domingo, 17 de setembro de 2017

PELO MENOS TIRAMOS O PT


“Pelo menos tiramos o PT”.


Para grande parcela da população brasileira, esse é seu mais valioso mantra.


Repetem com facilidade a frase que tenta justificar seus erros ou ratificar suas convicções que ameaçam ruir a cada novo escândalo que envolve seus heróis de pés de barro.


Para muitos, tirar o PT do poder era o objetivo mais importante e inegociável da vida.


Incompreensível é que esse objetivo tenha suas bases não na análise e perspectiva sobre o que fizeram ou deixaram de fazer os governos petistas, mas no sentimento irracional de anti-esquerda.


Lula tornou-se para essas pessoas o ícone do PT e o PT o ícone da esquerda.


Tirar Lula/Dilma do Poder era tirar o PT, consequentemente, tirar a esquerda do poder mesmo tendo sido esse poder conquistado nas urnas.


Para essa gente deve-se defender democracia (isso é, tirar o PT) mesmo com ações antidemocráticas.


Assim agiram movidos pelo antismo, e esse antismo é basicamente cultural e não político pois não resiste ao mínimo debate racional.


A anti-esquerda cresceu no Brasil com o fermento do ódio anticomunista, criado pela direita mais retrógrada que, para justificar seus golpes, jamais teve moralismos em qualificar seus adversários como comunistas, mesmo sabidamente não sendo.


Getúlio Vargas foi acusado de comunismo, mesmo tendo sido o governante que fechou a Aliança Nacional Libertadora, baniu o PCB e prendeu suas lideranças, inclusive Luís Carlos Prestes. Vargas não teve pudores nem para entregar numa bandeja à Gestapo, para ser morta, Olga Benário, agente comunista internacional e mulher de Prestes.


Da mesma forma João Goulart, fazendeiro gaúcho e discípulo de Vargas, foi taxado de comunista para ser apeado do poder. Suas propostas de reformas do sistema de ensino, planejamento urbano e agrário foram rotuladas de propostas comunistas e contra elas se organizaram marchas da Família com Deus e pela Liberdade.


No Brasil, a elite esperta sempre usou o preconceito para dirigir a classe média burra.


Dessa forma, se Lula é PT, o PT é esquerda e esquerda é comunista, o que vale é tirar o PT do poder, perseguir e aniquilar a figura de Lula para fazer sangrar a esquerda brasileira.


Pior ainda é que esse anticomunismo virulento e radical não nasce do debate ideológico e da defesa das coisas boas do capitalismo contra os erros do comunismo real, mas do medo de ver os mais “miseráveis” ascender à patamares sociais (que julgam ser a bandeira da esquerda) vedados aos “miseráveis”.


Hoje, o mantra se repete entre uma população mais ou menos arrependida.


Diante das barbaridades cometidas e anunciadas pelo governo Temer, parte da população antista começa a perceber que caiu numa armadilha, mas, para justificar seus erros repete que “o importante foi tirar o PT”.


Não entende essa parcela da população que tirar o PT do poder em cima de uma conspiração da mídia e do judiciário foi fácil, difícil será pagar o preço. E o preço é a desnacionalização do país com à venda do seu patrimônio em leilão, pago em suaves prestações.


O preço poderá será a perda de seus direitos trabalhistas e previdenciários.


Perdemos, mas, o importante foi tirar o PT.


Tirar o governo mais pacífico da história, incapaz de qualquer ato de força e persuasão foi mais fácil que tirar um Brizola (também rotulado de comunista) capaz de botar fogo no circo. Difícil é reconhecer que junto tirou a esperança de milhões de brasileiros que ousaram sonhar.


Junto com tirar uma presidente legitimamente eleita do poder, sem cometimento de qualquer ilícito, tirou-se também o Brasil do clube dos países modernos e em desenvolvimento, respeitado lá fora como nunca fora antes em sua história.


“Pelo menos tiramos o PT”, mais do que um mantra, ameaça se tornar, num futuro imediato, o título do mais triste e bizarro capítulo da história brasileira.



Prof. Péricles

sábado, 16 de setembro de 2017

NÓS GÓRDIOS


O Brasil está amarrado a quatro nós górdios que ninguém conseguiu ainda desatá-los e assim libertá-lo para se auto-construir como país soberano e livre.

O nó górdio vem de uma lenda da mais longínqua província romana, a Frígia, para onde eram levados condenados políticos sediciosos e na era cristã, os herejes. Era uma espécie de Sibéria, lugar de punição a opositores ou defensores de doutrinas heterodoxas.

A lenda diz que tendo ficado vacante o trono, foi escolhido como rei um camponês de nome Górdio. Veio com seu carro de bois. E para honrar Zeus e mostrar a humildade de sua origem, colocou a carroça dentro do templo. Amarrou-a com grossa corda com infindáveis nós de sorte que ninguém conseguia desatá-la. E assim ficou por muito tempo. Até que no ano 334 a.C. passou por lá Alexandre, o Grande. Curioso, foi ver os nós. Circulou ao redor. Não ficou refém dos nós da corda. Teve uma iluminação. Desembanhou a espada. Num golpe cortou a corda. Daí se derivou a conclusão de que uma ideia fora dos quadros convencionais – os nós – pode facilmente desatar os nós e resolver o problema.

O Brasil está amarrado a quatro nós górdios, sem que até hoje chegasse alguém que num corte libertasse o Brasil deles. Mas um dia ele irromperá.

O primeiro nó górdio é o etnocídio indígena. Eram cerca de 4 milhões. O extermínio os reduziu a 800 mil de hoje. O mais vergonhoso extermínio foi a decisão de Dom João VI em 13 de maio de 1808 de declarar uma guerra de exermínio contra os krenak (botocudos) do Vale do Rio Doce. Eram tidos indomesticáveis e por isso deveriam ser exterminados. Quase o foram. Alguns fugiram para dentro da mata. Eles se refizeram e hoje Ailton Krenak é um dos líderes maiores dos povos sobreviventes. A consequência: esses povos originários até hoje são discriminados como inferiores e suas terras com dificuldade são demarcadas e muitos deles são ainda assassinados.

O segundo nó górdio é o nosso passado colonial. Todo processo colonialista é violento: implica invadir terras, impor a língua, a política, a religião e desestruturar a cultura dos colonizados. A colônia criou duas instituições que se transformaram em estruturas mentais: a Casa Grande do senhor que tem o poder de vida e morte sobre os subordinados e a Senzala onde vivem os escravos e os peões sem qualquer direito. A consequência: sempre dependemos de fora, consideramos o que é estrangeiro melhor do que o nosso próprio produto. Deixamos surgir o sentimento de “vira-lata” sem autovalorização.

O terceiro nó górdio foi a escravidão. 4-5 milhões de africanos foram trazidos de África como escravos. Eram postos no pelourinho para serem vendidos como “peças” para servirem como trabalhadores no engenho ou serviçais nas cidades. Eram proibidos de constituir família. Os filhos logo que cresciam eram vendidos para longe e assim romper o laço de afeto entre a mãe e os filhos e filhas. Foram tratados com crueldade como a animais. Consequência: a falta de respeito aos outros, a discriminação e o ódio que grassa na sociedade contra os negros e a seus descendentes. Isso perdura até os dias de hoje. Jessé Souza em sua obra sociológica enfatiza que os descendentes da Casa Grande não apenas os mantém nas periferias mas os humilham e desprezam. Apenas o Governo Lula-Dilma fez alguma reparação para com eles, criando cotas nas universidades e nas escolas técnicas e uma universidade UNILAB em Redenção no Ceará.

O quarto nó górdio que obnubila a realidade brasileira é o patrimonialismo associado à corrupção. O patrimonialismo significa que as oligarquias consideram como privado o bem público, ocupam altos postos do aparelho do Estado, controlam as políticas públicas, entram em consórcio com empresas privadas para realizarem projetos do Estado, ganhando propinas pela mediação ou pelo superfaturamento das obras. Aí corre solta a corrupção que foi naturalizada. Somente nos últimos tempos pela Lava Jato os donos das grandes empresas e políticos dos mais altos escalões foram desmascarados e muitos deles postos na prisão. Esse nó górdio é o mais difícil de ser desatado pois se infiltrou em toda a sociedade como pertencendo ao negócio e ao nosso ser brasileiro.

Se o Brasil quiser construir seu próprio caminho, ganhar autonomia e contribuir para o devenir da nova fase planetária da Terra, deverá cortar estes quatro nós. Um governo com forte liderança e coragem e com sentido de nacionalidade poderá cortar esses nós, como condição de realizarmos o sonho brasileiro.

Não perdemos a esperança de que esse dia chegará.

Energias ponderosas estão impulsionando nesta direção.



Por Leonardo Boff, teólogo, escritor e professor universitário

domingo, 10 de setembro de 2017

OS FURACÕES PASSAM



Mensagem em nome de um brasileiro chamado Carlos André Montenegro, que mora e trabalha em Miami há dois anos, circula pela internet destacando as medidas tomadas pelo estado para evacuar a região sul da Flórida diante da chegada do furacão Irma.



São milhões de pessoas evacuadas por terra e por ar, com ordem nas estradas e companhias aéreas oferecendo passagens a preços módicos (98 dólares) para que o maior número possível de pessoas possa abandonar a região em ordem e com tranquilidade.



Além disso, hotéis que receberão por alguns dias essa quantidade impressionante de pessoas libera o wi-fi e a programação de tv a cabo, especialmente às voltadas para crianças, no sentido de que, a estada que poderia ser de terror transcorra da maneira mais agradável possível.



Ressalte-se que o estado oferece ainda, transporte gratuito para os que estão sem condições financeiras ou de saúde para se locomover.



A mensagem termina com o autor lembrando a tragédia de 2011 na serra do Rio de Janeiro, especialmente Teresópolis, com milhares de vítimas fatais, onde o povo foi praticamente abandonado à sua própria sorte e, hoje, sabe-se, até o dinheiro enviado para a reconstrução das casas foi desviado por autoridades corruptas e imorais.



