quarta-feira, 23 de julho de 2014
BARBÁRIE EM GAZA
Por Noam Chomsky/Outras Palavras
Às três da madrugada (horário de Gaza), de 9 de julho, em meio ao último exercício de selvageria de Israel, recebi um telefonema de um jovem jornalista palestino em Gaza. Ao fundo, podia ouvir o lamúrio de seu filho pequeno, entre sons de explosões de jatos, atirando sobre qualquer civil que se mova e sobre casas.
Ele acabava de ver um amigo, num carro claramente identificado como “imprensa”, voar pelos ares. E ouvia gritos ao lado de sua casa, após uma explosão — mas não podia sair, ou seria um alvo provável. É um bairro calmo, sem alvos militares – exceto palestinos, que são presa fácil para a máquina militar de alta tecnologia de Israel, abastecida pelos Estados Unidos.
Ele contou que 70% das ambulâncias haviam sido destruídas e, até aquele momento, mais de 70 pessoas [o número subiu para 120 na sexta, 11/7, segundo o Guardian] haviam sido mortas e 300 feridas – cerca de 2/3, mulheres e crianças. Poucos ativistas do Hamas, ou instalações para lançamento de foguetes, haviam sido atingidas. Apenas as vítimas de sempre.
É importante entender como se vive em Gaza, mesmo quando o comportamento de Israel é “moderado”, no intervalo entre crises fabricadas, como esta. Um bom retrato está disponível num relatório da UNRWA (a agência da ONU para refugiados palestinos) preparado por Mads Gilbert, o corajoso médico norueguês.
Quando Israel está em fase de “bom comportamento”, mais de duas crianças palestinas são mortas por semana – um padrão que se repete há 14 anos. As causas de fundo são a ocupação criminosa e os programas para reduzir a vida palestina a mera sobrevivência em Gaza.
Enquanto isso, na Cisjordânia os palestinos são confinados em regiões inviáveis e Israel tomas as terras que quer, em completa violação do direito internacional e de resoluções explícitas do Conselho de Segurança da ONU – para não falar de decência.
“Tudo isso vai continuar, enquanto for apoiado por Washington e tolerado pelo Ocidente – para nossa vergonha infinita”
Tradução: Antonio Martins/Outras Palavras
sábado, 19 de julho de 2014
CEM ANOS DE TRINCHEIRAS
A Primeira Guerra Mundial, cuja data de início fez cem anos, recentemente, foi uma das maiores tragédias humanas da nossa história, e também, um dos fatos mais anunciados e previstos.
No século XIX ocorreu a segunda revolução industrial. Novas fontes de energia, máquinas cada vez mais rápidas e eficientes, provocaram uma superprodução de bens nunca antes vista na história do capitalismo.
Nunca se produziu tanto e a venda dessa produção prometia uma riqueza nunca antes imaginada.
Para isso, era fundamental vender. Ampliar o mercado consumidor virou obsessão de industriais, banqueiros, investidores e de seus representantes, os respectivos governos de seus países.
Junto a isso havia a “necessidade” de encontrar matéria-prima que fosse cada vez mais barata para serem transformadas no produto industrial.
O primeiro passo para o enriquecimento surreal que se previa fora os investimentos na criação de máquinas cada vez melhores. Ao mesmo tempo o pagamento de salários cada vez menores, a exploração da mão-de-obra infantil e do trabalho da mulher.
Num segundo momento ocorreu uma das mais indecentes e desumanas corridas que a história já assistiu. Uma corrida desenfreada de potências européias em direção aos territórios da África e da Ásia. Territórios ricos em matéria-prima e ocupados por povos divididos, governos regionalizados e defendidos por exércitos frágeis e mal equipados
Utilizando um pensamento asqueroso a quem alguém chamou de “Darwinismo social”, no qual os Europeus alegavam estarem levando o progresso aos povos primitivos do planeta, os países europeus empreenderam guerras de conquista que incluíram limpeza étnica e massacres incontáveis para dominar os territórios desses dois continentes. Esses crimes bárbaros, essa dominação violenta, são registrados na história como “neocolonização”.
Povos inteiros massacrados, espoliados, humilhados, expulsos de suas terras, em nome do progresso e do lucro do capital estrangeiro.
