sábado, 13 de outubro de 2012

NÚMEROS DA ELEIÇÃO MUNICIPAL 2012


Os analistas têm o hábito de considerar que as eleições locais são uma ante-sala das presidenciais. Em função desse cacoete, olham os resultados como se fossem o primeiro round da disputa pelo Palácio do Planalto em 2014.

Trata-se de um equívoco, como mostram as evidências. Desde a redemocratização, não houve sequer uma eleição presidencial que tivesse sido “antecipada” pelo ocorrido na disputa pelas prefeituras.

O que acontece nela pode ter efeito na sucessão dos governos de alguns estados, especialmente os menores e aqueles onde a capital tem grande proeminência na estrutura urbana. Nesses casos, a eleição dos prefeitos costuma fornecer um bom indício do que vai acontecer dois anos depois e estabelece de imediato o vencedor na capital como concorrente de peso.

Na verdade, para a política nacional, as eleições municipais são relevantes muito mais por suas consequências na composição do Congresso, especialmente da Câmara. Na vida política dos estados, por seu impacto nas Assembléias.

Quem leu o que nossa grande imprensa andou falando nas últimas semanas terá tomado um susto com o que aconteceu domingo.

Jornalistas e comentaristas são livres, como qualquer cidadão, para ter opiniões e preferências políticas. É perfeitamente natural que gostem mais de um partido que de outro.

Também são compreensíveis as implicâncias que têm com algumas lideranças.

Costuma-se, no entanto, cobrar de todos o compromisso com a informação. Que evitem deixar que seus sentimentos os impeçam de fornecer a leitores e espectadores a notícia correta.

Se houve um tema predominante na cobertura das eleições deste ano foi a “queda do PT”. Quase diariamente, saíam matérias ressaltando o mau desempenho que o partido teria em todo o País e, em particular, nas capitais.

Misturando análise apressada das pesquisas com muita torcida, a tese central era que o julgamento do “mensalão” prejudicaria os candidatos petistas e dos partidos da base do governo. Prenunciava-se, de acordo com essa suposição, um quadro de diminuição do PT e crescimento dos partidos de oposição.

Para quem acreditou nisso, o resultado das eleições deve ter sido uma surpresa.

Considerando os cinco partidos que mais venceram em 2008, o PT foi o único que aumentou o número de prefeituras ganhas. PMDB, PSDB, PP e DEM encolheram - os tucanos em seus principais redutos, São Paulo, Minas Gerais e Ceará.

Em queda semelhante à que aconteceu em 2010 nas eleições para o Legislativo, as três principais legendas oposicionistas - PSDB, DEM e PPS - diminuíram em 25% o total de prefeituras conquistadas, indo de 1418 para 1077 (sem considerar as cidades onde haverá segundo turno).

Faz sentido dizer que o PSB é a estrela em ascensão?

Cresceu como o PT, indo de 314 para 435 prefeituras. A grande vitória no Recife compensou a inesperada derrota em Curitiba. Manteve Belo Horizonte. Disputa algumas capitais importantes no segundo turno.

A eleição foi certamente positiva para o partido. Daí, no entanto, a imaginar que é o “grande vitorioso” vai uma vasta distância.

Por estranho que pareça a algumas pessoas, o partido que mais cresceu em número de prefeitos e vereadores, que melhor performance teve nas cidades médias, que está mais bem posicionado nas capitais, é o PT.

Pode-se gostar ou não disso. Mas é um fato.

por Marcos Coimbra

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

A CAUSA DO PT


De saída quero dizer que nunca fui filiado ao PT. Interesso-me pela causa que ele representa, pois a Igreja da Libertação colaborou na sua formulação e na sua realização nos meios populares.

Há um provérbio popular alemão que reza: “você bate no saco mas pensa no animal que carrega o saco”. Ele se aplica ao PT com referência ao processo do “Mensalão”. Você bate nos acusados, mas tem a intenção de bater no PT. A relevância espalhafatosa que o grosso da mídia está dando à questão mostra que o grande interesse não se concentra na condenação dos acusados, mas através de sua condenação, atingir de morte o PT.

Por que muitos resistem e tentam ferir letalmente o PT? Há muitas razões. Ressalto apenas duas decisivas. A primeira tem a ver com uma questão de classe social.

Sabidamente temos elites econômicas e intelectuais das mais atrasadas do mundo, como soia repetir Darcy Ribeiro. Estão mais interessadas em defender privilégios do que garantir direitos para todos. Elas nunca se reconciliaram com o povo. Como escreveu o historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma no Brasil 1965,14) elas “negaram seus direitos, arrasaram sua vida e logo que o viram crescer, lhe negaram, pouco a pouco, a sua aprovação, conspiraram para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que continuam achando que lhe pertence”.

