quarta-feira, 19 de julho de 2017

O DESCANSO DO SEU RUI


Seu Rui já deveria estar em casa, descansando.


Setenta e poucos anos de idade, trabalhou a vida inteira. Bem, na verdade seu Rui já havia se aposentado, mas não podia ficar em casa com valores tão baixos pagos como aposentadoria, e por isso, todos os dias lá estava ele, na entrada do cursinho que, fraternalmente, lhe permitia a presença, vendendo sanduiches, pastéis e cafezinho.


Certa vez, rimos juntos quando distraído passei pela entrada e, não fosse ele, continuaria andando com a cabeça nas nuvens.


Figura frágil, encurvada, mesmo na soleira da porta já demonstrava certas dificuldades de movimento. Não deveria estar trabalhando, murmuravam os alunos e funcionários.


Então, não se sabe bem porque, naquela tarde ele resolveu subir as escadas do prédio onde guardava a porta. Ficou tonto ou simplesmente escorregou, ninguém sabe, e caiu. Queda feia até para guri novo.


Foi levado pela SAMU pra emergência. Foi hospitalizado, UTI. Traumatismo craniano.


Sexta-feira, 14 de julho, seu Rui morreu.


Foi enterrado no sábado.


Provavelmente a ausência de sua figura na porta do prédio, será sentida por todos. Com certeza a dor entre os familiares será prolongada.


Nada importa. Nada faz muita diferença, agora que tudo acabou.


Apenas mais um brasileiro que por mérito de seu trabalho deveria estar usufruindo merecido descanso, morreu, na ativa, trabalhando, aos setenta e poucos anos.


A aposentadoria que é paga ao trabalhador brasileiro é um escândalo. Um deboche.


Valor tão reduzido que a grande maioria se obriga à atividade, mesmo sobre o risco de vertigens e de quedas.


Quem não tem a sorte de ser filho da elite, sabe, ou deveria saber disso.


E para o cúmulo do sarcasmo, uma reforma ameaça diminuir o já ridículo provento.


Definitivamente, há algo de muito doente no Brasil.


Quem aplaude governo entreguista e da elite, que suborna a ordem constitucional para dar golpes, não vale o pastel que seu Rui vendia.


Esse país é um país de muita falsidade, excesso de hipocrisia e de tombos para todos que não podem pagar planos privados.


Ou estaremos exagerando?


Não sei. As vezes, diante da dor, a gente conclui não saber de mais nada.


Só sei que seu Rui já deveria estar em casa, descansando.



Prof. Péricles

domingo, 16 de julho de 2017

ESPÓLIO



POR FERNANDO BRITO


A sentença de Sérgio Moro, embora tão previsível, abriu um portão para todos os apetites, de todas as tendências, pela disputa de 2018.

De todos os lados, disputa-se o espólio do líder que, embora vivo, quase todas as camadas dominantes da política brasileira querem morto.

O primeiro personagem é Jair Bolsonaro, que já ganhou musculatura e que precisa, agora, de apoio político que lhe garanta estrutura – e tempo de televisão – para existir eleitoralmente.

Por isso, quase dois meses depois do surgimento das malas de Loures, o homem do “bang-bang” se mantém calado, sem ataques a Temer, com quem estão ainda muitos dos quais conta atrair para a sua candidatura. Um mínimo de espaço na TV e um vice evangélico são os objetivos militares, as colinas que o ex-capitão precisa dominar para ocupar outros territórios, além daquele que o ódio e a histeria com a violência criminosa já lhe deram.

Atrás do mastim, vem o poodle, com seu latido esganiçado. João Dória, não duvidem, deseja ardentemente que Lula seja candidato.

Sabe que é isso o que pode unir em torno dele a classe média furiosa, com um vago discurso de “gestão” e de “solidariedade social” dos empresários, discurso “bacaninha” que as picaretagens promocionais – com bom financiamento, claro – o acostumaram a fazer com seu “Lide”.

Sem Lula, perde seu alvo (nacional e social) e fica meramente paulistano, o que o deixa prisioneiro da máquina tucana, onde é importante apenas como promessa de livrar o partido do desastre eleitoral, mas não um membro da família. Aliás, é o que fica claro hoje, com a leitura do editorial da Folha onde se diz que Dória não foi “muito além da divisa municipal, embora seja obviamente cedo para descartar possibilidades no pleito de 2018”.

