quarta-feira, 25 de novembro de 2015

UM RANZINZA EM PARIS


Por Apollo Natali


Outro dia me deu na telha de conhecer Paris. Ranzinzas como eu não devem ir a Paris.

Não me ligo a lugares, paisagens, museus, estátuas, viagens. História, sim. Tinha de ir a Paris. Sou chegado mais nos meus livros, no meu cachorro, no meu chuveiro, na minha cama de Romeu encalhado, na lembrança das mulheres que passaram.

Vidrado mesmo sou em gente e ideias. É isso.

Chegamos. Paris!

Nestas plagas só dá Torre Eiffel. É vista de qualquer canto, pois a cidade milenar é feita toda de prédios baixos, sem espigões. Estonteante, impactante a beleza desse entrelaçamento de aço de luzes douradas tremeluzentes que alcançam o céu.

O padre brasileiro Bartolomeu Lourenço de Gusmão, inventor do balão dirigível, esteve lá, faz alguns séculos, a dar voltas com seu brinquedo cheio de ar nessa torre da altura de um prédio de 100 andares.

Inaugurada em 1889 em comemoração ao centenário da Revolução Francesa, recebe pintura de 2 em 2 anos. Reformada a cada 7 anos. Está sempre lindamente nova.

Inquisição: o Santo Ofício cremou o padre brasileiro na fogueira, acusado de bruxaria por ter inventado o balão dirigível. Sabiam que Bartolomeu de Gusmão escondia dos inquisidores numa floresta os apetrechos do seu balão? Mais dia, menos dia, teria que subir. Foi pego. Só um ranzinza como eu pensa nessas coisas, em Paris.

Leia a placa da casa onde viveu Santos Dumont: o verdadeiro Pai da Aviação. Levantou vôo e aterrisou sob vivas no seu dirigível 14-BIS na Praça de Bagatelle, comecinho do século 20.

Os irmãos Wright, a História conta, não está na placa, isso digo eu, voavam com um fraquinho motor tipo um ponto zero. Esticavam um grande estilingue para pôr o avião no ar. Os manos americanos voavam em linha reta. Santos Dumont, motor potente, subia. Inventou apetrechos para dirigir a sua jeringonça para lá e para cá, para cima, para baixo, esquerda, direita. O brasileiro ainda cruzou os céus de Paris no seu Demoiselle, quer dizer Senhorita, um aviãozinho lindo lindo que voava como uma vespa, o delírio da Belle Èpoque. Grande Santos Dumont, resmunguei. 

O pessoal da fila acho que não entendeu.

Eis o Largo da Concórdia, não o do bairro do Brás, em São Paulo e, sim, o francês, o De la Concorde. É a praça onde a Revolução Francesa decepou na guilhotina o pescoço de mais de 20 mil nobres e aristocratas. Tanta pompa, tanto brilho, tanta arrogância, brutais relações de domínio sobre a pessoa, para, enfim, ficar todo mundo sem o mais valioso bem da espécie humana, o pescoço. O público se amontoava dias antes para ver o morticínio.

Fui dar uma olhada na rua Dè Sevres, onde viveu o líder de outra revolução que se seguiu na França, 60 anos depois desse corte em massa de cabeças. Uma revolução espiritual, liderada pelo ex-ministro da Educação do país, cientista, professor de astronomia, física, química, diretor do Instituto Educacional Pestalozzi, na Suíça, messieur Alan Kadec.

O novo revolucionário mostrou no seu livro O Céu e o Inferno o lugar para onde vão as almas dos déspotas depois da morte do corpo físico, os tiranos de todos os tipos, os do Estado, os domésticos, os midiáticos. O livro descreve a Justiça Divina, segundo o Espiritismo.

Estou de frente para a viela onde Alan Kardec morou e codificou as leis que regem o intercâmbio entre o mundo espiritual e o mundo físico, a chamada Doutrina Espírita.

A Rue Dè Sevre é hoje uma via de passagem deteriorada, abandonada, esquecida, as casas parecendo desabar.