Ora, o PT e Lula vem desta periferia. Chegaram democraticamente ao centro do poder. Essas elites tolerariam Lula no Planalto, apenas como serviçal, mas jamais como Presidente. Não conseguem digerir este dado inapagável. Lula Presidente representa uma virada de magnitude histórica. Essas elites perderam. E nada aprenderam. Seu tempo passou. Continuam conspirando, especialmente, através de uma mídia e de seus analistas, amargurados por sucessivas derrotas como se nota nestes dias, a propósito de uma entrevista montada de Veja contra Lula. Estes grupos se propõem apear o PT do poder e liquidar com seus líderes.

A segunda razão está em seu arraigado conservadorismo. Não quererem mudar, nem se ajustar ao novo tempo. Internalizaram a dialética do senhor e do ervo. Saudosistas, preferem se alinhar de forma agregada e subalterna, como servos, ao senhor que hegemoniza a atual fase planetária: os USA e seus aliados, hoje todos em crise de degeneração. Difamaram a coragem de um Presidente que mostrou a auto-estima e a autonomia do país, decisivo para o futuro ecológico e econômico do mundo, orgulhoso de seu ensaio civilizatório racialmente ecumênico e pacífico. Querem um Brasil menor do que eles para continuarem a ter vantagens.

Por fim, temos esperança. Segundo Ignace Sachs, o Brasil, na esteira das políticas republicanas inauguradas pelo PT e que devem ser ainda aprofundadas, pode ser a Terra da Boa Esperança, quer dizer, uma pequena antecipação do que poderá ser a Terra revitalizada, baixada da cruz e ressuscitada. Muitos jovens empresários, com outra cabeça, não se deixam mais iludir pela macroeconomia neoliberal globalizada. Procuram seguir o novo caminho aberto pelo PT e pelos aliados de causa. Querem produzir autonomamente para o mercado interno, abastecendo os milhões de brasileiros que buscam um consumo necessário, suficiente e responsável e assim poderem viver um desafogo com dignidade e decência.

Essa utopia mínima é factível. O PT se esforça por realizá-la. Essa causa não pode ser perdida em razão da férrea resistência de opositores superados porque é sagrada demais pelo tanto de suor e de sangue que custou.


Por Leonardo Boff - teólogo e escritor.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

NUNCA FALTARÃO ARGUMENTOS


Poderíamos dizer que a sociedade se divide em 3 grupos: A - os ricos, muito ricos e quase ricos; B – os medianos pra cima, os medianos pra baixo e os que se acham medianos e C – os pobres e miseráveis.

Já os partidos se dividem em 1 – Os que representam declaradamente os da A; 2 – Os que representam os da A, mas não assumem, adotando discurso do “momento político” e os ouvidos a atingir e 3 – os que desejam, realmente, representar os pobres e miseráveis, do seu jeito.

Claro que existem variações, pois “a política é dinâmica” e nada impede que um partido que comece sendo da categoria 3 sofra uma metamorfose e jogue o jogo do pessoal da categoria 2. Isso, aliás, é bem comum.

Mas, dentro desse jogo político e social as coisas decorrem de certa forma, muito simples. Assim:

- Os partidos ideológicos, aqueles, dos mais pobres já foram fortes em nosso país, mas suas lideranças foram assassinadas, desaparecidas e dizimadas. Hoje são chamados de nanico e são mesmo. Ninguém lembra que eles foram fortes, entusiasmaram e acalentaram os sonhos de milhões de pessoas porque isso nunca foi ensinado nas escolas, nunca apareceu em novelas e nenhum “formador de opinião” fala disso. Dessa forma, os jovens acham que isso nunca aconteceu e os velhos escondem essas memórias entre os seus fantasmas trancados no armário. Quando esses partidos não aceitam alianças com os partidos grandes, são chamados de sectários, radicais e que jamais terão governabilidade, pois, ninguém poderá governar sozinho. Quando eles fazem alianças são chamados de traidores, caricatos e que perderam a “pureza ideológica” e, na verdade, perdem mesmo.

- Os partidos maiores se dividem em siglas que afirmam representar todos a mesma coisa que na verdade é coisa nenhuma que não seja manter seus privilégios, seja como membro do andar de cima, seja como aliado dos interesses do pessoal do andar de cima de outros países, ditos, imperialistas.
O mais interessante é quando surge uma idéia nova, uma proposta mais popular.
Os medianos, por um dever moral, quase religioso, já que juram se preocupar com os pobres (coitadinhos, tão famintos), no início aceitam a idéia. Alguns até se entusiasmam e compram bandeiras e usam bótum e se filiam ao partido. É tão bonito ver a classe média com ares de pobre, com fotos de Tche, que, aliás, são chiquérrimas.