Lembramos também, da tragédia dos vendavais (ciclones), aqui no Rio Grande do Sul, que destelharam milhares de casas e que tiveram como respostas de nossos empresários o aumento do preço da lona e dos materiais de construção.



Não há espaço para ingenuidade e sabemos que, certamente, o governo da Flórida também tem seus esqueletos no armário, mas, ao menos em tempos de tragédia parece haver entre as comunidades norte-americanas a esperança de que não serão esquecidos pelas autoridades.



Parece não ter sido isso que aconteceu em Nova Orleans com o furacão Katrina, mas...



Parece que, na hora das tragédias é que se conhece a verdadeira face das pessoas poderosas que podem auxiliar (ou não) os mais carentes. Não é na hora da campanha eleitoral, ou na demagogia de cada dia, mas, nessas horas é que a verdade se escancara.



O povo americano sofre anualmente com a temporada dos furacões, mas, talvez mais sofrido seja o povo brasileiro, livre de furacões, mas que sofre todos os dias os efeitos nefastos da ambição desmedida de uma das elites mais arcaicas e reacionárias do mundo.



Os furacões passam e os atingidos retornam aos seus lares.



Já as consequências da fome de poder, ganância e políticas públicas que esquecem dos mais fracos e que atingem milhões de brasileiros, não acabam e se cristalizam, numa temporada que alguns querem que não tenha fim.




Prof. Péricles







sábado, 9 de setembro de 2017

O ENIGMA GERALDO VANDRÉ


Desde 1985 Vitor Nuzzi se interessava pela trajetória do cantor e compositor Geraldo Vandré, o principal expoente da resistência musical à ditadura militar durante os anos 60 (na década seguinte, tal papel seria desempenhado por Chico Buarque).


Segundanista de Jornalismo, descobriu em 1985 o telefone do artista e disse estar querendo conversar com ele sobre um trabalho para a faculdade. Foi recebido no apartamento que Vandré ainda possui na rua Martins Fontes, próximo ao prédio que durante muitas décadas sediou o jornal O Estado de S. Paulo, na capital paulista. A conversa foi cordial, mas breve.


Quando Vandré se tornou septuagenário, em setembro de 2005, Nuzzi temeu que ele mergulhasse cada vez mais no esquecimento; decidiu, então, assumir como sua a tarefa de apresentá-lo às novas gerações.


Foi um trabalho longo e abrangente como bem poucas biografias brasileiras. Entrevistou mais de 100 pessoas (inclusive esta que vos escreve), garimpou informações em 51 livros e 29 jornais/revistas. Com isto, pôde reconstituir nos mais ínfimos detalhes a história do artista.


E a odisseia de Nuzzi, depois dos mesmos 10 anos que durou a descrita por Homero, teve final feliz, com o lançamento, no final do ano, de Geraldo Vandré: uma canção interrompida (Karup, 2015, 352 p.)


É um trabalho de fôlego e muito bem escrito; tem qualidade superior, na minha opinião, à das obras congêneres de biógrafos famosos como Fernando Moraes e Rui Castro. Quem não acompanhou a trajetória de Vandré, certamente se deslumbrará.


E mesmo os contemporâneos de sua trajetória ficarão conhecendo muita coisa nova.


Por exemplo, é inverossímil ao extremo que os responsáveis pelo FIC, com a espinha flexível que era marca registrada dos profissionais da Globo nos anos de chumbo, tivessem ousado guardarem para si as ameaças dos fardados, torcendo para que, espontaneamente, o júri não premiasse nem a Caminhando, nem a América, América, de César Roldão Vieira (outra que a caserna impugnara). Fala sério…


Quanto ao comportamento esquisito e errático de Vandré desde que voltou do exílio em 1973, todas as informações que Nuzzi levantou são conclusivas quanto ao fato de que Vandré não foi torturado antes de deixar o Brasil e dificilmente o terá sido na volta negociada para o País.


Estava em más condições psicológicas e com a saúde debilitada nos últimos tempos de exílio. Foi sequestrado discretamente pela ditadura no aeroporto e, um mês depois, a Globo o exibiu no Jornal Nacional como se estivesse desembarcando naquele instante.


Parece ter ficado 58 dias (antes e depois da entrevista ao JN) recebendo tratamento psiquiátrico.


A menos que algum militar, algum médico ou algum enfermeiro abra o bico, jamais saberemos o que aconteceu com Vandré enquanto esteve internado (rigorosamente isolado dos demais pacientes) numa clínica do bairro de Botafogo, RJ.


Em Aroeira, o narrador (Vandré) declara estar “escrevendo numa conta/ pra juntos a gente cobrar/ no dia que já vem vindo/ que este mundo vai mudar”. E alerta os marinheiros (os colonizadores portugueses) que está próxima “a volta do cipó de aroeira/ no lombo de quem mandou dar”.


Bonita é uma guarânia na qual um presumível guerrilheiro tenta explicar à sua amada que não a pode tomar naquele instante e (como poderá morrer seguindo o destino que escolheu) talvez ela só venha novamente a saber dele “se um dia encontrares alguém/ que te cante meus versos”.


Há outras. A mais explícita de todas, Terra plana, traz este desafio que o combatente lança a um militar: “Se um dia eu lhe enfrentar/ Não se assuste, capitão/ Só atiro pra matar/ E nunca maltrato não/ Na frente da minha mira/ Não há dor nem solidão/// E não faço por castigo/ Que a Deus cabe castigar/ E se não castiga ele/ Não quero eu o seu lugar/ Apenas atiro certo/ Na vida que é dirigida/ Pra minha vida atirar”.


A canção interrompida me fez cair a ficha: Vandré havia dado um duro danado para se tornar artista vitorioso e era exatamente isto que ele queria ser. Acreditava nos ideais da esquerda e era favorável à luta armada, mas nunca como causas às quais se pretendesse engajar como militante. Cansava de repetir que sua atuação não era partidária.


A sensibilidade de artista o levava a incluir tais fantasias em suas músicas, mas ele apenas se colocava imaginariamente no lugar dos revolucionários e dos guerrilheiros. Não queria ser uma coisa nem outra.


E lá se foi outra das fantasias que nos ajudavam a manter a sanidade durante aqueles anos terríveis! Ainda assim continuo lamentando —e muito!— que esse extraordinário artista tenha caído numa armadilha da História, acabando por ser destruído.


Nunca haverá desculpa para os que fizeram desabar tamanha tempestade em cima de um músico, apenas por ele ter composto uma canção que expressou o sentimento de todo um povo.


Como bem lembrou o Benito de Paula, “esse trapo, esse homem um dia foi um rei”.




Celso Lungaretti, jornalista e escritor, escreveu o livro Náufrago da Utopia (Geração Editorial).



quinta-feira, 7 de setembro de 2017

COMEMORAR O QUE?


A independência política do Brasil ocorreu após um processo dirigido pelas elites brasileiras.


Nesse processo, a maior preocupação das elites, não era com a independência propriamente dita, nem com a situação de seu povo menos favorecido. Ao contrário, a independência se fez sob uma ótica quase obsessiva de se manter a escravidão no país que então iria nascer.


Para atingir esse objetivo obsessivo, as elites apostaram todas suas fichas na figura do Príncipe Regente, D. Pedro, a ponto de fazer nascer na América latina uma monarquia, sistema político totalmente estranho ao cenário americano e decadente no restante do mundo.


Fez-se a monarquia e D. Pedro foi coroado imperador, tudo para manter a escravidão, na forma desumana de exploração da mão-de-obra africana. Para isso, o novo governo chegou a assumir um compromisso por escrito com a Inglaterra de que iria sim acabar com a escravidão, mas só no dia de “São Nunca”.


O Brasil nasceu como país já demarcando fortemente as mais perversas características de seu caráter: um estado fascista, explorador e assassino.


Tudo para suas elites, nada para seus desgraçados.


Desgraçados que foram sistemática e perversamente mortos ao longo dos anos com as torturas da escravidão, nos sertões miseráveis de Canudos, na região do Contestado.


Quando não pode matar como gostaria, o estado fascista e elitista brasileiro usou todos os recursos da mentira e dissimulação como na Revolta da Vacina ou na Revolta da Chibata, para manter sua autoridade acima de qualquer reivindicação popular.


A torpeza de caráter dos dirigentes políticos brasileiros sempre foi exposta e imposta vencendo com todos os recursos da fraude mais baixa em eleições mentirosas como as da República velha.


Nossa classe média que sempre esteve no degrau mais baixo, muito mais próximo dos miseráveis do que dos poderosos, sempre foi subserviente, dócil e mais que isso, uma autêntica defensora dos interesses de seus amos e senhores.


Foi ela, nossa classe média, que forçou Getúlio a apertar o gatilho daquela arma, que cerrou fileiras nas marchas com Deus pela Pátria e Liberdade, que apoiou a ditadura e agora, contribuiu decisivamente para o golpe jurídico-midiático-parlamentar que depôs uma presidenta legitimamente eleita.


Ao longo dos tempos no Brasil se forjou uma classe média déspota e reacionária, talvez a mais hipócrita do mundo.


Engana-se quem pensa que todos nós somos brasileiros no sentido de igualdade. Não somos iguais e o Estado não se preocupa com todos. Somos como que reféns num gigantesco campo de concentração onde os senhores não nos lançam nas fornalhas, mas, exploram o trabalho e o talento, sugam a juventude e depois lançam os restos ao lixo de uma aposentadoria imoral.


O Estado Brasileiro não é brasileiro no sentido dos que nascem no Brasil, mas existe, serve e preocupa-se apenas e tão somente com suas elites e senhores e vende sistematicamente as riquezas do país a preço de bananas, e com isso, ao mesmo tempo que se delapida o país, fortalece-se a riqueza dos que já são ricos.


Aqui quem é nacionalista é mal visto e rotulado de subversivo e até é, realmente, tendo em vista que a ordem vigente é do entreguismo.