Do século XIX em diante as guerras não mais se dariam por fronteiras ou por direitos de coroa ou religião. Foram todas guerras por mercados.
Esse dinheiro sujo de sangue promoveu na Europa o luxo e o progresso que alguém denominou de “La Belle Époque”.
Agora, na virada do século XIX para o XX pairava um momento de grande expectativa.
A partilha pacífica tornava-se cada vez mais difícil diante de tantos interesses e de tanto dinheiro envolvido. Além disso, havia a Alemanha.
Esse país nasceu no final do século XIX a partir da concretização da idéia de criar “a pequena Alemanha” com a unificação dos estados germânicos, sem a Áustria. Oto Von Bismarck foi o artífice do sonho e idealizador da política que após três guerras bem planejadas, contra a Dinamarca, Áustria e frança, permitiram nascer uma nova nação no coração da Europa.
Mas, não era apenas uma nova nação, e sim, uma potência emergente que já surgiu com propostas bem concretas de ocupação de espaço e de conquistas de gordas fatias do já, disputadíssimo mercado.
O surgimento da Alemanha decretou um desequilíbrio definitivo entre as antigas potências.
Com os primeiros anos do século XX termina a Bela Época e se inicia um período tenebroso em que, apesar de não haver tiros, o cheiro da morte está no ar e era possível saber que a guerra estava próxima. A esse período denominamos “Paz Armada”.
Alianças secretas foram assinadas. Uma unia Inglaterra e França (arque inimigos, porém unidos pelo mesmo temor da Alemanha) e Rússia. Outra agrupava Alemanha e Itália (recém nascidos que se sentiam excluídos da partilha) e Áustria-Hungria.
O início da Grande Guerra foi antecedido por uma intensa campanha da mídia (sempre ela) que visava convencer os cidadãos de que a guerra era necessária. Não eram os interesses de industriais e banqueiros que estavam em jogo. Mas da pátria.
Na Inglaterra chegou-se a ouvir o discurso de que, não haveria um só inglês que não fosse beneficiado com a derrota da Alemanha numa guerra direta.
Na França o discurso nacionalista e revanchista contra uma guerra perdida em 1871 para essa mesma Alemanha, alimentava a imaginação de uma guerra inevitável.
Uma guerra que, diziam, seria rápida, quase a tempo de retornar para as aulas do colégio no ano seguinte.
Daí termos um acontecimento inédito na história das nações. A I Guerra Mundial não teve uma causa direta, específica. O assassinato do arquiduque da Áustria-Hungria em visita a Sarajevo, capital da Bósnia Herzegovina por estudantes sérvios, é apontado como causa. Mas, um assassinato político, seguido da prisão dos seus responsáveis jamais justificaria uma guerra mundial. A menos que, ela já estivesse preparada, apenas aguardando um sinal.
Na verdade a causa da Guerra que matou milhões foi a cobiça, a ambição e amor ao lucro e ao poder de gente que, não morreu na guerra, porque quem morre na guerra, não são os ricos e seus filhos, são os pobres, os trabalhadores, que, aliás, não tinham nada a ver com essa briga
Prof. Péricles
quinta-feira, 17 de julho de 2014
ADIVINHA O QUE NÃO ACONTECEU
Por Matthew Futterman, no Wall Street Journal
O sol apareceu. As pessoas foram para o trabalho. Elas dirigiram táxis, abriram supermercados, clicaram em seus computadores para tratar de assuntos jurídicos e financeiros. Médicos curaram os doentes. Assistentes sociais enfrentaram os problemas da grande pobreza neste país de cerca de 200 milhões. A vida continuou.
Adivinha o que não aconteceu? Cidades não queimaram. Rebeliões em massa não aconteceram. Tanto quanto sabemos, torcedores não se jogaram de edifícios porque sua amada Seleção foi destruída pela Alemanha, por 7-1, na semifinal da Copa.
À luz cruel do dia, ainda é estranho escrever “Alemanha 7, Brasil 1.” Esse tipo de resultado não acontece neste nível de futebol. O último jogo oficial que o Brasil perdeu em casa foi em 1975. Se eu fosse um nativo, estaria abalado, tentando descrever a debacle que aconteceu em Belo Horizonte.
