sexta-feira, 12 de maio de 2017

MEU ÓDIO A LULA


Por Cristina Diniz


Luiz Inácio Lula da Silva tornou-se Presidente da República quando eu tinha 13 anos – entre 2003 e 2010 – e, nesses oito anos de mandato, senti muita raiva do sujeito. Não consigo lembrar exatamente desde quando ou por que, mas desde que me conheço por gente eu tenho uma certeza: que ódio desse Lula ignorante.

Em partes, porque minha família inteira o detesta também. Cresci ouvindo comentários da piada que ele era. De como supostamente arrancou um dedo só para ganhar um processo contra a fábrica que trabalhava. E, o mais chocante: porque não tinha educação. Como assim? Quer ser Presidente do Brasil e só fez até a quarta-série? Até eu já tinha passado da quarta-série. Diziam também que era analfabeto e não sabia escrever ou ler – circulava sempre uma sátira dele lendo um livro de ponta cabeças. Pessoalmente eu tinha minhas dúvidas em relação ao fato, afinal aprende-se a ler antes da quarta-série.

Outra razão e objeto de canalização do meu ódio era o partido que ele representava. *Insira um palavrão*, o PT. Quem conseguia apoiar o Partido dos Trabalhadores? Eu ficava revoltada porque meu número na chamada na escola foi o 13 por três anos seguidos. Também não gostava de vermelho e evitava a cor. Nunca me esqueço do ano em que, para as Olimpíadas do Colégio, minha turma teve que ficar com a camisa vermelha – e o meu número era o treze, imaginem que vergonha eu passei.

Oras, o PT e o Lula já eram a escória da sociedade brasileira mesmo antes de estarem no poder. Mesmo antes do Lula ser Presidente eu já odiava o Lula e nós já sabíamos que ele era um ignorante. A voz dele irritava, e o fato do partido dele representar a esquerda. Ah, a esquerda! – ameaçava a paz global. Pra ser sincera eu também não sei desde quando comecei a ver a esquerda como a representação do mal na Terra, porém eu tinha as explicações que recebia: Che Guevara comunista matou milhares, comunismo é satanismo e o MST é uma barbaridade. Ok, no fundo eu não sentia nem vergonha por não saber explicar o meu ódio.

Quando entrei na faculdade de Relações Internacionais em 2010, era ano de eleições. E com informação, meu ódio cresceu. O curso estava dividido entre PSDB e PT, e eu obviamente, andava pelos corredores com meu “Serra” no peito. Para meu primeiro trabalho importante como universitária, na aula de Introdução à Política Externa, me propus a estudar e promover o debate “As Propostas de Política Externa dos Candidatos a Presidente do Brasil” – José Serra e Dilma Rousseff (Deus me livre, a Dilma).

Em resumo, depois de dois meses de pesquisa a minha conclusão me irritou: basicamente a política externa de Lula e do PT estavam trazendo o país para o seu momento mais privilegiado no cenário internacional, e a proposta de Serra levava para outro caminho. Por fim, tentei disfarçar mas apresentei o estudo e a conclusão. Ainda assim votei pelo PSDB naquele ano, e ainda assim tive muita raiva e “ameacei sair do país” quando Dilma foi eleita. Também culpei o Nordeste analfabeto por não saber votar e comprar os votos pra ganhar esmola do bolsa-família.

E saí do país, fui fazer o primeiro intercâmbio (trabalhar em uma fábrica nos Estados Unidos) e, aprendendo melhor o inglês, também fiz um curso online oferecido pela ONU na época: Os Desafios da Fome no Mundo. No primeiro texto eu já queria desistir. “Caso de estudo Brasil: a política social que tirou o país do mapa da fome”. É claro que enaltecia o programa Bolsa Família e o ex-Presidente Lula. Será que os doutores conheciam o Lula e o PT? Ah, que raiva. Que raiva por que mesmo?

Quem nunca se sentiu uma pessoa ruim por odiar um alguém sem saber explicar o porquê? Principalmente nós, mulheres, que fomos educadas para ver a outra como inimiga e ameaça, e o fazemos assim até a maturidade chegar através de informação e experiências (quando ela chega) – enfim, comecei a perceber então que o que agora mais me dava raiva era que eu não sabia do que estava falando. Afinal, o problema do Brasil era a desigualdade e vilão nesse caso poderia ser o neoliberalismo, mas não era o Bolsa-Família ou o Lula.