O problema é quando essas idéias ganham forma e pior, quando ganham espaços na vida política.

Quando os medianos vêem os pobres e miseráveis serem prioridade bate um arrepio em suas espinhas sociais. Longe de querer subir o que o mediano quer mesmo, como projeto oculto de vida, é não descer e se o pessoal de baixo sobe, isso de certa forma, acontece.

Então o desconforto origina as mais variadas justificativas para abandonar os "planos progressistas" e uma guinada para o conservadorismo.

Há os que dizem que eram daquele partido de esquerda e agora não são porque se decepcionaram (?) com suas alianças (e esse discurso é dos bons porque deixa no ar uma idéia de que é o verdadeiro revolucionário)ou então com suas lideranças. Mas tem também aqueles que só esperavam a oportunidade para bradar sua extraordinária cultura política dizendo que jamais foram enganados e que nunca caíram naquele conto do vigário porque, eles, logicamente, são mais inteligentes do que a maioria, ou são mais velhos e experientes e inclusive votaram no Jânios Quadros, pra tu ver como são avançados.

E, claro, tem os indignados que consideram toda vantagem aos miseráveis, uma medida populista e eleitoreira.

Escondem de si mesmo que ver pobre tendo um carro ou fazendo plano privado de saúde os ofende como uma bofetada.

Pergunte a uma mãe que dá sopa de papelão a seu filho faminto o que ela acha do populismo.

Pergunte a um pai que agora pode comprar remédios pra sua prole quando necessário e antes mendigava com a receita na mão, o que ele acha das medidas populistas.

Se era tão simples e tão barato cooptar o apoio dessa gente por que eles não o fizeram quando estavam no poder? Por que combater a miséria é medida demagógica? Mas que extraordinário senso de moral tem nossa gente!

Furar fila é malandragem, não observar leis de trânsito básicas é ser esperto, desobedecer regras de civilidade é jeitinho, tudo isso pode. Criar Bolsa Família não pode. É imoral.

Chaves, na Venezuela que alterou a Constituição do seu país forçando um investimento direto dos lucros da exportação do petróleo em atenção aos mais pobres, como construção da casa própria é chamado de populista.

Lula e seus programas sociais são populistas.

O conceito é falso, mas faz bem. Porque justifica a injustificável contrariedade dos medianos à algo que eles não conseguem assumir, o seu egoísmo.

Por que não se buscam justificativas para o fato de que, no país do 8º PIB do mundo, 10% da população concentre 48% da riqueza? Não será essa a maior imoralidade?

Quer saber, viva a demagogia e o populismo se ela secar uma só lágrima dos abandonados desse país!

Quem tem fome tem pressa.

Já, os medianos precisam de argumentos para humanizar seus preconceitos.

Diante de uma criança de barriga inchada ser contra o Fome Zero não é politicamente correto.

Sobre os olhos de quem nunca teve esperança, num país onde educação sempre foi para as elites, ser contra o Bolsa Escola exige argumentos.

Mas, que fiquem tranqüilos os medianos.

No mundo do capital que divide as criaturas em classes, nesse mundo que ter é mais importante que ser, nunca faltarão famintos, nem espoliados, mas também, jamais faltarão argumentos.

Até porque os críticos escrevem muito bem, e os conceitos, tal qual roupas elegantes e da moda, podem ser adaptados a qualquer necessidade.

Podemos dormir em paz com nossas consciências.

Prof. Péricles

domingo, 7 de outubro de 2012

ELEIÇÕES E DEMOCRACIA


As pessoas costumam confundir margarina com manteiga, amor com paixão, e por que não eleições com democracia?
Ainda mais sendo incentivados à confusão pela nossa competente e criativa mídia.
Sem dúvida, eleições fazem parte do processo da democracia, mas, isoladamente, elas não são a democracia.

Democracia é muito mais.

Democracia exige, por exemplo, que todos os que participam do processo eleitoral, tenham toda a informação necessária para formar um juízo de valor e a partir disso, e só a partir disso, votar livremente.

Algum tempo atrás achei interessante um comunicador de televisão (desses talentosos que ocupam todos os espaços eletrônicos) após uma cena mostrando o vai-e-vem das pessoas no feriado eleitoral, concluir com um demagógico “como está sólida a democracia brasileira”.

Sim, tão sólida como palanque em banhado.

