quinta-feira, 11 de abril de 2013

CARROCINHA DE PIPOCA



Por Luis Fernando Veríssimo


Eu sei que a coisa é séria. Se o Kim Jong-un disparar mesmo os foguetes que está ameaçando disparar contra bases americanas na Ásia, teremos uma guerra nuclear com dimensões e consequências imprevisíveis. Mas lendo sobre o perigo iminente não pude deixar de pensar na história do homem que foi atropelado por uma carrocinha de pipoca.

Era um homem cauteloso que olhava para os dois lados antes de atravessar a rua e só atravessava no sinal, e que dificilmente um carro pegaria. Mas que um dia não viu que vinha uma carrocinha de pipoca, e paft.

Já no ambulatório do hospital, onde lhe deram uns pontos no braço, o homem disse que tinha sido atropelado por um motoboy.

Em casa, contou que tinha sido atropelado por um carro e só por sorte escapara da morte.

Naquela noite, para os amigos que souberam do acidente e foram visitá-lo, especificou: tinha sido atropelado por um BMW. No dia seguinte disse aos colegas de trabalho que tinha sido atropelado por um caminhão e não sofrera mais do que um corte no braço por milagre. E quando um dos colegas de trabalho comentou que tinha visto o acidente e vira o homem ser atropelado por uma carrocinha de pipoca, gritou: "Calúnia!".

Por que me lembrei do homem que tinha vergonha de ter sido atropelado por uma carrocinha de pipoca?

Desde o fim da Guerra Fria a possibilidade de um confronto nuclear entre duas potências, os Estados Unidos e a Rússia, diminuiu, mas os estoques de armas nucleares continuaram e sua proliferação também. Israel se segura para não usar seus foguetes para destruir as bombas nucleares que o Irã está ou não está construindo, Índia e Paquistão vivem comparando seus respectivos arsenais nucleares como guris comparando seus pipis, a França e a Inglaterra têm a bomba...

Enfim, ainda se vive num frágil equilíbrio de terror possível, exigindo de todos os nucleares um cuidado extremo, um cuidado de atravessar a rua sem serem atropelados pelo imprevisto.

E aí aparece o Kim Jong-un empurrando uma carrocinha de pipoca em alta velocidade...

terça-feira, 9 de abril de 2013

CORÉIA DO NORTE: NADA A PERDER



Simon Bolívar costumava dizer que só teve coragem de lutar todas as guerras que lutou, e botar a vida em risco tantas vezes como fez, porque perdera sua esposa muito cedo.

Jovem e sem filhos, cheio do dinheiro e sem prazer para gastá-lo, resolveu seguir seus sonhos doidos de promover a independência da América Latina. Missão difícil, quase impossível e de imenso perigo. Na época, para impor o medo aos coloniais, as metrópoles não faziam prisioneiros. Enforcavam alguns, fuzilavam outros, e até mesmo esfolavam vivo como fizeram com o índio Tupac Amaru.

O homem costuma medir as conseqüências dos seus atos, e nada o torna mais prudente e temeroso do que ter família para prover e filhos para ver crescer. Quanto menos ele tiver a perder mais afoito será, mais radical poderão ser suas alternativas.
De certa forma dá para dizer o mesmo das nações.

Quanto mais tem a perder numa guerra maior a prudência, quanto menos a perder maior a afoiteza.

É exatamente esse o perigo que representa a Coréia do Norte hoje para a paz mundial.
Desde que a Coréia se desmembrou em duas por força do cessar fogo de Pamunjog (tecnicamente ainda estão em guerra), em 1953, a Coréia do Norte se acostumou a fazer papel de vilão para, em troca, manter a independência e a economia funcionando. Dessa forma, durante a Guerra Fria foi sustentada pela China e em troca representava um peão, estrategicamente colocado pelo bloco socialista no tabuleiro mundial. Quando a Guerra Fria acabou o peão deixou de ter importância e a Coréia do Norte tornou-se uma espécie de peça de museu de uma era encerrada.