Durante a realização, no século vinte e um, de um encontro espírita mundial, me contaram, a polícia cercou o pavilhão dos espíritas. As lojas de Paris exibiam placas: proibida a entrada de cachorros e de brasileiros. Isso no coração da cidade-berço do Espiritismo. Uma revolução ao avesso.

No meio da praça histórica de La Concorde.

Nesse chão de La Concorde, a Rainha Maria Antonieta chora para não ver seus filhos morrer na frente dela. Suplica para ser guilhotinada antes. Negativo. A senhora vai ver com seus próprios olhos a maneira brutal e sanguinária como o seu governo tirânico matava os filhos dos outros, rangem os revolucionários. Rios de sangue não teriam se formado, talvez, se a Rainha não tivesse mandado os pobres que não tinham pão, comer brioches. Infeliz rainha, desabafei irônica e ranzinzamente.

O passeio no metrô de Paris. Por baixo da cidade, uma rede de trilhos como teia de aranha com rodas de aço. Dão mapas para ninguém se perder no labirintão. Alguém já viu trens de metrô com pneus em vez de rodas de aço? Tem alguns, lá.

E não se vai a Paris sem ir ao Louvre. Um mundo de obras de arte e antiguidades juntas!

Para visitá-las todas, apregoou o guia do museu, levaríamos seis meses contemplando cada uma delas por um minuto e sem interrupção, nas 24 horas do dia. Ao delirar diante do encanto do original da obra mais visitada, a Monalisa, de Leonardo Da Vinci, apertado entre outros turistas, bateram-me a carteira. Do bolso de trás levaram-me os euros. Idênticas algumas ideias, lá como cá.

O Arco do Triunfo!

Em Roma, os legionários vencedores desfilavam por baixo do arco do triunfo deles. Em Paris, foram as tropas vitoriosas de Napoleão Bonaparte que cruzaram esse monumento francês. Decepção: o ranzinza aqui se amargurou lá, em plena Paris, com a reprise mental das tropas nazistas violando o Arco do Triunfo francês, chafurdando por baixo dele. Que horror.

No mais, uma visita à periferia de Paris me fez parecer que eu estava na Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro. Não me vi muito vidrado nas gentes da atual Paris. Os franceses que mudaram o mundo, hoje não se dão a mão ao se cumprimentar, não se abraçam, não são efusivos como gente italiana e brasileira como eu. Você lá, eu cá, assim me parecem os franceses de Paris.

Acontece que eu abomino um abismo afetivo entre seres humanos. Prefiro a calorosa Vila Cruzeiro. As francesas são lindas, lindas, eu vi, eu vi! As afetuosas vilacruzeirenses, muito mais.

Nada mais a declarar.




Apollo Natali foi o primeiro redator da antiga Agência Estado, foi redator da Rádio Eldorado, do Estadão e do antigo Jornal da Tarde. Escreve atualmete para diversos sites e blogs de notícia, como o Observatório da Imprensa.




segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A FLAUTA DE PÃ




Pã (para os gregos) ou Lupércio, Fauno ou Silvano (para os latinos) era o deus dos bosques e dos campos. Deus dos rebanhos e protetor dos pastores.

Numa versão Pã é filho de Dryope com o Deus Hermes (Mercúrio), mensageiro dos deuses.


Sendo filho de um deus transitório (entre os deuses e mortais) Pã seria um ser de forma transitória (entre antropo e zoo). É representado com orelhas, chifres, pernas e barba de bode.

Em outra versão ele teria sido um dos filhos de Zeus com sua ama de leite, a cabra Amalteia.

Na visão latina era um deus alegre, que adorava tocar sua flauta e dançar com as ninfas instigando a sensualidade. Nos bacanais (orgias sexuais de Baco, deus do vinho) era constante a sua presença.

Era um ser instável que às vezes podia ser perverso e em outras extremamente bondoso.

Em Roma havia um festival em sua homenagem (Lupercália), celebrado nos dias 15, 16 e 17 de fevereiro. Os sacerdotes que o cultuavam vestiam-se de pele de bode.

