quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

VÍTIMAS DA DITADURA 7 - FINAL

É muito difícil fazer um inventário sobre as vítimas da ditadura militar brasileira.

Poderíamos dizer que a primeira vítima da ditadura foi a frágil democracia brasileira que, desde 1946 quando havia sido elaborada a mais liberal de suas Constituições, lutava em terreno movediço para se consolidar.

Essa frágil democracia havia sobrevivido ao suicídio do Presidente Getúlio Vargas em agosto de 1954 graças ao povo nas ruas que impediram um golpe militar já articulado. Sobreviveu às tramas golpistas de Carlos Lacerda que tentou impedir a posse de Juscelino em 1956, ironicamente, devido à atuação enérgica de um militar, o General Henrique Teixeira Lott, e ainda no governo de Juscelino sobreviveu a pelo menos duas articulações golpistas graças ao traquejo político do presidente.

Sobreviveu também a própria renúncia de Jânio Quadros, um ato que deve ser entendido como uma tentativa de centralização política que não deu certo e principalmente, sobreviveu ao golpismo que se seguiu a essa renúncia quando os militares impediram a posse do vice João Goulart. Sem dúvida, a sobrevida de nossa democracia em 1961 deve muito ao heroísmo do Governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola e aos apoiadores da Campanha da Legalidade, especialmente ao Comandante do 3º Exército, General José Machado Lopes.

Mas, não sobreviveu aos arranjos norte-americanos aliados às elites brasileiras e à sua conservadora e hipócrita classe média, em 1964.

Outra vítima da ditadura foi toda uma geração de brasileiros das mais diferentes matizes sociais que não aceitou o cabresto e lutou pela democracia, da sua forma e do seu jeito, alguns participando da oposição consentida do MDB, dos que militaram pela democracia em organizações que discordavam da luta armada como o PCB, ou mesmo dos que não militaram em nenhuma organização oposicionista, mas que, fizeram do seu silêncio e do seu amargor uma arma para lembrar que viviam no arbítrio.

Vítimas da ditadura foram os estudantes brasileiros, secundaristas e universitários, que optaram pela luta armada. Jovens que deram suas vidas em organizações como o PC do B, ALN (de Carlos Marighela), VPR e MR-8 (de Carlos Lamarca), da Colina e da VAR-Palmares (como Dilma Roussef), e especialmente dos sonhadores, apaixonados e livres, porque nunca aceitaram a escravidão, os heróicos guerrilheiros do Araguaia.

Foram também intelectuais, expoentes da música, das letras e das artes cênicas, como o genial Glauber Rocha ou o talentosíssimo Taiguara, músico campeão de perseguição ao seu trabalho.

Lideranças e militâncias sindicais e camponesas também foram suas vítimas.

Também foram vítimas os nacionalistas que percebiam com clareza a forma entreguista com que o Brasil foi governado nesse período, vendendo-se aos interesses estrangeiros, especialmente ianques, por um punhado de dólares.

Os servidores públicos civis e militares demitidos arbitrariamente por real ou suposta simpatia ao governo deposto.

Foram presos políticos de todas as idades torturados de forma desumana e cruel nos porões da ditadura, massacrados por sádicos servidores do estado, pagos pelo contribuinte.

Foram os mortos, assassinados pelo aparelho da repressão, em crimes quase sempre não assumidos por seus carrascos.

Foram vítimas da ditadura os “desaparecidos”. Brasileiros que, sabemos todos, estão mortos, mas cujos corpos jamais foram encontrados. Cuja sepultura clandestina permanece um mistério.

Essa série “Vítimas da Ditadura” apresentada por esse Blog a partir de farto material arquivado pela “Revista O Berro” se encerra aqui com uma homenagem especial aos familiares desses desaparecidos.

Nas palavras da mãe de uma dessas desaparecidas:
“Eu sei, eu sei que ela morreu. Mas, enquanto não me disserem onde está seu corpo, enquanto não me permitirem enterrar seus restos mortais e fazer uma prece sobre eles, eu sempre terei a ilusão que ela vai romper por essa porta a qualquer momento, me abraçando e beijando enquanto me chama de mama, como sempre fez”.

A essas vítimas da ditadura, suas maiores vítimas, pois seu sofrimento não conheceu anistia e que sofrem hoje na mesma intensidade que sofreram naquela época. A essas vítimas da ditadura para quem a ditadura ainda não terminou, a nossa mais humilde e singela, porém verdadeira, homenagem.

Prof. Péricles

3 comentários:

Anônimo disse...

É de arrepiar o texto, quando, ao final, lê-se a fala da mãe e se percebe a dor dela. É triste porque se sabe que era uma jovem idealista, assim como os outros, gente que queria fazer um mundo melhor. É uma das tragédias da humanidade.
Artur F. B. Martins

Anônimo disse...

E hoje, as gerações que como eu, que só conheceram a ditadura através de livros, não temos a verdadeira noção de ter privado um dos maiores bem dos Homens, a Liberdade!!
Matheus Monticeli Rocha

Anônimo disse...

"A essas vítimas da ditadura, suas maiores vítimas, pois seu sofrimento não conheceu anistia e que sofrem hoje na mesma intensidade que sofreram naquela época. A essas vítimas da ditadura para quem a ditadura ainda não terminou, a nossa mais humilde e singela, porém verdadeira, homenagem."

Sem ter o que comentar só me resta agradecê-lo por abrir este espaço representando todos nós solidários a estas vítimas de fatos tão cruéis e covardes.
Meu muito obrigado Professor. Você é incrível.
Marcos.