Ela está muito longe de representar qualquer tipo de governo socialista. Não representa nem o socialismo nos moldes da antiga União Soviética, nem o socialismo que veio dos campos, como na China. Na verdade é uma ditadura atípica, algo como uma Monarquia absolutista em que o poder se processa por hereditariedade.

Tudo o que se sabe da Coréia do Norte, não se sabe, apenas se desconfia tão fechado é o país para os olhos do mundo.

Segundo desconfia a FAO, órgão da ONU encarregado dos assuntos da agricultura e alimentação, ocorre alta taxa de mortalidade infantil originada da falta de alimentos.
Ao mesmo tempo o país investiu seus parcos recursos num programa nuclear cujo único objetivo é esse que vemos atualmente, ameaçar o mundo. É, portanto uma espécie de miserável, esfomeada, mas muito bem armada.

Ao contrário do Irã, a Coréia do Norte, embora não tenha chance nenhuma de vencer um conflito, tem condições reais de provocar grandes prejuízos, especialmente ao Japão e à Coréia do Sul. Além disso, poderia causar um prejuízo incalculável ao meio ambiente e a todo o planeta.

E o pior é que, diante da situação econômica de abandono, quando até a China, agora interessada em manter mercados, lhe volta às costas, a Coréia do Norte não tem muitas opções.

Por isso, a crise só pode lhe trazer benefícios de barganha, já que, pior do está, não pode ficar. Não tem literalmente, nada a perder

Prof. Péricles

O JULGAMENTO POPULAR DE MARGARET TATCHER



Por Paulo Nogueira

Manifestação de Morrisey, cantor do Smiths, à morte de Thatcher.

“Cada movimento que ela fez foi marcado pela negatividade.

Ela odiava os mineiros, ela odiava as artes, ela odiava os pobres, ela odiava o Greenpeace e a todas as entidades de proteção ambiental.

Ela deu a ordem para explodir o Belgrano já quando o navio argentino estava se afastando das Malvinas. E quando os meninos argentinos a bordo do Belgrano sofreram uma morte terrível e injusta, Thatcher deu o sinal de positivo para a imprensa britânica.

Ela odiava feministas ainda que tenha sido graças a elas que o povo britânico aceitou que um primeiro-ministro pudesse realmente ser do sexo feminino.

Thatcher era um horror sem um átomo da humanidade.”



Quanto a mim: sabia, evidentemente, que Thatcher era uma figura que dividia os ingleses.

Mas não imaginava, até ver as reações a sua morte aqui na Inglaterra e em outras partes do Reino Unido, quanto o ódio que ela despertou suplantava o amor e a admiração.

Horas depois do anúncio da morte, enfrentaram-se em Manchester os dois times locais, o United e o City.

Não houve minuto de silêncio. A torcida teria devastado o tributo.

Em Liverpool, os torcedores cantavam em comemoração à morte de Thatcher. Numa tragédia em que morreram muitos torcedores no estádio do Liverpool nos dias de Thatcher, a polícia acusou a torcida local – erradamente, como se veria depois.

Thatcher condenou a torcida e apoiou a versão falaciosa da polícia. Jamais foi perdoada.

Em Glasgow, uma multidão foi às ruas celebrar a morte. Os escoceses acham que foram tratados como subespécies por Thatcher.

No twitter, o congressista George Galloway lembrou que ouviu Thatcher chamar Mandela, no Parlamento, de “terrorista”. (Alguém disse que houve justiça poética em Mandela, tão combalido, ter sobrevivido a ela).

“Que ela arda no inferno”, disse Galloway, sob numerosas manifestações de apoio e poucas de protesto. Alguém pediu respeito a Galloway.

A melhor maneira de mostrar respeito hoje é esta, respondeu Galloway – e postou um link que ia dar no seu partido, chamado exatamente Respeito.

Fora da galhofa, Galloway disse algo que merece reflexão.

Ele comparou a reação à morte de Thatcher com a reação à morte de Chávez, um mês atrás.
O povo não é bobo.

Thatcher fez um governo dos ricos, pelos ricos e para os ricos.