Alckmin, ao contrário, é de novo o candidato-chuchu, que pretende crescer pela falta de outros e fora da polêmica, com o apoio do empresariado e do tucanato que não o pode renegar e do uso da “solução Dória” para garantir a sucessão paulista e, portanto, seu reduto eleitoral em São Paulo, um quarto do eleitorado do país.

Marina, que como certas aves, aparece quando há carniça, confirmou, neste episódio, sua opção preferencial pela direita e pela histeria moralista. Poderia ter desancado o processo de erosão dos valores morais dentro do PT ressalvando Lula, a quem deve tanto. Preferiu, como sempre, guinchar platitudes sobre a justiça ser para todos e elogiar Sérgio Moro.

A alma microbiana de Marina Silva não consegue alcançar que, para o establishment escravocrata, ela é algo assemelhada a uma criada, cuja função é dividir para ajudá-lo a reinar, servindo na bandeja uma parte do eleitorado popular.

Só consegue ver as possibilidades de, com a exclusão de Lula, ganhar alguma parcela do eleitorado por conta de sua origem – distante, tão distante… – pobre.

Ciro Gomes, homem decente, foi exceção e, com todas as críticas que faz, não cedeu à demagogia falsa. Suas possibilidades eleitorais, embora pequenas, não o fazem um canalha à procura de oportunidades. Não ganha, à primeira vista, votos, mas continua crescendo em respeitabilidade como político outsider.

O problema essencial da utilização do espólio político de Lula, “decretada” sua morte pela “intelligentsia” nacional que se arrojou aos pés de um juiz medíocre e messiânico (gostaria que seus áulicos de alto saber o que viria a ser aquela página “Eu MORO com ele”, produzida dentro de sua casa senão a mais barata demagogia), é “apenas” um fato: o morto está vivíssimo.

Deixá-lo disputar as eleições é um risco.

Tirá-lo delas, a garantia de instabilidade de quem vier a ser eleito.

O Aroeira, que desenhando pensa com mais lucidez que todos eles, pegou no ar o espírito da coisa.

Matar Lula na fogueira é por fogo no Brasil.



sábado, 15 de julho de 2017

HORA DECISIVA DA REVOLUÇÃO VENEZUELANA


Por Igor Fuser


O conflito na Venezuela ingressou num período decisivo, com todo um conjunto de sinais de que a oposição direitista optou por uma tática de “tudo ou nada” na tentativa de inviabilizar a eleição da Assembleia Constituinte, marcada para o dia 30 de julho. O objetivo da ofensiva política em curso é derrubar, por qualquer meio, o governo legítimo do presidente Nicolás Maduro.


Atos violentos que em qualquer outro lugar do mundo mereceriam a definição unânime de terrorismo foram cometidos na semana passada por milícias fascistas opositoras, sob o silêncio condescendente dos jornalistas estrangeiros. A ação mais chocante foi a destruição de um depósito da rede estatal de abastecimento Mercal, com a queima de 50 toneladas de alimentos que seriam distribuídos em comunidades pobres do estado de Anzoátegui. A suprema ironia foi uma pichação pintada numa parede pelos fascistas: “No más hambre” (“Chega de fome”).

Em outra ação terrorista, na mesma semana, um grupo liderado por um ex-policial que se passou para o lado da oposição jogou granadas e disparou tiros contra a sede do Supremo Tribunal de Justiça, em Caracas, a partir de um helicóptero roubado. Só por pura sorte o episódio ficou restrito ao susto, sem vítimas. O agressor, elogiado por políticos da oposição e festejado como “herói” nas redes sociais antichavistas, ostentava na janela do helicóptero um pano com o número 350, em alusão ao dispositivo constitucional que permite – em tese – a rebelião contra qualquer governo que pratique violações aos direitos humanos.