Os antigos romanos, nos tempos em que Roma era pouco mais que uma aldeia, temiam a fúria dos lobos famintos e rogavam a sua presença para mantê-los afastados.

Na visão dos gregos era um ser extremamente angustiado pelas zombarias causadas por sua estranha forma animal. Com o tempo, essa divindade tornou-se inspiração dos solitários.

Vivia nas grutas mais profundas, ou como andarilho sem destino nas matas e campos.

O silêncio e a tristeza emanados por Pã impregnavam de tal maneira os seus domínios (os campos, bosques e matas) que podiam atingir aquele que perambulava sozinho esses lugares fazendo brotar em seu coração um medo aparentemente sem sentido dando origem a palavra pânico (de pã).

Em sua homenagem Zeus criou a constelação de Capricórnio.

Já, os senhores da Igreja cristã primitiva associaram sua forma com o demônio e a sedução e luxúria com o som de sua flauta.





Prof. Péricles

sábado, 21 de novembro de 2015

A SOLIDÃO DOS REJEITADOS



Nasci numa noite fria, sem lua.

Feio e repulsivo.

Minha própria mãe, Dríope, me abandonou ao ver meu rosto.

Meu pai, Hermes, foi zombado de tal forma pela minha aparência que me proibiu de chama-lo de pai por toda a eternidade.

Na terra dos deuses belos e conquistadores, nasci com pés de bode, chifres e uma barba espessa e áspera.

Desde criança convivi com as galhofas e zombarias. Com o olhar divertido dos fanfarrões reconhecidamente belos.

Só me restava a solidão.

Passei a viver nos campos e nas matas.

Conversava com o sussurrar dos ventos nas folhas mortas, e agradecia a neblina alta que escondia meu rosto dos desavisados.

Minha dor sempre foi imensa e ela contagiou todo o meu reino, dos pastos aos picos mais altos, das matas verdejantes até a restingas e dunas.

 Passei a ser temido por todos os viajantes que tinham que atravessar as florestas à noite, pois na solidão da travessia, quando só ouviam as batidas do próprio coração era comum serem contaminados por minha melancolia e por um medo inexplicável de estar sozinho.

As ninfas zombavam de mim sem a menor piedade.

Por isso, jurei nunca me apaixonar.

Mas fui traído pelo desejo duas vezes.

Na primeira vez me apaixonei por Syrinx que como eu, amava a solidão apesar de bela e encantadora.

Mas, ela preferiu a solidão eterna dos caniços a se entregar a uma entidade bizarra como eu.

Na segunda vez foi pela ninfa Pítis, que era tão bondosa e tinha o coração tão doce que conseguiu ver em mim mais do que a forma deprimente.

Mas Pítis era amada por Bóreas, o maligno vento do Norte que, num acesso de ciúmes soprou com tamanha impetuosidade que jogou minha amada ninfa num precipício sem fim.

Pítis foi transformada por Zeus numa árvore consagrada a mim (Pitis, pinheiro em grego).

Cada vez mais sofrido e isolado fiz uma flauta com sete tubos.

Meu irmão Cupido à abençoou e me disse que seus sons mágicos deixariam enfeitiçadas as mais belas, apaixonadas pela doce música de minha flauta.

Cupido me disse que o coração da mulher, quando enfeitiçado pela paixão, pode achar a beleza na alma de um homem e no seu talento, mesmo que dele nem mesmo o próprio homem suspeite.

Assim passei a jogar no ar os sons de minha dor misturados com a harmonia das saudades de Pítias.

As ninfas dançavam ao meu redor e me seguiam.

Mas, o amor enfeitiçado não é amor verdadeiro e mantive minha jura de nunca mais amar ninguém.

Quem eu sou?

Eu sou Pã, a divindade protetora dos rebanhos. Deus dos bosques e dos pastos. Protetor dos pastores.

Mas também sou o deus dos rejeitados, o senhor da solidão e mestre do amor perdido.

Quando se sentir só, apure seus ouvidos nas janelas de seu quarto.

