O que importa, o que vale a pena mesmo, não é o que se tem, mas o que sobra.
Velhas certezas e convicções não valem mais do que uma dúvida recente.
Toneladas de preconceitos e intolerâncias são insignificantes diante de um simples abraço fraterno que, mesmo sem uma única palavra, diz mais do que todos os manuais de sobrevivência.
Não somos livres como pensamos, nem inteligentes como gostaríamos.
Não somos diferentes como acreditamos nem especiais como nos fizeram crer os velhos livros.
Somos um depósito de sedimentos culturais que não são realmente nossos, não foram escolhas nossas, mas que são ensinados como verdades absolutas desde que nascemos.
Temos mais medos do que assumimos. Mais rancores do que gostaríamos. Mais carências do que aceitamos ter.
Por isso, diante de tantas obras construídas por outras mentes e mantidas acima de nosso querer o que importa, o que vale mesmo, é o que sobra de tudo isso.
Pois o que sobra é o que realmente é nosso.
Somos mais negros do que qualquer racista possa aceitar. Mais índios do que poderíamos imaginar. Somos marginais e excluídos, vencedores e vencidos.
Somos herdeiros de chacinas e holocaustos e se não estávamos lá, algo de nós estava e por isso, não podemos ver na história humana fatos alheios à nossa vontade.
Pacifistas de almanaque, transgredimos apenas o que nossos medos nos permitem transgredir e odiamos aqueles que se arriscam no espaço entre abismos que não ousamos experimentar.
Talvez por isso a classe média conservadora tanto odeie as políticas sociais que avancem em direção a diminuição das desigualdades.
Para os membros reacionários da classe média é apenas a desigualdade para baixo que permite alguma sensação de superioridade.
É essa desigualdade que justifica sua rotina de aceitação à dominação como algo normal e torna a ousadia de sonhar subversivo à sua ordem.
Pensar que tem quem esteja pior reconforta essa gente e quando alguém vindo lá debaixo ousa fazer aquilo que ela mesma jamais ousou, acaba odiando profundamente esse alguém, não pelo que ele é mas pelo que desejaria ser mas nunca teve coragem de tentar.
Chamar os que lutaram contra a ditadura de terroristas é o único alento à sua própria covardia.
Os escravos capatazes, aqueles que recebiam o privilégio de não participar das atividades mais duras em troca do trabalho de vigiar seus próprios irmãos, odiavam profundamente os Zumbis dos Palmares porque eles tinham a dignidade que eles mesmos jamais poderiam ter.
O que importa quando se apaga a televisão depois de toda a manipulação é o que sobra de você nisso tudo, o que você realmente pensa, do que é capaz de provocar indignação genuinamente sua e não a estereotipada pelos âncoras e suas caras e bocas.
O que importa realmente é o que sobra de nós depois de cada tragédia alheia e do verdadeiro estupro a que a nossa democracia está submetida.
Como nos alerta o Dalai Lama, o que pensamos nos faz agir de certa forma, esse agir se torna hábito e a soma de nossos hábitos determinam nosso caráter.
Ou ainda como dizia Friedrich Nietzsche: é preciso ter um caos dentro de si para dar à luz uma estrela cintilante.
Por isso, o que sobra e o que realmente interessa, é o que pensamos de nós mesmos e de nossos sonhos.
Por isso, o que sobra e o que realmente interessa, é o que pensamos de nós mesmos e de nossos sonhos.
O que fazemos diante da violência crescente e como reagimos à perseguição contra às forças progressistas diante do fascismo crescente é o que, um dia, poderemos dizer aos nossos filhos e netos sem corar de vergonha.
Prof. Péricles
Prof. Péricles