A atual ofensiva da burguesia venezuelana, apoiada ostensivamente pelo governo e por setores da cena política dos Estados Unidos, já completou três meses, e está muito longe de alcançar seus objetivos. A violência é empregada, em intensidade crescente, por opositores organizados em grupos armados, com treinamento militar e hierarquia de comando. Já não é simplesmente uma situação em que protestos pacíficos degeneram em confronto com policiais. É algo muito mais grave. Todos os dias, ocorrem ataques a escolas infantis, hospitais e edifícios públicos em geral, com o uso de bombas e de armas de fogo.

A escalada do terror causou até o final de junho 92 mortes, das quais apenas 13 podem ser atribuídas às forças estatais de segurança, enquanto ao menos 24 ocorreram comprovadamente em consequência da violência opositora. Há um alto número de vítimas fatais nos ataques a estabelecimentos de comércio, quando grupos organizados incitam a população ao saque, gerando a reação dos proprietários.

O atual ciclo de instabilidade política na Venezuela teve início em janeiro de 2016, quando se instalou a nova composição da Assembleia Nacional, em que os deputados opositores, reunidos na Mesa de Unidade Democrática (MUD), formavam uma ampla maioria. Mas logo se criou um impasse, causado pela recusa da MUD em aceitar a impugnação de três de seus parlamentares, cuja eleição foi invalidada devido ao uso de fraude. Esses três deputados tomaram posse em desafio a uma ordem do Judiciário, o que deixou o Legislativo em situação irregular, conforme interpretação do Tribunal Superior de Justiça.

A bancada da MUD, majoritária na Assembleia Nacional, declararou guerra ao Poder Executivo. Em lugar de elaborar propostas de enfrentamento da crise econômica, concentrou suas energias em sucessivas tentativas de depor Maduro por meio do impeachment, sem sucesso. Fracassou também sua campanha para convocar um referendo revogatório em que a continuidade do mandato presidencial seria submetida ao voto popular. A iniciativa naufragou diante da comprovação de que boa parte das assinaturas apresentadas à Justiça Eleitoral nas petições pelo referendo tinha sido obtida por meio de fraude.

Sem paciência para aguardar as eleições presidenciais de 2019, a oposição escolheu então o caminho do golpismo. Intensificou a sabotagem econômica, valendo-se do fato de que a maior parte da distribuição de produtos está nas mãos do empresariado, maciçamente alinhado com a direita política. Por meio da escassez artificial, do aumento dos preços e da manipulação do mercado de câmbio para desvalorizar a moeda nacional (o bolívar), os opositores têm conseguido levar adiante sua estratégia de “quanto pior, melhor”, jogando nas costas do governo a culpa pelas dificuldades da economia, já abalada pela queda dos preços do petróleo.

Em paralelo, os líderes da oposição se articularam com as autoridades estadunidenses e com setores da direita em diversos países (governos, empresas, ONGs) para aplicar o cerco político e o boicote econômico à Venezuela. Uma lei aprovada recentemente no Congresso dos EUA destina US$ 9,5 milhões para financiar os grupos contrários ao governo venezuelano, sem contar o dinheiro que é encaminhado diretamente por ONGs, empresas privadas e por atores ilegais, como as milícias paramilitares da extrema-direita colombiana.

Para reforçar o apoio externo à sua causa, líderes da oposição venezuelana chegaram a se reunir com autoridades e congressistas em Washington, pedindo o envio de tropas para depor o governo do seu próprio país. Imaginem, só por hipótese, o que aconteceria se deputados estadunidenses viajassem a um país estrangeiro para pedir o uso de força militar a fim de expulsar Donald Trump da Casa Branca. Na Venezuela, chamada de “ditadura” pela mídia burguesa brasileira e internacional, os parlamentares que defendem a intervenção externa circulam em liberdade, continuam a exercer seus mandatos e se expressam diariamente pela televisão, rádio e internet.

Os golpistas brasileiros e o governo neoliberal argentino se engajaram até o pescoço nessa estratégia conspirativa, logrando que a Venezuela fosse suspensa do Mercosul. Mas a cartada mais importante, no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA), fracassou. O plano da diplomacia estadunidense e da direita regional era aprovar na OEA uma condenação ao governo de Maduro que significaria, na prática, o sinal verde a sanções econômicas contra a Venezuela e até mesmo a uma intervenção militar sob pretexto “humanitário”. A resistência de pequenos países do Caribe, solidários à Venezuela, e de integrantes da Alba, a Aliança Bolivariana para as Américas (Bolívia, Equador, Nicarágua, Cuba), barrou essa tentativa ao negar aos EUA e seus aliados a maioria qualificada necessária à aprovação da proposta (nesse processo, a Venezuela se retirou da OEA).