Se tiver o coração enfeitiçado ouviras minha música no gemido enlouquecido do vento, que como eu, nunca será de ninguém.



Prof. Péricles



quinta-feira, 19 de novembro de 2015

SÍRIA, A EQUAÇÃO DO INFERNO

Criança Síria se rende ao confundir uma máquina fotográfica com uma arma




País de largas planícies e de desertos, além de altas montanhas, seu relevo facilitou desde tempos remotos a fixação de várias etnias, onde se destacam os curdos, armênios e turcos.

A região era espécie de protetorado da França e se tornou independente, após o fim da segunda guerra mundial, mas precisamente em 24 de outubro de 1945.

Após a retirada das tropas francesas da região, apenas em 1946, o país passou por um período de instabilidade até que em 1963 surgiu um partido poderoso, o Partido Baath, que uniu a maioria dos sírios e deu um golpe, assumindo o poder.

A Síria é inimiga mortal de Israel que, desde 1967, ocupa militarmente, as Colinas de Golan, território sabidamente Sírio e onde os israelenses desenvolveram uma indústria moderna de aços finos, altamente lucrativa.

Ao longo dos anos afastou-se da esfera dos Estados Unidos, tradicional aliado de Israel, aproximando-se da União Soviética, mais tarde Rússia, além da China.

Hafez al-Assad governou de 1970 até 2000, e seu filho, o atual presidente, Bashar al-Assad governa desde então, ou seja, há 15 anos.

Em 18 de dezembro de 2010, na Tunísia, teve início uma série de revoltas de cunho nacionalista e popular, que se expandiria para vários países muçulmanos, denominadas de “Primavera Árabe”.

Em março de 2011, ocorreram revoltas contra Assad e contra o Partido Baath.

Para alguns essas revoltas foram consequência da onda democratizante da Primavera Árabe. Para outros ela foi criada pelos Estados Unidos e aliados dentro da Síria, interessados em derrubar Assad o mais importante aliado da Rússia na região.

Embora o governo Assad se destaque pelo autoritarismo e pela eternização no poder, também se destaca por políticas sociais que lhe davam forte apoio popular.

Talvez, por isso, os rebeldes não obtiveram todo o apoio esperado da população e, assim sendo, não conseguiram derrubar o presidente ou fazê-lo renunciar.

Apoiado por importantes setores da sociedade e também de fora do país (especialmente o Irã), o Presidente manteve o poder, mas não conseguiu aniquilar o movimento de rebeldia.

Diante disso, a Síria vive desde 2011 uma horrenda guerra civil que literalmente destrói o país e massacra seu povo.

De um lado as forças do governo oficial; de outro as forças da “Coalizão Nacional Síria” como passaram a se chamar as forças da oposição.

A “Coalizão Nacional” recebe apoio logístico dos Estados Unidos e da OTAN.

A oposição rebelde é dominada por muçulmanos sunitas enquanto as principais figuras do governo são alauitas.

Essas denominações representam diferentes alas de pensamento dentro da mesma religião (islâmica) sendo que os sunitas (seguem as sunas além do Corão) são tradicionalmente considerados menos radicais e próximos do ocidente, enquanto os alauitas são xiitas, isso é, mais ortodoxos e distantes do ocidente (isso, claro, nem sempre ocorre de forma tão simplista).

A partir de 2013 a situação caótica de um país dividido (acredita-se que o governo tenha poderes apenas sobre 60% da população e 30 a 40% do território) surge o autoproclamado “estado Islâmico”.

O EI surgiu como uma das facções da al-Qaeda de Osama Bin Laden, depois se desmembrou desse grupo. Inicialmente lutou ao lado da oposição contra Bashar al-Assad, mas, nesse ano de 2013 passa a reivindicar um território próprio cuja área é composta por territórios da Síria e uma parte do Iraque.

Em junho de 2014 o EI proclama a criação de um Califado e Abu Bakr al-Baghdadi, seu líder, o califa da região.