Por tudo isso, é de se perguntar, comemorar o que em 7 de setembro?





Prof. Péricles

NO MEU NÃO


Por Eugênio José Guilherme Aragão



O título desta nota não contém erro ortográfico. Remete a uma das frases preferidas de Rodrigo Janot em legítimo mineirês, também disseminada como “lei da nudez": "nu d'ês é bão, no meu não!".

A frase denuncia escapismo, atitude de quem não gosta de enfrentar riscos a si. Quem a escolhe como moto de vida profissional demonstra não ser um líder, no sentido próprio da palavra, alguém que sobressai por virtudes que possam ser tomadas como exemplo a ser seguido pelos outros. Nenhuma sociedade sobreviveria regulada pela “lei da nudez" e, muito menos, uma instituição.

O episódio revelado em fragmentos na noite de ontem é mais um espécime prático de aplicação da lei da nudez. Rodrigo Janot se contorceu para explicar o inexplicável e concluir: "no meu não".

Reconheceu o óbvio: as gravações de Joesley foram fabricadas em casa, por instigação da equipe do Procurador-Geral da República e sem autorização judicial. Insistiu, porém, em que, como provas, seriam íntegras, plenamente aproveitáveis. Afinal, não seria a "suposta" molecagem de Marcelo Miller, seu ex-auxiliar, que colocaria tudo a perder. "No meu não".

Nenhum penalista, ainda que iniciante, subscreveria a ressalva sobre a integridade da escuta ilegal de Michel Temer. Escutas ambientais só são lícitas, sem autorização judicial, se forem tomadas por quem, partícipe no interlóquio, queira usá-las em defesa própria. Este é o entendimento solidamente firmado pelo STF. Não foi este o caso das gravações de Joesley.

O que se tornou público ontem foi o uso de um prospectivo delator premiado como longa manus do ministério público, clandestinamente plantado no domicílio alheio, para ali extrair informações da boca de um alvo de devassa política. Sim, porque aquilo que estava em curso quando da gravação do alvo não podia ser chamado de “investigação”. Esta pressupõe fato determinado, completado no passado. Já a devassa é a busca frenética de um fato comprometedor. É o que a Força Tarefa da Lava Jato tem feito incessantemente, em Curitiba e em Brasília. Usar um prospectivo delator premiado para essa tarefa é iniciativa do melhor estilo mafioso. Lembra cena típica de filme sobre a “Cosa Nostra”, em que um pequeno batedor de carteira com sonhos de grandeza quer entrar para a organização e é submetido a teste de valentia e lealdade: obriga-se o pobre coitado a matar um policial, para mostrar do que é capaz, como um aperitivo de sua utilidade para a organização. Joesley, ao que tudo indica, foi usado como o batedor de carteira. Foi obrigado a oferecer à Procuradoria Geral da República um aperitivo para conquistar a premiação. O aperitivo era Temer.

Ninguém no grupo da Lava Jato pode dizer que não sabia dessas práticas. Muito menos o chefão.

O uso de prospectivos delatores para a escuta ambiental não autorizada tem sido recorrente. Foi assim com Bernardo, filho de Nestor Cerveró, que gravou Delcídio do Amaral; foi assim com Sérgio Machado, que gravou José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá. No caso de Delcídio, a crueldade foi requintada: após ter, este, fechado negociação com a Procuradoria Geral da República, por acordo do qual constava cláusula de sigilo por três meses, deu-se que a cláusula não foi aceita pelo relator, Ministro Teori Zavascki, por não encontrar amparo legal. Por um desses acasos da vida, a gravação de Delcídio foi tornada pública logo a seguir, impedindo o senador a voltar atrás no acordo de delação.

Entre as patacoadas do acerto constava declaração do senador de que Dilma Rousseff teria, com a nomeação de Marcelo Navarro para o STJ, visado a obstar investigações contra a construtora Odebrecht. Uma hipótese sem qualquer lastro, como, agora, reconheceu a polícia federal, mas que serviu para abrir inquérito contra a Presidenta às vésperas da votação da admissibilidade do impeachment no Senado, com clara finalidade de desgastá-la perante a opinião pública.

O que causa perplexidade é o cinismo da gestão de Rodrigo Janot à frente do Ministério Público Federal, quando insiste em que sua atuação tem sido estritamente “técnica”. Façam-me rir. Já o disse alhures, o técnico é uma forma de dar roupagem de isenção a decisões que são essencialmente políticas.

O direito usa a técnica como meio de legitimar essas decisões. Mas, decidir sempre é optar. O julgador opta entre, no mínimo, duas teses: a do autor e a do réu, ambas revestidas de fundamentos jurídicos e, portanto, ambas plausíveis se sustentadas com boa técnica. A independência do juiz está no intervalo entre essas teses, que tem o nome de lide. Não pode decidir fora dela, pois seria decidir “ultra petita”, como se diz no bom jargão profissional. A opção, quando não balizada por sólida jurisprudência, é algo completamente subjetivo. E o juiz faz política ao optar. Assim também o faz o ministério público quando decide, ou não, levar um caso adiante.

Mas política não é sempre molecagem. Ela funciona como tempero necessário para preservar as instituições e a governabilidade. Pressupõe-se de quem vai decidir que tenha equilíbrio e senso de justiça, de correção, de critério – virtudes que só se adquirem com muita experiência, ao longo de anos de atuação. Por isso, não é crível tenha o Procurador-Geral da República deixado um grupo de procuradores verdes, sem seu cabedal, rolar solto. O procurador Marcelo Miller, que, pelo que se anuncia, estaria por detrás dessa “técnica” de exigir aperitivos de prospectivos delatores premiados, com meros treze anos de casa, não pode ter agido por conta própria. As informações colhidas por sua “técnica” foram usadas não só em juízo pelo chefe da instituição, mas, também, pela instituição-corporação (hoje é difícil divisar entre ambas), para fazer seu barulho e adquirir musculatura – política(neste caso, com sentido de molecagem mesmo).

Das duas uma: ou o Procurador-Geral se revelou um grande irresponsável, deixando o barco correr enquanto gente de sua equipe pintava e bordava com falta completa de ortodoxia técnica; ou então ele era parte da trama, aquiescendo com a “técnica” de Miller.

Por erro de cálculo estrutural, desabou o edifício que homiziava a política da “técnica” de Janot. Ficou exposta à curiosidade coletiva. Fez tudo errado. Confiou em quem não devia ter confiado. Omitiu-se na defesa da democracia e deixou de exercer o que a Constituição lhe atribuiu – ser "Chefe do Ministério Público da União" (art. 128). Preferiu as intrigas da politicagem interna e o discurso corporativo fácil. Revelou-se um ignorante no jogo da macropolítica. Traiu quem lhe dera a mão, não para beneficiar quem quer que seja, mas para tirar o país da polarização inaugurada com o processo do chamado “Mensalão”.

A "lei da nudez" falhou e não tem como salvar o do Rodrigo Janot.



sábado, 2 de setembro de 2017

GUERRA NA VENEZUELA, ESTILHAÇOS AMAZÔNICOS


Por Jaime Sautchuk


Começando pelo começo, não devemos ter dúvidas de que o tresloucado presidente estadunidense é capaz de cumprir a promessa. A indústria de armamento dos Estados Unidos, que injetou muita grana na campanha eleitoral dele, está mandando a conta, pedindo alguma guerra que encha seus cofres com bilhões de dólares.


Pode estar muito próxima outra guerra imperialista em floresta tropical


Nessa sinistra empreitada, Trump terá outros apoios internos em seu país, entre políticos, militares e diplomatas, por exemplo. E também externos, entre os quais, por certo, de alguns mandatários sul-americanos; inclusive do atual governo golpista de Michel Temer, que já tem se manifestado a favor da direita venezuelana, igualmente golpista.


Todos fingem ignorar as imediatas consequências que um conflito desta natureza traria ao Brasil, queiram eles ou não. A vasta fronteira terrestre entre os dois países, por si só, já é um convite ao compartilhamento de um conflito armado na região. Esses limites vão do Sistema Parima de Serras (onde está o Pico da Neblina, ponto mais elevado do Brasil) no sentido oeste, pela Planície Amazônica, até encostarem na Colômbia.


No lado brasileiro, a área lindeira tem a cidade de Pacaraima, em Roraima, que já é o ponto de entrada de imigrantes venezuelanos e, em caso de guerra, será certamente transformada em centro de refugiados.


Mas, o restante é habitado por povos da floresta. Entre os quais alguns grupos indígenas binacionais, como é o caso dos Yanomamis, sobre os quais um conflito terá consequências pouco previsíveis. O certo é que essas populações só passaram a ter apoio oficial do estado venezuelano nos governos de Hugo Cháves, no regime hoje liderado por Nicolás Maduro.


De quebra, vai sobrar pra Guiana Francesa e pro Suriname. Vizinhos nas águas territoriais no Oceano Altântico. Porém, o que é mais grave, vai sobrar também pra Guiana. Cuja existência nunca foi reconhecida pelos venezuelanos de todas as cores; que pleiteiam territórios daquela ex-colônia britânica. Em verdade, mais da metade do país faz parte do Território Essequibo; que pertenceria à Venezuela, segundo tratados internacionais, e é rico em petróleo.


Aliás, nessa região está também a cidade de Lethem, onde funciona uma zona franca que atrai turistas e comerciantes de Boa Vista (RR) e Manaus (AM); durante o ano inteiro. Segundo a Polícia Federal. Em média, todos os dias 4 mil automóveis brasileiros cruzam a fronteira da Guiana com destino a esse centro de compras.


Ou seja, toda nossa divisa norte estará em meio ao conflito. E, com certeza, milhares de brasileiros pegarão em armas contra os invasores ianques e seus aliados internos na Venezuela.


São, portanto, muitos os estilhaços que atingirão o Brasil, caso essa guerra imperialista venha mesmo a ocorrer.