Num país em que a quantidade de analfabetos ainda se conta em milhões e onde jovens que iniciam o ensino médio o concluem, onde está a consolidação da democracia?

No Brasil ainda existem milhões de sem terra de sem teto e de sem nada que votam em Partidos políticos que apresentam em seu programa de governo idéias conservadoras e reacionárias, claramente contrárias aos seus interesses.

É tipo ovelha votando em lobo pra cuidar do rebanho.

Mas, por que fazem isso? Por que votam em partidos que não representam seus interesses?

Porque, como diria o animado jornalista, “nossa sólida democracia” ainda é uma mentira da qual todos são obrigados a participar.

Enquanto meios externos como a televisão e sua programação de lobotomia continuarem dominando as mentes, não dá pra falar em democracia.

Enquanto uma só criança ainda estiver carente de atenção, de pão ou de tudo, não se pode falar em democracia.

Enquanto partidos políticos continuarem livremente afirmando defende o que não defendem e nem consta em seus programas, nossa democracia continuará no palanque armado no banhado.

E pra falar a verdade, Democracia nunca se consolida porque é feita todos os dias pela participação das pessoas.

Enquanto o exercício do voto for obrigatório e dentro das condições postas no nosso país, eleição continuará sendo um capítulo incompleto, que se lê de má vontade.

Participe se essa for sua vontade. Vote, até porque é obrigatório, mas não se iluda.
O caminho para a democracia no Brasil está apenas em seu início.

Não se iluda nem confunda funda com profunda assim como a simples prática do voto não representa o exercício da democracia.


Prof. Péricles

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

O PODER ABSOLUTISTA DOS PAPAS


A crise da Igreja-instituicão-hierarquia se radica na absoluta concentração de poder na pessoa do papa, poder exercido de forma absolutista e distanciado de qualquer participação dos cristãos e criando obstáculos praticamente intransponíveis para o diálogo ecumênico com as outras Igrejas.

Não foi assim no começo.

A Igreja era uma comunidade fraternal. Não havia ainda a figura do papa. Quem comandava na Igreja era o imperador, pois ele era o sumo pontífice (ponntifex maximus) e não o bispo de Roma ou de Constantinopla, as duas capitais do Império.

Assim o imperador Constantino convocou o primeiro concílio ecumênico, em Nicéia (325), para decidir a questão da divindade de Cristo. Ainda no século 6 o imperador Justiniano, que refez a união das duas partes do império, a do Ocidente e a do Oriente, reclamou para si o primado de direito e não o do bispo de Roma. No entanto, pelo fato de em Roma estarem as sepulturas de Pedro e de Paulo, a Igreja romana gozava de especial prestígio, bem como o seu bispo, que diante dos outros tinha a “presidência no amor” e o “exercia a serviço de Pedro” — o de “confirmar na fé” e não a supremacia de Pedro no mando.

Tudo mudou com o papa Leão I (440-461), grande jurista e homem de Estado. Ele copiou a forma romana de poder, que é o absolutismo e o autoritarismo do imperador. Começou a interpretar em termos estritamente jurídicos os três textos do Novo Testamento atinentes a Pedro — Pedro como pedra sobre a qual se construiria a Igreja (Mt 16,18), Pedro, o confirmador da fé (Lc 22,32) e Pedro como pastor que deve tomar conta das ovelhas (Jo 21,15). O sentido bíblico e jesuânico vai numa linha totalmente contrária: do amor, do serviço e da renúncia a toda honraria. Mas predominou a leitura do direito romano absolutista. Conseqüentemente, Leão I assumiu o título de sumo pontífice e de papa em sentido próprio. Logo após, os demais papas começaram a usar as insígnias e a indumentária imperial (a púrpura), a mitra, o trono dourado, o báculo, as estolas, o pálio, a cobertura de ombros (mozeta), a formação dos palácios com sua corte e a introdução de hábitos palacianos, que perduram até os dias de hoje nos cardeais e nos bispos, coisa que escandaliza não poucos cristãos que lêem nos Evangelhos que Jesus era um operário pobre e sem aparato. Então, começou a ficar claro que os hierarcas estão mais próximos do palácio de Herodes do que da gruta de Belém.

