domingo, 5 de março de 2017

UM NOVO 1968 NOS ESTADOS UNIDOS



Trecho de um ótimo artigo da revista Cult, assinado por Sean Purdy (professor do departamento de História da USP), para nos fazer refletir: .



“A primeira grande mobilização do movimento estudantil nos Estados Unidos aconteceu na Universidade da Califórnia em Berkeley em 1964-1965 sobre o direito dos estudantes de organizar atividades políticas no campus, já que, nos anos 1950, os administradores dessa renomada universidade pública haviam banido tais atividades.



No outono de 1964, estudantes abertamente organizaram atos no campus em solidariedade ao movimento negro para desafiar as proibições. O aluno Jack Weinberg foi preso pela polícia e uma manifestação espontânea de 3 mil estudantes cercou o carro da polícia, proibindo-o de partir por 32 horas.



Por dois meses, estudantes continuaram organizando grandes atos e manifestações sob a bandeira do Movimento pela Livre Expressão. Em dezembro, alunos ocuparam o principal prédio da administração da universidade. A polícia entrou e mais de 700 alunos foram presos. Em janeiro, a universidade suspendeu os líderes da ocupação, provocando uma greve estudantil e manifestações amplas que efetivamente fecharam a universidade. Logo depois, a administração da universidade cedeu e atividades políticas foram permitidas no campus”.



Estamos passando por momento semelhante, com uma difusa insatisfação entre os jovens dos EUA e Europa, cientes de que a crise econômica colocará enormes obstáculos no seu caminho para a inserção profissional e sucesso nas futuras carreiras.



Os avanços autoritários pipocam em várias nações e a recém-iniciada presidência de Donald Trump vai na contramão de quase tudo que é belo, digno e justo na face da Terra, ameaçando tanger a humanidade para uma nova Idade Média ou mesmo para o extermínio (em função de seus desvarios ambientais).



Não é utópico trabalharmos com a hipótese de que os EUA novamente se dividirão entre uma embotada e intolerante parcela reacionária e uma ampla frente comum de pessoas esclarecidas e idealistas, dispostas a deter a marcha para a insensatez trumpiana. Sendo que, desta vez, a correlação de forças não será maioria silenciosa x minoria estridente, mas, provavelmente, meio a meio (não esqueçamos que a o apresentador de reality show só ganhou permissão para tocar o terror graças ao estapafúrdio sistema eleitoral estadunidense, pois foi sua hilária adversária quem obteve maior quantidade de votos).



E, com os rigores que se abatem sobre a Europa, tudo leva a crer que uma escalada de protestos estudantis e outras manifestações de inconformismo contra as políticas de Trump repercutirá instantaneamente no velho continente, alavancando o ressurgimento, em larga escala, da contestação jovem.



Um novo 1968 não só é possível, como pode já estar começando.








sábado, 4 de março de 2017

A FRANÇA SEM REVOLUÇÃO


A maior revolução popular de todos os tempos a Revolução Francesa, teve início após uma série de abusos insuportáveis sobre a população mais humilde e sobre a burguesia que na época, estava no mesmo barco que o povão.

Para se ter uma ideia do nível dos abusos, os nobres e o clero não pagavam impostos. Bem assim. Eram isentos, enquanto o terceiro estado formado pela tigrada e pela burguesia pagava todo tipo da tarifação que se possa imaginar.

Em 1788 o inverno foi inclemente e a safra insipiente até para o consumo interno. Por causa disso, a fome se tornou um flagelo entre os miseráveis e o número de idosos e crianças que morreram por inanição, impressionante.

No ano seguinte a revolução explodiu nas ruas.

Não foram os teóricos iluministas que botaram o povão nas ruas para enfrentar uma Guarda Nacional bem armada. Eles apenas deram um empurrãozinho. Foi a fome, o desespero e a vergonha na cara.

Não foi meramente a cobrança de impostos que transtornou até o mais pacato cidadão francês, foi o abuso, foi saber que perto dali as famílias aristocráticas viviam bem e seus filhos e seus idosos, se alimentavam do bom e do melhor.

Alguém já disse que, o Brasil é a França sem revolução.

Temos os absurdos, mas não temos povo nas ruas.

Não temos os iluministas dando empurrões, mas temos uma mídia canhestra empurrando para trás.

Temos um projeto, uma PEC que é abominada por bem mais da metade da população e ao mesmo tempo um Congresso que aprova a mesma PEC como se o povo não existisse. Como se o Parlamento não devesse representar maioria.

