sábado, 8 de agosto de 2015
CONGRESSO DE BERLIM, O CONGRESSO DA MORTE
(CONTINUAÇÃO DE "A REVOLUÇÃO DOS RICOS")
Em sua primeira fase (século XVIII), a Revolução Industrial esteve restrita à Inglaterra, mas, na segunda fase (século XIX) ela se expandiu para outros países europeus, além dos Estados Unidos na América e Japão, na Ásia.
A velocidade e o volume da produção multiplicaram-se por variáveis até então, impensáveis.
A concorrência também.
Impulsionada pelos avanços da tecnologia se produzia todo o essencial e já entrava-se no supérfluo. Nunca se necessitou tanto vender e faturar.
Na segunda metade do século XIX a Europa parecia uma panela de pressão. Inglaterra, França, Alemanha, Bélgica, Itália, já eram o que se poderia considerar, potencias industriais.
O mundo ficava cada vez menor para o alcance de seus lucros e a competição entre eles ameaçava a própria paz no continente.
Assim, a África, a Ásia e a Oceania, tornaram-se objetivos a serem conquistados. De lá poderiam vir matéria-prima por um preço muito mais barato se fossem geridas pelos próprios europeus, em vez de, simplesmente importadas. Além disso, os povos desses continentes poderiam também representar consumo garantido de seus produtos e mão de obra baratíssima se os produtos fossem feitos lá mesmo, na área de origem da matéria-prima.
Tudo muito parecido com a colonização da América entre os séculos XVI e XIX, e por isso, os livros de história registram esse pérfido plano de exploração com o nome de “neocolonização”.
Até mesmo o cinismo da justificação se repetia, apenas mudando a roupagem.
Enquanto a justificativa para a ocupação das terras dos povos ameríndios e o massacre dessa gente era de que o Europa estava levando a religião cristã e as verdades de Deus através da salvação pela evangelização, agora, a justificava era de que os nobres povos da Europa estavam levando aos infelizes da África, da Ásia e da Oceania, o progresso da ciência e da tecnologia.
A Europa jurava promover a evolução econômica dessas regiões mais pobres e a isso chamavam “Darwinismo social”. Mas ocultavam que na verdade promoviam a exclusão, a destruição de culturas, as guerras e a morte.
Entre novembro de 1884 e fevereiro de 1885 os países imperialistas da Europa organizaram um Congresso da ganância e da perversidade, que iria dividir entre eles as “terras a serem conquistadas” a ferro e fogo. No Congresso de Berlim a África foi dividida entre eles como fatias de pão.
Diferenças étnicas e culturais dos povos africanos foram desconsideradas e a nova geografia que os europeus criariam dariam origens as Guerras tribais fratricidas que até hoje infelicitam gerações desses povos.
Já, na América, recém descolonizada, o processo foi mais político do que militar.
O capital europeu invadiu o continente em busca de mão-de-obra barata e consumo.
Na América, portanto, não se formaram Impérios, mas se promoveu o poder empresarial que denominamos de “imperialismo”.
Enquanto isso, os Estados Unidos, única nação industrializada do Continente trataria de expulsar a Espanha de Cuba e das Filipinas, reorganizando sua área de influência.
O mundo inteiro parecia um enorme mercado para uma burguesia que, de diferentes matizes nacionais, não parava de enriquecer às custas do sangue e das lágrimas dos não-industrializados.
A fome por lucros jamais estava saciada e os povos pobres foram sugados até o bagaço como laranjas de suco.
O pesadelo de alguns era o sonho dourado de outros poucos.
O que jamais o empresário europeu e seus sócios, os governantes de seus respectivos países poderiam imaginar é que, esse macabro banquete de exploração iria leva-los ao mais terrível de seus pesadelos.
A Primeira Guerra Mundial, que mataria mais do que qualquer outra guerra até então, seria apenas uma consequência da ganância sem freios e sem limites.
(Continua)
Prof. Péricles
quinta-feira, 6 de agosto de 2015
MENTIRAS QUE NÃO RESISTEM 24 HORAS
Por Mário Augusto Jakobskind
O jornal O Globo realmente não se emenda em seu furor contra o Estado. Em recente editorial o jornal da família Marinho não fez por menos e culpou a grandeza do Estado pela corrupção no país. Por sinal, o tipo de editorial repetido ao longo do tempo.
Não é por aí, o jornal mais vendido do Rio de Janeiro aproveita a oportunidade para investir contra o Estado e se vale das revelações de que um grupo de bandidos passou a mão no erário público.