A minha ficha caiu quando realmente olhei para uma charge na Veja (a revista que meus avos assinam e eu lia assiduamente): O ex-presidente Lula aparecia montado em um jegue cheio de malas e bolsas, e a legenda “mais um nordestino que veio pra São Paulo sem saber o que fazia” me deixou horrorizada. Esqueci o político naquela imagem e lembrei que essa era uma referência a um povo. Que horror. Era isso que eu pensava. Racista e preconceituosa. Sem a menor empatia. Achando que eu era melhor porque estava no Sul do país. Que bom que eu só tinha 22 anos e ainda dava tempo de me desconstruir.

Ainda faço esse exercício quando me surpreendo com sentimentos negativos a algo ou alguém. Pergunto-me o porquê e espero saber responder com lucidez. Hoje, admiro o Presidente que Lula foi e acompanho a perseguição que sofre, enquanto outros políticos estão envolvidos em escândalos maiores, mas não causam nem metade da indignação. Eu não tenho problemas se o Lula for preso – se fez errado, que pague. Porém como disse uma amiga “se contra fatos não há argumentos, contra a falta a de provas, qual é o argumento ?”.

P.S: É claro que toda vez que um texto que não ataque o Lula seja publicado já se espera ser rotulado como “defender bandido”. Mas aí isso já é analfabetismo funcional, e tudo bem, eu tento entender. Também já fui assim.



Cristina Diniz, Bacharel em RELAÇÕES INTERNACIONAIS – UNIVALI/Santa Catarina
Austin, Texas, 11 de maio de 2017

terça-feira, 9 de maio de 2017

LULA E A HORA DA VERDADE



O que o juiz e sua turma devem estar esperando é algo parecido com o típico nordestino pobre que sempre entrou na “sala da justiça” com os olhos para o chão, segurando nervoso o chapéu entre as mãos, constrangido por achar que não merece estar num lugar dos bacanas.



Todos nós, de alguma maneira, aprendeu um pouco que seja de Lula, para saber que isso não acontecerá amanhã.



O nordestino que entrar naquela sala, diante da austeridade do momento, irá trazer a altivez de quem fez um governo que terminou com 80% de aprovação.



Um governo que teve seus erros e vacilações sim, mas que, como nenhum outro governo soube combater a fome e como nenhum outro procurou associar desenvolvimento com justiça social.



Não será um nordestino arrogante, mas não será o sertanejo massacrado pelo drama da seca que como nenhum outro presidente, ele soube combater com ações e não demagogia.



O Lula que estará amanhã diante do juiz carregará o peso do maior massacre midiático que alguém já sofreu nesse país. Nem Getúlio Vargas, nem João Goulart foram tão espezinhados pela força de uma mídia, robusta pelas novas tecnologias, como foi e tem sido, Lula.



Com certeza estará machucado. A Inquisição deixa marcas na alma. As saudades de Marisa que tombou no combate das hipocrisias e pela primeira vez não poderá estar materialmente presente, será forte.



Mas estará carregando também, as convicções, não as apressadas e artificiais de procuradores, mas as convicções maduras de todos aqueles que acreditam que é possível governar para todos e manter a dignidade apesar de toda campanha desmoralizante que se faça.



O Lula diante do juiz será um pouco de cada um de seu povo diante da onipotência dos poderosos que governam esse país a 500 anos e que em todo esse tempo não fizeram pelos mais pobres uma só fração do que foi feito nos últimos 14 anos de governos populares.



Que ninguém se assuste se ele chorar. Povo chora. Esse povo chora faz 500 anos.



Mas que ninguém espere que ele grite e aponte dedo. Nosso povo aprendeu que a verdade sempre aparece, mesmo que profundamente submersa em mentiras e que, para que ela apareça, não é preciso gritar.



A verdade não precisa de gritos, precisa apenas de tempo para aparecer.



As pretensões de acabar com os direitos trabalhistas, com as aposentadorias e a abertura do país entregue em fatias aos interesses estrangeiros já começam a descortinar os verdadeiros interesses por trás de toda a pirotecnia do golpismo.