Até agora, o governo Maduro, as organizações populares e os partidos comprometidos com a Revolução Bolivariana se mantêm firmes no rumo das transformações sociais iniciadas na gestão de Hugo Chávez. Mesmo sob o assédio político, o contexto econômico internacional desfavorável e a sabotagem da burguesia local, os herdeiros políticos de Chávez dão andamento aos projetos sociais em benefício da maioria desprivilegiada. Nos últimos seis anos, a Misión Vivienda entregou 1,4 milhões de novas moradias (casas e apartamentos de qualidade) a famílias de baixa renda. Os programas de saúde, educação e aposentadoria seguem em plena vigência, sem cortes. Para fazer frente à escassez, foram criados os Comitês Locais de Abastecimento e Produção (CLAPs), que fornecem alimentos subsidiados para grande parte da população.

O tempo político na Venezuela se acelera e tudo pode acontecer nas próximas semanas. Cada momento é crucial. Ou a Revolução Bolivariana supera a paralisia burocrática dos primeiros anos após a morte de Chávez e alcança um novo patamar de radicalidade política, impondo uma derrota decisiva à burguesia e ao imperialismo, ou será esmagada de forma sangrenta, com consequências terríveis para o povo venezuelano.


Igor Fuser é doutor em ciência política pela USP e professor de relações internacionais na Universidade Federal do ABC (UFABC), em São Bernardo do Campo (SP).





quinta-feira, 13 de julho de 2017

A GUERRA SEM GUERRA NO BRASIL

Muitos brasileiros tinham esperança, ou ao menos expectativas, na atuação da Justiça. Mesmo sabendo que os tribunais brasileiros são lentos, formais e que se expressam num leguleio que poucos entendem – mesmo assim! – esses brasileiros tinham esperanças. Não podíamos crer, materializar, o dito antigo de que a Justiça no Brasil é feita – e com dureza! – apenas para ladrão de galinhas. “Para os amigos tudo, para os inimigos a Lei!”.

Muito menos podíamos imaginar que seria através de tribunais brasileiros que interesses estrangeiros declarariam guerra ao Brasil.

Uma guerra de novo tipo: uma guerra sem guerra, ou seja, uma guerra que usa meios não-bélicos para destruir, solapar, aniquilar a capacidade do adversário. Assim, utilizando-se de modernos meios tecnológicos – mídias digitais, propaganda massiva, formação de quadros de elite em universidades estrangerias, sistemas de estágios e bolsas de estudos em centros de treinamentos, etc… arma-se uma elite para atuar a serviço, consciente ou inconscientemente, desse poder estrangeiro.

O Brasil não seria o primeiro alvo. Na verdade Ucrânia, Líbia, Egito, Tunísia, Síria, Geórgia e Turquia foram alvos anteriores desse modelo novo de guerra – uma guerra que não precisava recorrer aos custosos meios tradicionais de luta com canhões, bombardeios e destruição de cidades.

Para funcionar a “guerra sem guerra”, precisa-se conhecer bem o ponto fraco do inimigo.

No caso brasileiro foi fácil: homens do talho de Victor Nunes Leal e Raymundo Faoro já apontavam para a chaga aberta do país – o caráter patrimonial do Estado brasileiro. O patrimonialismo, no perfeito conceito de Max Weber, permitiu que uma elite parasitária colonizasse o Estado e cooptasse tudo e todos que se apresentem como “o novo”, “o transformador”, “o renovador”. Trata-se do velho “transformismo” das elites, e de seu poder de cooptação, tão bem descrito por Jorge Amado em seu personagem “Doutor Mundinho”, de “Gabriela, Cravo e Canela”.