Nesse sentido, as cartas dos leitores são também bastante sintomáticas, chegando uma delas a afirmar que o “grande erro de FHC foi não ter privatizado a Petrobras”. Tudo que os Marinhos sempre sonharam, mas não conseguiram converter em realidade, apesar do esforço nesse sentido.
Bem que o ex-presidente Cardoso tentou, mas os trabalhadores petroleiros se mobilizaram e conseguiram evitar o crime lesa pátria. Agora, os mesmos petroleiros estão mobilizados para impedir a privatização, desta vez de alguns setores da empresa, inclusive a BR distribuidora, um dos filés mignons do setor petrolífero.
Na mesma linha, com algumas variações, a revista Veja estampa em sua manchete semanal, como se fosse um criminoso, a figura do ex-presidente Lula. A matéria tem como sustentação supostas declarações de um tal de Leo Pinheiro, ex-presidente da empreiteira OAS.
Poucas horas depois da edição, o próprio Pinheiro desmentiu a revista Veja afirmando que não pretende se valer da delação premiada, inventada pela publicação com chamada espalhafatosa.
Não se trata aqui de defender o ex-presidente Lula, mas simplesmente mostrar como a sujíssima (como o jornalista Helio Fernandes denomina a publicação da família Civitas) Veja planta matérias mentirosas. E qualquer tipo de protesto, seja verbal ou mesmo ação judicial, a Veja se diz vítima de uma campanha contra a liberdade de imprensa.
Na verdade, tanto a Veja como as Organizações Globo e outros órgãos da mídia conservadora se consideram donos da verdade e acima do bem e do mal, mesmo quando a propalada “verdade” não resiste 24 horas para ser demonstrada como mentira.
O que a Veja faz não é jornalismo, mas sujeira da pior espécie. Mente e apresenta matérias que não resistem 24 horas, repetindo sempre o mesmo esquema.
Lembro-me de uma ocorrência que já contei há alguns anos. Trata-se da história de uma reportagem da Veja. Um amigo jornalista, que já não está entre nós e tinha me pedido para não revelar o nome, me chamou para testemunhar uma entrevista que daria para a Veja sobre o tema anistia. Aceitei o “desafio”.
Apareci no local, um restaurante de Copacabana, não como jornalista, mas como amigo do entrevistado. Prestei atenção às palavras do jornalista e as perguntas do repórter e qual não foi minha surpresa que quando saiu a matéria o que o entrevistado tinha dito não apareceu, mas sim o que ele não falou.
Este é o tipo de jornalismo que faz a sujíssima Veja. Provavelmente repetiram o esquema da mentira em muitas outras edições.
Agora, na rotina, usaram uma suposta delação premiada do tal Léo Pinheiro, que menos de 24 horas depois desmentiu negando que tenha feito acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal na Operação Lava Jato.
A revista Veja quer de todas as formas criar fatos contra quem não reza por sua cartilha. Os Civitas não se importam com as mentiras, desde que elas sirvam para provocar impacto inicial.
Na última eleição presidencial inventou história incriminando Dilma Rousseff e o próprio Lula com manchete na antevéspera do pleito afirmando que “eles sabiam de tudo” em relação aos escândalos da Petrobras.
O objetivo era mais do que claro, ou seja, evitar a reeleição da Presidenta Dilma Rousseff. Não era jornalístico. Não conseguiram alcançar o objetivo, mas de qualquer forma jogaram no ventilador.
Tanto a Veja, como O Globo e outras publicações, quando sofre qualquer tipo de contestação se vale da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), o organismo que reúne os barões midiáticos das Américas para a defesa e investir contra os “detratores”, como grupos que querem restringir a liberdade de imprensa e de expressão.
A SIP não defende propriamente a liberdade de imprensa, mas sim a liberdade de empresa, cujas mídias aqui no Brasil sempre almejam mais e mais lucros, mas se negam a pagar o piso salarial, que é lei, como acontece no Estado do Rio de Janeiro, por exemplo.
Para evitar a repetição de “petardos” mentirosos, é necessário sempre estar atento às armadilhas da mídia conservadora.
Mário Augusto Jakobskind, jornalista e escritor, correspondente do jornal uruguaio Brecha. Seus livros mais recentes: Líbia – Barrados na Fronteira; Cuba, Apesar do Bloqueio e Parla , lançado no Rio de Janeiro.
terça-feira, 4 de agosto de 2015
HISTÓRIAS DE NÁUFRAGOS
Após um naufrágio um grupo de pessoas, entre homens, mulheres e crianças, ocupam o mesmo barco e tentam sobreviver na imensidão do mar.