Chávez governou para os pobres.

O reconhecimento da voz rouca das ruas — vital para o que vai ficar registrado para a posteridade nos livros – irrompe com potência sublime e comovedora na morte de pessoas públicas.

É a aprovação definitiva, ou a reprovação, ou a indiferença.

Chávez foi amplamente aprovado, como gritaram as filas de catorze horas formadas por venezuelanos desesperados por vê-lo pela última vez em Caracas – num lamento épico e histórico protagonizado não pelo Comandante, mas pelos excluídos ao longo da história por uma elite corrupta e predadora controlada pelos Estados Unidos.

Thatcher foi reprovada.



Sobre o autor: O jornalista Paulo Nogueira, baseado em Londres, é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

sábado, 6 de abril de 2013

SEM NOÇÃO



Sempre tem aquela figura da turma que desmoraliza com brincadeiras sem graça ou ações os momentos mais sérios...

Você e seus amigos ali, concentrados, tentando fazer aquela maldita fubica funcionar pra te levar pra praia e chega alguém pra dizer que não adianta porque vai chover.

Ou quando interessadíssimo na nota da última avaliação do bimestre, você fazendo o melhor trabalho possível enquanto o teu colega folheando uma revista de mulher nua canta a “Atoladinha”.

Você sabe aquela rodinha de amigos discutindo qual seria o melhor filme de todos os tempos que você assistiu em toda sua carreira de cinéfilo, o que incluí alguns filmes alternativos e nada comerciais, e um infeliz chega de repente e diz que jamais conseguirá esquecer do “Titanic”.

Convenhamos que não tem graça nenhuma.

São os verdadeiros “sem-noção” ou “abobado feliz”.

Pois alguém resolveu sacanear dessa maneira com a Comissão de Direitos Humanos da Câmara ao indicar (na verdade nomear) como Presidente da própria Comissão um exemplo de sem-noção...

Na boa, não tem graça nenhuma.

No campo democrático pode-se discutir nomes e concordar com uns, discordar de outros. Faz parte do jogo.

Mas não se pode avacalhar nas escolhas dos nomes sob pena de avacalhar com a própria democracia.

Com certeza, certas viúvas esfregam as mãos e resmungam que na Ditadura se escolheria melhor. Afirmação com a qual eu discordo, pois na Ditadura não haveria Comissão dos Direitos Humanos para ter um presidente.

Entretanto, o fato se presta para deboche e provocação. Mas, se a intenção foi fazer pouco dos trabalhos que a comissão realiza, conseguiu.

Essa Comissão tão cara ao povo brasileiro e a seu governo (a Presidenta Dilma sempre afirmou que os direitos humanos seriam uma das prioridades de seu governo) ficou com a cara da Academia Brasileira de Letras, do guardinha do colégio ou do ET de Varginha: já foi importante, já foi respeitada, mas agora ninguém mais leva a sério.

Como levar à sério uma Comissão de Direitos Humanos cujo Presidente afirma que a África é miserável porque sofre uma maldição divina dos tempos de Noé?

Ou que demonstra homofobia até quando tenta disfarçá-la?

Sinceramente, alguém deveria proibir os “sem noção” de falar sobre carros ou discutir cinema ou presidir comissões sérias.

E algumas pessoas nesse país deveriam levar o país mais a sério, pois, brincar com a democracia, não tem graça nenhuma.

Prof. Péricles

quarta-feira, 3 de abril de 2013

TESTAMENTO DE UM POVO



Após a independência, proclamada em 04 de julho de 1776 e ratificada pelo Tratado de Versalhes em 1781, os Estados Unidos viram-se como o maior potencial em desenvolvimento das Américas.

Não tendo sido colonizados na forma de exploração tipo “plantation” ou mineração, puderam criar um mercado local único, que apesar de humilde, nos primeiros tempos, iria se ampliar e ratificar o novo país como uma potência futura.

A industrialização era viável desde que houvesse a expansão de sua produção interna e consumo.