Califa é o chefe de estado, um governante político e religioso e Califado, uma comunidade muçulmana governada pela sharia (a Lei do Corão) que iam se formando a partir da expansão muçulmana do século VII e VIII.

O primeiro a usar o título de califa foi Abu Bakr, sogro de Maomé após sua morte em 632.

O título de Califa deixou de existir no século XX, principalmente após o fim do Império Turco Otomano em 1924.

Em outubro de 2015 a Rússia anunciou sua participação direta no conflito com ataques aéreos ao Estado Islâmico.

A presença da Rússia preocupa pelos efeitos colaterais que pode ter.

Como aliados de Assad provavelmente aproveitem a oportunidade para atacar também os grupos rebeldes (aliados dos EUA lembra?) e um enfrentamento entre as duas superpotências não seria bom para ninguém.

A Rússia, inclusive, acusa as forças da coalizão EUA-Europa de estarem fazendo “corpo-mole”, não atacando adequadamente o EI, preferindo atacar as tropas leais ao presidente.

Existem ainda fortes indícios que o califado receba do próprio EUA aparato militar para manter os combates.

Os ataques do EI em Paris, são significativos. Eles demonstram que o grupo está sentindo a pressão militar russa já tendo, segundo algumas fontes, perdido cerca de 20% do território que já dominou.

O ataque fora da Síria é politicamente arriscado e militarmente suicida e o EI sabe disso.

Ao optar assim mesmo pela ação, parece ter concluído não haver possibilidade de sustentar a guerra por muito tempo e prepara-se para agir como a Al-Quaeda, ou seja, com ações do tipo guerrilha e fora do Oriente Médio.

Hoje a Síria é expressão do horror.

Com o governo atuante apenas em 40% do território a manutenção dos serviços públicos estrangulou. O respeito aos direitos mínimos da população não são assegurados por nenhuma das forças em conflito.

Abastecimentio de água e provisões, energia elétrica, transporte, etc deixaram de existir enquanto serviços básicos e a população, abandonada à própria sorte sofre com o desabastecimento e os combates que não respeitam nenhum limite geográfico.

Não há mais escolas para as crianças, nem trabalho para os jovens, pois toda a estrutura do país entrou em colapso.

Mais de 2,5 milhões de sírios fugiram para países vizinhos, especialmente Jordânia e Líbano, além de tentarem a fuga desesperada para a Europa (a foto do corpo do menino Aylan, recentemente, chocou o mundo).

Cerca de 500 mil cristãos movem-se com extremo cuidado em uma fuga cautelosa e solitária, pois foram jurados de morte pelo exército do Califa.

Em terra o território convulsionado está repartido entre vários atores: o governo que mantém a fidelidade do exército nacional, armado com equipamentos russos e chineses domina de 30 a 40% do território, especialmente o leste, incluindo a capital Damasco.

Grupos armados da Coalizão Nacional (treinados e equipados pelos Estados Unidos); Forças militares e paramilitares do Estado islâmico e seu califado ao centro e norte.

Grupos armados curdos que habitam o norte da Síria e combatem o EI tendo significativas vitórias; comandos especiais do Irã, também ao norte.

Comandos da Al-Quaeda que dominam a região sudoeste, tropas turcas estacionadas a oeste, na fronteira e determiandas a impedir qualquer aproximação de seu território e tropas israelenses, ao sul, ocupam Golan e impedem qualquer aproximação temendo um envolvimento que poderia ser catastrófico aos seus interesses.

No ar aviões de guerra dos Estados Unidos, França, Inglaterra e Rússia, além de misseis de médio alcance, e conforme recentes informações, misseis de cruzeiro disparados de navios franceses estacionados no Golfo Pérsico.

Por tudo isso, poucas coisas parecem claras na Síria além de que, é muito fácil morrer, enquanto muitas indagações assombram o mundo.

Pilhas de crianças mortas, adultos inválidos, mulheres estupradas e escravizadas compõem seu novo cenário.

Talvez a maior dúvida seja, afinal, como civis ainda sobrevivam no meio do caos e, na equação do inferno, quem é mocinho e quem é bandido nas terras de Alá?