O Lula amanhã será novamente a senzala diante da Casa Grande, a esperança enfrentando a soberba.



E será um pouco de cada um de nós.



Prof. Péricles



domingo, 7 de maio de 2017

QUANDO O GOLPE COMEÇOU?


Uma pergunta que se faz pertinente na reflexão que exigem os fatos que abalam a política brasileira jogando o país num dos períodos mais tristes de sua história: afinal, quando começou o golpe?


Parece certo que não foi com a deposição de Dilma, pois esse foi o ápice do golpe. O golpe em si, começou quando?


Bem, alguns pensam que foi em 26 ou 27 de outubro de 2014. Nessa data realizou-se o segundo turno com a vitória de Dilma e derrota de Aécio Neves. Quem assim pensa costuma apontar a não aceitação da derrota pela direita como decisiva e, o político derrotado como principal artífice para a conspiração só fez crescer a partir desse dia.


Outros, mais desconfiados, acreditam que o golpe começou em 01 de janeiro de 2003, quando Lula assumiu seu primeiro mandato. Raciocinam que desde o momento que um partido identificado como de esquerda chegou ao governo tudo passou a ser feito para que esse governo fosse um fracasso, derivando depois de novas derrotas sucessivas, para o golpismo mais clássico.


Pode ser. Argumentos existem, embora não exista unanimidade.


Poderíamos ainda, apontar uma outra data como data máxima de início do golpe: o dia 2 de agosto de 2007.


Nesse dia o STF iniciou um dos mais esdrúxulos e surreais julgamentos de que se tem notícia: o julgamento da Ação Penal 470, vulgo, “mensalão”.


Foram tantas as infâmias jurídicas, as perseguições deslavadas, a complacência para os abusos da mídia que, provavelmente essa seja a data mais segura para o nascimento do monstrengo fascista.

Foi quando soou a primeira nota dessa orquestra autoritária que agora toca sozinha o baile da governança.


Houvesse postura corajosa das alas progressistas e enfrentamento dos abusos com a força que os abusos pediam, provavelmente, tudo seria diferente.


Do jeito que foi, a extrema direita foi descobrindo aos poucos que podia tudo, que era aplaudida sempre, que aparecia no fantástico cheia de glórias e, pior, que as forças populares não reagiam.


Foi aqui que nasceu o golpe.

E você, qual a sua data para aniversário do golpe?





Prof. Péricles

sábado, 6 de maio de 2017

REVOLUÇÃO RUSSA, O DIA DA CAÇA

Por Antonio Luiz M. C. Costa



Há cem anos, em 15 de março de 1917, o tsar Nicolau II foi obrigado a abdicar e pôr um fim a séculos de monarquia russa e de relativa estabilidade social das elites europeias.

Não foi coincidência a revolução começar na data hoje comemorada como o Dia Internacional da Mulher. A partir da campanha das militantes alemãs Clara Zetkin e Luise Zietz, o movimento socialista do início do século XX aceitara incorporar pautas feministas não especificamente trabalhistas e um Dia Internacional da Mulher foi organizado pela primeira vez pelo Partido Socialista dos EUA, em 23 de fevereiro de 1909, em apoio à campanha pelo voto feminino.

A iniciativa fora assistida pela Internacional Socialista no ano seguinte e dias de reivindicação feminista foram celebrados em diferentes datas de fevereiro e março de 1911 a 1914, quando a irrupção da Primeira Guerra Mundial desorganizou o movimento internacional.

Em 1917, porém, a situação na então Petrogrado era insuportável. Com a convocação dos homens válidos para a frente de batalha, mulheres haviam ocupado grande parte das vagas industriais. A guerra e um inverno rigoroso haviam se combinado para desabastecer as cidades de alimentos, matérias-primas e combustíveis. A inflação disparava e a comida faltava, enquanto as fábricas paravam e demitiam por falta de materiais.

Que o Dia da Mulher surgisse de uma greve de 1857 é lenda. Mas nesse ano nasceu Clara Zetkin, sua inspiradora.