Entretanto, havia um grave problema: pelas próprias características de ocupação do terreno, as colônias existiam na prática apenas na parte leste do atual mapa. Para ampliar sua indústria nascente e seu mercado, era necessário ocupar e fazer crescer, também o oeste do país.

Ocorreu então a chamada “marcha para o oeste”.

Na ocupação do oeste, o ouro que apareceu na Califórnia foi decisivo para atrair colonos, ávidos por riqueza. E dois povos tiveram um encontro com o destino.

Primeiro foram os mexicanos que derrotados em guerras territoriais perderam quase metade de seu território aos Yankes.

Outro foi o povo indígena, verdadeiros proprietários das terras invadidas.

O que aconteceu com essa gente na chamada “conquista do oeste” foi um verdadeiro holocausto.

O governo norte-americano financiou várias “Guerras Indígenas”, sempre culpando os índios, claro, e ao final, os sobreviventes foram colocados em reservas, sem a menor preocupação e respeito por suas culturas. Povos das montanhas, como os Navajos foram retidos em reservas na planície enquanto povos de planície como os Apaches foram presos às montanhas.

Uma verdadeira chacina cultural que regada à muito álcool prostou esse povo à uma situação de mendicância..

Uma vez, questionado, o General nazista Humller confessou que os campos de concentração de judeus na II Guerra Mundial foram inspirados nas reservas indígenas dos Estados Unidos.

Ao cidadão norte-americano sempre foi divulgada a idéia de que índio era selvagem. Povo sem Deus e sem compaixão, justificando o massacre hediondo. Apenas em 1970, com o lançamento do filme “O Pequeno Grande Homem” (Little Big Man) de Arthur Penn, magistralmente interpretado por Dustin Hoffman, a opinião pública norte-americana conheceu o outro lado da história, a versão dos índios.

Em 1855, Chefe Seattle, cacique da tribo Suquamish, escreveu uma carta ao presidente dos Estados Unidos (que ele chamava de O Grande Chefe de Washington) que muitos consideram o testamento, o último suspiro de um povo em fase de extermínio. Nessa carta temos uma grande lição sobre preservação da natureza, respeito ao meio-ambiente e crescimento sustentável.

De certa forma, é uma carta profética e embora bem conhecida do público, sempre merece uma releitura pela sua incrível atualidade.

Leia a seguir a carta de um índio e tire suas conclusões sobre quem é o “selvagem”.



"O grande chefe de Washington mandou dizer que quer comprar a nossa terra. O grande chefe assegurou-nos também da sua amizade e benevolência. Isto é gentil de sua parte, pois sabemos que ele não necessita da nossa amizade. Nós vamos pensar na sua oferta, pois sabemos que se não o fizermos, o homem branco virá com armas e tomará a nossa terra. O grande chefe de Washington pode acreditar no que o chefe Seattle diz com a mesma certeza com que nossos irmãos brancos podem confiar na mudança das estações do ano. Minha palavra é como as estrelas, elas não empalidecem.

Como pode-se comprar ou vender o céu, o calor da terra? Tal idéia é estranha. Nós não somos donos da pureza do ar ou do brilho da água. Como pode então comprá-los de nós? Decidimos apenas sobre as coisas do nosso tempo. Toda esta terra é sagrada para o meu povo. Cada folha reluzente, todas as praias de areia, cada véu de neblina nas florestas escuras, cada clareira e todos os insetos a zumbir são sagrados nas tradições e na crença do meu povo.

Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver. Para ele um torrão de terra é igual ao outro. Porque ele é um estranho, que vem de noite e rouba da terra tudo quanto necessita. A terra não é sua irmã, nem sua amiga, e depois de exaurí-la ele vai embora. Deixa para trás o túmulo de seu pai sem remorsos. Rouba a terra de seus filhos, nada respeita. Esquece os antepassados e os direitos dos filhos. Sua ganância empobrece a terra e deixa atrás de si os desertos. Suas cidades são um tormento para os olhos do homem vermelho, mas talvez seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que nada compreende.
Não se pode encontrar paz nas cidades do homem branco. Nem lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem na primavera ou o zunir das asas dos insetos. Talvez por ser um selvagem que nada entende, o barulho das cidades é terrível para os meus ouvidos. E que espécie de vida é aquela em que o homem não pode ouvir a voz do corvo noturno ou a conversa dos sapos no brejo à noite? Um índio prefere o suave sussurro do vento sobre o espelho d'água e o próprio cheiro do vento, purificado pela chuva do meio-dia e com aroma de pinho. O ar é precioso para o homem vermelho, porque todos os seres vivos respiram o mesmo ar, animais, árvores, homens. Não parece que o homem branco se importe com o ar que respira. Como um moribundo, ele é insensível ao mau cheiro.
Se eu me decidir a aceitar, imporei uma condição: o homem branco deve tratar os animais como se fossem seus irmãos. Sou um selvagem e não compreendo que possa ser de outra forma. Vi milhares de bisões apodrecendo nas pradarias abandonados pelo homem branco que os abatia a tiros disparados do trem. Sou um selvagem e não compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ser mais valioso que um bisão, que nós, peles vermelhas matamos apenas para sustentar a nossa própria vida. O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem os homens morreriam de solidão espiritual, porque tudo quanto acontece aos animais pode também afetar os homens. Tudo quanto fere a terra fere também os filhos da terra.

Os nossos filhos viram os pais humilhados na derrota. Os nossos guerreiros sucumbem sob o peso da vergonha. E depois da derrota passam o tempo em ócio e envenenam seu corpo com alimentos adocicados e bebidas ardentes. Não tem grande importância onde passaremos os nossos últimos dias. Eles não são muitos. Mais algumas horas ou até mesmo alguns invernos e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nestas terras ou que tem vagueado em pequenos bandos pelos bosques, sobrará para chorar, sobre os túmulos, um povo que um dia foi tão poderoso e cheio de confiança como o nosso.
De uma coisa sabemos, que o homem branco talvez venha a um dia descobrir: o nosso Deus é o mesmo Deus. Julga, talvez, que pode ser dono Dele da mesma maneira como deseja possuir a nossa terra. Mas não pode. Ele é Deus de todos. E quer bem da mesma maneira ao homem vermelho como ao branco. A terra é amada por Ele. Causar dano a terra é demonstrar desprezo pelo Criador. O homem branco também vai desaparecer, talvez mais depressa do que as outras raças. Continua sujando a sua própria cama e há de morrer, uma noite, sufocado nos seus próprios dejetos. Depois de abatido o último bisão e domados todos os cavalos selvagens, quando as matas misteriosas federem à gente, quando as colinas escarpadas se encherem de fios que falam, onde ficarão então os sertões? Terão acabado. E as águias? Terão ido embora. Restará dar adeus à andorinha da torre e à caça; o fim da vida e o começo pela luta pela sobrevivência.

Talvez compreendêssemos com que sonha o homem branco se soubéssemos quais as esperanças transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais visões do futuro oferecem para que possam ser formados os desejos do dia de amanhã.

Mas nós somos selvagens. Os sonhos do homem branco são ocultos para nós. E por serem ocultos temos que escolher o nosso próprio caminho. Se consentirmos na venda é para garantir as reservas que nos prometeste. Lá talvez possamos viver os nossos últimos dias como desejamos. Depois que o último homem vermelho tiver partido e a sua lembrança não passar da sombra de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará a viver nestas florestas e praias, porque nós as amamos como um recém-nascido ama o bater do coração de sua mãe. Se te vendermos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Protege-a como nós a protegíamos. Nunca esqueça como era a terra quando dela tomou posse. E com toda a sua força, o seu poder, e todo o seu coração, conserva-a para os seus filhos, e ama-a como Deus nos ama a todos.

Uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é querida por Ele. Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum."


Prof. Péricles
Agradecemos a colaboração do amigo Hilton.

domingo, 31 de março de 2013

ÍDOLOS DE PÉS DE BARRO




Houve um tempo, no Brasil e no mundo, em que todas as portas para a participação política estavam fechadas.