Jaime Sautchuk, é jornalista.

terça-feira, 29 de agosto de 2017

ESTADOS UNIDOS É AQUI

Tem coisas que, geralmente não podemos escolher.


Uma delas é vizinho.


Às vezes está tudo maravilhoso e de repente o vizinho do lado, sujeito gente fina, se muda e para seu lugar chega um chato ao quadrado.


Fazer o que? São coisas da vida.


Agora, o que aconteceu com os moradores do bairro Passo d’Areia, em Porto Alegre (entre eles, eu), é algo de cruel.


Já tivemos muitos vizinhos, ao longo de muitos anos nessas paragens, quase todos amigos.


Pouquíssimas broncas.


Mas, eis que, sem aviso prévio, se instala no bairro, com pompa, bandeira e águia... o consulado dos Estados Unidos da América do Norte.


Sério! Deve ser castigo.


Logo no meu bairro?


Se engana quem pensa que é implicância com os irmãos do norte e que eles chegaram na boa.


Negativo.


Chegaram no velho estilo, somos o melhor do mundo e sai da bando de índios...


Compraram um velho prédio de um supermercado e construíram tudo novo.


Interessante é que na construção abocanharam metade de duas ruas. Pode isso produção? Cadê o prefeito? Ah... deixa pra lá prefeito em Porto Alegre só existe para defender dono de empresa de ônibus.


Pelo menos eles foram fiéis a tradição. Digo, a tradição de invadir a terra dos outros. No caso, metade de duas ruas. Um pedaço do Brasil.


Além disso expulsaram a banca de revistas do seu Manuel que a mais de trinta anos estava no mesmo lugar, na frente do supermercado.


A segurança na área chega a ser intimidadora. Guardas armadas com cara de agentes de filmes de espionagem.


Até abandonei a ideia de ir vestido de muçulmano e carregando uma sacola no dia da inauguração.


Tudo bem.


Nos tempos atuais pós golpe eles mandam, compram, sem pedir.


Só o que falta é ter que conviver com procissões de coxinhas que pensam que devem ao menos uma vez na vida conhecer seu templo.


Eu que guarde minha fantasia de homem bomba.


Estados Unidos é aqui.




Prof. Péricles

domingo, 27 de agosto de 2017

COPACABANA ME ENGANA




Por Maria Lúcia Dahl

Descobri que meu senso de direção não era essas maravilhas, quando meu ex-marido, desesperado com minhas idas e vindas a bordo do querido fusca, implorava ao meu lado: “não seja insegura, meu bem, quando você achar que é pra esquerda, vá pra direita! ”


Então, quando vi as novas placas espalhadas pela cidade implorando-nos por tudo o que é mais sagrado, que “acredite na sinalização”, como se fosse um dogma de fé, espécie de mantra que se vai repetindo pelo caminho até incorporá-lo ao nosso inconsciente, deixei meu marido de lado, e passei a acreditar piamente nelas, quando saí de Correias para o Rio, junto com minha amiga e minha irmã.


Dirigindo o fusca, segui­a religiosamente, como uma crente diante de um Pai de Santo famoso, e por causa disso, fui parar na Penha, Irajá e Guadalupe.


Dez horas da noite. Ninguém na rua. Então, diante da impossibilidade de alguma troca de informação com algum ser vivo, continuamos, já exaustas, a viagem por um deserto de Saara, até sermos surpreendidas, de repente, por um motel.


Salto, aliviada, do carro, diante de uma remota possibilidade de informação e toco a campainha de uma portaria vazia. Esperamos na porta, as três, até que esta se abriu, fechando­-se imediatamente, em seguida, e por de traz dela: ninguém.


E agora? O que faremos, três senhoras distintas presas num motel em Guadalupe?


Tocamos novamente a campainha e um novo “abre­-te Sésamo” nos liberou de volta à estrada vazia.


Num acesso de fúria, descontrolado, minha irmã começou a gritar: “táxi! Táxi! ” e o eco a remedou, debochado: “táxi! Táxi! ”


Assim como uma miragem no deserto um homem surgiu da escuridão. Fitei-­o determinada, o que o fez fugir, apavorado, temendo um assalto. Então abri a janela do carro e gritei ao volante: “Moço! Pelo amor de Deus, onde fica Copacabana? ” Em disparada, ele gritou de longe, com o dedo indicador, apontando uma abstração:


“Tem que fazer o retorno! ” em meio ao eco que respondeu: ”ôrno, ôrno!”


Mais alguns quilômetros de desconfiança até me deparar com a prova dos nove à minha frente, escrito: “Campo Grande”, e como por milagre, um novo retorno, à direita, indicava a palavra mágica: Copacabana


Como um filho pródigo que, finalmente retorna ao lar depois de um longo período ausente, desembarco, feliz, diante de uma das minhas primeiras e mais belas referências da minha vida: a Princesinha do Mar!



Maria Lúcia Dahl, atriz, escritora e roteirista.

sábado, 26 de agosto de 2017

ÁLBUM DE DECEPÇÕES



Todo aquele brasileiro que possuí algum comprometimento com o país e a democracia, anda estocando em casa farto depósito de decepções.

Nos últimos tempos as decepções, se diversificaram de tal modo que, decidi lançar um álbum de figurinhas, para que se possa colecionar esse “tesouro”.

Sou do tempo que se curtia muito álbum. Figuras eram disputadas no jogo do bafo ou trocadas em comércio intenso de pátio de colégio.

Pois vou aproveitar minha experiência no “produto” e lançar um Álbum de Decepções. Desconfio que será o maior sucesso.

Claro, não faltarão aquelas figurinhas trazendo decepções mais raras como aquela com a foto de um ex-defensor da educação e governador do Distrito Federal apoiando o impeachment.

Muitas serão mais comuns e repetidas, como a que mostrará congressistas vendendo seus votos como quem negocia bananas.

Algumas figurinhas não terão imagem, só frases coloridas, como as “por minha mãe, por meu marido, meus filhos, voto sim”. Ou “pauta bomba” ou outra idiotice qualquer.

Com o tempo surgirão os debates sobre qual seria a decepção preferida. Essas escolhas de preferências sempre foram muito divertidas.

Por exemplo, a turma da preferência pelas decepções com o judiciário trocará figurinhas com o pessoal que acreditava que a Polícia Federal era imparcial e impessoal, incapaz de permitir uma filmagem no meio de uma ação policial.

Claro que coisas assim as vezes provocam discussões apaixonadas.

Meu temor apenas é que, as decepções se vulgarizem, entendem?

Sabe a Lei da oferta e da procura? Pois é, quando um produto se banaliza, se torna muito farto, superando até mesmo a demanda, ele perde valor.

No caso das decepções em excesso o perigo é que elas desvalorizem o escândalo, as pessoas se anestesiem e deixem de dar qualquer importância.

Em todo caso já iniciei meu processo de criação para fabricar a primeiras figurinhas.

Tem as que trazem o rosto de juízes que viraram pop, onde aquela do juiz que sempre tem uma expressão de pouco caso com os outros será a mais procurada.

Tem uma página só daquele outro que rotulou que crimes do PSDB não vem ao caso e uma foto especial, daquelas grandonas no meio da página dele sorrindo e trocando confidencias com um dos maiores corruptos do pais.

Ah... tem duas páginas de meio, especiais, reservadas à mídia, com figurinhas estampando fotos de ancoras televisivos com expressão indignada e capas de revistas que fizeram a diversão da turma mais alienada.

Não poderia faltar a promoção para aqueles que derem a sorte de adquirir uma figurinha premiada, tipo assim, um símbolo fascista de intolerância. Para esses felizardos o prêmio será uma cópia do grampo criminoso contra a presidente.

Bem, está tudo ainda muito no começo, e devo me apressar antes que alguém tenha a ideia de fazer um filme de humor tipo pastelão e torne meu álbum algo superado.

Mas, eu já tenho minha decepção preferida. E está bem na primeira página, no início do álbum. Uma sequência de três ou cinco figuras que mostram a esquerda acreditando em papal Noel e se deixando derrubar como uma fadinha virgem.

E você qual é sua decepção favorita?





Prof. Péricles

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

O SILÊNCIO


Por Vladimir Safatle


Há algo de instrutivo no ritual que o Congresso Nacional ofereceu ao país na última quarta-feira, quando um ocupante do cargo da Presidência, gravado em situação flagrante de prevaricação e corrupção passiva, formalmente denunciado pela Procuradoria Geral da União, foi poupado.

É difícil imaginar algum país no mundo que chegaria a um espetáculo tamanho de degradação comandado por uma casta de políticos dignos de filmes de gângsteres série B. Ao menos, depois dessa confissão de desprezo oligárquico pela opinião pública, quem sabe agora parem de falar que estamos em uma “democracia”.

Enquanto o país assiste a universidades públicas suspenderem as aulas por se encontrarem em situação falimentar, serviços públicos entrarem em deterioração, agências de pesquisa decretarem estado de calamidade e 3,6 milhões de pessoas saírem da classe média baixa em direção à pobreza, o ocupante do trono da Presidência, único presidente da história brasileira a ser denunciado pela Justiça no cargo, gastava milhões de reais em suborno explícito de deputados, uso de cargos públicos para aliciamento de votos e liberação de emendas escusas a fim de garantir sua sobrevida.

Ou seja, bem-vindos a uma cleptocracia que agora não faz nem sequer questão de conservar as aparências.

Há algo de terminal quando até mesmo as aparências já não são mais conservadas. Tudo isso com o beneplácito daqueles que dizem que o país precisa, afinal, de “estabilidade”.

Como se vê, há algo de muito interessante no conceito de “estabilidade” que circula atualmente. Uma estabilidade da pauperização, da precarização do emprego, do desmonte dos serviços públicos e da redução final da república brasileira a uma farsa macabra.

Contra isso, há aqueles que falam que receberam uma “herança maldita” do governo anterior. Alguém deveria explicar essa repetição compulsiva que nos acomete. Vivemos em um país onde todo governo usa o expediente de culpar a herança maldita do anterior para mascarar sua própria impotência. O cômico é que eles sempre encontram alguém a continuar a vociferar a mesma estratégia surrada de sempre.