Em 18 de fevereiro, os operários e operárias da maior fábrica local, a Companhia Putilov, entraram em greve. No dia 23, trabalhadoras de toda a cidade, organizadas pelas companheiras mais militantes, aproveitaram o Dia Internacional da Mulher para arregimentar apoio aos grevistas nas ruas e fábricas e a elas se juntaram donas de casa enregeladas nas filas.

As lideranças revolucionárias de médio escalão de Petrogrado julgavam a rebelião prematura e se enfureceram.

A paralisação da Putilov tornou-se uma greve geral. O tsar ordenou às tropas de Petrogrado disparar contra os manifestantes de ambos os sexos, se fosse necessário, mas, ao contrário do que temiam dirigentes como Kayurov, os soldados se amotinaram, atiraram contra os comandantes e populares tomaram ou incendiaram os quartéis da polícia.

Sergei Mstislavski, um dos líderes do Partido Social-Revolucionário, confessou o espanto: “A revolução apanhou a nós, o pessoal do partido, cochilando como as virgens tolas da Bíblia”. Leon Trotski escreveu, mais tarde: “As massas quase não tiveram lideranças. Os jornais estavam silenciados pela greve. Sem olhar para trás, elas fizeram a própria história”.

Foi a partir desse 23 de fevereiro, tornado 8 de março com a mudança do calendário, que a Internacional Comunista fixou, em 1922, o Dia Internacional da Mulher. Por muito tempo foi comemorado quase exclusivamente por partidos e sindicatos comunistas e ignorado ou repudiado pelo chamado “mundo livre”.

Segundo historiadoras do feminismo, a lenda de sua origem na repressão violenta a uma imaginária greve de operárias da confecção dos EUA de 1857 surgiu em um artigo de 1955 do jornal comunista francês L’Humanité.

Se com isso pretendia desvincular a data feminista do comunismo soviético e ampliar sua aceitação, teve sucesso. Durante os anos 1960, as feministas dos EUA aderiram à comemoração, internacionalizada pela ONU em 1975. Neste ano de 2017, até conservadores como Donald Trump e Michel Temer precisaram assinalá-la. À sua maneira, é claro.

Logo surgiu quem se dispusesse a dirigir as massas. No dia 27, com mais de 100 mil soldados já rebelados, líderes operários presos foram libertados e organizaram o Soviete (Conselho) de Petrogrado, presidido pelo menchevique Nikolay Chkheidze com esse objetivo. Os políticos tradicionais e a própria nobreza perceberam então o risco de iminente atropelamento pela história e tentaram recuperar a iniciativa.

O presidente da Duma (Parlamento) Mikhail Rodzianko, que na véspera implorara ao tsar por reformas para acalmar a população sem receber resposta, decidiu tomar o poder. Assumiu o comando dos militares não rebelados, prendeu os ministros, fez deter o trem do tsar que voltava à capital e proclamou um governo provisório, liderado pelo príncipe “cadete” Georgy Lvov.

Este não tinha parentesco próximo com a família imperial, mas o próprio grão-duque Kirill Vladimirovich, primo do imperador, hasteou uma bandeira vermelha no seu palácio e juntou-se à revolução.

Muitos aristocratas, assim como políticos burgueses, ansiavam por se livrar da inabilidade militar de Nicolau II e da incompetência política da tsarina Alexandra e julgavam estar em posição de controlar as massas e comandar a transição. Não conseguiram, porém, obrigar o gênio a voltar para a garrafa. O Soviete de Petrogrado continuou a controlar vários ramos do governo e das Forças Armadas e, em plena guerra com a Alemanha, digladiou pelo poder com o Parlamento por meses, enquanto diferentes partidos disputavam as duas casas. Lev Kamenev, Josef Stalin e outros vieram da Sibéria nas semanas seguintes.

Vladimir Lenin, Grigori Zinoviev, Grigori Sokolnikov e demais exilados bolcheviques na Suíça tiveram o retorno facilitado pela Alemanha com a expectativa de um acordo de paz mais favorável e chegaram em 3 de abril. Trotski chegou de Nova York no mês seguinte.

As consequências para a Rússia são bem conhecidas e vale mais a pena lembrar o impacto no resto do mundo. Em 1918, operários e soldados rebelaram-se contra a continuação da guerra em vários países da Europa e em várias regiões chegou-se a proclamar repúblicas soviéticas. Essas insurreições foram esmagadas, mas o fantasma do comunismo passou a assombrar como nunca as elites europeias.