Prof. Péricles


terça-feira, 17 de novembro de 2015

SEXTA-FEIRA 13, A GUERRA VOLTOU À EUROPA

Por Rui Martins


Já tive oportunidade em outras oportunidades de comentar o que era ainda um risco iminente do jiadismo trazer a guerra de atentados à Europa. Esses horríveis e covardes atentados desta Sexta-feira 13 de novembro assinalam o começo de uma longa e dolorosa guerra desfechada pelos fanáticos islamitas jiadistas aos infiéis europeus em nome de Alá, por um califado fiel a uma leitura e aplicação literal do Corão.

Alguns ensaios e ameaças tinham sido feitos na Bélgica e, faz dez meses, houve o ataque e assassinato dos redatores da revista Charlie Hebdo com um objetivo bem definido: punir os humoristas desenhistas autores das caricaturas de Maomé.

Os atentados desta Sexta-feira 13 não tinham um objetivo específico mas visavam aglomerações de pessoas, fosse num estádio de futebol como numa casa de espetáculos ou bares e restaurantes com a intenção de matar cegamente a desconhecidos.

De onde saíram esses novos bárbaros que se comprazem em transmitir imagens de brutalidade e ódio na guerra missionária em que estão empenhados? Da Caixa de Pandora aberta pelos Bushs americanos ao atacarem e destruírem o Iraque de Sadam Hussein, único Estado laico existente na época no Médio Oriente.

Aprendiz feiticeiro, o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy quis imitar Bush, enquanto o inglês Cameron quis imitar Tony Blair e assim abriram outra Caixa de Pandora destruindo a Líbia de Kadhafi.

Embora venerados por certos esquerdistas, tanto Hussein como Kadhafi eram ditadores implacáveis, mas asseguravam um certo equilíbrio dentro do mundo árabe-muçulmano xiita ou sunita.

Esse equilíbrio acabou, instalou-se a luta entre os muçulmanos xiitas (o Irã não é árabe, mas persa) e os sunitas, uns subvencionados pela Arábia Saudita outros pelo Irã, surgindo primeiro a Al Qaída e a seguir com autonomia própria, o Estado Islamita ou Daesch.

Infelizmente, a primavera árabe, que muitos imaginavam levar o mundo árabe à democracia, provocou o caos ao deixar entrarem fundamentalistas islamitas entre as legiões de combatentes internacionais na luta contra o ditador sírio Assad.

Assim, entraram na Síria brigadas vindas do Estado Islamita que, ao participarem da guerra na Síria, provocaram a fuga de milhões de pessoas para a Europa, fracionando a União Europeia na questão do dar ao não refúgio a esses fugitivos.

E procuraram conquistar jovens das periferias europeias, marcados pela estigmatização e exclusão social, incitando-os a se tornarem voluntários na luta contra Assad com o objetivo de lhes darem treinamento militar para, ao regressarem à Europa, criarem o clima de terror entre os infiéis europeus.

Mais de quatro mil jovens revoltados, filhos de imigrantes do Magreb (Argélia, Marrocos, Tunísia e Líbia) nos países europeus, encontraram sua fé no fundamentalismo islamita literal do Corão, onde os conceitos de solidariedade e humanidade foram substituídos pela aplicação dos preceitos de uma religião exigente e cruel.

Alguns já foram mortos em combate pela bandeira negra do terror, mas algumas centenas estão regressando aos seus países, depois de um aprendizado prático da guerra como o saber matar sem ter medo de morrer. Não há nessa luta um objetivo social ou político, nos moldes das antigas lutas de libertação contra o colonialismo, mas o retorno a objetivos de dominó religioso comparáveis ao que o Ocidente viveu na Idade Média.

Esses jovens estão de volta e diluídos na população, escondidos e disfarçados entre seus familiares religiosos moderados, irão por em execução sua missão de desestabilizar a União Europeia com séries períódicas de atentados. Difíceis de localizar, podendo agir em conjunto, mas preferivelmente como células independentes, os jiadistas lançaram nesta Sexta-Feira 13 seu primeiro grande e simultâneo ataque.