Um pastor ordena que seus fiéis ao descobrirem falcatruas da Igreja, troquem de igreja mas não denuncie a falcatrua pois “não é problema seu” e continua livre lépido, solto e ainda ganhando dinheiro.

Um processo de impeachment abandona qualquer tipo de análise sobre a existência ou não de ilícito e, simplesmente matematicamente somando votos de partidos contra o governo derrubam uma presidente eleita por mais de 54 milhões de votos e tudo continua na boa.

Um juiz abandona qualquer imparcialidade a ponto de ser fotografado ganhando prêmio e trocando sorrisos e confidências com um político rei de delações sobre corrupção. E nada acontece.

Outro, candidato ao Supremo Tribunal, antes de ser sabatinado, promove uma festa particular num barco, com aqueles que julgaram sua admissão ou não, e tudo bem...

Nem mesmo a mortandade infantil absurda nos falta. Nem a violência contra os humildes e as ditas, minorias.

Temos o palco e os atores, mas não temos a revolução da vergonha na cara.

Mas, temos carnaval.

Temos carnaval e a Portela, finalmente campeã outra vez.

Claro, nossa alegria dá um porre na tristeza por quatro dias.

O circo de Otávio no reinado de momo.

O Brasil é a França sem a Revolução, ao que parece.

Muito confete e serpentina





Prof. Péricles

sexta-feira, 3 de março de 2017

ATÉ QUANDO TRUMP?


Por José Inácio Werneck


Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra?, perguntava Marco Túlio Cícero no Senado Romano ao político Lúcio Sérgio Catilina, numa das mais famosas peças oratórias da história.

Até quando abusarás, Catilina, de nossa paciência?

Hoje já há muita gente nos Estados Unidos (e no mundo) dirigindo a frase a Donald Trump, o recentemente inaugurado Presidente americano.

Já há quem especule que Donald Trump não chegará ao fim do primeiro mandato, quando mais de um eventual segundo.

Para tanto haveria o recurso a um impeachment ou, segundo alguns, ao dispositivo contido na emenda 25 da Constituição Americana.

Ela dispõe que o Presidente pode ser afastado se o Vice-Presidente e uma maioria dos membros do Gabinete (isto é, os Ministros) afirmar ao Presidente em Exercício do Senado e ao Líder da Maioria na Câmara de Deputados que o Presidente da República não tem condições de exercer o cargo.

Como, por exemplo, se ele estiver mentalmente insano ou incapaz.

Será Donald Trump insano ou incapaz?

Há quem garanta que sim e que o cargo de Presidente na verdade vem sendo exercido pela “Eminência Parda” Steve Bannon.

Steve Bannon, antigo Oficial de Marinha, com passagem por Hollywood (por mais contraditório que possa parecer, dada a fama de liberalidade da indústria cinematográfica americana) é um dos fundadores e depois Executivo-Chefe do Breitbart News, um site da extrema direita americana.

Tudo indica que no momento é Bannon, o “Senior Counselor to the President”, quem faz a cabeça de Trump e que sua estratégia é criar propositadamente uma situação de confronto com o “establishment”, o mundo político do país.

Faz sentido. Se Trump provoca um imenso escândalo com sua proibição de entrada no país de pessoas de diversas nações muçulmanas, se cria uma situação de confronto com o México, com sua ameaça de erguer um muro e obrigar os mexicanos a pagar, se torpedeia o acordo comercial Trans-Pacífico, se ameaça não pagar a OTAN, se nomeia para a chefia do Departamento de Proteção Ambiental um cidadão inimigo declarado do meio ambienrte, se diz que vai retirar os Estados Unidos do Acordo Climático de Paris, se ameaça ações militares contra a China no Oceano Pacífico, se diz que vai mudar a Embaixada Americana em Israel para Jerusalém, com o que sepultaria qualquer esperança de negociações pacíficas com os palestinos, se diz que vai rasgar o Acordo Nuclear com o Irã, ao mesmo tempo que diz estar na hora dos Estados Unidos aumentarem seu arsenal nuclear – se Trump provoca tal alvoroço e desorientação, quem vai lembrar ou ter tempo de pedir-lhe coisas mais prosaicas, como revelar sua Declaração de Imposto de Renda ou desvendar seus interesses de homem de negócios na Rússia e outros países?

A mais recente investida de Trump é exigir que o Partido Republicano rompa com a tradição do “filibuster” no Senado se os democratas se opuserem à sua indicação de Neil Gorsuch para a Suprema Corte.

(O filibuster é um mecanismo pelo qual, em certos assuntos importantes, se faz necessária a concordância de 60 dos cem senadores.)