Apesar do enrijecimento do regime russo com Stalin e sucessores, 1917 continuou em boa parte do mundo a inspirar progressos sociais e políticos – ou, pelo menos, inibir certos retrocessos – até o colapso soviético em 1991.

quarta-feira, 3 de maio de 2017

DISCURSO ARRASADOR

Por Miguel do Rosário



Luigi Ferrajoli, um dos maiores autores jurídicos do mundo, faz uma análise política brilhante do golpe no Brasil no parlamento italiano: “o impeachment completamente insensato e infundado da presidenta Dilma ilumina o sentido político da operação contra Lula. E vice-versa! O processo de fúria judicial, a demonização, a espetacularização, tudo isso ilumina o verdadeiro sentido do impeachment”.

O discurso de Ferrajoli é um violento tapa na cara da comunidade jurídica brasileira, incluindo os operadores da Lava Jato, que gostam de citar o autor.

Ferrajoli rechaça veementemente qualquer vínculo entre a Operação Mãos Limpas, que, segundo ele, está longe de ser um modelo de garantismo penal, pois cometeu muitos abusos, e a Lava Jato. A Mãos Limpas respeitava o processo penal. A Lava Jato, não.

Faz um discurso emocionado contra a Lava Jato e contra Sergio Moro, acusando-os de repetir procedimentos enterrados desde o fim da idade média do direito penal:

(…) podemos reconhecer, neste processo, além das extraordinárias violações, como a difusão e a publicação de interceptações, feitas pelo próprio juiz, as características típicas da Inquisição.

Outros trechos do discurso proferido em 11 de abril de 2017:

(…) por isso tem se falado em golpe de Estado que é, de um lado, judicial, e, por outro, parlamentar.

Ou seja, uma operação contra uma presidenta legitimamente eleita, Dilma Rousseff, e um impedimento de outro candidato do mesmo grupo de se candidatar, evidenciam uma mudança de linha política, inclusive institucional, visto que o governo tinha implementado programas como o Bolsa Família. Haviam sido implementadas medidas sociais de direito à saúde e à educação.

Então devemos nos preocupar porque, além de um caso judicial que é realmente escandaloso, e além do processo que atingiu a presidenta do Brasil, estamos diante de uma operação que se apoia num processo de deformação do espírito público, do senso comum, da informação, para controlar, instrumentalizando meios judiciais e pseudoparlamentares, o poder institucional do Brasil. ”

(…) Isso nos lembra da figura do juiz inquisidor, descrita por Beccaria, ou seja, “quando o juiz se torna inimigo do réu, e se atormenta, e receia perder o jogo, se não consegue comprovar uma acusação”.

Isso não é admissível.

É preciso proteger, antes de tudo, a jurisdição e o Estado de Direito, que requer um respeito às leis, as quais foram criadas sem o intuito de declarar guerra a ninguém!

Por isso é importante, e eu acredito nessa ideia de uma organização de magistrados ativos que precisam analisar esses processos, criticá-los, denunciar os abusos, nem que seja só para discutir opiniões.

São atitudes que podem colocar um freio e deslegitimar essa operação [Lava Jato], que é de uma gravidade enorme, porque além de suas intenções políticas, contingentes, que são as eleições de 2018, ela está produzindo uma mudança na estrutura do Estado de Direito, com base na indiferença, na desinformação e no consenso geral.

Porque a forma mais terrível de populismo não é o populismo político, e sim o populismo judiciário.

E isso pode representar um perigo para o qual a comunidade jurídica deve olhar de maneira muito atenta, para proteger a jurisdição e a própria dignidade do direito!

segunda-feira, 1 de maio de 2017

VAZA TEMER


Como se sentiu na sexta-feira, golpista?

Não adianta fingir. Se desse, teria baixado o pau, né? Mas não baixou, porque lhe deu paúra.

Gente demais. Mais de 30 milhões de trabalhadores paralisados em todo o País.

E seu ministro da porrada, aquele da bancada ruralista, chama isso de pífio. A raposa falando das uvas. Para quem não tem popularidade e é avaliado como o pior "governante" da história do Brasil, tanta gente na rua não é um bom presságio.