Alguns eram kamikases, e ao se explodirem com a promessa de irem ao céu de Alá, não deixaram pistas, os outros fugiram e serão difíceis de localizar.

Esses atentados feitos por uns poucos fanáticos serão suficientes para instaurar o caos e desestabilizar a União Europeia.

Hoje a Europa deixa de viver seus longos anos de paz desde 1945, para entrar numa outra época – a da guerra intestina, de atentados ou guerrilhas, que provocarão a insegurança nas populações dos diversos países a começar pela França.

Essa guerra irá fortalecer os movimentos racistas de extrema-direita que elegerão parlamentos e governos. Hoje a Europa mudou, nada mais será como nestes últimos anos, a insegurança vai se juntar à crise econômica e de desemprego. Como os ovos do Alien, eles serão chocados pelos próprios europeus.





Rui Martins, jornalista, escritor. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, pela recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes. Escreveu Dinheiro Sujo da Corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A Rebelião Romântica da Jovem Guarda, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil, e rádios RFI e Deutsche Welle.


sábado, 14 de novembro de 2015

DILMA E A SÍNDROME DE ESTOCOLMO

Pattie Hearst
No Julgamento



Numa quente manhã do verão de 1973, dois homens invadiram o “Creditbank” em Estocolmo, capital da Suécia. A ação dos assaltantes não deu certo e o prédio acabou cercado pela polícia, resultando num terrível tiroteio.

Impossibilitados de fugir, a dupla de assaltantes fez quatro desafortunados reféns por longos e arrastados seis dias (de 23 a 28 de agosto) de ameaças e negociações  com a polícia.

Para surpresa de todos, ao final das negociações os reféns mostraram-se arredios ao auxilio da polícia e usaram os próprios corpos para proteger os assaltantes de algum atirador de elite. Em seguida passaram a defender publicamente os raptores.

Desde então, essa estranha condição psicológica em que a vítima submetida a longo estresse físico e emocional (quando perde toda esperança de escapar) desenvolve um processo de simpatia, aceitação e dependência da aprovação do raptor, é denominado de Síndrome de Estocolmo.

Segundo especialistas “A princípio, as vítimas passam a se identificar emocionalmente com os sequestradores por meio de retaliação e/ou violência. Pequenos gestos gentis por parte dos raptores são frequentemente amplificados porque o refém não consegue ter uma visão clara da realidade e do perigo em tais circunstâncias. O complexo e dúbio comportamento de afetividade e ódio simultâneo junto aos raptores é considerado uma estratégia de sobrevivência por parte das vítimas”.

O caso mais famoso de Síndrome de Estocolmo envolveu Patty Hearts, uma norte –americana hedeira de um verdadeiro império (neta do Roberto Marinho dos Estados Unidos, William Randolph Hearst, magnata das comunicações).

Sequestrada em 04 de fevereiro de 1974 quando estava em seu apartamento com o noivo, pelo “Exército Simbiones”, um grupo de americanos marxistas pirados que se diziam contra o racismo, a monogamia e o sistema penitenciário do país, Patty foi ameaçada de morte, torturada e violentada pelo líder do grupo, Donald DeFreeze.

Depois de libertada do cativeiro, juntou-se aos raptores e passou a viver com eles com novo nome “Tania” em homenagem a companheira de Che Guevara, participando de assaltos e outras ações do bando.

“Tania” e um casal foram os únicos sobreviventes do “exército” quando os outros seis mebros (inclusive DeFreeze) foram mortos em confronto com a polícia em Los Angeles.

Reorganizaram o grupo e executaram mais dois assaltos (um com morte de uma mulher grávida), e finalmente presos em setembro de 1975.

Julgada em março de 1976 foi condenada a sete anos de prisão, mas cumpriu apenas 21 meses, tendo a pena comutada pelo presidente Jimmy Carter, muito amigo de seu avô.