Mas o que pode realmente impressionar alguns é o silêncio com que este momento foi recebido por setores da sociedade brasileira ou, antes, os expedientes que vemos para justificar a passividade. Por que as ruas não queimam, perguntam?

Ao menos três fatores deveriam ser levados em conta aqui.

Primeiro, porque estamos falando de um governo que atira em manifestantes em toda impunidade, como vimos na última manifestação de greve na Esplanada dos Ministérios. Ele usa seu braço armado para cegar estudantes com bala de borracha, atemorizar a população nas ruas com sua polícia gestora da desordem, ameaçar com punições os que entram em greve e ridicularizar o fato de 35 milhões de pessoas pararem o país (como na última greve geral). Ou seja, boa parte das pessoas não sai às ruas porque elas têm medo da violência do Estado, já que elas tacitamente sabem que não têm mais garantias alguma de integridade.

Segundo, porque há um setor da sociedade brasileira que nunca teve problemas com corrupção, mesmo que tenham saído às ruas em 2015 falando o contrário. Eles sempre votaram em corruptos notórios e continuarão fazendo isto. O único problema deles era com o governo anterior. Derrubado o governo, todos eles voltaram para casa e continuarão lá para todo o sempre.

Por fim, não há ninguém nas ruas porque a esquerda brasileira entrou em colapso. Presa entre a tentativa de ressuscitar o que morreu e a incapacidade de encontrar outra forma de incorporação genérica de sua multiplicidade de demandas em um ator político unificado, ela encontra-se paralisada e sem capacidade de dizer claramente o que quer, qual seu horizonte.

Queremos simplesmente retornar ao passado recente, conservar o que está sendo desmontado, ou temos algo a mais a propor? Conseguiremos fazer a maioria da população brasileira sonhar e acreditar em sua própria força de transformação e luta ou empurraremos todos a um horizonte desinflacionado de mudanças, como se isso fosse a expressão de um realismo duro, porém pretensamente necessário?

Sem clareza acerca desses pontos, ninguém avançará um passo.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

JOÃO SALDANHA - FINAL


Em 1959, comentou, pela Rádio Nacional, o campeonato sul-americano disputado em Buenos Aires. Gostou da experiência e resolveu dedicar-se exclusivamente à função de comentarista.

“Saldanha revolucionou o comentário sobre futebol. Raspou o ouro parnasiano, de porta da Colombo (confeitaria tradicional do Rio de Janeiro), que caracterizava o gênero, e impregnou-o com o clima de porta de botequim.”

A popularidade do futebol subia pelo elevador. O Brasil ganhara também a Copa de 1962 no Chile e o jornalismo esportivo se especializava. Surgiu, nesse período, a Grande Revista Esportiva Facit, transmitida pela TV Rio, canal 13, a primeira mesa-redonda futebol exibida pela televisão ao vivo. Saldanha integrou a equipe do programa, que logo caiu nas graças das torcidas.

No rádio e na TV Saldanha ia consagrando palavras e pensamentos muito reais do cotidiano das pessoas. Para analisar os motivos de uma renda baixa, por exemplo, ele dizia: “Sacumé, fim de mês, a moçada tá dura.”

Ao mesmo tempo, escrevia, com o mesmo talento, comentários no jornal Última Hora.

Durante a Copa de 1966, na Inglaterra, que comentou pela Rádio Nacional, Saldanha concedeu várias entrevistas para emissoras estrangeiras com a mesma franqueza com que falava aos brasileiros. Em uma delas, o entrevistador perguntou o que ele tinha a dizer sobre a matança de índios no Brasil.

“Nosso país tem 470 anos de história. Nesses 470 anos, foram mortos menos índios do que em dez minutos de uma guerra provocada por vocês. Os selvagens são vocês”, tascou.

A perda da Copa de 1966 desencadeou uma crise no comando da seleção brasileira. Para surpresa geral do país, o presidente da CBD, João Havelange, convidou Saldanha para assumir o cargo.

Siqueira diz que ele pretendia continuar denunciando, agora com mais repercussão, o que estava acontecendo no país. O novo técnico montou um time de “feras” e o sucesso da seleção fez o regime se levantar contra ele. A CBD era uma entidade ligada ao Ministério da Educação e Cultura, ocupada por Jarbas Passarinho, e uma eventual conquista da Copa com Saldanha à frente do selecionado seria um constrangimento para os generais golpistas. Nelson Rodrigues, em sua famosa crônica “João Sem Medo” no jornal O Globo, resumiu a questão:

“Um amigo meu, bem-pensante, veio me perguntar: ‘Você acha que o João tem as qualidades necessárias?’ Respondi: ‘Não sei se tem as qualidades necessárias. Mas afirmo que tem os defeitos necessários.’ E, realmente, o querido Saldanha possui defeitos luminosíssimos.”

Um desses “defeitos” era que ele fechava espaços para a ditadura capitalizar a provável conquista do tri. E a mídia, servil ao regime, começou a fustigá-lo. O complô estava armado. Daí para a queda, foi um passo. Depois da turbulenta passagem pelo comando técnico da seleção brasileira, Saldanha continuou escrevendo para o jornal O Globo e comentando na Rádio Globo.  Passou por outras emissoras, festejou a volta dos seus camaradas com a anistia, mas nunca deixou o futebol.

Em sua crônica intitulada “Pelo Cano”, publicada dia 23 de março de 1982 no Jornal do Brasil, escreveu: “Nosso único produto interno bruto que dá é o futebol. Falam no carnaval. Nada disto. Faça um desfile de escolas por semana e no fim de um mês a sociedade brasileira pedirá por amor de Deus para pararem.”

Apesar da “teimosia siderúrgica” do técnico Telê Santana, vibrou com a seleção de 1982. Voltou à militância política, foi candidato a vice-prefeito da cidade do Rio de Janeiro pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB) em 1985 e participou ativamente da redemocratização do país.

Morreu na Itália, participando da cobertura da Copa de 1990 pela Rede Manchete de Televisão.

Saldanha viveu a vida como ela deve ser vivida. Brigou, namorou, casou várias vezes, escreveu muito e deixou uma bela história para o futebol brasileiro. Jogou com a vida. E ganhou.



Osvaldo Bertolino é jornalista e escritor.

domingo, 20 de agosto de 2017

JOÃO SALDANHA - O FUTEBOL E O JOGO DA VIDA


Por Osvaldo Bertolino

A explosão de popularidade do futebol no Brasil nas primeiras décadas do século XX despertou análises como as de Gilberto Freyre que já em 1936, no livro Sobrados e Mucambos, mencionou “a ascensão do mulato não só mais claro como mais escuro entre os atletas, os nadadores, os jogadores de futebol, que são hoje, no Brasil, quase todos mestiços”. No artigo A propósito de Pelé, publicado na Folha de S. Paulo em 3 de setembro de 1977, Freyre comparou o rei a Machado de Assis, Euclides da Cunha, Heitor Villa-Lobos e Oscar Niemeyer. O que os une? A genialidade.

Um personagem que sintetiza o potencial do universo futebolístico é João Saldanha. 

Como jornalista, técnico e dirigente ele traduziu, mais do que ninguém, o que a crônica esportiva chama de “magia do futebol” - história brilhantemente reconstituída pelo jornalista André Iki Siqueira no livro João Saldanha, uma vida em jogo, publicado pela Companhia Editora Nacional. Em 550 páginas, Siqueira conta os 73 anos de vida do jornalista - dos quais a maioria vivida também como militante do Partido Comunista.

Saldanha chegou ao posto mais alto do futebol brasileiro em fevereiro de 1969, quando assumiu o cargo de técnico da seleção. Dirigiu o time brilhantemente em pleno governo do presidente Emílio Garrastazu Médici, o general que comandou o período mais violento da ditadura imposta pelo golpe de 1964. Para ele, Médici era o maior assassino da história do Brasil. 

O paradoxo terminou treze meses depois, em 17 de março de 1970, quando Saldanha foi demitido depois de um turbulento período de interferência do presidente na seleção. Em uma “Carta aberta ao futebol brasileiro”, publicada pela revista Placar de 27 de março de 1970, o já ex-técnico da seleção puxou o fio da meada e explicou como o regime colocou verdadeiros cães de guarda para vigiar seus passos.

Foi uma trama urdida pelo presidente da então Confederação Brasileira de Desportos (CBD), João Havelange, e o ministro da Educação, o coronel Jarbas Passarinho. O ministro nega, no livro de Siqueira, que Médici tenha dado ordem para demitir Saldanha. Mas, em entrevista publicada pela Fundação Getúlio Vargas, o general e também ex-presidente da República Ernesto Geisel afirma que:

“Médici teve um papel importante nessa vitória (da Copa de 1970), porque influiu na nossa representação, inclusive na escalação da delegação brasileira e na escolha dos técnicos".

A crise começou quando surgiu o boato de que Médici queria a convocação de Dario, centroavante do Atlético Mineiro, sem o perfil das “feras do Saldanha” - como era chamada a seleção.

"O senhor organiza o seu ministério, e eu organizo o meu time”, respondeu o técnico por meio dos jornalistas".

Dias antes, em janeiro de 1970, ele esteve no México para acompanhar o sorteio das chaves da Copa do Mundo de 1970 e disse que havia terríveis torturas no Brasil.

“Levei para o México uma pilha de documentos sobre 3 mil e poucos presos, trezentos e tantos mortos e não sei quantos torturados”, afirmou.

O clima ficou pesado. Convidado para um jantar com Médici em Porto Alegre, Saldanha respondeu:

“Não vou. O cara matou amigos meus. Tenho um nome a zelar".

O caso terminou com duas sentenças sumárias.

“Está dissolvida a comissão técnica”, disse Havelange.

“Não sou sorvete para ser dissolvido”, rebateu Saldanha.

