domingo, 26 de maio de 2013

FILHO DESSA RAÇA NÃO DEVE NASCER



Rendo minhas homenagens à memória de meu pai, Paulo Fonteles, advogado de posseiros no Sul do Pará, assassinado pelo latifúndio em 1987 e a minha mãe, Hecilda Veiga, a pessoa mais íntegra que conheço nesta vida e que, com o destemor de ter me feito nascer, em meio ao Pelotão de Investigações Criminais, em fevereiro de 1972, revelou inexorável bravura ao ponto de um agente da repressão política, dentro da Polícia Federal, cunhar a frase: “Filho dessa raça não deve nascer”.

No dia de meu nascimento, em 20 de fevereiro de 1972, minha mãe asseverou:
“(…) levaram-me ao Hospital da Guarnição em Brasília, onde fiquei até o nascimento do Paulo. Nesse dia, para apressar as coisas, o médico, irritadíssimo, induziu o parto e fez o corte sem anestesia. Foi uma experiência muito difícil, mas fiquei firme e não chorei (…)”.

Minha mãe, Hecilda, afirma ainda que o tal médico disse-lhe que ela não gostava do filho, simplesmente porque não sofria.

Uma das lembranças mais antigas que tenho sobre mim mesmo está no fato de ter nascido na prisão e de ser filho de comunistas. Minha avó, Cordolina Fonteles de Lima, contava que os agentes da repressão atrasaram minha entrega para a família, por horas, porque simplesmente não haviam encontrado algemas que dessem em meus pulsos de recém-nascido, eles deviam me achar bastante perigoso!

Não tenho dúvidas que herdamos de nossos pais, seus destemores e convicções. A canção de Belchior, cantada pela mais bela voz feminina em todos os tempos de civilização brasileira, a de Elis Regina, está prenhe de verdade quando afirma que “ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”. Neste caso, Paulo e Hecilda, por seus valores fraternais devem sempre ser seguidos pelos filhos, o que nos dá a régua e o compasso.

Se este é meu depoimento, vou falar de um tempo em que, menino, testemunhei a retomada de meus pais na luta do povo, meu pai no campo e minha mãe na cidade. Poderiam ter se acomodado, poderiam ter cuidado de suas próprias vidas, o que seria justo diante das memórias do cárcere. Mas não, retomaram às posições de combate!

E ali estávamos nós, crescendo como crescem as árvores. As histórias da carochinha contadas eram sempre de guerrilheiras tartaruguinhas contra um jacaré de fardas que viviam no Araguaia.

Debruçado na defesa dos camponeses pobres e procurando reunir informações sobre a heroica luta rebelde araguaiana, meu pai, Paulo Fonteles, mais uma vez passou a sofrer a carga da reação, de famigerados como o Major Curió, do Centro de Inteligência do Exército (CIE) e do grande latifúndio, aliados incontestes na espoliação da Amazônia, sempre em benefício dos poderosos, sejam eles nacionais ou estrangeiros.

Moramos em Conceição do Araguaia e tínhamos o imenso rio dos karajá em nosso quintal. Por aqueles dias já convivíamos com os lavradores e os filhos destes, como é o caso dos filhos de Amaro Lins e de Neuza, Vladimir, Carlos e Mauricio, além de Helenira, amigos para todo o sempre.

Por conta de uma atuação radicalmente vinculada à luta dos lavradores conheceu, mais uma vez, as ameaças contra sua própria vida e a vileza dos donos do poder de então. Foi eleito deputado estadual em 1982 sob a consigna de “Terra, Trabalho, Liberdade e Independência Nacional”.

Foi assassinado à mando da União Democrática Ruralista (UDR), quando se votava o Capítulo da Terra. O intermediário de tamanha covardia foi James Sylvio de Vita Lopes, da OBAN e do SNI, que, nos auspícios do regime moribundo, foi organizar milícias da grande propriedade rural na Amazônia.