Pífios são vocês. Traidores mesquinhos. Gente feia. Smeagols.

Poderia ter entrado para a memória como pacificador, dando apoio à Presidenta Dilma Rousseff e articulando sua base parlamentar, mas preferiu comprar bancada para golpeá-la pelas costas com o Eduardo Cunha, que hoje apodrece na cadeia em Curitiba.

E agora você distribui cargos num descarado clientelismo, como se a República fosse res privata sua. A FUNAI, por exemplo, não serve mais aos povos indígenas, serve ao PSC, "é do André Moura"...

Nada mais impressiona nesse arrastão que você e sua turma promovem no governo.

Política indígena, assim como a educacional, a de saúde, a de moradia... tudo deixou de existir. As pastas que deveriam dar suporte às políticas públicas foram transformadas em regalos para os politiqueiros sem princípios que lhe dão apoio por pura ganância e ambição. Nunca o Brasil chegou tão baixo.

Já não nos comovem cenas deprimentes como aquela experimentada semana passada por seu ministrinho da falta de educação, o Mendoncinha, que gosta de conselhos de ator pornô. Saiu da Universidade Federal da Bahia cortando a cerca, para não ser vaiado pelos estudantes.

Neste seu "governo", nada mais surpreende. Nem mesmo manter nos seus cargos oito ministros investigados por corrupção.

Você conseguiu zerar o investimento público neste ano. Assaltou o BNDES, desviando 1 bilhão de reais de seus cofres. Tudo para debelar uma crise que você e os seus criaram para derrubar uma Presidenta eleita com 54 milhões de votos. Depois a aprofundaram com um déficit primário artificial de 170 bilhões de reais, para distribuir 50 bilhões a amigos. E este ano quis fazer a mesma coisa, não fossem os cofres vazios.

Para alimentar sua rede de favores, resolveu desnacionalizar o Brasil, vendendo campos de petróleo a preço de banana para companhias estrangeiras, abrindo o mercado aéreo para empresas não brasileiras, permitindo a venda de terras a estrangeiros sem qualquer limite e por aí vai.

É o jeito de manter seu cassino funcionando, né? Ou será o butim que coube a seus aliados do Norte na guerra que moveu contra nossa jovem democracia?

E acha que nós aceitamos pagar a conta desse seu jogo contra a sociedade? Claro que não.

Quando as instituições se omitem na defesa da democracia, devolve-se ao detentor da soberania popular – ao povo – o direito de resistir à arbitrariedade.

Somos nós os verdadeiros e originários guardiões da Constituição!

Os próximos dias de seu "governo" serão seu ocaso. É bom se acostumar. Sexta-feira foi só o começo. Quem sabe a gente se surpreenda em algum momento próximo com um lampejo de dignidade que em toda sua vida não mostrou e possa aceitar seu pedido de renúncia na paz? Sonhar é de graça. Mas seria melhor assim. Seria melhor você sair pela porta dos fundos da história, para não ter que passar por seu corredor polonês pela frente.

Agora, se insistir nessa coisa bandida de destruição da previdência pública para enriquecer seus sócios de fundos financeiros e em pensar que o trabalhador brasileiro é otário e se submeterá a seu capricho de nos catapultar de volta para o regime constitucional de 1891, estará escolhendo o caminho mais doloroso.

O povo vai se transformar no pior pesadelo de sua malta. Pense bem antes de testar. Ano que vem – ou até antes – haverá eleições. Ainda é tempo de recuar.

O dia 28 de abril de 2017 foi nossa primeira resposta, a da sociedade brasileira, ao espetáculo deprimente que você e seus ratos no Congresso protagonizaram em 17 de abril de 2016.

Foi uma resposta à altura e é bom ouvi-la. Sua liga de super-heróis, a Rede Globogolpe e os MBLs da vida, não tem tamanho para enfrentar o que começamos sexta-feira.

Quem viver verá.

Vaza, Temer, vaza!



Por Eugênio José Guilherme de Aragão jurista, membro do Ministério Público Federal desde 1987, foi último Ministro da Justiça de Dilma Rousseff em 2016