quinta-feira, 12 de novembro de 2015
É O MERCADO, ESTÚPIDO
Por Moisés Mendes
Uma das propostas de resgate de fortunas extraviadas que recebi por e-mail neste ano me desafia a buscar US$ 85 milhões no ICBC, o Banco Industrial e Comercial da China.
É o apelo de sempre: o dinheiro abandonado por um investidor poderá ser meu.
Por que sempre tão longe? Por que não no Equador? De qualquer forma, é tentador. É perto dos US$ 97 milhões que Pedro Barusco, o ladrão avulso da Petrobras no tempo do governo tucano, levou para a Suíça.
Foi a primeira vez que recebi tal convite vindo da China.
Tenho e-mails enviados da Síria, do Sudão, da Líbia, da Tunísia, do Azerbaijão.
Ainda me causa estranheza que a terra de Confúcio seja citada entre os lugares de fortunas sem dono. Até pouco tempo, não havia especulação financeira na China, que aos poucos acabou virando essa coisa estranha, disforme, que ninguém sabe direito o que é.
Fortunas de financistas extraviadas na Índia, na Ucrânia, no Paquistão, tudo bem. Mas na China?
E recebo o apelo na hora em que se anuncia que o país vai quebrar. O mundo aguarda a implosão do comuno-capitalismo confuciano.
O que será do povo comunista que investiu loucamente em ações, quando o povo capitalista ocidental tentava se desfazer das suas? De onde os chineses tiraram que o mercado de ações funciona, se desde 2008 as bolsas do mundo rico estão emperradas?
Seria o fim da superbolha chinesa.
Imagine um chinês ainda agarrado à lembrança de Mao Tsé-tung — e ainda em dúvida sobre o que levou o país a esse estranho capitalismo —, agora falido e com um monte de ações que não valem nada.
A China pode ter seu crash de 29, apenas quatro décadas depois da morte de Mao.
Vou esperar o livro Breve Introdução à História da China, que o professor Carlos Eduardo da Cunha Pinent lança agora pela Sulina, para entender a crise de identidade do capitalismo chinês. Gostaria que o professor me ajudasse a decifrar o ódio que certos jovens liberais brasileiros sentem pela ditadura cubana e a adoração que nutrem pela ditadura chinesa.
Um amigo apressado me disse: é o mercado, estúpido. Cuba não tem mercado, nem mão de obra de graça, nem bagulhos baratos. Cuba, estúpido, só tem médicos.
Pobre Mao Tsé-tung.
O estágio superior do capitalismo está vicejando na sua China. Mao não merece. Nem Confúcio.
E muito menos os nossos velhos liberais.
Moisés Mendes é jornalista de Porto Alegre/RS
terça-feira, 10 de novembro de 2015
O ÉDEN AMEAÇADO
Templo de Palmira foi destruído |
Mesopotâmia,
terra entre rios. Um dos berços da humanidade.
Terra de
muitos povos que surgiram, floresceram e desapareceram, mas deixaram sua marca
e seu legado.
Tudo
testemunhado pelos rios Tigre e Eufrates e seus vizinhos como a Palestina do
Rio Jordão e o Egito, a terra dos faraós.
Ali a
humanidade aprendeu a escrever em cuneiformes gravados em tabletes de argila,
tão antigos quanto os hieróglifos egípcios.
E foi em
escrita hieroglífica que ficou registrado o mais antigo código de leis
conhecido pelo homem, o Código do grande rei Hamurabi.
“Eu,
Hamurabi, pela vontade dos deuses rei de toda a mesopotâmia...”
Suas
velhas cidades assistiram o esplendor de povos que cultuavam o prazer do agora
e buscavam fazer da vida o melhor passatempo possível.
Segundo
os autores bíblicos foi ali que um dia Deus criou o Jardim do Éden, os homens
construíram a Torre de babel e onde duas cidades, Sodoma e Gomorra, foram
completamente destruídas pela ira de Deus.
Muitas de
suas maravilhas, como os Jardins Suspensos da babilônia já desapareceram,
muitas outras ainda são perceptíveis através de ruínas e outras ainda estão
para serem descobertas.
Mas a
Mesopotâmia e seus arredores fica na região mais conflituosa do globo. O
Oriente Médio, mais especificamente o Iraque, destruído pelos Estados Unidos e
aliados, a Síria, o Irã, o Afeganistão.