Naqueles dias eu tinha 15 anos e para não enlouquecer decidi ingressar nas fileiras do Partido Comunista do Brasil. Era minha saída e a forma de me organizar para enfrentar o futuro.

É preciso que as Comissões de Verdade façam as ligações na perspectiva de traçar um paralelo comum entre essas vivências de filhos de presos políticos e dos inúmeros centros de detenção de menores, criados durante a ditadura como a FEBEM e que na vida democrática não mudou seus métodos e, como é o caso de São Paulo, onde a tortura se esconde travestida pelo pomposo nome de “Fundação Casa”.

Apenas agora nos debruçamos sobre a infância na ditadura militar e há um caminho extenso a percorrer. Tal caminho seguramente irá nos levar aos filhos de camponeses e crianças indígenas, além dos casos de filhos de militantes políticos, já bastante relatados.

Há dois anos conheci o Sebastião, ex-motorista do Incra durante a Guerrilha do Araguaia, na cidade de Marabá. Tal pessoa relatou-me sua revolta em lembrar, de que na Base da Bacaba, que havia uma ala de tortura apenas para crianças e jovens, filhos dos sertões naquele país profundo e desigual. Naquelas condições é que as filhas de Adalgisa e Alfredo, amigos dos combatentes, de São Domingos do Araguaia, foram seguidamente estupradas quando trabalhavam em regime de escravidão naquela terrível base militar. Isso sem falar na mocidade indígena, aikewara, que apenas agora começa a relatar as barbaridades sofridas. Todos eles têm direito a reparações.

Aqui termino com o registro poético de meu pai que assim relatou meu nascimento em Força e Arte:

“A criança nasceu.
A mãe passa bem.
Apesar de todas as proibições
bebamos vinhos até a embriaguês!
Quem é que pode com povo?”

Paulo Fonteles Filho
Depoimento na Comissão da Verdade

sexta-feira, 24 de maio de 2013

INFÂNCIA ROUBADA



em www.redebrasilatual.com.br/politica

Cecília Capistrano, neta do militante Davi Capistrano e sobrinha do ex-prefeito de Santos Davi Capistrano da Costa Filho, chorou muito e emocionou o público com seu depoimento na 36ª audiência pública da Comissão da Verdade de São Paulo, que iniciou o seminário "Verdade e Infância Roubada", com testemunhos de pessoas que, durante o período da ditadura no Brasil (1964-1985), eram crianças e sofreram a brutalidade da repressão, física ou psicologicamente.

A fala de Cecília, nascida em 1975, dividiu-se entre a memória do avô e a luta da própria mãe, Maria Cristina Capistrano, torturada no DOI-Codi. Sua mãe, militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), foi presa em 1971 junto com seu filho mais velho e irmão de Cecília, então com quatro anos. A criança ficou sob a custódia de policiais. David Capistrano, segundo se apurou, foi levado para a chamada Casa da Morte, em Petrópolis (RJ), e nunca mais foi visto.

O avô de Cecília foi seqüestrado em 16 de março de 1974, em algum lugar entre Uruguaiana (RS) e São Paulo, para onde se dirigia para ver a família. “O que a gente sofre é uma coisa invisível, a gente fica procurando onde afetou”, disse Cecília. “Não queremos revanche, vingança, mas justiça. Queremos saber quem são os que fizeram aquilo, as pessoas têm nome.”

Rosana Momente, filha do operário Orlando Momente, desaparecido em dezembro de 1973, aos 41 anos, no Araguaia, contou que só soube o que ocorreu com o pai aos 15 anos, por meio de uma prima. Rosana morou por quatro anos em um orfanato católico e com os avós, em Rio Claro (SP). Os acontecimentos decorrentes da repressão, entre os quais jamais ter tido uma residência fixa ou uma família estável, provocaram profundas cicatrizes psicológicas.