Passado o primeiro dia surgem as primeiras diferenças de opiniões entre eles.
Um pequeno grupo tenta impor sua vontade alegando que a madeira de fabricação do barco foi extraída da fazenda de um tio, por isso, eles produziram mais para todos e merecem hegemonia.
Outro grupo discorda. Afirma que o barco é de todos e que é imoral tentar impor vontades a partir da pseudo-propriedade.
Um terceiro grupo se mantém em silêncio ouvindo as discussões cada vez mais acaloradas de ambos os lados.
Resolvem então fazer uma votação para escolher um líder.
Nos debates que se seguem um dos grupos apresenta suas ideias. Querem racionar a água, mas priorizar as necessidades das crianças e dos mais velhos. Alega também que os que estão remando merecem comer uma porção maior de ração já que estão trabalhando mais e que, seria interessante que outros, que nada estavam fazendo além de especular fossem socialmente mais úteis, por exemplo, adaptando fios e anzóis e para pescar para todos.
O líder do outro grupo alega que não tem ideia nenhuma. Defende que todos devam se abraçar fraternalmente e desenhar corações no barquinho, pois isso os irá salvar. Não tem a menor ideia para onde ir e o que fazer. Na verdade, seu maior argumento (o único) para ser escolhido como líder é que se eleito impediria a vitória do outro incentivando o sentimento de antagonismo, aversão e preconceitos que, ele sabia, existirem de forma natural entre alguns.
O grupo do “abraço, coração e sem ideias” venceu as eleições.
Logo depois o barco afunda tragicamente no meio do oceano e todos, sem exceção são tragados para o abismo.
Estranhamente o grupo que votou pela desgraça não sente o menor remorso ou vergonha. Mesmo diante do último suspiro ainda se acha mais esperto e e em seu último suspiro ainda carregava a patética alegria de evitar a vitória “do outro”.
Esse barco se chamava “Rio Grande do Sul”.
Em outro ponto do vasto oceano, outro naufrágio acontece e algumas pessoas sobrevivem num barco.
Nesse barco a história inicialmente, se repete, mas, quem vence a votação pela liderança é o grupo das ideias novas.
A reação do grupo perdedor, porém, é autoritária e rancorosa.
Longe de pular fora do barco que odeiam preferem colocar em risco a segurança de todos.
Reclamam que houve fraude na eleição, mesmo depois dos votos contados e recontados, não aceitam o resultado, boicotam as ações do líder, tentam convencer os demais náufragos que o barco está afundando e que jamais barco algum foi tão malconduzido.
Inconformados passam a fazer de tudo para que o barco afunde.
Se afundar, todos se afogarão, de onde se pode concluir que, para o grupo que não aceita que perdeu a vez é preferível um barco perdido no fundo do mar do que um barco no rumo certo, mas levado por um timoneiro que não seja de seus propósitos.
Esse barco se chamava Brasil.
Prof. Péricles
sábado, 1 de agosto de 2015
A REVOLUÇÃO DOS RICOS
Qual foi a maior importância da Revolução industrial na história humana?
Antes de lembrar a definição mais simples “Revolução Industrial foi a introdução de novas tecnologias (máquinas) e novas fontes de energia (vapor, eletricidade) no sistema produtivo”, vamos refletir.
Qual a primeira consequência de colocar máquinas a fazer o trabalho humano? O fato de que as máquinas fazem mais ligeiro.
E qual a importância de fazer mais ligeiro? Certamente não é a melhor qualidade visto que um produto artesanal pode ser muito melhor que um produto feito pela máquina. Então qual a vantagem de fazer mais ligeiro? O fato que isso representa que se faz mais, em maior quantidade, aliás bem maior quantidade a partir de que as máquinas são aperfeiçoadas indefinidamente e, por isso, sempre fazendo mais e melhor.
Então, a pergunta mais importante: qual a importância de se fazer com a máquina e novas fontes de energia, consequentemente, mais rápido e em maior quantidade? A possibilidade de ganhar mais dinheiro.
Ulalá... eis o mistério da industrialização.
A Revolução Industrial foi uma revolução nas possibilidades de ampliação dos lucros.
Antes da revolução industrial os horizontes da riqueza eram bem mais modestos. O rico era rico mas não era imponderável. As peças de Shakespeare no século XVII eram vistas no mesmo teatro por pobres e ricos. Aliás, eles se conheciam. A diferença era que os pobres levavam as próprias cadeiras de casa.