Aqui a
perversidade anda de mãos dadas com a intolerância e no rastro de exércitos
muito mais cruéis do que foram um dia os Assírios do rei Sargão II, os tesouros
de sua história convivem com a ameaça de agressão.
A Rússia
há algumas semanas entrou no conflito pois o “faz de contas” dos Estados Unidos
de combater o tragicômico EI já ameaçava diretamente o governo de seu aliado Bashar
al-Assad.
Sem fazer
de contas a aviação russa em três semanas destruiu mais da força militar do EI do
que EUA e aliados em mais de ano.
Mas os misseis não distinguem os tesouros humanos de seus objetivos, quando lançados, por isso Sergei Lavrov, ministro das Relações Exteriores russo, pede que a UNESCO (órgão
da ONU para Educação, Ciência e Cultura), envie peritos para a região para
avaliar os danos causados pela guerra ao patrimônio cultural e mapear, com
clareza, as regiões de interesse histórico mais importantes e que precisam ser
preservadas.
Diga-se
de passagem, essa é uma súplica antiga de historiadores do mundo inteiro.
Historiadores norte-americanos chegaram a entregar por escrito uma carta de
recomendação ao presidente Barak Obama, assinalando os pontos mais importantes a serem preservados mas, ao que parece, não foram levados
em consideração pelos senhores da guerra.
A questão
é urgente como demonstra à demolição do templo de Palmira uma antiga cidade semita de muitas histórias, situada num oásis na província de Homs, a 215 km de Damasco, capital da Síria.
Palmira
foi declarada Patrimônio Mundial da UNESCO, mas nem por isso o Estado Islâmico
deixou de dinamitar vários lugares, incluindo os antigos templos de Baal
(divindade máxima dos mesopotâmios) Marduke e Baalshamin, de onde
veio a expressão Belzebaal, ou Belzebu, dos hebreus.
O pedido do Ministro Lavrov tem
como base jurídica a Convenção das Nações Unidas de 1954 sobre a proteção de
bens culturais em caso de conflito armado.
Os esforços da Rússia para o
desenvolvimento das relações culturais entre os países do mundo no âmbito do
trabalho da Unesco estão prejudicados por medidas discriminatórias de certos governos
para quem os interesses estratégicos e econômicos superam em larga margem os
interesses culturais, afirma o Ministro.
Espera-se
que os deuses antigos orientem os passos daqueles que, como herdeiros da
cultura milenar deixada pelos mesopotâmios, têm a tarefa intransferível de
protege-la.
Prof.
Péricles
sábado, 7 de novembro de 2015
PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE FLORES
Por Vitor Nuzzi
Pouca coisa se sabe efetivamente sobre a obra de Geraldo Vandré. Sua carreira de músico profissional foi relativamente curta e prejudicada por um certo folclore alimentado pelo silêncio.
São apenas cinco LPs lançados, de 1964 a 1973, data de seu retorno ao Brasil, após quatro anos e cinco meses de andanças pelo exterior, em uma saída forçada pela repercussão de sua música mais conhecida, Pra não Dizer que não Falei das Flores (Caminhando), de 1968.
A partir daí, prevaleceram as lendas. Para usar uma expressão do escritor Eric Nepomuceno, em artigo recente no jornal Valor Econômico, o artista "alcançou píncaros de luz para depois mergulhar numa névoa densa, carregada de perguntas sem resposta e mistérios sem solução".
As perguntas mais recorrentes são se Vandré foi mesmo torturado, se enlouqueceu. Ou por que motivo nunca mais se apresentou no Brasil – seu último show foi do lado paraguaio da fronteira, em 1982. A alguns artistas, como Jair Rodrigues e Ney Matogrosso, chegou a falar em fazer apresentações "nas fronteiras", que nunca aconteceram.
Vandré estava no radar do regime, mas tortura física nunca houve. Talvez algo mais grave tivesse acontecido se ficasse no Brasil. Depois da decretação do AI-5, em 13 de dezembro de 1968, ele permaneceu escondido – na casa de praia do pai de sua namorada, no litoral sul paulista, e depois no apartamento de dona Aracy, viúva de Guimarães Rosa, no Rio de Janeiro, perto do Forte de Copacabana. Os soldados faziam manobras e Vandré, versos.