“A gente sabe o que é a depressão já na infância”, disse Rosana. Seu pai, militante do PCB e depois do PCdoB, saiu de casa e, embora visitasse a família periodicamente, não voltou a vê-la a partir de 1969. Antes de desaparecer, ele viveu no norte de Goiás e posteriormente no sul do Pará. Em 1974, meses depois de seu sumiço, uma amiga de Orlando na região do Araguaia e esposa de um camponês também desaparecido, Joana de Almeida, encontrou um corpo em decomposição em seu sítio, onde era proibida de ir pelo Exército. Um chapéu de couro de curtido teria dado a Joana a certeza de que aquela era a ossada de Orlando Momente.

“O que me deixa triste é que as pessoas tentavam ajudar as outras e acabavam presas, torturadas e mortas”, contou Rosana na Assembléia. “Minha mãe era trabalhadora doméstica, então eu ficava nas casas cheias de coisas caras e pássaros empalhados.”

Paulo Fontelles Filho nasceu na prisão. Sua mãe, Hecilda Fonteles Veiga, era estudante de Ciências Sociais quando foi presa, em 1971, em Brasília, com cinco meses de gravidez. Num depoimento reproduzido na audiência pública, a mãe de Paulo contou: “Quando fui presa, minha barriga de cinco meses de gravidez já estava bem visível. Fui levada à delegacia da Polícia Federal, onde, diante da minha recusa em dar informações a respeito de meu marido, Paulo Fontelles, comecei a ouvir, entre sob socos e pontapés: ‘Filho dessa raça não deve nascer”’.

Segundo Hecilda, hoje com 64 anos, ela foi colocada na chamada “cadeira do dragão”, apanhou no rosto, pescoço e pernas e foi submetida à “tortura cientifica”. “Da cadeira em que sentávamos saíam uns fios, que subiam pelas pernas e eram amarrados nos seios. As sensações que aquilo provocava eram indescritíveis: calor, frio, asfixia”.

O parto de seu filho Paulo, segundo o relato, foi feito por cesariana sem anestesia, “para apressar as coisas”.

Na abertura da audiência pública no Auditório Teotônio Vilela da Assembléia Legislativa, foi exibido o documentário “Os 15 filhos (1996)”. Dirigido por Maria de Oliveira Soares e Marta Nehring, o filme, de 20 minutos, reúne depoimentos de filhos de militantes políticos que sofreram as conseqüências dos “anos de chumbo”.

As diretoras produziram a película para fazer parte do seminário Revolução Impossível, de 25 a 28 de março de 1996, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em homenagem às vítimas do regime. A temática é a mesma abordada pela audiência pública realizada pela Comissão da Verdade de São Paulo.

sábado, 18 de maio de 2013

A CAIXA DE PANDORA



As mulheres são seres iluminados, mas complicadas, complexas, imprevisíveis, instáveis.

Diferem do homem de forma emocional e cultural, além da própria tradição e mitos criados em torno de si.

Sabemos muito do cosmos, das relações físicas, do fundo do mar, mas sabemos pouco desse misterioso ser.

Em suas variantes como filha, mulher, mãe, namorada, etc ela continua, como antes, a ser a protagonista maior das nossas melhores e das nossas piores cenas.

Entender uma mulher é algo que poucos conseguem.

O significado do “nada” dito por uma mulher ou “não estou te acusando” permanecem a desafiar nossa compreensão.

Sacerdotes budistas e eremitas após anos e anos de reflexão dizem conseguir entendê-las, mas é um conhecimento inútil, pois já não há mais utilidade prática.

Selvagens e submissas, conservadoras e revolucionárias, piedosas e cruéis, sedutoras e vingativas, tudo isso num só ser é demais para nossas humildes cabeças masculinas.

Um povo, porém, parece ter compreendido a mulher como nenhum outro, os gregos.

Poucos como eles expuseram as mais íntimas características desse estranho ser.

