RACISTAS AMADORES
Eles são tipicamente americanos. A extrema-direita americana se juntou e
saiu em furiosa passeata, para revolta mundial. Não faltaram vozes que gritaram
forte contra aqueles racistas agrupados e os males terríveis que representam.
Foi tão cruento que ele, ninguém menos do que ele, Donald Trump, saiu a dar
declarações, dizendo ser desprezível o movimento; justo ele, ícone do racismo,
ninguém acreditou em um por cento da sinceridade de suas palavras, mas vá lá,
falou institucionalmente, como Presidente dos Estados Unidos da América.
Eles
são os supremacistas, neologismo
não reconhecido, ao menos, no dicionário que acabo de consultar.
Eles, aqueles porcos racistas americanos devem morrer de inveja porque
não-racistas brasileiros têm, faz quase quinhentos anos, suas babás negras, em
uniformes brancos, para cuidar de seus rebentos, sem que houvesse necessidade
de formalizar-se esse vínculo de emprego, porque não era emprego, era apenas
trabalho.
Ah, aqueles racistas sórdidos americanos devem sonhar com uma escola
exclusiva, privada e cara, em que o negro seja, no máximo, o tio da cantina,
jamais um professor ou mesmo um aluno. Pois, chorem, americanos racistas
idiotas, temos isso aqui, em nossa democracia mega-racial, escolas privadas e
não precisamos por isso mesmo nos preocupar com a escola pública, já que essa
gentinha não vai estudar muito mesmo na vida.
Seria um sonho para aqueles nazis americanos que a polícia de lá
prendesse ou matasse mesmo os negros inconvenientes. Pois bem, já fazemos isso
aqui há tempos, sem que ninguém mais se escandalize. Aliás, a palavra de
policial, aqui, sorry, Racist America, é suficiente para condenar os pretos
abordados na rua, sem qualquer motivação, apenas por atitude suspeita.
Tudo que lhes preencheria o domingo era ver pretos miseráveis serem
atingidos por jatos d’água gelada, numa madrugada de inverno. Se isso lhes
aquecesse a alma, bastaria que viessem a São Paulo e assistissem a esse
espetáculo, patrocinado pela Prefeitura e sua operosa Guarda Civil, com direito
a uma performance extra de nosso alcaide, que derrubou paredes de casa ocupada
por gente que mal tinha o que comer.
Racistas Americanos! Deve ser horrendo a eles ver a grana dos impostos
brancos, direcionada a comprar comida para a criançada filha dos pretos que
insistem em ter direitos. Mal sabem eles que, nesse Brasil verde-amarelo, nosso
prefeito mandou cortar fundo a merenda na creche, de um jeito que provocaria
risadinhas entre os racistas americanos: para prevenir a obesidade infantil,
ele disse. Ele não é engraçadinho? Nós aqui, já estamos tão acostumados com
esse seu senso humor, que nada, mas nada dissemos. Quando muito, jogamos um ovo
na testa dele e é só.
Não penduramos negros enforcados, que horror. Optamos por outra
estratégia, seus racistas ignorantes! Construímos uma doutrina da Guerra ao
Tráfico, só para isso: invadir comunidades de gente preta e passar fogo em quem
for possível. Vale tudo: de feto a criança, todos são pretos, quase pretos, ou
vivem como pretos, com direito a carro blindado, a que chamamos carinhosamente
de caveirão. Elegemos deputados, temos programas de televisão, humanos
direitos, enfim, sabemos fazer a coisa e, claro, sabemos botas a culpa de tudo
até na Venezuela.
Nós odiamos vocês, americanos racistas. Odiamos tanto que lutamos
ferozmente contra essa coisa horrorosa de colocar cota para pretos em que tudo
que é lugar, desde faculdades até concursos públicos, menos, claro, para os
concursos perigosos, como os da magistratura e ministério público, em que a
meritocracia ainda manda mais alto, ora essa. Não brincamos com fogo, rapazes.
Professores negros, médicos negros, engenheiros negros, arquitetos
negros, advogados negros, promotores de justiça negros, juízes negros, já
fizemos nossa parte por aqui e não corremos esse risco! Não sofremos desse mal aqui
no Brasil, racistas de mierda!
Nessa crise em que vivemos, por culpa do PT, bem que o Itamaraty poderia
fazer uma campanha publicitária, com nosso super-prefeito paulistano,
sorridente, com pulôver nas costas, com seu arzinho de genro preferido, com aquele
rostinho de trabalhador que ele possui, chamando o bravo turista americano e
seus dólares de prata:
“Venha para o Brasil.
Aqui o racismo deu certo”
Uma globeleza bem que
poderia ilustrar o folder. Seria o máximo. Eles, os racistas americanos morreriam
de inveja. Amadores!
Roberto Tardelli é Advogado.
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