Franco, ele imediatamente foi ao microfone da Rádio Globo, onde trabalhava, e desancou:

“O futebol brasileiro tem tanta força que passará por cima desses homens, covardes e pusilânimes.”

A personalidade forte era uma herança dos pais. Gaspar Saldanha, o pai, além de renomado advogado foi maragato e participou das batalhas contra os chimangos no extremo Sul do Brasil. Era bisneto de Rodriguez Chávez, conhecido como Arredondo, nome de peso na independência do Uruguai. No Acre, o gaúcho que comandou a reconquista daquele espaço, José Plácido de Castro Jobim, era tio-avô materno de João Saldanha - sua mãe chamava-se Jenny Jobim Saldanha.

(CONTINUA)


quinta-feira, 17 de agosto de 2017

O PREÇO DO DEBOCHE


De acordo com matéria do jornal Valor Econômico publicada na semana passada, a Lojas Marisa, a mesma que debochou de Lula e da Dona Marisa em campanha publicitária, em 2016, registrou um prejuízo líquido de R$ 24,4 milhões no segundo trimestre de 2017, o que representa um aumento de 32,4% em relação ao resultado negativo do mesmo período de 2016, de R$ 18,4 milhões.



Em 2016, comercial da empresa fez piada com Marisa Letícia, a esposa falecida do ex-presidente Lula, protagonizando uma das maiores bizarrices do marketing, extremamente criticado por especialistas em publicidade e propaganda.



Em postagem no Instagram, uma imagem com "A culpa não é da Marisa", foi usada como comercial do Dia das Mães. Na época da postagem, notícias falsas de que o ex-presidente Lula teria culpado sua esposa falecida de envolvimento em irregularidades foram bastante difundidas.



Nas redes sociais, milhares de internautas iniciaram uma campanha para boicotar a companhia. A maioria dos clientes da Lojas Marisa pertencem à classe C, a chamada "nova classe média", justamente as pessoas que demonstraram total indignação contra o desrespeito da empresa. Novas ações de boicote estão sendo lançadas.



A Lojas Riachuelo, que apoiou abertamente o impeachment da Presidenta Eleita Dilma Rousseff, sofreu um boicote e também viu seus lucros despencarem.



Nos Estados Unidos, ações de boicote são realizadas com muita frequência e funcionam. O Brasil ainda está engatinhando nesse aspecto, mas já demonstra grande potencial. Recentemente, o jornalista Sidney Rezende divulgou em seu site que um grupo de empresas estavam preocupadas com os inúmeros protestos contra o jornalismo da TV Globo e contrataram uma empresa especializada para monitorar as redes sociais. Os empresários estavam com receio de que os telespectadores associassem suas empresas à TV Globo e realizassem um boicote.



Segundo a companhia, o resultado foi afetado pela manutenção da fraca demanda no varejo e pelo acirramento da disputa por preços em lojas de rua e em shoppings.



Além disso, um número relevante de varejistas em shoppings optou por antecipar a liquidação de inverno já na segunda quinzena de julho — movimento não seguido pela Marisa.



A Lojas Marisa encerrou o trimestre com endividamento líquido de R$ 526,8 milhões, valor 1,5% abaixo do registrado entre abril e junho de 2016.




Por Revista Fórum

terça-feira, 15 de agosto de 2017

RACISTAS AMADORES


Eles são tipicamente americanos. A extrema-direita americana se juntou e saiu em furiosa passeata, para revolta mundial. Não faltaram vozes que gritaram forte contra aqueles racistas agrupados e os males terríveis que representam. Foi tão cruento que ele, ninguém menos do que ele, Donald Trump, saiu a dar declarações, dizendo ser desprezível o movimento; justo ele, ícone do racismo, ninguém acreditou em um por cento da sinceridade de suas palavras, mas vá lá, falou institucionalmente, como Presidente dos Estados Unidos da América. 
Eles são os supremacistas, neologismo não reconhecido, ao menos, no dicionário que acabo de consultar.
Eles, aqueles porcos racistas americanos devem morrer de inveja porque não-racistas brasileiros têm, faz quase quinhentos anos, suas babás negras, em uniformes brancos, para cuidar de seus rebentos, sem que houvesse necessidade de formalizar-se esse vínculo de emprego, porque não era emprego, era apenas trabalho.
Ah, aqueles racistas sórdidos americanos devem sonhar com uma escola exclusiva, privada e cara, em que o negro seja, no máximo, o tio da cantina, jamais um professor ou mesmo um aluno. Pois, chorem, americanos racistas idiotas, temos isso aqui, em nossa democracia mega-racial, escolas privadas e não precisamos por isso mesmo nos preocupar com a escola pública, já que essa gentinha não vai estudar muito mesmo na vida.
Seria um sonho para aqueles nazis americanos que a polícia de lá prendesse ou matasse mesmo os negros inconvenientes. Pois bem, já fazemos isso aqui há tempos, sem que ninguém mais se escandalize. Aliás, a palavra de policial, aqui, sorry, Racist America, é suficiente para condenar os pretos abordados na rua, sem qualquer motivação, apenas por atitude suspeita.
Tudo que lhes preencheria o domingo era ver pretos miseráveis serem atingidos por jatos d’água gelada, numa madrugada de inverno. Se isso lhes aquecesse a alma, bastaria que viessem a São Paulo e assistissem a esse espetáculo, patrocinado pela Prefeitura e sua operosa Guarda Civil, com direito a uma performance extra de nosso alcaide, que derrubou paredes de casa ocupada por gente que mal tinha o que comer.
Racistas Americanos! Deve ser horrendo a eles ver a grana dos impostos brancos, direcionada a comprar comida para a criançada filha dos pretos que insistem em ter direitos. Mal sabem eles que, nesse Brasil verde-amarelo, nosso prefeito mandou cortar fundo a merenda na creche, de um jeito que provocaria risadinhas entre os racistas americanos: para prevenir a obesidade infantil, ele disse. Ele não é engraçadinho? Nós aqui, já estamos tão acostumados com esse seu senso humor, que nada, mas nada dissemos. Quando muito, jogamos um ovo na testa dele e é só.
Não penduramos negros enforcados, que horror. Optamos por outra estratégia, seus racistas ignorantes! Construímos uma doutrina da Guerra ao Tráfico, só para isso: invadir comunidades de gente preta e passar fogo em quem for possível. Vale tudo: de feto a criança, todos são pretos, quase pretos, ou vivem como pretos, com direito a carro blindado, a que chamamos carinhosamente de caveirão. Elegemos deputados, temos programas de televisão, humanos direitos, enfim, sabemos fazer a coisa e, claro, sabemos botas a culpa de tudo até na Venezuela.
Nós odiamos vocês, americanos racistas. Odiamos tanto que lutamos ferozmente contra essa coisa horrorosa de colocar cota para pretos em que tudo que é lugar, desde faculdades até concursos públicos, menos, claro, para os concursos perigosos, como os da magistratura e ministério público, em que a meritocracia ainda manda mais alto, ora essa. Não brincamos com fogo, rapazes.
Professores negros, médicos negros, engenheiros negros, arquitetos negros, advogados negros, promotores de justiça negros, juízes negros, já fizemos nossa parte por aqui e não corremos esse risco! Não sofremos desse mal aqui no Brasil, racistas de mierda!
Nessa crise em que vivemos, por culpa do PT, bem que o Itamaraty poderia fazer uma campanha publicitária, com nosso super-prefeito paulistano, sorridente, com pulôver nas costas, com seu arzinho de genro preferido, com aquele rostinho de trabalhador que ele possui, chamando o bravo turista americano e seus dólares de prata:
  “Venha para o Brasil. Aqui o racismo deu certo”
Uma globeleza bem que poderia ilustrar o folder. Seria o máximo. Eles, os racistas americanos morreriam de inveja. Amadores!

 Roberto Tardelli é Advogado. 

sábado, 12 de agosto de 2017

MANUTENÇÃO DE ESPÍRITOS


Nunca tive pai. Isso é, tive, se não, biologicamente eu não existiria. Mas só biologicamente. Mas, por outro lado, fui pai três vezes e meus filhos são meu maior patrimônio como ser humano.



Posso dizer aos jovens, não pais que, ser pai é algo realmente mágico.



Se no momento da fabricação não existe mistério e a própria natureza nos ensina os caminhos, a manutenção do que foi feito é, realmente, o maior desafio que um homem pode ter.



Nem estou me referindo aquelas questões mais materiais, de necessidade de trabalhar e abastecer constantemente a prole com que ela precisa, e como tem coisa que a prole precisa.



Não, me refiro às coisas mais, digamos, espirituais.



Ser pai implica em fazer brotar nos filhos aquelas sementes que eles já trazem de fábrica e que, germinarão ou não, muito, de acordo com a educação que receberem.



É um desafio enorme indicar aos filhos os valores que realmente valem a pena ser priorizados, como solidariedade, amizade, justiça, igualdade.



Podar as ervas daninhas que surgem nos escaninhos do tempo, escondidas e que podem botar a perder toda uma vida, como vaidade, orgulho, arrogância.



Num mundo em que o “vale tudo” é defendido até nos programas televisivos e onde a violência é cultivada até em games, ensinar que a paz vale mais que qualquer valentia grotesca é um verdadeiro quebra-cabeças.



Nesta vida em que campeia a falsa malandragem e a intolerância nos tira o sono, ter filhos é sim, o maior desafio da terra.



Filhos, melhor não tê-los dizem os que preferem não arriscar ou como procedem alguns, imitando a maioria dos animais da natureza, tendo-os, mas se afastando e deixando à fêmea a exclusividade das obrigações.



Mas, não é a esses que nos referimos e sim aos que são pais na essência da palavra.



Por isso, hoje, nesse domingo especial em homenagem aos pais, nosso blog envia o mais afetuoso abraço aos corajosos que não fogem das obrigações que a paternidade responsável impõe.