E isso, fizeram com grande talento, nos contando as coisas a partir de seus mitos, como, por exemplo, na fascinante narração da Caixa de Pandora.

Essa história foi contada pelo poeta grego Hesíodo, um homem do século VIII AC.

Era um homem sábio que dizia “sem mulher, a vida do homem é impraticável, e com mulher impossível”. É ele que nos relata:

O titã Prometeu roubou o fogo do Olimpo e o revelou aos homens. Zeus, o Deus dos deuses” ficou indignado, pois esse segredo deveria ser vedado aos homens. E quando Zeus se indignava praticava o passatempo preferido dos deuses, a vingança. E a vingança de Zeus era implacável.

Prometeu foi amarrado a um rochedo e tinha seu fígado devorado por uma águia. Durante a noite um novo fígado crescia e no dia seguinte a águia retornava e o martírio se repetia. Nem o DOPS bolou um sofrimento tão grande.

Mas Zeus queria se vingar dos homens também e para isso elaborou um plano. Um plano ardiloso.

Criou a primeira mulher, extremamente linda, a quem chamou de Pandora. Antes, porém, convocou os deuses para uma reunião e determinou que cada um colocasse uma desgraça dentro de uma caixa. Apenas um único dom, a esperança misturou-se as maldições.
Em seguida deu essa caixa, na verdade um jarro, à Pandora (a primeira mulher, lembra?) e ordenou que fosse viver com os homens.

Detalhe importante para entender o maquiavelismo de Zeus: não revelou a Pandora o que havia dentro da caixa e ordenou que ela não a abrisse, sob nenhuma hipótese.

Zeus conhecia muito bem sua criação e sabia que nenhuma mulher conseguiria suportar tamanha curiosidade.

Como sabemos bem, Zeus estava certo. Pandora resistiu por dias, mas, finalmente disse a si mesma que não faria mal nenhum dar apenas uma olhadinha. Então abriu a Caixa para ver o que tinha dentro e zás todas as desgraças como orgulho, ódio, doenças, medo, egoísmo etc. escaparam da caixa. Assustada Pandora ainda tentou fecha-la, mas, conseguiu reter apenas a esperança.

A partir desse dia todas as desgraças passaram a conviver com o homem, além de Pandora e suas descendentes, como essa mesma que você agora tem a seu lado.

O que estariam nos dizendo os gregos sobre a mulher?

Primeiro nos alertam sobre a curiosidade feminina, que, convenhamos,longe de ser um defeito, é uma das melhores características do pensamento humano. Se é verdade que a ciência tornou nossas melhores vidas, também é verdade que foi a curiosidade que criou a ciência.

Se a falta de controle sobre a curiosidade foi à responsável pelo surgimento de todas as desgraças humanas é fato que o que nos faz evoluir são as dificuldades que as desgraças nos trazem o que provoca a busca da superação dessas dificuldades. Não houvessem desafios a serem superados o homem, provavelmente permaneceria inerte perante a vida.

Nos chamam a atenção de que apesar de todos os desafios e de todos os sofrimentos, o homem segue em frente porque é movido pela força invencível da esperança, e essa, a esperança é o dom que Pandora mantém e com a qual irá buscar se reabilitar perante os homens. A mulher, muito mais do que o homem, acalanta a esperança renovadora e fiel.

Hesíodo sabia muito de mulher. Eis aí um cara que valeria a pena conhecer e conversar, numa roda de cerveja (um modo bem melhor de comprometer o fígado do que o de Prometeu). Com certeza rindo muito de Zeus, que pensando nos estar sacaneando, nos presenteou com a mais maravilhosa de suas criações.

Prof. Péricles



UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA



Por Rogerio Diaferia Rossi

Em meio a essa polêmica de médicos cubanos e revalidação de diplomas, eu que sou médico brasileiro e estrangeiro, que trabalhei alguns anos em áreas inóspitas como hospitais e postos de saúde dentro de favelas, e também em hospitais públicos e privados de centros urbanos, que fui coordenador de pronto atendimento, que trabalhei até no meio do mar sem auxílio de profissionais de enfermagem, vou deixar minhas reflexões...