Não se engane: a derrota para a Alemanha, para usar a frase favorita do técnico dos EUA, Jurgen Klinsmann, foi uma lástima. As pessoas aqui amam o futebol. O governo declara feriados nos dias de partidas da equipe nacional. Ruas vazias, e eu quero dizer vazias – como se você pudesse montar uma barraca no meio de uma delas e não acontecer nada.
Ainda assim, não compre a história de que esta perda vai deixar alguma cicatriz indelével em um país tentando desesperadamente prosperar em uma série de áreas que não têm nada a ver com futebol. Essa idéia é um pouco humilhante para os brasileiros, que são a coleção de almas mais acolhedoras com que eu me deparei.
Houve a mulher na loja de óculos aqui em São Paulo que se recusou a aceitar dinheiro pelo estojo de óculos que ela me deu depois que eu perdi o meu. Houve os estudantes universitários em Natal que me ofereceram um tour pela cidade e uma carona de volta para meu hotel no meio da noite, quando não havia transporte à vista após a vitória dos EUA sobre Gana.
Lá estava o rabino que, 30 segundos depois de me conhecer, insistiu para que eu fosse jantar no sábado em sua casa (eu fui, e a sopa de matzo ball estava incrível). Houve as inúmeras almas pacientes comigo na rua, esperando enquanto eu tateava meu dicionário de bolso de português, procurando a palavra certa para completar uma pergunta idiota, quando certamente eles tinham algo melhor para fazer.
Estive aqui por um mês. Isso dificilmente me qualifica como um especialista na cultura brasileira. Minha amostragem é pequena e limitada a hotéis, restaurantes, estádios de futebol e pistas de corrida ao lado de praias do Rio, Natal, Recife e algumas outras cidades-sedes. Eu sei do crime e da pobreza.
Mas eu também sei que este é um país incrível, diverso. Encare quatro horas de voo rumo à Amazônia a partir de São Paulo e as pessoas parecem completamente diferentes daquelas em qualquer centro comercial do país. Em Salvador, você pode muito bem achar que está na África Ocidental. Em cada cidade, pessoas de todos os tons de pele — preto, marrom e branco — preenchem áreas de ricos e pobres. É um país de beleza física impressionante e vastos recursos naturais. O tráfego da hora do rush faz as avenidas de Los Angeles parecerem estradas do interior, um sinal claro de que o lugar precisa de alguns melhoramentos de infra-estrutura, mas também que há um grande número pessoas trabalhadoras que querem tornar o amanhã melhor do que hoje.
Em outras palavras, o Brasil é muito mais do que uma camisa canarinho e uma obsessão com o futebol.
O colapso contra a Alemanha certamente vai despertar algum exame de consciência nacional sobre como o Brasil cultiva e desenvolve a sua próxima geração de estrelas do futebol. O país tem um enorme banco de talentos, mas acidentes não podem mais acontecer no esporte. Vencer nesse nível hoje significa não apenas talento, mas dinheiro, treinamento e uma estratégia coerente.
“Quando você pensa sobre isso”, disse uma brasileira de 20 e poucos em um bar na noite passada, “é meio engraçado. Quer dizer, sete gols. É engraçado, né?”
Eu vou apostar que o Brasil como um todo vai se sair muito bem depois disso. Chateado um pouco, claro, mas em última análise, tudo vai dar certo. De muitas maneiras, já deu.
quinta-feira, 10 de julho de 2014
O AMOR, A ALMA E O PRAZER
Filho de Vênus (deusa do amor) e de Marte (deus da guerra), Cupido era o deus do Amor e da paixão em Roma, equivalente a Eros, entre os gregos.
Júpiter (pai dos deuses), sabedor das perturbações que iria provocar, tentou obrigar Vênus a desfazer-se dele assim que nasceu. Para protegê-lo, a mãe escondeu-o num bosque, onde ele se alimentou com leite de animais selvagens.
Cupido encarnava a paixão e o amor em todas as suas manifestações. Era geralmente representado como um menino alado que carregava um arco e setas, sempre pronto para disparar sobre o coração de homens e deuses. Os ferimentos provocados pelas setas que atirava despertavam amor ou paixão nas suas vítimas.
Embora fosse algumas vezes apresentado como insensível e descuidado, Cupido, geralmente orientado por sua mãe Venus, muitas vezes provocava situações terríveis ao fazer despontar a paixão onde ela não poderia, ou deveria ocorrer.