Durante o carnaval de 1969, ele deixou o país disfarçado em direção ao Uruguai, e de lá para o Chile. Partiu para a Europa, andou pelo Velho Continente, fixou-se na França e, por fim, voltou ao Chile, de onde saiu dois meses antes do golpe que em setembro de 1973 derrubou Salvador Allende e iniciou um período de terror.
Artistas como Caetano Veloso e Chico Buarque, presos naquela época, dizem que nos interrogatórios era possível perceber certa "prioridade" dos militares em relação a Vandré. Alguns falavam mesmo em matá-lo, segundo o compositor baiano.
Famoso produtor de festivais, Solano Ribeiro acredita que ele poderia ser morto se fosse preso no pós AI-5. Por ironia, seu último show no Brasil como cantor profissional foi em 13 de dezembro, data do ato institucional, em Anápolis (GO).
O motivo de tanta raiva seriam alguns versos de Caminhando, que teriam sido especificamente destinados aos militares, em um período que culminaria no período mais violento da ditadura.
Em 2007, à então estudante de Jornalismo Jeane Vidal, o autor chamaria sua obra mais famosa de expiação. "Mais do que uma canção, Caminhando foi um desnudamento. Um dizer-se tudo quando era proibido dizer-se quase tudo. Sem ofensas e sem reivindicações. Um relato indeclinável para todos nós, brasileiros, que ali nos reunimos num concurso de arte, sem paradigma e sem igual, até hoje, para mim."
O concurso a que Vandré se refere foi o Festival Internacional da Canção (FIC). Um representante do Brasil seria escolhido previamente para a fase internacional. Ganhou Sabiá, de Tom Jobim e Chico Buarque. Uma música delicada, que tratava do exílio, mas de forma sutil.
O público queria a canção explícita de Vandré e vaiou longamente a decisão dos jurados. Não era exatamente para Tom, mas ficou marcada como a maior vaia que o compositor recebeu.
O médico otorrino José Vandregíselo (do qual se origina o nome artístico) foi ligado ao Partido Comunista, mas seu filho Geraldo nunca foi militante político.
Paraibano de João Pessoa, no Chile, chegou a ser internado para tratamentos psiquiátricos.
Uma condição para a permanência no Brasil foi uma falsa entrevista, forjada pelos militares e exibida no Jornal Nacional, da Globo, um mês depois da real data de seu retorno. Ali, Vandré renegou qualquer uso político de sua obra. Foi uma espécie de retratação, como se dizia na época.
O silêncio foi imposto e também assumido.
Vandré deu entrevista em 1974 para o programa de estreia de Flávio Cavalcanti, mas o censor viu "apologia" à figura do artista e vetou o quadro. O Brasil também era outro.
Para a pesquisadora Dalva Silveira, autora do livro A Vida não se Resume em Festivais, houve uma tentativa do governo autoritário de "apagar Vandré e sua obra da memória coletiva nacional", à medida que a imprensa não podia fazer referência ao seu nome, nem ele podia se apresentar.
Mas o compositor faz também sua crítica à sociedade que, de alguma forma, deu as costas quando ele retornou, doente e fragilizado, e que talvez o preferisse como mártir.
Assim, há muito o que se explorar e descobrir no universo musical criado por Vandré. Sem se preocupar tanto com o festival que representou seu auge e o fim, ao mesmo tempo. Até hoje fala-se em uma possível pressão militar para que Caminhando não ganhasse em 1968.
"A história reserva às peças desse tabuleiro as suas posições corretas, não adianta você mexer. Tanto filme ganha Festival de Cannes e cai no esquecimento em seguida... E tantos filmes que não ganham prêmio nenhum e ficam eternos na memória de todos os cinéfilos", O que traduz este momento? Naquele momento, traduzimos com Caminhando."
Em Teresópolis, região serrana do Rio de Janeiro, onde tem vivido nos últimos tempos e onde sua mãe morava (dona Marta morreu em 2011; "seu “José, em 1986), ele se ocupa, fazendo canções e versos em silêncio.
O repórter Vitor Nuzzi lançou em abril o livro Geraldo Vandré – Uma Canção Interrompida.
São apenas cinco LPs lançados, de 1964 a 1973, data de seu retorno ao Brasil, após quatro anos e cinco meses de andanças pelo exterior, em uma saída forçada pela repercussão de sua música mais conhecida, Pra não Dizer que não Falei das Flores (Caminhando), de 1968.