Cabia,assim, utilizar-se dos males propiciados pela elite corrompida do país como brecha para iniciar o ataque à soberania nacional. O interessante é que tal ataque a nossa soberania seria feita pela parcela, aparentemente, não corrompida dessa mesma elite. A elite “renovadora”, capacitada em centros estrangeiros,em nome de uma pureza que só o “outro perfeito”, “o estrangeiro”, “o espelho” em que devemos nos mirar e, assim, deixar de ser o que somos para ser a cópia mascarada do “Outro” colonizador, renega sua própria gente, sua história e suas tradições.

Com tudo isso destrói as bases da própria soberania nacional.

A Operação Lava-Jato abriu, sim, para muitos, a esperança de que as coisas mudariam: o patrimonialismo de mais de quatro séculos seria arrancado pelas raízes e o país seria “passado a limpo” – mas, infelizmente, só miravam no espelho do Outro, do estrangeiro.

Depois de seus cursos e estágios no exterior se sentiam prontos para a hercúlea tarefa de “limpar” o Estado brasileiro, tomando-a como “missão”. De qualquer ponto que puxassem o fio viria o novelo de pecados da história-pátria: propinas, sinecuras, prebendas, filhotismo, estelionato, favoritismo, peculato, e tanto mais… Contra uma “história feia”, a nossa, a da própria pátria, considerada viciosa, antepunham a história virtuosa do outro”, sem saber que a história desse “Outro” é uma pura construção mítica, ideológica, benzida na pia da religião.

Incultos na sua erudição, tomaram o mito d´Outro como história.

Iniciaram-se, então, os procedimentos jurídicos, o flanco da “guerra sem guerra”, a primavera do Brasil: afinal poderosos iriam para prisão. E realmente foram. Foram mesmo? Bem, Eduardo Cunha – uma unanimidade nacional, uma espécie de “meu malvado predileto” da Nação – mas, só depois que cumpriu seu papel, o de defenestrar Dilma Rousseff do seu cargo via acusações que seriam nos meses seguintes “fichinha”, “crime” de freira de colégio interno, face ao chorume a vazar do Congresso Nacional nos meses seguintes ao seu impeachment.

Bom, prendeu-se Cunha com seu aspecto melífluo, sua voz dissimulada, suas mãos felinas e seu cabelo oleoso e com aparência de caspa severa – está lá! Condenado a 15 anos de prisão! No entanto, sua esposa – uma jornalista de grande experiência foi considerada inocente, pois não sabia de onde caía o dinheiro no seu generoso cartão de crédito… Há quem mais? Ah, não… Esse está livre; este outro… Fez delação e foi solto; aquele… hum, foi liberado e…. acolá outrem está em prisão domiciliar.

O próprio Cunha é personagem central de tramas noturnas da República e continua sendo personagem central no “esquema” (ou será “organização”, um sinônimo talvez de “quadrilha”) que sustenta com propinas e malas cheias o presidente em exercício. Portanto, é, em verdade, um homem mais livre que a maioria dos 204 milhões de brasileiros que não escolheram seu presidente e com passes de equilibrista esticam seus salários até o mês seguinte!

Ah, temos sim um prisioneiro da Lava-Jato: o Almirante Othon Silva, condenado a 43 anos de reclusão. Um homem que prestou inúmeros serviços à Pátria, que enfrentou terríveis forças internacionais para dotar o país de uma tecnologia única e avançada, resistindo heroicamente às pressões ocultas de grandes potências. Envergonhado, após a prisão, tentou o suicídio. Mostra caráter! Sérgio Cabral, Eduardo Cunha, qual outro político escreveu sequer uma linha de arrependimento? Nada!

Muito pelo contrário continuam, com recursos escusos, conspirando contra a ordem constitucional da República. No entanto o tribunal entendeu que o homem que dotou o país de alta e exclusiva tecnologia de ponta, um saber estratégico para a Nação, merecia uma pena 3.7 vezes superior ao mago do mal que presidiu o Congresso Nacional, o senhor Eduardo Cunha.

Temos, contudo, como explicar mais esse paradoxo: como permitir que um país com tantas riquezas como o Brasil pudesse se dotar de uma tecnologia nuclear autônoma? Tinha-se que exemplificar em alguém o castigo para parar, deter e nunca mais permitir a ousadia de uma mera colônia neo-extrativista de ser, de fato, um país verdadeiramente soberano.