Certo dia, Vênus estava admirando a terra quando avistou uma bela moça numa praia. Na verdade, mais que bela, era tão linda que abalava a própria hegemonia de Vênus entre as mais belas.
Essa moça se chamava Psiquê.
Contrariada, Vênus decidiu que ela, por castigo de tamanha beleza, iria se apaixonar e casar com o homem mais feio do mundo.
Chamou seu filho Cupido e pediu que este fosse, durante a noite, até a casa de Psiquê e lhe atingisse com sua flecha do amor.
Cupido obedeceu, mas ao ver Psiquê em sono profundo, bela, e totalmente nua, ficou perturbado, e se aproximou demais de sua “vítima”. Nesse instante a jovem se moveu no leito e acidentalmente bateu no braço de Cupido que disparando a flecha atingiu a si mesmo.
Cupido imediatamente sentiu um amor profundo por Psiquê.
Sem mais conseguir sossego, pois o amor desassossega, o jovem deus foi falar com Zéfiro, senhor do vento oeste e pediu para que transportasse Psique para os ares e a instalasse num palácio magnífico, onde era a casa de Cupido.
Quando a noite caiu, a moça ouviu uma voz misteriosa e doce: "Não se assuste, Psiquê, sou o dono desse palácio. Ofereço-lho como presente do nosso casamento, pois quero ser seu esposo. Tudo que está vendo lhe pertence. E tudo que deseja será concebido. Eu só lhe faço uma exigência: não tente ver-me. Só sob esta condição poderemos viver juntos e sermos felizes".
Todas as noites Cupido vinha ver Psiquê, mas numa forma invisível. A moça estava vivendo muito feliz naquele lindo palácio. Mas, sabemos como são as mulheres, a curiosidade cada vez mais tomava conta de sua vontade de conhecer o rosto do homem que a fazia tão feliz.
Certa noite, quando Cupido veio vê-la, eles encontraram-se e amaram-se profundamente, mas quando Cupido adormeceu Psiquê escondida e em silêncio pegou numa lamparina e acendeu-a, e quando ela viu o belo jovem de rosto corado e cabelos loiros, ficou encantada. Mas num pequeno descuido deixou cair uma gota de óleo no braço do rapaz, que acordou assustado e, ao ver Psiquê, Cupido grita que o amor não sobrevive sem confiança e em seguida desaparece.
O encanto todo acabou, o palácio os jardins e tudo que havia em volta desapareceu, como por magia. Psiquê ficou sozinha e perdida num lugar árido, pedregoso e deserto.
Infeliz, Cupido foi para o Olimpo e suplicou a Júpiter que lhe permitisse uma nova chance e devolvesse a esposa amada.
A princípio Júpiter quis argumentou que o deus do amor não podia se unir a uma mortal, mas Cupido, em lágrimas tornou a suplicar que então, o deus dos deuses a tornasse imortal.
Júpiter, um conquistador incorrigível que, várias vezes havia pedido ajuda a Cupido em suas aventuras, acabou cedendo.
Psiquê foi transformada em imortal por Júpiter, tornando-se a alma humana.
Cupido e Psiquê, amor e alma, casaram-se e ainda vivem em amor eterno.
Tiveram em consequência desse amor, um filho, o prazer.
Mais uma vez a mitologia nos lembra sobre o que realmente importa em nós. A nossa porção divina, a alma, única capaz de reter aquilo que nunca morre.
É na eternidade da alma que o amor é possível. Apenas cultivando a nossa própria vida somos capazes de confiar nos sentimentos reais como o amor e não nos falsos reflexos da paixão.
Nossos castelos estão além das futilidades da existência e, nosso inferno, árido e perdido reside na nossa impaciência.
Ressalta ainda que o prazer é filho e conseqüência do amor e não a sua gênese.
Prof. Péricles
terça-feira, 8 de julho de 2014
INCÊNDIO EM SARAJEVO
Era um domingo de muito sol. As ruas da bela cidade de Sarajevo, capital da Bósnia-Herzegovina, estavam enfeitadas com bandeirinhas e cartazes coloridos. Pessoas se espremiam nas calçadas para assistir a passagem do comboio composto por cinco carros, onde ao centro, em um carro aberto, acenava para a multidão o arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro ao trono da Áustria-Hungria e sua esposa, a duquesa Sofia. Era o dia 28 de junho de 1914, cem anos atrás.