Mas há um fenômeno para nós de difícil compreensão: no afã de legitimar esta transformação e de garantir o poder absoluto do papa, forjou-se uma série de documentos falsos. Primeiro, uma pretensa carta do papa Clemente (+96), sucessor de Pedro em Roma, dirigida a Tiago, irmão do Senhor, o grande pastor de Jerusalém, na qual ele dizia que Pedro, antes de morrer, determinara que ele, Clemente, seria o único e legítimo sucessor. E evidentemente os demais que viriam depois. Falsificação maior foi ainda a famosa Doação de Constantino, um documento forjado na época de Leão I, segundo o qual Constantino teria dado ao papa de Roma como doação todo o império romano. Mais tarde, nas disputas com os reis francos, se criou outra grande falsificação: as Pseudodecretais de Isidoro, que reuniam falsos documentos e cartas como se viessem dos primeiros séculos que reforçavam o primado jurídico do papa de Roma. E tudo culminou com o Código de Graciano, no século 13, tido como base do direito canônico, mas que se embasava em falsificações de leis e normas que reforçavam o poder central de Roma, além de cânones verdadeiros que circulavam pelas igrejas. Logicamente, tudo isso foi desmascarado mais tarde, sem qualquer modificação no absolutismo dos papas. Mas é lamentável, e um cristão adulto deve saber os ardis usados e forjados para gestar um poder que está na contramão dos ideais de Jesus e que obscurece o fascínio pela mensagem cristã, portadora de um novo tipo de exercício do poder, serviçal e participativo.

Verificou-se posteriormente um crescendo no poder dos papas: Gregório VII (+1085), em seu Dictatus papae (“a ditadura do papa”), se autoproclamou senhor absoluto da Igreja e do mundo; Inocêncio III (+1216) se anunciou como vigário representante de Cristo e, por fim, Inocêncio IV(+1254) se arvorou em representante de Deus. Como tal, sob Pio IX, em 1870, o papa foi proclamado infalível em campo de doutrina e moral.

Curiosamente, nunca nenhum destes excessos foi retratado e corrigido pela Igreja hierárquica. Esses excessos continuam valendo para escândalo dos que ainda crêem no Nazareno pobre, humilde artesão e camponês mediterrâneo, perseguido, executado na cruz e ressuscitado para se insurgir contra toda busca de poder e mais poder, mesmo dentro da Igreja.

Essa compreensão comete um esquecimento imperdoável: os verdadeiros vigários representantes de Cristo, segundo o Evangelho (Mt 25,45), são os pobres, os sedentos e os famintos.



*Leonardo Boff, teólogo, é filósofo e escritor

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

NOTÍCIA MUITO TRISTE


LONDRES - Eric Hobsbawm, considerado um dos mais maiores historiadores do século XX, morreu aos 95 anos de idade, informou a filha Julia Hobsbawm nesta segunda-feira. Segundo Julia, seu pai morreu durante a noite em um hospital de Londres. Ele vinha sofrendo de pneumonia.

O intelectual marxista é considerado um dos maiores historiadores do século XX e escreveu "A Era das Revoluções", "A Era do Capital", "A Era dos Impérios", "Era dos Extremos", "História Social do Jazz", entre outras obras.

Hobsbawm nasceu em uma família judia, na Alexandria, no Egito, em 1917, mas cresceu em Viena e em Berlim, mudando-se para Londres em 1933, ano em que o nazista Adolf Hitler chegou ao poder na Alemanha. Sua experiência como um estudante na Alemanha na década de 1930 consolidou suas visões de esquerda. Ele entrou para o Partido Comunista, na Inglaterra, em 1936 e foi membro por décadas, até 1989, e manteve a militância apesar da invasão soviética na Hungria, em 1956, e de sua desilusão com a URSS.

- Tínhamos a ilusão de que inclusive o sistema brutal, experimental (soviético) ia ser melhor que o ocidental, que era isto ou nada - disse uma vez o intelectual, afirmando que nunca quis minimizar os abusos da antiga União Soviética.

Considerado um dos maiores intelectuais do século XX, Hobsbawm se tornou o historiador mais respeitado do Reino Unido, admirado pela esquerda e pela direita e um dos poucos a desfrutar de reconhecimento nacional e internacional.

Crítico árduo do Partido Trabalhista, Hobsbawm foi determinante na reformulação da legenda, apesar de mais tarde ter revelado em público sua decepção com o ex-premier britânico Tony Blair.

Em 1962, Hobsbawm publicou o primeiro de três volumes cobrindo o "longo século XIX", que abrange o período 1789-1914. Um volume mais tarde, "Era dos Extremos", cobriu o período até 1991. Seu último livro, "Como Mudar o Mundo", lançado em 2011, é uma defesa do uso das ideias marxistas para analisar a crise atual do mundo.

Ele estudou na Escola de Gramática de Marylebone e em Kings College, em Cambridge, antes de ser nomeado, em 1947, professor na Universidade de Birkbeckem, de onde virou reitor mais tarde. Em 1978, entrou para a Academia Britânica. O historiador deixa a mulher, três filhos, sete netos e um bisneto.