Por Miguel do Rosário
Luigi Ferrajoli, um dos maiores autores jurídicos do mundo, faz uma análise política brilhante do golpe no Brasil no parlamento italiano: “o impeachment completamente insensato e infundado da presidenta Dilma ilumina o sentido político da operação contra Lula. E vice-versa! O processo de fúria judicial, a demonização, a espetacularização, tudo isso ilumina o verdadeiro sentido do impeachment”.
O discurso de Ferrajoli é um violento tapa na cara da comunidade jurídica brasileira, incluindo os operadores da Lava Jato, que gostam de citar o autor.
Ferrajoli rechaça veementemente qualquer vínculo entre a Operação Mãos Limpas, que, segundo ele, está longe de ser um modelo de garantismo penal, pois cometeu muitos abusos, e a Lava Jato. A Mãos Limpas respeitava o processo penal. A Lava Jato, não.
Faz um discurso emocionado contra a Lava Jato e contra Sergio Moro, acusando-os de repetir procedimentos enterrados desde o fim da idade média do direito penal:
(…) podemos reconhecer, neste processo, além das extraordinárias violações, como a difusão e a publicação de interceptações, feitas pelo próprio juiz, as características típicas da Inquisição.
Outros trechos do discurso proferido em 11 de abril de 2017:
(…) por isso tem se falado em golpe de Estado que é, de um lado, judicial, e, por outro, parlamentar.
Ou seja, uma operação contra uma presidenta legitimamente eleita, Dilma Rousseff, e um impedimento de outro candidato do mesmo grupo de se candidatar, evidenciam uma mudança de linha política, inclusive institucional, visto que o governo tinha implementado programas como o Bolsa Família. Haviam sido implementadas medidas sociais de direito à saúde e à educação.
Então devemos nos preocupar porque, além de um caso judicial que é realmente escandaloso, e além do processo que atingiu a presidenta do Brasil, estamos diante de uma operação que se apoia num processo de deformação do espírito público, do senso comum, da informação, para controlar, instrumentalizando meios judiciais e pseudoparlamentares, o poder institucional do Brasil. ”
(…) Isso nos lembra da figura do juiz inquisidor, descrita por Beccaria, ou seja, “quando o juiz se torna inimigo do réu, e se atormenta, e receia perder o jogo, se não consegue comprovar uma acusação”.
Isso não é admissível.
É preciso proteger, antes de tudo, a jurisdição e o Estado de Direito, que requer um respeito às leis, as quais foram criadas sem o intuito de declarar guerra a ninguém!
Por isso é importante, e eu acredito nessa ideia de uma organização de magistrados ativos que precisam analisar esses processos, criticá-los, denunciar os abusos, nem que seja só para discutir opiniões.
São atitudes que podem colocar um freio e deslegitimar essa operação [Lava Jato], que é de uma gravidade enorme, porque além de suas intenções políticas, contingentes, que são as eleições de 2018, ela está produzindo uma mudança na estrutura do Estado de Direito, com base na indiferença, na desinformação e no consenso geral.
Porque a forma mais terrível de populismo não é o populismo político, e sim o populismo judiciário.
E isso pode representar um perigo para o qual a comunidade jurídica deve olhar de maneira muito atenta, para proteger a jurisdição e a própria dignidade do direito!
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