A sede de nosso partido ficava no
segundo andar de um velho casarão, bem no centro da cidade.
Estávamos no apagar das luzes da
ditadura, mas sabíamos que ainda haviam forças que apostavam no retrocesso.
Uma caça às bruxas no velho estilo anticomunista
era algo possível, embora não esperado, mas a bomba do Rio Centro também não
era esperada, e, no entanto, aconteceu.
Por isso a palavra de ordem era discrição.
O partido ainda estava na ilegalidade e
o melhor era manter uma rotina sóbria aguardando que os tempos de abertura
removessem os últimos entulhos.
Numa noite estávamos somente cinco, no
segundo andar arrumando panfletos a serem distribuídos numa manifestação do dia
seguinte.
O andar debaixo era vazio, tinha a porta
de entrada e a escada para o andar de cima.
O trinco era antigo, e o último que
entrou esqueceu de passar a chave.
Lá em cima, nós cinco fazíamos as
últimas arrumações movidos a cafezinho quando ouvimos um estouro.
Juro que nunca imaginei que em segundos
se pudesse pensar em tantas coisas.
Uma bomba? Pé na porta? Polícia? Um
tiro?
O medo é um sentimento mais veloz do que
a luz, e flexível, podendo tomar várias formas.
Uma entrada excessiva de água na
embarcação causa pânico.
Barulho no quintal em plena madrugada traz
apreensão.
Nuvens carregadas e sombrias riscadas
por relâmpagos podem aflorar verdadeiras fobias.
Medo é um sentimento que contagia, mas,
por outro lado, relativamente fácil de extirpar.
O segredo? Combatê-lo. Enfrenta-lo em
sua raiz não fugindo das consequências porque nenhuma consequência é pior do
que cultivar o medo, viver com ele, tentar fingir que ele não existe.
No estouro do prédio do nosso partido,
passado o primeiro impacto despencamos pelas escadas para ver o que era em vez de
pular pela janela dos fundos, para descobrir que era apenas o vento e o estouro
de uma velha porta pesada.
No caso da água da embarcação o melhor é
saber de onde ela vem e se necessário preparar os recursos de emergência.
No barulho do quintal as luzes que se
acendem acompanhadas de um bom sistema de alarme pode ser a solução.
E no caso das nuvens carregadas o melhor
é buscar abrigo numa área protegida e esperar que a tempestade passe, porque,
toda tempestade, não importa sua fúria, irá passar.
O medo é covarde pois ataca nossas
fraquezas, mas, não resiste quando se ergue a cabeça para enfrenta-lo.
Hoje os que acreditam na democracia
sentem um indisfarçável sinal de medo.
Temos confiança nas instituições, mas é
inegável que os acordos de interesses, as traições e as alianças dos poderosos
sempre nos causarão desconforto.
Ao ver a Polícia Federal o Judiciário
agindo partidariamente mais preocupados com as luzes da ribalta de uma mídia
comprometida do que com a verdade, como não ter medo?
Mas o medo não pode ser maior que a
esperança, como diria o ex-presidente Lula.
É necessário enfrentar as ameaças à
ordem democraticamente constituída.
Cada um de seu jeito, devemos lutar:
levando informação aos mal informados, conhecimentos que a história nos dá a
quem não a conhece.
Mensagens em redes sociais são
importantes já que os inimigos da democracia controlam as mídias oficias e a
desinformação se esparrama em toda a rede.
E, principalmente, temos que ir para a
rua. Participar do esforço que será demonstrar aos que decidiam os próximos passos,
que, no Brasil a democracia será defendida com unhas e dentes.
Ao que parece a guerra a recém se
inicia.
Haverá tempo para a luta e por mais
desgastante que ela seja temos que ter vivo em nossa mente que pior, muito
pior, seria o conforto dos indignados se a presidente aceitasse a chantagem
para manter a normalidade.
A presidente, guerreira de muitas batalhas
optou pelo enfrentamento e era bem isso que esperava dela seus eleitores.
A nós, cidadão que prezamos a liberdade
e as conquistas populares ao longo desses treze anos, cabe combater o medo, enfrenta-lo
e dissipar as nuvens de ódio que escurecem os céus do Brasil.
Até porque, sabemos bem, por pior que
seja a tempestade, ela passará, assim como porta velha a gente tranca.
Prof. Péricles