A partir daí, prevaleceram as lendas. Para usar uma expressão do escritor Eric Nepomuceno, em artigo recente no jornal Valor Econômico, o artista "alcançou píncaros de luz para depois mergulhar numa névoa densa, carregada de perguntas sem resposta e mistérios sem solução".
As perguntas mais recorrentes são se Vandré foi mesmo torturado, se enlouqueceu. Ou por que motivo nunca mais se apresentou no Brasil – seu último show foi do lado paraguaio da fronteira, em 1982. A alguns artistas, como Jair Rodrigues e Ney Matogrosso, chegou a falar em fazer apresentações "nas fronteiras", que nunca aconteceram.
Vandré estava no radar do regime, mas tortura física nunca houve. Talvez algo mais grave tivesse acontecido se ficasse no Brasil. Depois da decretação do AI-5, em 13 de dezembro de 1968, ele permaneceu escondido – na casa de praia do pai de sua namorada, no litoral sul paulista, e depois no apartamento de dona Aracy, viúva de Guimarães Rosa, no Rio de Janeiro, perto do Forte de Copacabana. Os soldados faziam manobras e Vandré, versos.
Durante o carnaval de 1969, ele deixou o país disfarçado em direção ao Uruguai, e de lá para o Chile. Partiu para a Europa, andou pelo Velho Continente, fixou-se na França e, por fim, voltou ao Chile, de onde saiu dois meses antes do golpe que em setembro de 1973 derrubou Salvador Allende e iniciou um período de terror.
Artistas como Caetano Veloso e Chico Buarque, presos naquela época, dizem que nos interrogatórios era possível perceber certa "prioridade" dos militares em relação a Vandré. Alguns falavam mesmo em matá-lo, segundo o compositor baiano.
Famoso produtor de festivais, Solano Ribeiro acredita que ele poderia ser morto se fosse preso no pós AI-5. Por ironia, seu último show no Brasil como cantor profissional foi em 13 de dezembro, data do ato institucional, em Anápolis (GO).
O motivo de tanta raiva seriam alguns versos de Caminhando, que teriam sido especificamente destinados aos militares, em um período que culminaria no período mais violento da ditadura.
Em 2007, à então estudante de Jornalismo Jeane Vidal, o autor chamaria sua obra mais famosa de expiação. "Mais do que uma canção, Caminhando foi um desnudamento. Um dizer-se tudo quando era proibido dizer-se quase tudo. Sem ofensas e sem reivindicações. Um relato indeclinável para todos nós, brasileiros, que ali nos reunimos num concurso de arte, sem paradigma e sem igual, até hoje, para mim."
O concurso a que Vandré se refere foi o Festival Internacional da Canção (FIC). Um representante do Brasil seria escolhido previamente para a fase internacional. Ganhou Sabiá, de Tom Jobim e Chico Buarque. Uma música delicada, que tratava do exílio, mas de forma sutil.
O público queria a canção explícita de Vandré e vaiou longamente a decisão dos jurados. Não era exatamente para Tom, mas ficou marcada como a maior vaia que o compositor recebeu.
O médico otorrino José Vandregíselo (do qual se origina o nome artístico) foi ligado ao Partido Comunista, mas seu filho Geraldo nunca foi militante político.
Paraibano de João Pessoa, no Chile, chegou a ser internado para tratamentos psiquiátricos.
Uma condição para a permanência no Brasil foi uma falsa entrevista, forjada pelos militares e exibida no Jornal Nacional, da Globo, um mês depois da real data de seu retorno. Ali, Vandré renegou qualquer uso político de sua obra. Foi uma espécie de retratação, como se dizia na época.
O silêncio foi imposto e também assumido.
Vandré deu entrevista em 1974 para o programa de estreia de Flávio Cavalcanti, mas o censor viu "apologia" à figura do artista e vetou o quadro. O Brasil também era outro.
Para a pesquisadora Dalva Silveira, autora do livro A Vida não se Resume em Festivais, houve uma tentativa do governo autoritário de "apagar Vandré e sua obra da memória coletiva nacional", à medida que a imprensa não podia fazer referência ao seu nome, nem ele podia se apresentar.
Mas o compositor faz também sua crítica à sociedade que, de alguma forma, deu as costas quando ele retornou, doente e fragilizado, e que talvez o preferisse como mártir.
