sexta-feira, 27 de março de 2015

POLACAS




Elas eram ainda meninas.

E eram judias.

Viviam na Polônia. Pobre Polônia de tantas guerras e massacres, no século XIX.

Elas eram sozinhas. A maioria de pais mortos ou distantes.

Elas vieram para o Brasil. Aqui chegaram em 1867. No Rio de Janeiro.

Mas continuaram meninas judias e sozinhas, agora numa terra estranha.

E resolveram viver, apesar das saudades da Polônia, dos pais mortos e distantes. Optaram pela sobrevivência.

E se tornaram prostitutas.

E a Torah despreza prostitutas.

Agora eram judias renegadas por seu povo, pobres meninas, prostitutas famosas do Rio de Janeiro.

E ganharam um apelido, um nome genérico, um ícone.

As polacas.

Polacas, prostitutas, judias.

Adoravam a vida apesar da miséria, apesar dos homens rudes e do desprezo do seu povo.

Polacas. Meninas polacas. Mulheres da vida. Mulheres em vida.

Apesar de renegadas decidiram continuar judias.

Fundaram a Associação Beneficente Funerária e Religiosa Israelita, em 1906 e criaram sua própria Sinagoga, na rua Afonso Cavalcanti, 171.

Amavam a vida, mas, precisavam pensar na morte. Sim, a morte era certa. Como o desprezo de seu povo, de homens que as adoravam a noite e as negavam de dia.

Conforme a Torah, suicidas e prostitutas não são enterradas junto aos bons cidadãos.

Suicidas e prostitutas, em cemitério judeu são enterrados encostados aos muros, lugar dos párias da sociedade.

Esquecidas na vida. Esquecidas na morte.

Não as polacas. Quem vive a margem da vida não aceita a margem de um muro.

E fundaram seu próprio cemitério, o Cemitério Israelita de Inhaúma.

As polacas, sobreviveram, decidiram viver.

Como sua última presidente de nome Rebeca e Beca como nome de guerra.

Foram tão populares que até a Constituição getulista do estado Novo, a Constituição de 1937 foi apelidada de “polaca”. Forma criativa do povo carioca chamar de prostituta sua Constituição ditadora.

O tempo passou, as polacas passaram. Os tempos são outros.

Mas ficaram as histórias. Algumas engraçadas como aquela em que elas gritavam “sacana” (polícia) dando origem a palavra sacanagem.

E ficaram as lápides. Mais de 700 no Cemitério de Inhaúma. Que está lá onde descansam seus corpos usados, e suas almas meninas.




Prof. Péricles
Fonte: TC Pesquisadora Beatriz Kushnir



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