Um tempo em que se dizia amém antes mesmo da prece terminar e que toda a indignação, todo questionamento era proibido.

Tempo de guerras injustificáveis como a do Vietnã e de primaveras, como a de Praga.

Anos duros em que qualquer participação política era crime, a censura dava a última palavra e oposição apenas consentida, num verdadeiro faz-de-conta.

Nessa era de trevas, os inquietos e inconformados, especialmente a juventude, talvez pela natural chama ardente da idade, os intelectuais, operários, e o meio artístico, que quisessem protestar ou denunciar, tinham que ser criativos e buscar formas de fazê-lo sem perder a liberdade ou mesmo, a vida.

Então, o estilo de vida, o fazer e a forma de fazer determinadas coisas, tornaram-se por si mesmas, protestos e gritos sem sons.

Nesses tempos rebeldes, em especial a década de 60, 70 e parte da 80, os cabelos compridos, a roupa desbotada, o ritmo rebelde do rock e das motos turbinadas e o excesso de velocidade, assim como o consumo de drogas, assumiram ares de rebeldia e protesto, e, com o tempo, ocuparam um espaço na mitologia da juventude, assumindo contornos de estilo de vida.

Algumas drogas marcaram época como a maconha (a mais comum entre os brasileiros), morfina (consumida principalmente nos Estados Unidos e Europa) e o ácido lisérgico, o LSD. Este último tinha, inclusive, defensores públicos de sua liberação como agente facilitador para a compreensão de outras dimensões da existência, como o peyote seria entre os índios mexicanos.

Muitos ídolos desses tempos tiveram suas vidas ceifadas por esse modo de viver e até hoje ocupam o panteão dos heróis “imortais”: James Dean,(morto em 30/09/1955 em acidente de carro por excesso de velocidade), Marilin Monroe (morta em 05/08/1962 por ingestão de várias drogas), Jimi Hendrix (em 18/09/1970 por ingestão de comprimidos para dormir), Janis Joplin (03/10/1970 por overdose de heroína), Jim Morrison (vocalista da Banda The Doors em 03/07/71 na banheira de seu apartamento por overdose de álcool e outras drogas) e muitos outros.

Todos eles jovens, todos eles rebeldes, viraram estrelas de uma geração amordaçada, que vivia perigosamente, raspando no guard-rail da vida, mergulhada no álcool e namorando com a morte.

Mas, a vida é uma constante evolução, e o mundo não para sua rotação por nenhuma de nossas dores.

Novos tempos vieram. A democracia sobreviveu à tirania no Brasil, na Argentina, no Chile e em outros países. As guerras injustificáveis como as do Vietnã tornaram-se caras demais e acabaram, o socialismo real e a União Sovética entraram em declínio e acabaram, e, apesar dos grilhões, novas formas de luta acompanhadas de novas tecnologias surgiram.

O caráter e a função das drogas também se alteraram.

Hoje o uso abusivo de drogas lícitas e ilícitas não indica qualquer tipo de mensagem política e é fonte de verdadeira epidemia.

Ao contrário de representar qualquer embate pela liberdade o uso de drogas está associado à escravidão, pois a liberdade é impossível quando se é dependente.

A droga perdeu seu charme. Perdeu seu mito. A droga perdeu a graça.

Entretanto nem todas as cabeças assumiram essa nova mentalidade.

Ainda existem ídolos que acham cult viver no limite do suicídio, ser considerado louco e morrer na banheira, afogado no próprio vômito.

Se é verdade que as novas gerações precisam urgentemente de ídolos, não é menos verdade que precisam de ídolos sadios. Que tragam com seu carisma a força da vida e da juventude a serviço dos ideais maiores.

Chega de cultivar o doentio.

Temos que ter clareza que morrer chapado é coisa de otário. Ser encontrando num apartamento sangrando por dar chute em parede é burrice.

Negar seu talento à seus fãns por um crise de dor de cotovelo, não é bonito, é mesquinho.

Chega de perder gente talentosa, porém, manhosa.

Basta de cultivar ídolos de pés de barro.


Prof. Péricles