Como se não bastasse, o mesmo tribunal, aliado a governos estrangeiros, condenam as empresas brasileiras. Isso mesmo, as empresas. Não condenam apenas os executivos responsáveis pelos atos de corrupção, condenam as empresas. Ou seja, em vez de julgar “CPFs”, o tribunal julga “CNPJs”. Condenando as empresas com multas bilionárias a serem pagas a governos estrangeiros, conseguem gerar desemprego massivo, destruição de postos de trabalho, extinção de modernas tecnologias, subdesenvolvimento e a retirada do Brasil de mercados duramente conquistados.

E os executivos? Bem, esses são “premiados” e vão para casa! Uma tornozeleira aqui, outra ali; uma retenção de passaporte de um e de outro não… e para outros nenhuma punição! Ou seja, as empresas, os “CNPJs”, são condenadas, caminham para extinção, o desemprego campeia, os trabalhadores sofrem e os executivos – “CEOs”, gostam de dizer! – vivem feliz o resto da história!

Nem as empresas que colaboraram, e mesmo colocaram em funcionamento o Holocausto durante o Terceiro Reich, foram punidas desta forma. A punição recai sobre seus proprietários e executivos e hoje são orgulho da nova Alemanha.

Enquanto isso, outros produtores/fornecedores internacionais, concorrentes do Brasil, ocupam fatias crescentes de mercados tradicionalmente do país. A capacidade de agregação de valor despenca e cada vez mais nos aproximamos de uma situação de colônia neo-extrativista.

Trava-se, assim, uma “guerra sem guerra” na qual o futuro da soberania nacional está em jogo. E o mais triste de tudo é que o povo brasileiro nada sabe sobre guerras.


Por Francisco Carlos Teixeira da Silva professor titular de História Moderna e Contemporânea da UFRJ e do departamento de História da UCAM. Professor-Emérito de Estratégia Internacional da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército Brasileiro


domingo, 9 de julho de 2017

O PAÍS DAS FARSAS


O descobrimento do Brasil foi uma farsa. Oficialmente foi um descobrimento casual, na prática foi um “achamento” proposital e organizado. Imagina Cabral com cara de tacho dizendo “Oh! Jesus! O que acabo de descobrir” e depois dando risada com os amigos dizendo “zoei de todo mundo o pá”!


A nossa “independência” também foi farsa. Vendida como um fato heroico que culminou com a romântica imagem de D. Pedro erguendo a espada contra todos e contra tudo, foi, na verdade, um grande acordo internacional, promovido pela Inglaterra e por nossas elites.


Só quem pagou mico, embora não fosse burro, foi D. João VI, que teve que deixar todo o conforto em Portugal para se mudar para o fim do mundo, que era aqui, abrir os portos rompendo o monopólio.


No Brasil Império as farsas foram abundantes.


A Guerra da Cisplatina que foi feita para ser perdida, a posse de um novo monarca de apenas cinco anos, assim como as leias abolicionistas que eram feitas para manter a escravidão, entre outras mentiras.


Já no nascimento da República tivemos um voto que se dizia universal, mas que excluía mulheres e pobres, ou seja, quase todo mundo e trinta anos de uma democracia mentirosa cujos votos eram tão direcionados que foram apelidados de voto de cabresto.


Já em 1930 a República Velha chega ao fim com uma revolução que não foi revolução e colocou no poder Getúlio Vargas que, por sua vez introduziu o Brasil no mundo industrial, porém, criando uma política sindical que castrava os próprios sindicatos.


O próprio Getúlio seria levado ao suicídio em agosto de 1954 vitimado por uma das maiores farsas de nossa história, o “Atentado da Rua Toneleros” onde se organizou um teatro que visava derrubar o presidente, mas que deu errado e acabou matando um aliado e deixando seu mentor, Carlos Lacerda, sem ter como explicar um tiro na perna com calibre diverso do agressor.


Mas, tudo bem, no país das farsas a verdade não vem ao caso.