Assim, há muito o que se explorar e descobrir no universo musical criado por Vandré. Sem se preocupar tanto com o festival que representou seu auge e o fim, ao mesmo tempo. Até hoje fala-se em uma possível pressão militar para que Caminhando não ganhasse em 1968.
"A história reserva às peças desse tabuleiro as suas posições corretas, não adianta você mexer. Tanto filme ganha Festival de Cannes e cai no esquecimento em seguida... E tantos filmes que não ganham prêmio nenhum e ficam eternos na memória de todos os cinéfilos", O que traduz este momento? Naquele momento, traduzimos com Caminhando."
Em Teresópolis, região serrana do Rio de Janeiro, onde tem vivido nos últimos tempos e onde sua mãe morava (dona Marta morreu em 2011; "seu “José, em 1986), ele se ocupa, fazendo canções e versos em silêncio.
O repórter Vitor Nuzzi lançou em abril o livro Geraldo Vandré – Uma Canção Interrompida.
quarta-feira, 4 de novembro de 2015
QUANDO PARLAMENTARES ANDAVAM ARMADOS
Tenório Cavalcanti |
Por Norman P.J. Davis Júnior
A liberação de porte de armas para senadores e deputados federais, aprovada em uma especial da Câmara nesta semana, faz lembrar uma época em que era comum que parlamentares não só andassem armados como resolvessem as querelas políticas na base do tiro e da intimidação.
O caso mais famoso foi o do senador Arnon de Mello, pai do atual senador Fernando Collor (PTB-AL), que assassinou um colega em plenário. Foi em 1963. Arnon de Mello tinha uma disputa com Silvestre Péricles, também de Alagoas, e atirou nele. Mas errou.
Quem acabou atingido foi outro senador, José Kairala, que não tinha nada a ver com a briga dos dois. O senador acabou morrendo horas depois em um hospital. Péricles prometeu em seguida que iria matar Arnon de Mello.
A história começou com Arnon de Mello provocando o rival e o chamando de crápula. Péricles partiu para cima dele e Arnon sacou a arma. João Agripino, da UDN paraibana, tio do atual senador José Agripino, tentou apartar. Péricles se jogou no chão para sacar a própria arma.
Kairala morreu porque tentou separar os dois enquanto Arnon seguia atirando. Arnon e Péricles foram presos, mas logo soltos e absolvidos.
(Não deixa de ser curioso que parte dos envolvidos siga com suas famílias representadas no Congresso)
Outra cena célebre envolve o então deputado Antônio Carlos Magalhães, avô do atual prefeito de Salvador, Antônio Carlos Magalhães Neto. Ele resolveu interromper um discurso de Tenório Cavalcanti, o famoso “homem da capa preta”, que não só andava armado como dava um nome a sua arma: a "Lurdinha".
Cavalcanti acusava um aliado de ACM de corrupção. O baiano retrucou: “Vossa Excelência pode dizer isso e mais coisas, mas na verdade o que vossa excelência é mesmo, é um protetor do jogo e do lenocínio, porque é um ladrão”.
Tenório sacou a arma e disse: “Vai morrer agora!” ACM revidou dizendo: “Atira, fdp!”
Tenório não atirou, e passou para o folclore que ACM molhou as calças em plenário. Mas sobreviveu. Tenório disse para a turma do deixa-disso que não se preocupassem. Podem sossegar. Só mato homem!
Seria uma pena, 50 anos depois, descobrir que os parlamentares pensam em
voltar a se armar e que a política nacional pode ter evoluído tão pouco em meio século.
segunda-feira, 2 de novembro de 2015
GUARDIÃO DE CABELOS AMARELOS
A figura de Sepé Tiarajú está fortemente relacionada ao imaginário do gaúcho.
Líder de um povo subjugado e inferiorizado militarmente teve a coragem de lutar pelo que considerava justo e erguer a voz com seu lendário: "Esta terra tem dono!".
Sepé foi brilhante como líder e como guerreiro em campo de batalha, sendo respeitado até pelos inimigos. Acredita-se que sua morte tenha sido premeditada para tira-lo da cena decisiva do conflito, a batalha de Caiboaté.
Como se dariam os fatos da tenebrosa batalha se houvesse a participação de Tiarajú? Jamais saberemos.
Ao longo do tempo, entretanto, a figura de Sepé foi sendo “europeizada” e “cristianizada” a ponto de ser visto como um santo popular dos católicos do Rio Grande.