E um abraço especial aos pais que militam no campo da esquerda e que enxergam não apenas a necessidade de felicidade não apenas de seus filhos, mas de todos os filhos, de todos os pais, principalmente daqueles mais esquecidos e marginalizados no mundo do capital e que se obstinam em mostrar os seus rebentos o quanto podem ser gloriosas as ações que visam a igualdade e a fraternidade, a defesa da dignidade humana e o valor insuperável dos direitos humanos.



Se a manutenção de máquinas é complicada a manutenção de espíritos é algo divino.





Prof. Péricles

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

A IMPRENSA NOS ANOS DE CHUMBO


O Correio da Manhã (RJ) foi o primeiro veículo da grande imprensa a manter uma posição firme contra o golpe militar. Tinha uma constelação de grandes jornalistas de esquerda, como Otto Maria Carpeaux, Paulo Francis, Antonio Callado, Jânio de Freitas, Sérgio Augusto, Márcio Moreira Alves e Hermano Alves. Os artigos que Carlos Heitor Cony escreveu sobre os primeiros tempos da ditadura, sarcásticos e combativos, foram depois por ele reunidos em livro: O Ato [alusão aos Atos Institucionais baixados pela ditadura] e o fato.


Quase um nanico, A Tribuna da Imprensa havia sido fundada pelo corvo Carlos Lacerda mas, na ditadura, se tornou uma espécie de trincheira pessoal do combativo jornalista Hélio Fernandes, irmão do Millôr. Seus editoriais, cuspindo fogo contra os tiranos, ocupavam a capa inteira, ou deixavam um pequeno espaço para as manchetes; eram o maior, talvez único, atrativo do matutino. Foi o dono de jornal mais intimidado e retaliado pelos militares.


Longe de serem de esquerda, O Estado de S. Paulo e o Jornal da Tarde honraram o passado de resistência ao arbítrio: repetindo a postura adotada face à ditadura getulista, foram os dois veículos da grande imprensa que mais resistiram à censura do regime militar na primeira metade da década de 1970.


Enquanto os demais, que publicavam as matérias sem os trechos cortados e aceitavam substituir as matérias integralmente vetadas por outras, inofensivas, o Estadão preenchia esses espaços vagos com poesias e o Jornal da Tarde com receitas culinárias. Assim, os leitores podiam saber exatamente qual era o espaço ocupado pelos textos tesourados e até adivinhar a que se referiam.


O semanário O pasquim foi o grande respiradouro da imprensa na virada dos anos 60 para os 70, com Paulo Francis pontificando nos comentários políticos e humoristas como o Millôr Fernandes, Jaguar, Ziraldo e Henfil soltando suas farpas na área de costumes, além de fazerem também suas alusões ao arbítrio e à burrice institucionalizada. Outros destaques eram Ivan Lessa, Tarso de Castro e o guru da nova esquerda Luís Carlos Maciel. Havia, ainda, colaboradores de peso como Glauber Rocha, Chico Buarque, Caetano Veloso e Carlos Heitor Cony.


Anárquico, irreverente, difundindo o jeito carioca de ser num Brasil ainda provinciano, atraiu um público jovem e não necessariamente politizado. Chegou a vender mais de 200 mil exemplares, tiragem superior à de muitos veículos da grande imprensa, antes de sucumbir ao arbítrio oficial e ao terrorismo oficioso: imposições da censura, prisões de integrantes da equipe, atentados contra bancas de jornais que ousassem vendê-lo, etc.


Finalmente, mais na linha da esquerda convencional, os alternativos Opinião, Movimento, EmTempo e Coojornal foram outros respiradouros importantes, ao longo da década de 1970. Atingiam um público bem menor que o do Pasquim, de pessoas que já pertenciam à esquerda ou com ela simpatizavam, a maioria do meio estudantil.


Corajosamente, conseguiam passar a esse pequeno universo informações importantes que a grande imprensa preferia não revelar (ou era impedida de fazê-lo).



Por Celso Lungaretti, jornalista e escritor, foi resistente à ditadura militar ainda secundarista e participou da Vanguarda Popular Revolucionária.

sábado, 5 de agosto de 2017

A VERDADE É DURA, A VOLKS APOIOU A DITADURA


Do site Nocaute


Uma força-tarefa investigativa formada pelo jornal Süddeutsche Zeitung e as emissoras estatais NDR e SWR obteve acesso exclusivo à investigação externa, ordenada pela própria Volkswagen, sobre o papel de sua filial brasileira na ditadura militar (1964-1985).


Segundo reportagens publicadas em 23/07 desse ano, a filial brasileira da montadora colaborou de forma mais ativa do que antes se imaginava com os militares na perseguição de opositores do regime.


Análise extensa de documentações mostrou quão participativo foi o papel da Volkswagen do Brasil e sugere que a sede em Wolfsburg tomou conhecimento disso – o mais tardar em 1979.


Os repórteres alemães analisaram documentos corporativos localizados na filial brasileira e na sede alemã, papéis classificados como secretos pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e relatórios confidenciais do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha.


“Operários eram presos na planta da fábrica e, em seguida, torturados: a colaboração da Volkswagen com a ditadura militar brasileira foi, aparentemente, mais ativa do que antes presumido”, escreveu o Süddeutsche Zeitung.


Os repórteres alemães também tiveram acesso às atas de investigação do Ministério Público de São Paulo. Além disso, eles realizaram entrevistas com alguns ex-funcionários da Volkswagen do Brasil – muitos confirmaram que foram detidos na fábrica em 1972. Eles faziam parte de um grupo oposicionista e distribuíram folhetos do Partido Comunista e organizavam reuniões sindicais.


Os veículos de comunicação alemães corroboraram que a filial brasileira espionou seus trabalhadores e suas ideias políticas, e os dados acabaram em “listas negras” em mãos do Dops. As vítimas lembraram como foram torturadas durante meses, após terem se unido a grupos opositores.


“A Volks roubou dois anos da minha vida”, disse Lúcio Bellentani, ex-operário da montadora e agora com 72 anos, que afirmou ter sofrido oito meses de tortura e ter passado outros 16 meses na prisão. “Indiretamente a Volkswagen foi responsável por numerosos casos de tortura e perseguição. A Volkswagen deve ter a dignidade de reconhecer sua responsabilidade por esses atos”.


Em 2016, a montadora alemã nomeou para uma investigação sobre seu passado o historiador Christopher Kopper, que confirmou a existência de “uma colaboração regular” entre o departamento de segurança da filial brasileira e o órgão policial do regime militar.


“O departamento de segurança atuou como um braço da polícia política dentro da fábrica da Volkswagen”, antecipou Kooper, pesquisador da Universidade de Bielefeld, à imprensa alemã. Segundo ele, a montadora “permitiu as detenções” e pode ser que, ao compartilhar informações com a polícia, “contribuísse para elas”. Ele sugeriu que a montadora alemã peça desculpas aos ex-funcionários afetados pela conduta.


De acordo com protocolos internos da Volkswagen, as chefias da montadora na Alemanha e em São Paulo trocaram memorandos referentes às detenções de funcionários. O conselho da multinacional tomou conhecimento da conduta em São Bernardo do Campo, cidade satélite de São Paulo, o mais tardar em 1979, quando funcionários brasileiros viajaram à Alemanha para confrontar o então presidente da companhia, Toni Schmücker.


A sede da montadora se negou a comentar o conteúdo das alegações e reiterou ter encarregado o historiador Kooper de investigar e apresentar um parecer sobre a questão. Kooper apresentará suas conclusões até o final do ano.


Há quase dois anos foi aberta em São Paulo uma investigação sobre a Volkswagen do Brasil para determinar a responsabilidade da empresa na violação dos direitos humanos durante a ditadura de 1964 a 1985.


Conforme estabeleceu a Comissão Nacional da Verdade (CNV), que examinou as violações dos direitos humanos cometidas pela ditadura militar, muitas empresas privadas, nacionais e estrangeiras, deram apoio tanto financeiro como operacional ao regime militar.

No caso da Volkswagen, a comissão constatou que alguns galpões que a empresa tinha numa fábrica de São Bernardo do Campo foram cedidos aos militares, que os usaram como centros de detenção e tortura. Além disso, a comissão sustentou que encontrou provas que a multinacional alemã doou ao regime militar cerca de 200 veículos, depois usados pelos serviços de repressão.

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

A BANCADA EVANGÉLICA E OS EVANGÉLICOS




Por Marcelo Santos

Na última sexta-feira (21/07) foi realizado o debate “Evangélicos, Igrejas Evangélicas e Política”, que fez parte do ciclo de conversas Novos Fenômenos da Realidade Política, promovido pela Fundação Perseu Abramo (FPA), Friedrich Ebert Stiftung (FES) e Instituto Pólis.

Foram apresentados no evento alguns resultados da pesquisa sobre políticas elaborada durante a Marcha para Jesus, realizada em 15 de junho, em São Paulo. “A nossa hipótese de partida é de que existia um descolamento do campo evangélico religioso do campo evangélico político” explicou a pesquisadora Esther Solano, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Segundo ela, apesar de a bancada evangélica no Congresso Nacional ser expressivamente neoliberal e a favor do Estado Mínimo, a imensa maioria dos adeptos da linha religiosa é contra as reformas defendidas pelo atual governo.

Entre os 527 entrevistados que participaram da pesquisa, feita por meio de questionário com perguntas fechadas, a maior parte (66%) afirmou não ter preferência de linha política, seja de esquerda, centro ou direita. Sobre os partidos, 81,6 % afirmaram não possuir preferência partidária. Quando a pergunta foi se eram identificados como conservadores, 45% se identificaram como ‘muito conservadores’ e 34% como ‘pouco conservadores’.

Esther ainda destacou que quando questionados se confiavam nos partidos, apenas 7% disse confiar no PSDB, e 6% no PT. “Os partidos que teoricamente representam os evangélicos, como no caso do PSC, que tem o pastor e deputado federal Marco Feliciano, e o PRB, de Marcelo Crivella, tiveram 1,2% e 0,4% de confiança dos entrevistados. Ou seja, praticamente zero”, relatou.