Depois da Revolução industrial a possibilidade de lucrar e fazer fortuna se ampliou dramaticamente. O rico, ficaria tão rico que se tornaria invisível ao pobre.
Se antes fazendo 10 chinelos por dia o dono dos instrumentos e do capital ficava satisfeito se vendesse 8, depois da revolução, podendo fazer mil por dia, a venda tinha que ser compatível com a produção e consequentemente o dono das máquinas e do capital não se conformaria em vender 8 e ser rico, iria querer vender mil e ser milionário.
O trabalho industrial para funcionar, precisava de mão de obra abundante, matéria-prima mais barata possível e gente que comprasse. Gente, muita, muita gente, pois as máquinas, precisam de gente para opera-las.
Desde o seu primeiro estágio, no século XVIII, a indústria resolveu o problema da mão de obra, transformando artífices em operários. Milhares, milhões de trabalhadores braçais foram enredados nas engrenagens que lhe tiraram os instrumentos e lhe deram um salário.
Para garantir a abundância da oferta de mão-de-obra e assim barateá-la, houve uma pequena revolução na agropecuária inglesa com os enclousures que, a partir da produção intensiva demitiu milhares, liberando-os para o trabalho nas cidades.
Os segredos do processo da feitura do produto se perderam do antigo artesão com a máxima especialização, que ao mesmo tempo que tornava tudo mais rápido, escondeu do simples trabalhador o segredo do preço final do todo.
O artesão que antes, com seus instrumentos fazia todo o sapato, agora trabalhava numa sessão que fazia apenas a sola, por exemplo, e só sobre sola ele entendia e era especialista.
Dessa forma embora a produção tenha se multiplicado a riqueza não foi do estado e de seus cidadãos, mas apenas dos proprietários das máquinas e das fábricas, portanto, uma revolução dos ricos.
(Continua)
Prof. Péricles
terça-feira, 28 de julho de 2015
DO ÓDIO À ESPERANÇA
Por Frei Betto
Sabem os publicitários que uma mentira repetida reiteradas vezes acaba aceita como verdade. É o caso dos sucos de caixinhas, vendidos como “naturais”. E ainda há quem pergunte por que tanta incidência de câncer…
A Operação Lava-Jato presta excelente serviço à nação. Leva corruptores à cadeia e traz à luz bilionárias somas de recursos públicos destinadas a favorecer interesses privados.
Mas por que a Lava-Jato é um samba de uma nota só? Será que houve corrupção apenas no governo do PT? E por que o Judiciário permite o vazamento de depoimentos especificamente centrados no PT? Algum diretor de revista anda corrompendo investigadores da Lava-Jato para obter o conteúdo dos depoimentos dos réus antes que cheguem à Justiça?
O fato é que se criou, no Brasil, um clima de amargura e ódio. Amargura, porque Dilma prometeu na campanha o contrário do que faz agora: não tocar nos direitos dos trabalhadores. O ajuste fiscal desajusta as conquistas obtidas nos últimos 12 anos. Estão de volta a recessão, os juros altos, a inflação e, em consequência, o desemprego, a retração da indústria e o fechamento de lojas. Após 12 anos de avanços, o Brasil dá marcha a ré.
O ódio resulta da falta de consciência política. Quando não se consegue racionalizar uma experiência traumática, o ódio emerge. Por isso se procura terapia quando as emoções são embaralhadas pelo ódio e a visão obnubilada pela sensação de desespero.
Ou se busca uma “saída” no gesto vingativo: o jovem branco que, em nome da supremacia “ariana”, extermina negros em uma igreja, ou o Exército Islâmico que, em nome de Deus, degola inimigos…
Muitos me perguntam se guardo ódio dos torturadores de meus tempos de prisão. Digo com sinceridade: não. Assim ajo, não por virtude, mas por comodismo. Aprendi que o ódio destrói primeiro quem odeia e não quem é odiado. Shakespeare já havia dito o mesmo com mais estilo: “Odiar é tomar veneno esperando que o outro morra”.
O PT promoveu a inclusão econômica de milhões de brasileiros, mas se omitiu quanto à inclusão política. Não politizou a nação. Não organizou os trabalhadores. Não fortaleceu os movimentos sociais. Ao contrário, estimulou o sonho consumista e, agora, é vítima da síndrome da criança impedida de tomar sorvete – a carência gera frustração e raiva.
Resta à sociedade civil descruzar os braços e não esperar dos políticos no poder. É hora de arregaçar as mangas e reorganizar a esperança. Com meros protestos não sairemos dessa depressão cívica. Há que ter propostas.