Após a cerimônia de recepção na câmara municipal, seguem a marginal junto ao rio Miljacka.
Na mesma manhã, seis jovens estudantes sérvios, componentes da organização ultranacionalista, clandestina, “Mão Negra”, tinham se espalhado pelo trajeto provável (o trajeto oficial não havia sido divulgado) que seria seguido pelo comboio. O plano é simples, matar o arquiduque e após cometer suicídio para não ser capturado com vida e delatar a organização sob tortura.
O primeiro dos seis, Muhamed Mehmedbasic acredita que foi descoberto e está sendo vigiado, entra em pânico e desaparece na multidão, mas o segundo, Nedeliko Cabrinovic lança uma bomba sobre o carro de Francisco Ferdinando, mas não atinge o alvo, acertando o terceiro carro da comitiva, ferindo alguns, mas sem causar mortes.
O terceiro, o mais jovem de todos, Vaso Cubrilovic acovarda-se ao perceber a presença não prevista da duquesa. Mas tarde, no seu julgamento dirá que não atirou pois seria incapaz de matar uma mulher.
O quarto, Cvijetko Popovic, era míope e não conseguiu distinguir a figura do arquiduque entre as outras personalidades.
Já Gavrilo Princip que ficara numa rua em que a comitiva acabou não passando, ouviu a explosão e acreditou no sucesso da operação. Mas, conseguiu ver Cabrinovic preso em meio à confusão após a bomba e percebeu que algo havia dado errado.
O atentado fracassara. Mas, uma séria de fatos aleatórios acabaria interferindo no desfecho do drama.
Furioso com a tentativa de assassinato e se dizendo indignado pelo risco que a esposa correra o
arquiduque decide abreviar os planos, mas, sem cancelá-los para não parecer covarde. Assim, decide ir ao hospital visitar feridos, conforme planejado. Já a reunião com mulheres bósnias de que participaria Sofia é cancelada e ela decide acompanhar o marido na visita ao hospital.
Desta vez vão à alta velocidade, mas o motorista engana-se no caminho,
mete-se num beco, pára o carro (sem marcha atrás) e este tem de ser
empurrado para a estrada.
Nesse momento Gavrilo Princip está descendo a rua, furioso pelo plano, meticulosamente preparado ter dado errado. É de se imaginar sua surpresa ao ver o carro do arquiduque completamente indefeso e à sua mercê.
São 11 horas da manhã quando Gravilo, sem pestanejar aperta o gatilho várias vezes.
Em instantes arquiduque e duquesa estão mortos.
O assassino tenta o suicídio atirando contra si mesmo, mas é agarrado por uma multidão atraída pelos tiros.
O que os desatinados jovens queriam era causar uma forte comoção que revertesse em favor da causa da criação de uma “Grande Sérvia”. Pensavam que, a presença da Áustria nos Bálcãs, em auxílio de sua aliada, a Bósnia-Herzegovina, impedia que seu povo alcançasse plenamente a nacionalidade e a independência.
Jamais poderiam imaginar que um mês depois do atentado, a Áustria usasse o atentado de Sarajevo para declarar guerra à Sérvia. Eu a Rússia aliada da Sérvia declarasse guerra à Áustria. Eu alemães, ingleses e franceses acabassem, por força de alianças secretas, também declarando guerra e que, assim, a Europa e o mundo entrassem no maior pesadelo de todos os tempos, até então, a Grande Guerra, mais tarde chamada de A Primeira Guerra Mundial.
No que será que pensaram os meninos de Sarajevo sobre uma guerra que matou mais de 10 milhões de pessoas. Eu pela primeira vez vitimou mais civis que militares, utilizou armas químicas, aviões e submarinos como armas letais?
Nunca saberemos se eles morreram se sentindo culpados da guerra ou se perceberam que todo o cenário já estava montado, aguardando apenas a ordem de ação.
Sabemos apenas que Gavrilo Princip, por ser menor, não pode ser condenado à morte e que acabou morrendo tuberculoso na prisão de Theresienstadt, em 1918, quatro anos depois do atentado de Sarajevo, e, curiosamente, poucos dias depois do fim da Grande Guerra.