Nas representações gráficas sua imagem abandonou o estereótipo guarani para adotar uma postura e rosto do “homem branco”.
Os Guaranis de hoje reclamam dessa “desindianização” do mito e alegam ser essa mais uma grande injustiça contra seu povo.
Como diz Werá Tupã (também chamado de Leonardo), tido como um dos mais destacados intelectuais indígenas do sul do país, “ninguém pode continuar pensando que perdemos a memória”.
Ele faz parte de um grupo de guaranis que vem pesquisando fatos históricos e episódios lendários com o objetivo de reapresentá-los ao povo brasileiro de um modo diferente daquele que se tornou predominante.
Um dos temas, cujo estudo demorou anos e ainda não está totalmente concluído, é a verdadeira história de Sepé Tiarajú.
Segundo Werá Tupã: Os homens da Igreja católica apossaram-se da figura heroica, metamorfoseando-a quase num branco que era índio por acaso.
Os livros falam que ele "abraçou a doutrina cristã" e foi "o mais ardoroso defensor da obra dos jesuítas"; que "seus mestres foram os padres"; que ele lutou "sugestionado pelos religiosos"; que "foi criado pelos jesuítas"; Werá Tupã discorda de tudo isso.
“Ele pertencia a um outro povo indígena que não conseguimos identificar. Ele foi adotado pelos guaranis e criado como um dos nossos".
Essa já é uma declaração bombástica de Leonardo, Sepé, era índio sim, mas não Guarani. E prossegue.
Quando ele tinha dois anos de idade, sua aldeia, que ficava no Rio Grande do Sul, foi atacada por portugueses ou espanhóis. Os guaranis correram para ajudar, mas o lugar já tinha sido invadido e quase todos tinham sido massacrados.
Os guaranis salvaram o menino e o levaram para uma aldeia nossa, perto da missão de São Miguel. Um casal adotou ele. O avô da família era um pajé muito poderoso e o menino adorava ele.
Uma coisa que quase ninguém sabe é que o nome certo dele não era Sepé Tiarajú. Esse era o jeito que os padres das missões entenderam e escreveram.
Seu nome era Djekupé A Djú, que significava "Guardião de Cabelo Amarelo".
"Guardião" porque era um guerreiro e "cabelo amarelo" porque não tinha o cabelo bem preto como os guaranis, era meio castanho. Mas era índio mesmo, não mestiço.
O destino de guerreiro (e não pajé como o avô adotivo) foi porque ele era revoltado com os brancos e tinha gratidão pelos guaranis. Queria lutar pelos guaranis. É que, na aldeia, nunca esconderam dele a sua história, tudo que tinha acontecido no ataque.
Os jesuítas não criaram ele, mas ia sempre nas missões porque aprendia tudo que pudesse com os padres. Foi assim que aprendeu a língua espanhola.
Sepé articulou uma espécie de Confederação Guaranítica, criando inovadoras táticas militares para a época, nas quais priorizava a guerrilha e evitava grandes batalhas. Chegou a idealizar e construir quatro peças de artilharia, confeccionadas com cana brava.
Foi assassinado numa emboscada, nos campos de Caiboaté, às margens da Sanga da Bica, em 7 de fevereiro de 1756.
As pesquisas a respeito de Sepé baseiam-se na história oral, preservada na memória de índios centenários que viveram no Rio Grande do Sul.
Resgatar a memória de Sepé Tiarajú, em nada diminuí seu espaço na galeria de heróis da liberdade, e é fundamental para se fazer justiça histórica a esse mito que sobrevive ao tempo nas histórias contadas e recontadas em torno no fogo de chão.
Prof. Péricles
quinta-feira, 29 de outubro de 2015
O MINUANO SUSSURRA SEU NOME
Local da Morte de Sepé Tiarajú |
Em 1750 com a assinatura do tratado de Madri, a região denominada de “Sete Povos das Missões” (noroeste do atual estado do Rio Grande do Sul) passou a fazer parte das terras portuguesas no continente.
Imediatamente, por iniciativa do Marques do Pombal, os Jesuítas de língua espanhola que, vindos da região do Paraguai em 1680, haviam fincados raízes por aqui, construindo às sete missões (São Borja, São Miguel, Santo Ângelo, São João, São Lourenço, São Nicolau e São Luis) foram expulsos para o outro lado do Rio Uruguai.