A primeira é que considerei mais do que injusto o longo, tortuoso, e caríssimo processo por que passei para ser médico no Canadá. Mesmo tendo cursado ótima faculdade pública, tendo feito 2 anos de internato (aqui no Canadá eles não fazem); Antes de entrar na residência eu tive que passar em 3 provas que os canadenses só fazem durante ou depois dela! Mas isso não ocorre para todos, pois médicos ingleses, franceses e dos EUA tem diploma automaticamente revalidado. O Canadá necessita muito de médicos, pois existe um funil rumo aos enormes salários dos EUA, mas nem por isso eles facilitam a vida de profissionais preparados que já vivem aqui. Existem milhares de médicos do mundo todo nos caixas de supermercado, dirigindo táxi aqui, e isso mesmo depois de já terem passado nas provas. E existe mesmo aqui, meus caros, uma numerosa população carente de médicos, só para não esquecermos que o mundo não gira ao redor dos umbigos dos diplomados em medicina...

Em seguida, conto que conheço de perto 10 médicos que fizeram medicina em Cuba, trabalhei de perto com eles e posso afirmar que suas condutas e posturas foram mais corretas e éticas do que a da maioria dos colegas brasileiros com que convivi. Cada uma que eu já vi... sem contar que meu pai morreu de enfarte após ter esperado por 9 horas em um pronto socorro público o médico que estava incomunicável por BIP...

Em terceiro, pergunto: os médicos brasileiros passam por algum processo de permissão de exercício no Brasil? Resposta: não. É só se formar em faculdades sem hospital, sem acesso a internato ou à rotação em atenção básica e já podem portar o porte de arma mais conhecido como CRM. Nos países sérios, se é isso que vocês tanto querem para o Brasil, o médico só pode trabalhar depois de ter passado no exame de ordem do CRM, depois de ter feito residência e depois de ter passado na prova de título de sua especialidade. Vocês realmente acham que um formado de Presidente Prudente e afins é melhor preparado do que um de Cuba???

Falando nisso, em quarto, eu pergunto, qual é a qualidade dos profissionais que atendem emergências e atenção básica públicas no Brasil? Resposta: a enorme maioria não fez nenhuma residência médica, pula de um emprego para o outro atrás do melhor pagamento, falta mais do que trabalha, chegam quase sempre atrasados aos plantões, poucos possuem certificação de ressuscitação ou de trauma, valorizam os empregos caixa 2 para não pagar imposto. Nos anos em que trabalhei no PSF (Programa de Saúde da Família) vi a enorme rotatividade de médicos em busca de mais privilégios, como dia de folga remunerado (day-off), flexibilidade de horário (poder não cumprir o horário), benefícios e salários maiores. Os pacientes das favelas em que trabalhei, sempre falavam que sabiam que o médico (muitas vezes eu) não iriam durar mais do que alguns meses... Muito triste, ainda mais nessas situações onde os cuidados necessários são contínuos.

A saúde brasileira necessita de muita coisa, de muito investimento, de muita competência, principalmente por parte dos médicos. Mas o que ela mais necessita, é de respeito, de pessoas que valorizem o sofrimento do povo mais vulnerável, os pobres. E os médicos que criticam tanto o governo do PT, não criticaram o governo do PSDB que demorou um ano para aprovar o plano de carreiras dos médicos servidores públicos. Por que será? Eles estão é mais interessados em entrar nas residências médicas que mais dão dinheiro e comodidade, como consultório particular lotado. Prova disso é sermos campeões mundiais em cirurgias plásticas estéticas, continuarmos a priorizar a cesárea ao invés do parto vaginal, termos centenas de concorrentes para dermatologia ou endocrinologia para 2 ou 3 vagas, e, às vezes, nenhum candidato para cursar medicina de família e comunidade.