E, nas últimas horas, as provocações continuaram:

1) Trump brigou pelo telefone com o Primeiro Ministro da Austrália, por causa de refugiados;

2) disse que “o mundo está errado e vamos consertá-lo”;

3) atacou Arnold Schwarzenegger, seu substituto em The Apprentice;

4) garantiu que acabará com a proibição legal de igrejas ao mesmo tempo pregarem política e serem isentas de Imposto de Renda.

A estratégia Trump-Bannon de provocar um tumulto que os beneficie parece cada vez mais clara.

Mas às vezes – e como antigo membro das Forças Armadas Steve Bannon deve saber – o tiro sai pela culatra.




José Inácio Werneck , jornalista e escritor com passagem em órgãos de comunicação no Brasil, Inglaterra e Estados Unidos. Trabalha na ESPN e na Gazeta Esportiva.

quarta-feira, 1 de março de 2017

BRASIL, TEATRO DOS HORRORES


Tudo bem, vamos combinar que somos todos, um pouco atores já que desempenhamos vários papéis sendo pais, irmãos, marido/esposa, colega, etc.


Mas, francamente, a atuação anda muito fraca em nosso país.


Para começar estamos representando uma peça cujo argumento não tem nada de inédito, sendo por isso repetitivo. Já vimos esse filme em 1964, por exemplo.


Alguns atores consagrados e campeões de audiência, como os ex-governadores  Leonel Brizola e Miguel Arraes, saíram de cena e não foram substituídos à altura, deixando um enorme vazio no elenco.


Temos alguns senhores togados cujas representações são tão fracas que o que deveria ser drama e sisudez se tornou comédia.


Um grupo inteiro atuando como sabatinadores, quando todos já sabem que o sabatinado já está previamente aprovado, a "cola" totalmente liberada e isso torna-se até monótona a peça montada.


E o que dizer de coadjuvante, no lugar do titular, sem nenhum talento para o “papel”?


Sinceramente, no Brasil há um exagero de representações fracas e diretores confusos.


Atores canastrões sendo levados a sério.


Muita gente exagerando na entonação de voz e, principalmente, na postura.


Homens e mulheres, brancos e de classe média fazendo o discurso da moralidade e anticorrupção, mas apoiando os grupos e pessoas mais corruptos do Brasil, não dá. 


Intitular-se piedosos, mas ser racistas, homofóbicos e odiando pobre, realmente, não dá veracidade aos personagens. 


Se dizer cristão e praticar a hipocrisia, tira do sério até o Papa Francisco.

Gente "de bem" repetindo falas decoradas de que acredita na justiça e que defende a igualdade, mas odiando programas sociais como o Bolsa Família já ultrapassou a linha do suportável.

Na boa, falar de amor e destilar ódio não combina, entende?

Prefeito perfumadinho pegando vassoura de gari e até atriz profissional dizendo que tem medo e revirando os olhinhos...

Já passou da hora de um diretor, um diretor de verdade e talento, grite “corta”.

Esse teatro mambembe de atores medíocres e de interpretações bizarras deveria ser todo refeito.

Para começar, atores eleitos para o papel no lugar que lhe é de direito. Quem foi eleito presidente no lugar de presidente, vice no de vice, policial e imprensa desempenhando suas atividades, deixando aos partidos políticos fazer política.

Não precisa nem ensaiar se cada macaco estiver no seu galho.

Será que é por isso que nenhum filme brasileiro, até hoje, ganhou um Oscar de filme estrangeiro?

De qualquer forma, não precisamos de Oscar no Brasil. Deixa lá essa festa para os norte-americanos. Bastaria que eles não interfirissem nos nossos filmes.

Precisamos é de justiça, de bons roteiros e final felizes.




Prof. Péricles

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

DIGNIDADE


Dignidade é uma coisa que, definitivamente, não se compra na farmácia ou na padaria. É o software de cada um, vem de fábrica. Pode ser burilado pela educação e outras influências, mas está lá, nasceu com o sujeito e será seu chip inviolável para toda a vida.

Existem mendigos abandonados nas calçadas que possuem olhar mais digno do que juízes de Direito.

A pessoa pode ser formalmente elegante e bem vestida, frequentar os melhores restaurantes, ter uma gorda conta corrente, mas no íntimo das quatro paredes bater na esposa. É um indigno, por mais que engane os outros.

Conheci uma moça, prostituta, que era capaz de chorar ao ver a dor de alguém e isso a tornava mais digna do que a imensa maioria dos seus fregueses. Não é a função nem a remuneração que torna o sujeito digno.