Princip e seus amigos deveriam ouvir os conselhos dos mais velhos quando de que, criança que brinca com fogo, acaba se queimando. Nesse caso, o incêndio foi maior que toda a Europa.
Prof. Péricles
sábado, 5 de julho de 2014
O DONO DA VERDADE
Ser o dono geralmente representa, ter poder.
Alguns donos fazem parte inesquecível de nossas vidas... Por exemplo, o dono da bola no tempo em que, crianças, desejávamos passar o dia todo jogando futebol. Pois, o dono da bola era alguém poderoso. Às vezes sua chegada era precedida de uma espera torturante, quem sabe, deliberadamente provocada, pois não basta ter o poder, é necessário demonstrá-lo diante dos que não tem. A tortura podia ser longa até sua chegada, dele não, da bola que o trazia a reboque.
Não sei por que maldita tradição, geralmente o dono da bola era péssimo jogador, mas, sua titularidade no time era inquestionável. A bola, ou melhor, a posse dela, lhe conferia poder indiscutível. Isso, porém, não lhe assegurava popularidade, pois, apesar de garantir um lugar no time, não garantia, necessariamente, amigos.
O dono das mais difíceis figurinhas também.
Sempre havia aquele sortudo (aquele cujos pais podiam comprar quantidades maiores de envelopes) que tinha no bolso das calças as mais difíceis figuras para completar o álbum. O dono das figurinhas difíceis foi, para muitos, o primeiro exercício de diplomacia na vida, pois exigia negociação e alianças. Geralmente o dono das figurinhas difíceis compreendia que, o que para ele, era excedente, para outros era o essencial, e disso fazia um macabro jogo de poder. Talvez a maioria dos especuladores financeiros de hoje foram donos de figurinhas difíceis no passado.
E o dono do carro?
Quando jovens um carro e a maturidade era quase a mesma coisa. A turma ansiava sair à noite e mostrar sua incondicional rebeldia e independência, e nisso, nada mais decisivo e impactante na cabeça das meninas (ao menos no imaginário dos meninos) do que sair de carro. Disse sair e não exatamente ter um carro.
Quem tinha o carro, era quase uma lenda, por isso mesmo, tinha uma coleção de amigos que o capitalismo pode cooptar.
Mas, o mais indesejável dos donos, atravessa os tempos e pode estar ao seu lado a qualquer momento do dia. É o dono da verdade.
Sabe aquela pessoa que tem todas as respostas corretas? Que esteve em todos os lugares, falou com todas as pessoas e que nunca, jamais, de maneira alguma tem dúvidas? Aquela que não ouve sua argumentação, pois enquanto você fala está apenas pensando no que dirá em seguida para arrasar seja lá o que você estiver dizendo?
Pois é, o dono da verdade, sempre acompanhado de certezas inflexíveis.
Muitas vezes certezas nascidas no que disseram na televisão ou no “dizem por aí”.
O dono da verdade pode ser uma pessoa inteligente e articulada tornando às vezes incompreensível como possa ser tão obtuso.
A presunção, na maioria das vezes é a causa maior de suas convicções, mas, existem outras causas.
O fanatismo, por exemplo.
Quando em 1578 o rei português D. Sebastião, determinou a organização de uma expedição militar para invadir o norte da África e de lá expulsar os infiéis muçulmanos, não faltaram por parte de seus comandantes bons argumentos de que a missão estava condenada ao fracasso, visto ser o exército português inexperiente e frágil perante os exércitos inimigos.
Como D. Sebastião era o dono da verdade e de convicções nascidas do fanatismo religioso, mesmo sendo um homem culto e bem informado, empreendeu a fatídica expedição, totalmente destruída na batalha de Alcácer-quibir. Ele e todos os seus soldados perderam a vida e Portugal a independência.
Fanatismo produz arrogâncias, autoritarismos e donos da verdade, não necessariamente nessa ordem.
Destruidor de qualquer rodinha de amigos desconhece, o dono da verdade que, muitas vezes, é melhor estar com a paz do que estar com a razão, que, aliás, não precisa se impor pois a humildade da verdade se impõe por si.
E, como diria o sábio grego, melhor seria não esquecer que a gente só sabe, com relativa certeza, que nada sabe.
Prof. Péricles
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