O Brasil necessita de mais médicos nas periferias e áreas rurais SIM. Vocês querem ir trabalhar lá? Dados do Ministério da Saúde mostram que no Brasil existe 1,8 médico para cada mil habitantes. Na Argentina, a proporção é de 3,2 médicos para mil habitantes e, em países como Espanha e Portugal, essa relação é de 4 médicos. No início do ano, os prefeitos que assumiram apresentaram ao governo federal uma série de demandas na área de saúde. Entre os pontos destacados estava a dificuldade de atrair médicos para as áreas mais carentes, para as periferias das cidades e para o interior. O governo brasileiro pretende atrair não somente médicos cubanos para trabalhar nas regiões mais carentes do País, mas também profissionais de Portugal e da Espanha.

Vejo que isso se trata muito mais de uma questão de saúde pública, do que proteção de nicho de mercado de um classe já muito privilegiada. Mas claro que o PT e Cuba são sempre motes para as mais reacionárias indignações.


domingo, 12 de maio de 2013

DIA DAS MÃES E SILÊNCIO



Hoje segundo domingo de maio, como todos os anos, no Brasil, comemora-se o dia das mães.

É comovente observar filhos ao lado de suas mães. Mãos entrelaçadas como nos tempos de atravessar as ruas.

As churrascarias estão lotadas, nem pensar em chegar a alguma delas sem ter reservado antes.

Os parques coloridos em cenas de filhos de todas as idades abraçados com suas progenitoras nos fazem acreditar que o amor não tem prazo de validade.

Presentes comprados para a vaidade eterna das mulheres em todas as idades e flores, muitas flores. A cidade chega estar perfumada.

O dia das mães reaproxima corações inclusive aqueles que guardam alguma mágoa, como se fosse uma trégua na guerra muda das relações humanas.

É um dia de reencontros, de reafirmações de afeto e de renovação de esperanças.
“Mamãe não morre, é imortal” pensamos quando crianças e depois, adultos costumamos viver com essa secreta esperança escondida na alma.

É a mulher mais poderosa do universo capaz de acabar com nossa dor com um simples sopro.

Ah se mamãe estivesse aqui... isto não doeria tanto.

Permitam-me, porém, lembrar algumas das mães que merecem, e muito serem lembradas nesse dia.

Permitam-me lembrar das mães dos desaparecidos políticos da história recente do país.
Hoje, elas, mais uma vez como nas últimas décadas, não serão beijadas por seus filhos e filhas, não serão paparicadas, nem levadas a qualquer churrascaria.

Elas não terão seus filhos para passear no parque, ou para dar presentes simbólicos de carinho.

Hoje mesmo que tenham mais filhos, será um dia de silêncio para elas, pois não existem estatísticas ou compensações. Um filho é um filho e não pode ser substituído nem mesmo por uma dezena de outros filhos.

Essas mães brasileiras assim como todas as mães da América agredida por ditaduras e tão bem representadas pelas Mães da Praça de Maio, não sabem onde jazem os corpos de seus filhos amados.

Os nomes de seus bebês constam de listas. Mas as listas são frias e nada respondem. Esboçam nomes, e permanecem sisudas, e enigmáticas.

Num relato comovente de uma dessas mães ouvi a seguinte frase: “eu sei que minha filha está morta, claro que sei, mas, enquanto eu não enterrar seus restos e colocar seu nome amado numa lápide, eu sempre esperarei que ela chegue de repente na madrugada, com aquele sorriso de criança arteira, gritando meu nome”.

Com certeza os nomes das mães dos desaparecidos devem ter sido o último a escapar de muitos lábios vítimados pela violência sórdida e assassina.

Com certeza muitas dessas vítimas tiveram a figura de suas mães como última imagem antes da morte.