Por isso, se faz necessário um pouco de paciência. Aquela pessoa de vocábulos ricos pode ser uma ameba moral.

Existe um depósito oculto na alma de cada um onde se armazenam essas coisas que não podem ser mensuradas quantitativamente, e que se destacam apenas pela vivencia.

É como um almoxarifado.

Num escaninho da mente temos solidariedade, noutro fraternidade, respeito, ética, enfim, aquele rol de valores que compõe a dignidade humana. Na medida que vivemos vamos usando cada um desses “materiais” e quanto mais velhos ficamos mais rapidamente reabastecemos nossos escaninhos da alma. Mas, os que não têm essa matéria prima estão sempre desabastecidos e confundindo amor próprio com dignidade.

Por mais enganador que seja, ninguém consegue demonstrar ter o que realmente não tem, e quando insiste acaba caindo em contradição.

Por exemplo: é impossível amar o Brasil sem amar seu povo, amar a democracia e defender golpismos e golpistas ou defender a igualdade entre as pessoas sendo preconceituoso e racista.

O pior mal caráter é aquele que não assume seus desejos e busca enganar as pessoas com defesas ambíguas de valores pontuais.

Para não assumir seu antipetismo afirmar que todos os partidos são iguais. Para não assumir seu fascismo ressaltar o pretenso ataque aos valores tradicionais que estariam sendo violados e aí arrola Deus, pátria, família, ordem e progresso.

Coisas assim que explicam, por exemplo, como pode um político que, num passado recente, representou seu papel de candidato à presidência pelo PCB com enorme dignidade, demonstrar agora uma agressividade injustificada numa solenidade pública, agredindo com palavras ácidas um intelectual que aos ser homenageado pronunciou palavras contrárias aos seus instintos de superioridade governista.

Embora sejam diferentes personagens de um mesmo ator, dá para apostar que o verdadeiro é esse, sem a dignidade que um dia representou ter.

Toda máscara tende a cair um dia.

Seria extraordinariamente mais fácil viver se cada um assumisse o que realmente sente e os valores que realmente lhe interessam defender.

Mas, aí, voltamos ao início desse texto... dignidade é algo que não se compra, nem se conquista com um curso superior... é seu chip de fábrica.



Prof. Péricles





domingo, 26 de fevereiro de 2017

TRUMP AJUDA THERESA, QUE AJUDA LE PEN



Faltando dois meses para o primeiro turno da eleição presidencial francesa, uma pesquisa divulgada esta semana mostra o crescimento da candidatura de Marine Le Pen, que alcança 26% das intenções de voto, contra 19% do principal adversário, o ex-ministro da Economia Emannuel Macron.



A líder da extrema-direita, filha de Jean-Marie Le Pen, deve causar dores de cabeça aos políticos de centro e de centro-esquerda franceses e aos defensores da União Europeia (UE), além de solavancos nos mercados.



Muito antes da vitória de Donald Trump do lado de cá do Atlântico, o continente europeu vive uma onda conservadora: a saída do Reino Unido da UE, capitaneada pelo primeira-ministra britânica, Theresa May, mostrou que, ao menos em tese, há vida fora do sonho da integração.



Atentados em Paris, Nice, Bruxelas e Berlim conquistam, dia após dia, mais adeptos da ideia de reerguer as fronteiras nacionais, anulando o Espaço Schengen da livre-circulação.



Partidos populistas têm crescido, como a Alternativa para a Alemanha (AfD), desbancando legendas de centro-esquerda, como o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE).



Políticas isolacionistas e, em alguns casos, xenófobas, nos EUA reforçam discursos de Thereza no Reino Unido e de Le Pen na França.



O último dos rompantes da líder da extrema-direita francesa foi ter desistido de encontrar o xeque Abdul Latif Derian, autoridade sunita do Líbano, na porta do gabinete. Isso porque lhe ofereceram o véu islâmico para a reunião. Le Pen é uma das principais defensoras da proibição da vestimenta em espaços públicos – o véu já não é permitido em escolas de ensino médio e serviço público na França.



Na quarta-feira (22/02), o centrista François Bayrou, líder do Movimento Democrático, fechou apoio a Macron, como alternativa a Le Pen.



Não será suficiente. Ela deve vencer em 23 de abril, mas não levará no segundo turno, em 7 de maio, quando os perdedores do primeiro turno se juntarão contra o inimigo comum. Essa costuma ser a lógica histórica da política francesa.



O problema é que, como o Brexit e Trump já mostraram, nem sempre a política tem seguido a lógica.




Por Rodrigo Lopes, colunista do Jornal Zero Hora de Porto Alegre