoas.

O uso da corrupção como arma política é abjeto na medida em que quem a usa posa de moralista impoluto, no meio do pântano da corrupção.

Um dos grandes enigmas da humanidade é entender esse ódio.

Por que tanto ódio contra alguém que mesmo depois de dois mandatos não tem apartamento em Paris, Iate, ou qualquer ato corrupto comprovado?

Será que é por que é nordestino? Por que não é doutor? Ou por que é tão parecido com aqueles que o odeiam e se sentem covardes diante de sua coragem diante dos poderosos?

Ironia ainda maior é saber que apenas aqui, na terra brasilis esse homem é tão odiado.

Vejam, por exemplo, a notícia de rodapé do “Estadão On-line” de 20/01/2017, que com certeza não se ouvirá na mídia que manda no Brasil:

“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva receberá o prêmio de Estadista Global do Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça), no dia 29 desse mês de janeiro). Esta é a primeira edição da homenagem, criada para marcar o aniversário de 40 anos do Fórum.

Conforme a organização do evento, o prêmio tem o objetivo de destacar um líder político que tenha usado o mandato para melhorar a situação do mundo.

“O presidente do Brasil tem demonstrado verdadeiro compromisso com todas as áreas da sociedade”, disse o fundador e presidente do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, em nota à Agência Estado.

Segundo ele, esse compromisso tem seguido de mãos dadas com o objetivo de integrar crescimento econômico e justiça social. “O presidente Lula é um exemplo a ser seguido para a liderança global. ”

A entrega do prêmio será feita pelo ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, e está prevista para às 11h30 [horário local; 8h30 de Brasília] do dia 29, quando o presidente brasileiro fará um discurso. Em seguida, terá início um painel de discussão sobre o Brasil. O objetivo é debater os atuais condutores do crescimento do País e os desafios à frente”.

Esse tipo de acontecimento deveria ser aplaudido, reconhecido e comemorado como um fato histórico de relevância num país tão carente de reconhecimento internacional, como o nosso. Mas é escondido como se fosse algo degradante.

Nunca na história desse país, alguém foi tão invejado e odiado assim.

Que mal fez esse homem para o brasileiro médio, trabalhador assalariado, despossuído de latifúndios e de interesses coorporativos?

Esse ódio é de difícil explicação epistemológica, sociológica, racional.

Sua esposa, Marisa Letícia, ex-primeira dama (a mídia costuma não citar essa expressão dedicada às esposas dos doutores) provavelmente desgastada por tanta sordidez, agora padece vítima de um AVC.

A mulher que um dia ganhou a vida fazendo faxina e combatendo a sujeira, não está mais resistindo à sujeira que não pode ser extirpada por uma boa faxina... a sujeira moral.

Provavelmente o homem mais odiado do Brasil esteja para se tornar também, o mais solitário.

Talvez faça bem a esquerda brasileira em geral e o PT em particular, em se preparar para viver sem a presença física desse grande líder agonizante, vítima de um ódio patológico crônico e inexplicável.

O AVC da mágoa costuma ser mais letal que o AVC hemorrágico.




Prof. Péricles

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

FIDEL VIVE NA REVOLUÇÃO VITORIOSA



Por Sergio Nogueira Lopes

A morte do comandante Fidel Castro, líder de uma revolução heroica e vitoriosa, simboliza o desaparecimento de parcela da Humanidade. Morrem com ele, símbolo de luta sem trégua contra o fascismo e o imperialismo que ora se impõem, no Ocidente, os sonhos de todos aqueles que, até o último suspiro, lançaram-se no enfrentamento à miséria e à exploração do homem pelo homem.

Nesse ciclo da vida, não há outro de sua estatura.

Fidel mostrou ao mundo que a arma mais quente dos idealistas não é aquela carregada de pólvora e chumbo. Mas com o respeito à fragilidade humana.

O líder de uma Nação tratada como quintal, bordel, pocilga de corruptos e entreguistas, pegou em armas. Sua coragem e a de tantos companheiros, a exemplo de Camilo Cienfuegos e Ernesto Che Guevara, expulsaram das fronteiras cubanas a potência imperialista da vez.

A vitória no campo militar, por mais relevante e significativa, no entanto, equilibra-se com as conquistas sociais. Ao longo de quase um século, Cuba tornou-se exemplo de solidariedade e humanismo.

Os vizinhos do Norte exportam armas e guerras. Mas os cubanos enviam os médicos e o modelo de Educação que curam do analfabetismo e do descaso os pobres, os desvalidos.

“Milhares de crianças estão passando fome no mundo hoje. Nenhuma delas é cubana” disse Fidel, em pronunciamento histórico. Enquanto os poderosos tentavam assassiná-lo — e falharam por mais de uma centena de vezes — Fidel devotava sua vida à resistência. Enfrentou o pior embargo já imposto a um país, desde a existência das Nações Unidas.

Como nenhum outro líder político, na face da Terra, Fidel elegeu a Saúde e a Educação como forma de consolidar uma nova realidade.

Cuba, hoje, é um exemplo para as futuras gerações de que um outro mundo é possível. Uma aliada de todas as outras nações que lutam contra o imperialismo e a opressão. Perdeu, com a morte de Fidel, o seu filho mais querido. Ainda assim, o legado que fica de uma vida exemplar será a inspiração para que nenhum povo se submeta ao egoísmo.

Que jamais um país seja anexado aos interesses de qualquer outro, por mais poderoso que possa parecer. Que não ceda um milímetro sequer na autodeterminação de se manter digna e honrada.

Quando tudo parecia dominado pela potência distante 140 quilômetros de Havana, que submetia seus desafetos aos desígnios do capitalismo mais selvagem, Fidel lidera a revolução que liberta a Ilha das garras da miséria. Promove o fim da exploração pelos Estados Unidos, sob a gerência de mafiosos, traficantes e bandidos de toda ordem. Mesmo sob a mais intensa pressão internacional, cria um Estado igualitário. Resgata da fome e da corrupção um contingente humano que, hoje, alcança Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) semelhante ao dos países nórdicos.

Cercada por todos os lados pela mediocridade que se alastra, nesses tempos perigosos, a Ilha de Fidel é um ponto de referência. Em pleno Caribe, estende-se um farol para aqueles que vivem os mesmos ideais um dia defendidos por um jovem judeu. Ele que, hoje, é representado na Terra por um homem bom, chamado Francisco. Talvez seja este a derradeira voz das pessoas bem que vagam por essa existência.

Desde que visitei Cuba pela primeira vez, ainda na década de 90, guardo comigo a leveza dos passos da minha filha. A luminosidade nas aulas de balé da professora Alícia Alonso, uma referência mundial que somente a Revolução Cubana poderia gerar.

Preferimos a aconchegante habanera e os seus tons calientes, às frias, comportadas e entediantes classes estabelecidas em Londres, Nova York e Paris.

Hasta Siempre, comandante!





Sergio Nogueira Lopes é sociólogo e embaixador da SPB/Brasil.