O fato foi recebido com inevitável resignação pelos padres mas com extrema pavor por seus aliados, os índios Guaranis.
Para os guaranis havia apenas dois tipos de brancos, os Jesuítas que lhes protegiam em troca de sua submissão religiosa e os bandeirantes que os atacavam com armas de fogo e, sempre que possível, os escravizavam, levando para terras distantes.
Para eles, a saída dos Jesuítas significava abandono e escravidão.
Em fevereiro de 1753 uma comissão de demarcadores ao chegar em São Miguel foi impedida pelos índios de seguirem adiante no trabalho de demarcar oficialmente o novo território.
Segundo os relatos, eles eram liderados por um jovem índio chamado Sepé Tiaraju.
Um ano depois, soldados portugueses estacionados no forte de Rio Pardo (atual cidade de Rio Pardo) convidaram, gentilmente, um grupo de guaranis a entrar no forte e ao penetrarem na guarnição foram imediatamente presos.
O oficial em comando acusou o grupo de ter roubado cavalos durante a noite. O líder do grupo de guaranis, Sepé Tiaraju disse saber onde estavam e prometeu ir busca-los. Mesmo escoltado por doze portugueses conseguiu fugir sem deixar rastro, muito menos, os cavalos.
Fatos como esses somado a insistência dos Guaranis de não abandonar a região enfureceram o governo português.
Era inadmissível aceitar a liderança de um selvagem que ousara dizer “Essa terra tem dono” numa afronta intolerável aos novos “senhores” do Continente de Rio Grande.
As “Guerras Guaraníticas” iriam se desenrolar entre os anos de 1754 a 1756.
A primeira expedição, foi organizada em parceria por forças portuguesas e espanholas e chegaram ao Continente no início do mês de setembro de 1754, mas, devido as péssimas condições climáticas de frio e chuvas intensas, tiveram que recuar.
Novas tropas portuguesas vindas do Rio de Janeiro unem-se a tropas espanholas vindas de Buenos Aires e Montevideo no início de 1756.
Algumas escaramuças menores, vencidas pelos índios fariam crescer a lenda do guerreiro invencível.
O desenrolar dos fatos acabaria levando a uma batalha que ambos os lados perceberam ser decisiva, a Batalha de Caiboaté, localidade próxima do atual município de São Gabriel.
Antes, porém, um grupo especial comandado por oficial português, e composto de renegados e desertores, que faziam guerra por dinheiro, recebeu a missão de matar Tiarajú. Não se conhece muitos detalhes, mas, conseguiram atraí-lo para uma emboscada.
O heroico índio foi morto em 7 de fevereiro de 1756, atingido por arma de fogo.
Três dias depois, a 10 de fevereiro, os índios foram forçados a enfrentar as tropas luso-espanholas em Caiboaté.
A morte de seu líder e maior estrategista seria fatal para os nativos.
O chefe dos Guaranis colocou suas forças postadas na forma de uma meia lua, o que enfraqueceu os flancos e fez com que seus homens fossem presas fáceis para o ataque de artilharia (armada até de canhões), além da cavalaria pelos lados.
A batalha de Caiboaté foi tão desigual que durou apenas uma hora e quinze minutos e o sangue indígena derramado foi tanto que formou uma grande pasta de lodo. Os sobreviventes capturados, feridos ou não, eram sumariamente executados.
O exército espanhol perdeu três homens e teve dez feridos. O português, um morto e 30 feridos. Os mortos entre os guaranis foram de 1500 a 1750 guerreiros.
Um militar português o coronel José Custódio de Sá e Faria chegou a escrever em seu diário, no dia 10 de fevereiro de 1756, que “fazia grande compaixão a multidão de mortos”.
A morte de Sepé e a chacina final representaram a derrota definitiva dos índios guaranis, os verdadeiros donos dessas terras.
Em maio de 1756, as tropas coloniais ocuparam os Sete Povos das Missões.
Em 1762 a Espanha voltou atrás e anulou o Tratado de Madri reiniciando a guerra contra os portugueses.
As Missões tornaram-se ruínas.
E Sepé tornou-se lenda e um dos mais fortes mitos na formação do povo rio-grandense.
Até hoje ainda dizem que o Minuano quando percorre as terras do Rio Grande sussurra o seu nome... Tiarajúúúúúúúúúúúúúúúúúú.