E é por eles, os desaparecidos políticos, assassinados nos porões imundos da ditadura, mas especialmente por suas mães, que tiveram o direito ao amor despedaçado pela repressão que celebramos esse dia, como um dia da vida, pois ela, a vida, continua insistente e como as ondas do mar ou a esperança de Pandora, e não há nada que impeça seu rumo.

A vida segue, mas as vezes tranca.

Pra elas, o melhor presente seria a simples informação de onde esconderam seus mortos. O que para a maioria não significa nada além de uma pequena noticia de jornal, para elas significa o fim de uma tortura inominável.

Se trazer suas crianças de volta é impossível, que se revele onde estão seus túmulos clandestinos.

O Brasil precisa fechar seus caixões.

Feliz Dia das Mães.

Prof. Péricles

sexta-feira, 10 de maio de 2013

AMÉRICA LATINA: SOMBRAS DA GUERRA



Por Cronicon.net


A presidente argentina Cristina Kirchner vem denunciando perante a comunidade internacional que a Grã-Bretanha - com o decidido apoio da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) - estabeleceu uma importante base militar nas Ilhas Malvinas, a partir da qual operam aviões de caça supersônicos, submarinos atômicos, e onde foi instalado um arsenal com o propósito de amedrontar o sul do continente. A Colômbia une-se a esta associação militar europeia, que está sob a autoridade e o controlo dos Estados Unidos, como único país latino-americano seu aliado.

Realmente, o governo colombiano enviou a sua vice-ministra da Defesa, Diana Quintero, à reunião da OTAN realizada na cidade de Monterrey no Estado da Califórnia entre 28 de Fevereiro e 1 de Março.

Segundo as informações à imprensa, a Colômbia é a única nação latino-americana que marcou presença nesta reunião da OTAN. Ao fim e ao cabo este país andino cumpre fielmente as orientações de Washington e segue sem falhas as estratégias do Pentágono e do Departamento de Estado, que lhe atribuíram a função de se consolidar como o Israel da América do Sul.

Merece a pena referir que os relatos oficiais colocam a ênfase na “honra” que constitui para a Colômbia ter sido o único país da América Latina convidado a participar neste encontro, denominado “Construindo Integridade”, que reuniu representantes militares de 138 países.

O convite a Colômbia, segundo o governo de Juan Manuel Santos, surgiu “graças ao reconhecimento dos seus progressos na boa utilização dos recursos do sector “Defesa”.

O objetivo da OTAN, com a acumulação de armamentos e tropas na América do Sul, é converter os mares do sul num enclave militar colonialista sob o absurdo pretexto de se tratar de um “santuário ecológico”. Trata-se, sem dúvida, de uma escalada da política imperialista e colonialista da Grã-Bretanha e dos seus aliados da OTAN que, como se sabe, estabeleceram uma importante base militar nas Ilhas Malvinas, a partir da qual operam aviões de caça supersônicos e submarinos atômicos.

O Ministério de Relações Exteriores da Argentina acusou o Reino Unido de, em cumplicidade com a OTAN, instalar armas nucleares próximo das disputadas Ilhas Malvinas e de militarizar o Atlântico Sul.

Para alguns organismos de direitos humanos é evidente que a inexistência de um poder militar antagónico equivalente no Atlântico Sul faz com que a presença armada de um país membro da OTAN nessa zona apenas possa ter um caráter agressivo. É uma clara ameaça do uso da força para preservar o estatuto colonial dos arquipélagos do Sul, por parte de um país que, é necessário não o esquecer, é uma potência nuclear e conta com o aval e a cumplicidade dos Estados Unidos.

A esta agressão une-se de forma cúmplice o governo colombiano de Juan Manuel Santos.

Contabilizam-se até este momento meia centena (47) de bases militares estrangeiras na América Latina. No arquipélago das Malvinas destaca-se a fortaleza da OTAN em Mount Pleasent, Isla Soledad, cuja pista maior tem um comprimento de 2.600 metros.

São as sombras da guerra na América Latina.