Atuou em alguns filmes, como Cry-Baby de 1990 e alguns seriados de televisão, e hoje, aos 61 anos, vive com Bernard Shaw, seu ex-guarda-costas, com quem teve duas filhas.

A síndrome de Estocolmo pode muito bem ser identificada, por exemplo, no clássico conto de Marie le Prince de Beaumont, "A Bela e a Fera".

O que ninguém esperava é que a Síndrome também se desenvolvesse entre governantes, como parece ser o caso dos governos petistas do Brasil.

Embora eleitos democraticamente por uma maioria de milhões de votos, os governos Lula e Dilma padecem do temor diante da falsa ideia de que não existe escapatória se não houver cumplicidade com os raptores.

Os raptores no caso são a mídia que assumiu uma postura de partido político de oposição e industrializou a forma de divulgar notícias que incluí “vazamento” estratégico de notícias sigilosas ainda sendo investigadas e pirotecnia de vocabulários, presunções de culpa e inocência além de defender ideais claramente golpistas.

Reeleita há um ano, Dilma ainda não conseguiu governar, sequestrada por aqueles que perderam nas urnas.

Estranhamente, os governos petistas reduzem-se no enfrentamento dessas agressões, evitando o debate mais aberto e mantendo programas milionários que beneficiam os “raptores” assumindo uma postura que varia da passividade à cumplicidade.

Querem acreditar que os raptores irão gostar deles e alterar posturas.

Enquanto faz de conta que está tudo bem, a apatia dos governos petistas põem em risco a própria sobrevivência da democracia brasileira.

Militantes, simpatizantes, eleitores, de Dilma e de Lula, muitas vezes ficam perplexos diante da passividade assim como os policiais ficavam perplexos diante de fotos de Patty Hearts com metralhadora na mão, assaltando um banco.

Na última viagem da presidenta aos Estados Unidos, na hora da entrevista coletiva que por lá é disputada à unhas e dentes, Dilma, diante da cara de espanto do presidente Obama, concedeu a uma repórter da Globo fazer a primeira pergunta (coisa que nos EUA representa valorização e reconhecimento por parte da autoridade). Fosse Obama e a repórter da Globo ficaria para a última pergunta e nisso nada haveria de ilegal já que é da preferência da autoridade a ordem das perguntas.

Talvez seja necessário que os governos petistas entendam que a defesa da democracia não implica em ser autoritário. A retaliação, dentro dos parâmetros civilizados, faz parte do jogo de pressão que é a essência da política.

Se Leonel Brizola não erguesse sua voz em defesa da Legalidade, a mesma mídia consideraria correta a tomada do poder pelos militares em 1961.

Se alguém erguesse a voz em favor de Getúlio Vargas em 1954, talvez o presidente levasse seu governo até o fim e ainda vivesse muito tempo.

A mídia brasileira jamais aprovará os governos petistas por mais que os governos petistas tentem ser simpáticos e “amiguinhos” da mesma forma que os senhores da Casa Grande jamais defenderão os interesses da senzala.

A mídia brasileira não é neutra e nisso reside um erro gigantesco dos ingênuos. São grandes empresas com grandes interesses aqui e fora do país, e que, defendem seus interesses antes de qualquer outra coisa.

As concessões sempre serão poucas e a exigência de mais concessões sempre será maior, pois o que a elite brasileira quer mesmo é aquilo que ela sempre teve e não se conforma perder, o poder.

Vale ressaltar que, as vítimas da Síndrome de Estocolmo não se reconhecem dentro do quadro doentio. É comum também no caso de violência doméstica e familiar em que a vítima é agredida pelo cônjuge e continua a amá-lo e defendê-lo como se as agressões fossem normais.

Da mesma forma, os governos petistas e seus mais leais e fervorosos defensores, entendem como normais os planos e golpes contra a democracia brasileira.

Pobre país que não tem nem mesmo a esperança de um Jimmy Carter hipotético que lhe indulte os pecados e que perdeu aqueles que não tinham medo da luta.




Prof. Péricles