Prof. Péricles
O fato foi recebido com inevitável resignação pelos padres mas com extrema pavor por seus aliados, os índios Guaranis.
Para os guaranis havia apenas dois tipos de brancos, os Jesuítas que lhes protegiam em troca de sua submissão religiosa e os bandeirantes que os atacavam com armas de fogo e, sempre que possível, os escravizavam, levando para terras distantes.
Para eles, a saída dos Jesuítas significava abandono e escravidão.
Em fevereiro de 1753 uma comissão de demarcadores ao chegar em São Miguel foi impedida pelos índios de seguirem adiante no trabalho de demarcar oficialmente o novo território.
Segundo os relatos, eles eram liderados por um jovem índio chamado Sepé Tiaraju.
Um ano depois, soldados portugueses estacionados no forte de Rio Pardo (atual cidade de Rio Pardo) convidaram, gentilmente, um grupo de guaranis a entrar no forte e ao penetrarem na guarnição foram imediatamente presos.
O oficial em comando acusou o grupo de ter roubado cavalos durante a noite. O líder do grupo de guaranis, Sepé Tiaraju disse saber onde estavam e prometeu ir busca-los. Mesmo escoltado por doze portugueses conseguiu fugir sem deixar rastro, muito menos, os cavalos.
Fatos como esses somado a insistência dos Guaranis de não abandonar a região enfureceram o governo português.
Era inadmissível aceitar a liderança de um selvagem que ousara dizer “Essa terra tem dono” numa afronta intolerável aos novos “senhores” do Continente de Rio Grande.
As “Guerras Guaraníticas” iriam se desenrolar entre os anos de 1754 a 1756.
A primeira expedição, foi organizada em parceria por forças portuguesas e espanholas e chegaram ao Continente no início do mês de setembro de 1754, mas, devido as péssimas condições climáticas de frio e chuvas intensas, tiveram que recuar.
Novas tropas portuguesas vindas do Rio de Janeiro unem-se a tropas espanholas vindas de Buenos Aires e Montevideo no início de 1756.
Algumas escaramuças menores, vencidas pelos índios fariam crescer a lenda do guerreiro invencível.
O desenrolar dos fatos acabaria levando a uma batalha que ambos os lados perceberam ser decisiva, a Batalha de Caiboaté, localidade próxima do atual município de São Gabriel.
Antes, porém, um grupo especial comandado por oficial português, e composto de renegados e desertores, que faziam guerra por dinheiro, recebeu a missão de matar Tiarajú. Não se conhece muitos detalhes, mas, conseguiram atraí-lo para uma emboscada.
O heroico índio foi morto em 7 de fevereiro de 1756, atingido por arma de fogo.
Três dias depois, a 10 de fevereiro, os índios foram forçados a enfrentar as tropas luso-espanholas em Caiboaté.
A morte de seu líder e maior estrategista seria fatal para os nativos.
O chefe dos Guaranis colocou suas forças postadas na forma de uma meia lua, o que enfraqueceu os flancos e fez com que seus homens fossem presas fáceis para o ataque de artilharia (armada até de canhões), além da cavalaria pelos lados.
A batalha de Caiboaté foi tão desigual que durou apenas uma hora e quinze minutos e o sangue indígena derramado foi tanto que formou uma grande pasta de lodo. Os sobreviventes capturados, feridos ou não, eram sumariamente executados.
O exército espanhol perdeu três homens e teve dez feridos. O português, um morto e 30 feridos. Os mortos entre os guaranis foram de 1500 a 1750 guerreiros.
Um militar português o coronel José Custódio de Sá e Faria chegou a escrever em seu diário, no dia 10 de fevereiro de 1756, que “fazia grande compaixão a multidão de mortos”.
A morte de Sepé e a chacina final representaram a derrota definitiva dos índios guaranis, os verdadeiros donos dessas terras.
Em maio de 1756, as tropas coloniais ocuparam os Sete Povos das Missões.
Em 1762 a Espanha voltou atrás e anulou o Tratado de Madri reiniciando a guerra contra os portugueses.
As Missões tornaram-se ruínas.
E Sepé tornou-se lenda e um dos mais fortes mitos na formação do povo rio-grandense.
Até hoje ainda dizem que o Minuano quando percorre as terras do Rio Grande sussurra o seu nome... Tiarajúúúúúúúúúúúúúúúúúú.
Prof. Péricles
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