terça-feira, 17 de setembro de 2013

UM HOMEM E A CRUZ DE TODOS


Com certeza o pai de Jean, foi seu primeiro modelo. Sr. Jean Jacques Dunant, comerciante, era membro do Conseil Représentatif, organismo da cidade de Genebra que cuidava de órfãos e ex-reclusos, mas, sua mãe Antoinette Dunant-Colladon, filha do Chefe do Hospital de Genebra e que trabalhava no setor de caridade, especialmente com pobres e doentes, também teve sua colaboração na formação da personalidade do jovem.

Uma das experiências que marcaram Jean ocorreu numa viagem que fez com seu pai para a França, quando foi testemunha involuntária de tortura de prisioneiros de guerra.

Essas imagens violentas e covardes jamais sairiam de sua mente.

Jean começou a vida adulta sendo um homem de negócios como seu pai, embora não tivesse talento nenhum para isso.

Corajoso como ninguém em sua cidade, e inconformado com as dificuldades nos negócios devido às guerras intermináveis, viajou para a Itália em junho de 1859, aos 31 anos, para falar pessoalmente com o Imperador francês Napoleão III, que comandava em pessoa suas tropas, aliadas da Itália, no esforço para expulsar os austríacos do solo italiano. Jean queria um encontro nem que fosse numa barraca de campanha para pedir ao imperador que amenizasse as medidas de guerra impostas à região. Essa loucura, facilmente poderia lhe custar a vida.

Desembarcou à tardinha na estação de Solferino e de carro alugado (já que ninguém seria louco suficiente para levá-lo), rumou para o campo de batalha, ante a estupefação das pessoas que viam naquilo um ato suicida.

Pior que isso aguardava Jean que, na noite daquele dia foi testemunha da terrível batalha de Solferino. Naquela única noite de 24 de junho de 1859, 40 mil soldados morreram ou ficaram gravemente feridos.

Ficou chocado com a dor, o silêncio dos mortos e os gritos alucinantes dos feridos. Percorreu a pé todo o campo de batalha e chorou compulsivamente vendo um jovem soldado morrer em seus braços.

Esqueceu completamente os objetivos comerciais de sua viagem e por vários dias peregrinou entre os acampamentos de feridos ajudando em tudo que pudesse. Presenciou amputações e cirurgias feitas sem qualquer anestesia num ciclo de dor interminável.

Desistiu do Imperador e voltou pra casa, em Genebra, e nunca mais seria o mesmo.

Passaria o resto da vida a se dedicar pelos fragilizados e feridos.

Em 1862 escreveu com recursos próprios “A Memory of Solferino” uma leitura candente das tristezas que assistiu.

Enviou cópias do livro para políticos e militares importantes em toda a Europa. Além das dores da guerra o livro também abordou vivamente, a necessidade de se criar uma entidade internacional, composta por voluntários, para colaborar na assistência médica dos feridos de guerra e de outras tragédias.

No terreno comercial, sua dedicação à causa dos desvalidos lhe tomou tanta atenção que acabou falindo. Na área das idéias, no entanto, foi um vencedor.

Ele e seu livro são considerados o marco da fundação da Cruz Vermelha Internacional, em 1863, organismo não governamental, internacional e composto por voluntários, de atuação destacada em todo o mundo.

O comitê que presidiu durante 46 anos, foi o responsável, ainda, pela criação da Convenção de Genebra que prevê a neutralidade do corpo médico durante as guerras e o cuidado e respeito aos feridos e prisioneiros de guerra.

Jean-Henri Dunant recebeu o primeiro prêmio Nobel da Paz em 1901. Quando seu nome foi anunciado, a platéia de pé, aplaudiu a ele e a Cruz Vermelha por muitos minutos, em momento de grande emoção.

Nove anos depois, envelhecido, pobre e sozinho, de forma silenciosa se isolou na cidade de Heiden, na Suíça, vindo a falecer, no hospital dessa vila em 1910, aos 82 anos.

Definitivamente, um péssimo homem de negócios, capaz de gastar todo o recurso financeiro de estadias e viagens no tratamento de doentes que não poderiam lhe restituir o dinheiro. Mas, com certeza, um espírito iluminado que nos deixou como herança uma Instituição reconhecida e respeitada internacionalmente por seus trabalhos humanitários.

Hoje, até mesmo no Oriente não cristão, temos filias da Cruz Vermelha, na versão “Crescente Vermelha”.

E tudo isso começou, numa viagem de um jovem cabeça dura, interrompida pela crueza da guerra.

Prof. Péricles






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