O Brasil soube dar a volta por cima diante de muitos períodos críticos, tanto na monarquia quanto na República. Precisamos é deixar de lamentar e articular em especial os jovens e os movimentos sociais.
Frei Betto, é escritor.
sábado, 25 de julho de 2015
FRANCO E MADALENA
Ela era filha e neta de espanhóis, mas nascida aqui na querência mais ao sul do Brasil.
Tinha os cabelos negros, pouco abaixo dos ombros e olhos graúdos numa face pálida e linda.
Deveria ser acompanhada por uma placa de trânsito: “curvas perigosas”.
Porque eram harmoniosas, generosas, sonhadoras, mas, extremamente sinuosas.
Na base de tudo isso, um par de pernas que, naqueles tempos de minissaia provocavam a imaginação do mais sem imaginação da turma.
Seu nome era Madalena, Mada para os amigos.
O macharedo parava tudo quando ela passava, e ficava aquele silêncio que fazem os predadores quando uma presa deliciosa aparece em seu território.
O alvo de desejo de 11 em cada 10 marmanjos.
Era difícil achar um defeito naquela filha de Afrodite, pois junto com a escultura brilhava um sorriso derretedor de pedras, um jeito de ajeitar os cabelos que provocava convulsões e espasmos de desejo.
Naturalmente, era também, o alvo do pensamento de seus colegas de turma na faculdade. Quase todos militantes de partidos e organizações de esquerda, proibidas naqueles duros tempos de ditadura e de repressão.
Simpática, simples e inteligente, era quase uma lenda na faculdade, o que, como sempre, provocava o ódio e a inveja do pessoal da engenharia.
Que injustiça, diziam eles, que negavam a nós os “comunistas”, qualquer direito à felicidade, uma mulher dessas fazendo o curso de história.
Mas, se é verdade que a perfeição não existe, também é verdade que nenhuma dor dói mais do que a decepção.
Mada, oh céus, era fã do odiado General Franco.
Francisco Franco, o generalíssimo que liderou os fascistas na Guerra Civil Espanhola, de 1936 a 1939 e que destruiu a democracia socialista que florescia no país.
Franco, que apoiara Hitler e Mussolini na segunda guerra e que fora responsável por milhares de mortes, prisões e torturas nos longos anos em que governou a Espanha com mãos de ferro até sua morte em 1975.
Não, era insuportável ouvir Mada falando bem de Francisco (Franco).
Para aqueles militantes da esquerda a contradição entre a bela Mada e seu horrendo discurso lembrava Médici fazendo balõezinhos com uma bola e se fazendo de bom moço.
Era uma missão estratégica traze-la para os domínios da razão e às verdades da democracia.
Como ela olhava com um pouco mais de atenção um dos nossos bravos heróis da resistência, formulou-se uma missão de guerra.
Claro que nosso companheiro de lutas que era olhado um pouco mais devagar pelos olhos límpidos de Mada, era a peça chave no nosso plano.
Nosso herói deveria penetrar no território inimigo e após efetivar a conquista, resgatar Mada para “nosso lado”. Muito simples.
Freneticamente, o plano foi elaborado e posto em ação.
Todos passaram a falar maravilhas do nosso combatente fazendo com que as maravilhas chegassem as lindas orelhinhas de nosso alvo.
Nas cervejadas depois das aulas, todas as amigas dela (incluindo algumas detestáveis infiltradas) eram convidadas para ter certeza que ela compareceria.
A cadeira ao lado dela, claro, era estrategicamente reservada ao nosso herói.
E assim as coisas foram indo. Tudo era feito para deixa-los juntos.
Para a felicidade do alto-comando tudo estava dando certo, e a primeira vez que os vimos de mãos dadas comemoramos com abraços emocionados.
E quando soubemos que, aquela noite seria a primeira entre os dois, preparamos nosso íntimo para a vitória certa.
No dia seguinte, todos nós reunidos na faculdade esperávamos pelo nosso guerreiro.
Já imaginávamos Madalena com a camiseta do Tche. Ficaria muito mais linda.
Ele chegou sorridente e acompanhado e ao se aproximar do grupo sentimos um inevitável arrepio ao ver que Mada vestia uma camisa escrito “Viva Franco”.
Passaram por nós de mãos dadas, e antes de dobrar o corredor ainda disse “Até la vista Compañeros”.
Havíamos perdido nosso agente em combate. Para sempre...
Aprendemos que o amor é maior, bem maior, que a ideologia.
Maldito Franco!
Prof. Péricles
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