Quando questionados se confiavam ou não em determinados políticos, 57% afirmaram não confiar em Bolsonaro, 53 % não confiam em Marcelo Crivella e 57% não demonstraram confiança em Marina Silva. “Baixíssima confiança nos partidos evangélicos e nos representantes evangélicos”, avaliou Esther.

O professor Marcio Moretto, da Universidade de São Paulo (USP), lembrou que alguns resultados coletados durante a Marcha para Jesus foram “surpreendentemente progressistas”. Questões como sobre se a escola deveria ensinar as pessoas a respeitar os gays teve o apoio de 77%. Já 70% entendem que ‘cantar uma mulher na rua é ofensivo’ e 64% dos que foram ouvidos durante o evento evangélico concordaram que ‘não se deve condenar uma mulher que transe com muitas pessoas’ e 90% discordam que o ‘lugar da mulher é em casa, cuidando da família’. “Principalmente nas pautas em relação ao direito das mulheres, com exceção do aborto, eles se mostraram mais progressistas do que se poderia imaginar.”

Moretto reforçou que mesmo em questões mostrando que 33% não concordam com a afirmação de que ‘pessoas do mesmo sexo não constituem família’ e apenas 35% entenderem que ‘dois homens devem poder se beijar na rua sem serem importunados', "é bom lembrar que se trata de pessoas que estão dentro do campo evangélico e que se definem como conservadores".

Já o pesquisador e professor Leandro Ortunes, do grupo de estudos de Mídia, Religião e Cultura (Mire), da Universidade Metodista de São Paulo, comparou dados levantados durante os eventos evangélicos de 2016 e 2017 e, com base neles, elencou algumas hipóteses para a vitória de João Doria (PSDB) nas eleições paulistanas do último ano. “Será que o discurso do ‘João Trabalhador’ não faz mais sentido para os evangélicos? Para os microempreendedores, por conta do ‘mérito’, do trabalho... Será que os discursos de luta de classes, de revolução, ecoam no mundo evangélico ou eles querem ser empreendedores?", questionou. "Isso porque existe uma teologia por trás. A ‘Teologia da Prosperidade’ ensina que você é capaz de conquistar bens materiais através do seu trabalho”.

Para a antropóloga Regina Novaes, pesquisadora do CNPq, é preciso ter em mente a pergunta sobre ‘a quem interessa generalizar sobre os evangélicos’. “Há interesses daqueles que falam em nome dos evangélicos e vimos como há diferenças entre eles. Há interesses também, numa conjuntura como a atual, de juntar conservadorismos que não atuam da mesma forma. Conservadorismo ‘político’ é uma coisa; de ‘costumes’ ou ‘econômico’ é outra”.

Para ela, a visibilidade exacerbada de alguns representantes evangélicos, como os pastores midiáticos e a bancada no Congresso, cria a invisibilidade de outros, como os evangélicos mais progressistas (caso da Frente Evangélica pelo Estado de Direito) ou mesmo os que não concordam com as reformas neoliberais e a ideia do Estado Mínimo, que são a maioria, de acordo com os levantamentos. “Precisamos desconstruir a ideia da polarização. Se há pontos que nos unem, esses pontos devem ser colocados acima da pauta.”

O evento foi mediado por Joaquim Soriano, da Fundação Perseu Abramo, e teve apresentação de Altair Moreira (Pólis) e Thomas Manz (FES). “Temos debatido sobre a base de um mapa político que parece ter origens nos anos 1990 e cujo data de validade já venceu. Isso parece mais verdade para a esquerda, deslocada de seu tempo. Então, precisamos fazer um esforço para nos reconectar com a realidade, reconstruir esse mapa político e abordar melhor as questões políticas e sociais”, avaliou Thomas.

quarta-feira, 2 de agosto de 2017

NOSSA GUERRA DO PELOPONESO


O povo grego se formou a partir de ondas sucessivas de invasões no sul da península Balcânica.


Não era um lugar deserto e sem vida, ao contrário. A região era habitada por grupos muito primitivos denominados de “pelasgos”, os ”pés descalços”.


Mas o povo helênico, como o conhecemos, surgiu mesmo dessas ondas invasoras.


Como o relevo da Grécia é extremamente acidentado, com montanhas, planaltos, planícies e depressões, esses grupos invasores acabaram acomodando-se em determinada parte e isolando-se do resto. Assim surgiram comunidades independentes, que denominamos de polis. Como pequenos países, autônomos uns dos outros, que mantinham identidade na língua, na religião e algumas tradições.


Foi, portanto, o relevo acidentado, a geografia, que fomentou a criação de núcleos independentes, porém, identificados e que até falavam do mesmo jeito.


No Brasil, não foi o relevo, mas a história acidentada, que criou bolsões identificados pela religião e pelo idioma, mas distantes entre si.


Aqui coexistem grupos que apesar de terem a mesma nacionalidade são tão diversos que mais parecem estrangeiros uns aos outros.


Temos, por exemplo, os preconceituosos se acotovelando todos os dias com a turma da inclusão.


Gente das extremas trabalhando junto e até suportando-se mutuamente, embora quase nada tenham em comum.


O fato de pagarem os mesmos impostos e, teoricamente, estarem expostos as mesmas leis, cria a falsa ideia de um mesmo povo, mas, é apenas uma ideia, não a realidade.


Os ricos brasileiros, que são muito ricos mesmo, tanto quanto outros ricos do mundo suportam conviver com a massa de pobres, aliás, muito pobres, tão pobres quanto os mais pobres do mundo.


Torcem pelo mesmo time de futebol, mas, de preferência, em arquibancadas, ou camarotes distantes.


Como a Grécia antiga o Brasil também tem seus pelasgos.


São os membros da classe média, média, tão média quanto em outros países, talvez apenas um pouco mais estúpidos, que acreditam viver na planície, quando na verdade habitam as depressões, na beirada do Hades.


Existem vários Brasis já se disse por aqui, e essa afirmação está coberta de razão.


Existe um Brasil, dessa gente varonil, que não vacila pegar a clava forte para defender os interesses da pátria mãe, nem tão gentil assim.


Mas também tem um Brasil de entreguistas que consciente, ou inconscientemente, negocia o tempo todo a sua honra verde amarela e seus bens, debaixo da terra ou do pré-sal.


Durante as Guerras do Peloponeso, no século V a.C. gregos enfrentaram gregos e a Grécia inteira definhou até perder de vez sua independência.


Tem gente que ainda não percebeu, mas a nossa guerra do Peloponeso já começou e tem sido cruel para a gente varonil massacrada em Canudos e no Contestado, suicidada na Rua Toneleros, massacrada nos porões da CIA/DOI/Codi e morta e desaparecida nas lutas contra os entreguistas.


Assim como Macedônia esperou pelo declínio grego para conquistar suas terras, “macedônios” do capital internacional aguardam nossa degradação.


O povo está perdendo o amor-próprio, o Brasil, sua tênue independência e todos nós, a guerra.



Prof. Péricles



segunda-feira, 31 de julho de 2017

A LIÇÃO DO GENERAL


Por Humberto Soares



As Forças Armadas, o Exército particularmente, parecem reativas ao uso dos quartéis para o costumeiro objetivo de botar a tropa nas ruas. Ao longo dos últimos 30 anos, essa saída, perigosa obediência militar à mentira política, tem conduzido os presidentes da República e os governadores, todos eles, para o caminho do fracasso. Botar as tropas na rua é uma expressão que, em passado não muito distante, amedrontava os civis. Mas a história agora é outra.


Apoiado na falência econômica do estado e no aumento da criminalidade, o governador Luiz Fernando Pezão seguiu a rotina. Buscou a ajuda do governo federal, que, mais uma vez, ofereceu o uso das tropas. Na sexta-feira 28, militares passaram a atuar no estado. Um contingente de 10 mil homens, sendo 8,5 mil das Forças Armadas, iniciou a patrulha na região metropolitana da cidade.


Em um primeiro momento, no entanto, não se falou do contingente a ser mobilizado nem quando o seria. Algo aconteceu. Para tapar o sol com a peneira foi preciso, então, usar a balela.


Os militares encarregaram como porta-voz o civil bom de papo Raul Jungmann, ministro da Defesa.


Ele inventou uma historinha. Tirou da manga a explicação de que as Forças Armadas agiriam a qualquer momento “de surpresa”.


Para sustentar a afirmação, Jungmann olhou pelo retrovisor. Segundo disse, as ações realizadas anteriormente “só baixavam a febre e não resolviam o problema”


Os militares têm sido usados, ilegalmente, pelo princípio constitucional de que são responsáveis pela garantia da lei e da ordem. Não cabe, entretanto, às Forças Armadas enfrentar problemas policiais. Quando isso ocorre, tornam-se força auxiliar das polícias militares. Uma inversão grotesca do preceito constitucional previsto no artigo 144.


Jungmann, espetado, tentou construir saída para um problema extremamente complicado. Disse ele: “Estamos mudando a cultura. As operações serão feitas sobre três pilares: inteligência, integração e surpresa. Surpresa, surpresa”. Diante dessa surpresa, é possível contrapor a mentira.


Pouco se vaza do que ocorre nos quartéis. Juntando, porém, uma coisa à outra é possível construir um vazamento. Durante audiência pública no Senado, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, afirmou que o uso de militares em atividades de segurança pública é “desgastante, perigoso, inócuo”.


A sagácia do general, cantada no Senado, favorece um episódio narrado por ele durante a ocupação da Favela da Maré, no Rio de Janeiro, em 2016: “Estamos aqui apontando arma para a população brasileira. Nós estamos numa sociedade doente”.


O general Villas Bôas travou a mentira, imaginada por Jungmann, ao se contrapor quanto ao uso das Forças Armadas como capitães-do-mato: “Nós não gostamos desse tipo de emprego. Não gostamos”.


Em sendo assim, viva o general!