No período militar enquanto o país mergulhava numa ditadura que rasgava a Constituição, governava por decreto, prendia, torturava e matava, os governantes e seus aliados divulgavam a ideia de que vivíamos em plena democracia. Brasil, Ame-o ou Deixe-o, como se as dificuldades fossem por culpa dos governados ou dos presos que, por sacanagem morriam durante as torturas só para deixar mal os governos dos generais.


O Brasil, portanto, tem largo know-how em criar mentiras. E viver farsas. Nosso povo já se acostumou.


Por isso, não deveria ser de surpreender ver um impeachment que teve êxito sem nenhum ilícito praticado pela autoridade. Ou um juiz que é visto aos abraços com políticos envolvidos e, mesmo assim, é levado à sério.


Deveria, mas felizmente ainda somos capazes de nos surpreender e indignar.


Esse país é o país das farsas.



Prof. Péricles

sábado, 8 de julho de 2017

O PAPELÃO DE AÉCIO


Nada do que aconteceu no Brasil, nos últimos dois anos e meio, estaria acontecendo se o candidato das elites e da militância cheirosa tivesse vencido as eleições.



Não haveria golpe, não haveria crise política, o Judiciário continuaria escondido sob o manto da falsa neutralidade, a imprensa noticiaria, dia após dia, incessantemente, o sucesso da grande virada ‘democrática’ que enterrava de vez a abominável era PT.



Não haveria sangria para estancar. As instituições estariam ‘funcionando’ a todo o vapor para restabelecer o engavetamento geral da república e, ao mesmo tempo, desencavar podres da administração petista, legitimando, por conseguinte, o mais completo desmonte do estado brasileiro.



Dilma não seria vítima de um golpe, mas apenas uma derrotada nas urnas. E é impossível imaginar a ‘ex-terrorista’ vindo a público para dizer que faria de tudo para que o Brasil fosse parado à força.



E, enquanto os direitos dos trabalhadores estivessem sendo surrupiados, enquanto o patrimônio nacional estivesse sendo entregue e, por fim, quando a redução do estado chegasse ao tamanho que só cabem banqueiros e rentistas, a mídia estamparia em suas capas de jornais e revistas: ‘Este É Um País Que Vai Pra Frente’



Que crise não há e que a ‘liberdade’, antes negada pela ditadura bolivariana-petista, estava de volta ao país.



Aécio seria reeleito, em 2018, no primeiro turno, assim como foi FHC. (a história se repetiria).



Mas Aécio não se elegeu. Faltou muito pouco: Dilma 51,64% – Aécio 48,36.



E a votação fantástica que a direita conquistou, depois de tudo que os governos do PT fizeram desde 2003 só foi possível pela idiotização da opinião pública e pelo apoio de famosos que ilustram as telas da TV, dia sim, dia não, em horários bem nobres nos mais longínquos e modestos lares da população brasileira.



Associar a imagem de um artista famoso a uma campanha sempre deu certo, não?



No caso do Aécio, mesmo com o governo desastroso que ele fez em Minas, mesmo sendo oposição a um dos projetos mais eficazes contra a fome, a miséria e a desigualdade, mesmo contra todas as possibilidades reais, ele quase venceu, e nas urnas.



Quase venceu com o apoio da elite, da mídia e de artistas – roqueiros universitários e sertanejos ensino médio – que testemunharam em seu favor: “Quem conhece Aécio, confia”. Como quem diz: se eu, um rico e famoso confio, por que tu, pobre trabalhador, não iria confiar?



Isso, sem falar, é claro, que teríamos evitado a invasão dos médicos cubanos, da marinha boliviana e das tropas bolivarianas de Maduro.



Os símbolos são capazes de alterar a realidade e criar, no senso comum, uma ilusão coletiva a ponto de esquecerem a realidade de sua própria vida, que mudou pra melhor, em troca de um mundo de fantasias com direito a trama e roteiro escritos por quem sequer mora no Brasil.



Desconsiderar que essa simbologia nos agride diretamente é desconsiderar a luta histórica de classes. Como foi escrito, nalgum tempo remoto, por algum alemão incomodado com a exploração do capital.



PS: Enquanto escrevia este texto, ainda não havia sido noticiada a decisão de Marco Aurélio Mello sobre a volta de Aécio Neves ao Senado.



Por Fernando Brito