quarta-feira, 30 de novembro de 2011

A SÍNDROME DAS OVELHINHAS

Então a aldeia de ovelhinhas entrou em pânico. Definitivamente essa situação era intolerável. De três em três dias, uma ovelhinha era morta por um tigre que atacava à noite, protegido pelas sombras e pelo silêncio.
Houve uma reunião no centro da aldeia à qual todas as ovelhinhas foram convocadas.

Uma sarada dirigiu os trabalhos, ou tentava, pois os apupos e as discussões pareciam intermináveis (vocês sabem como as ovelhinhas são nervosas, não sabem?).

Foi então, que em meio aos acalorados debates, uma ovelhinha jovem, de lãs alvas e sedosas pediu a palavra e se pronunciou...

“...béééé...minhas irmãs. Esse tigre assassino não pode continuar impune. Devemos nos livrar dele imediatamente. Fiquei sabendo que na colina, próxima da aldeia, mora um jovem leão, forte e poderoso. O que acham, minhas irmãs, de contratá-lo para dar cabo desse tigre?”

Foi uma explosão de aplausos. Muito bem! Muito bem! É isso mesmo, vamos contratar o leão e acabar com esse tigre sanguinário! Viva!

No meio da multidão, porém, uma ovelha, velhinha, ergueu sua patinha.

“Meninas, meninas!” Disse com a paciência de quem conhece a impulsividade da juventude: “Esse tigre está velho e decadente. Tanto que já não caça atacando ovelhinhas indefesas como nós. Basta nos organizarmos. Nada de pedir uma ajuda dos céus. Vamos fazer turnos de guarda e sem conseguir encontrar uma só ovelhinha distraída durante a noite, acabará morrendo de fome ou irá embora. Estaremos livres e salvas por nós mesmas”.

“Buuuuu...foi a reação da maioria. Cala a boca velha caduca, replicaram as massas jovens da aldeia das ovelhas.”

E, dessa forma, calou-se a ovelha que os anos fizeram sábia, e a jovem e enérgica idéia foi adotada.

O leão alegremente aceitou o convite. Veio para a aldeia, e à noite, numa emboscada, matou sem maiores problemas o velho e fraco tigre.

Na manhã seguinte as ovelhas entraram em euforia. Cataram, dançaram funk, soltaram fogos. Nomearam o leão "o cara" e por um dia inteiro comemoraram a morte do tigre.

Encerradas as festividades foram pagar a quantia combinada ao leão.

Esse sorriu num rugido assustador e diante das ovelhinhas de olhos arregalados exclamou: “Suas tolas. Gostei do lugar e na verdade estou me mudando para essa aldeia. Quanto a sua dívida... não se preocupem, cobrarei em prestações, tipo, uma ovelha por dia.”

Em sua cabana a velha e sábia ovelha sofria enroscada em suas lanzinhas, pois só ela havia percebido que, para se livrar de um problema menor, suas imprudentes companheiras haviam buscado a solução criando um problema muito, muito maior.

Na história dos povos muitas vezes se repete a síndrome das ovelhinhas.

Em 1898, para se livrar do velho e decadente império espanhol, sua última colônia das Américas, Cuba, pediu auxílio para os Estados Unidos, que como pagamento exigiu a edição da Emenda Platt na primeira Constituição do país, e dessa maneira pode estender suas garras e defender seus interesses no coração da jovem nação.

Já, o Brasil, para obter o reconhecimento de sua independência política em relação ao extinto Império português, assumiu compromissos e dívidas com o jovem império britânico.

Talvez fosse interessante ao povo da Líbia ouvir a ovelha velha antes de aceitar a “ajuda” da OTAN para derrubar seu ditador.

Quem sabe já seja tempo de abandonar soluções em pacotes formatados por mãos estrangeiras e entender que a solução dos problemas está inserida na cultura de cada povo. No talento e na criatividade de seus jovens e na justiça social.

Esse entendimento é que faz, realmente, o investimento na educação para a liberdade, uma questão de soberania nacional.

Prof. Péricles

domingo, 27 de novembro de 2011

A TORRE DAS DONZELAS

Durante quase três anos, Dilma Rousseff, morou na Torre das Donzelas.

A construção colonial não pertencia a nenhum palácio. Encravada no presídio Tiradentes, em São Paulo, ganhou o singelo nome por abrigar presas políticas do regime militar.

"Terrorista! Linda! O que você está fazendo aqui?", gritavam as presas comuns ao verem passar uma nova presa política pelo estreito corredor. Depois do corredor, havia um pequeno pátio. Em seguida, vinha a Torre.

Dilma atravessou o corredor em fevereiro de 1970, aos 23 anos, após mais de 20 dias nos porões da repressão política.

"Ela chegou fragilizada pela tortura, mas logo se recuperou", lembra a jornalista Rose Nogueira, 64 anos, que passara pelo mesmo processo três meses antes.

Não demorou para que as donzelas da Torre se agrupassem, primeiro com base nas organizações clandestinas às quais pertenciam no "mundão". Porque a Torre, no vocabulário das presas, era o "mundinho".

Mas as afinidades pessoais também contavam muito, como relata a médica e pesquisadora Guiomar Silva Lopes, 66 anos. "No mundão, o vínculo era de vida e morte", diz Guiomar. "Na cadeia, estabelecemos uma relação de confiança inabalável."

Dilma é até hoje lembrada pelo espírito solidário. Durante um período, cuidou de uma estudante de arquitetura. "Quando a menina chegou da tortura, estava muito desestruturada emocionalmente", afirma a advogada Rita Sipahi, 72 anos. "A Dilma ficou de olho nela o tempo todo para evitar que cometesse algum desatino."

Com a possibilidade de circular entre as celas, as presas políticas tentavam curar as feridas umas das outras e também se organizavam. Havia escala para as tarefas da limpeza e da cozinha. Com os víveres levados pelas famílias, elas preparavam as próprias refeições. Algumas conseguiam bons resultados, embora só contassem com dois fogareiros elétricos. Outras, nem tanto.

A dupla mais desastrada na cozinha era formada por Dilma e Cida. "Não dominávamos a arte do tempero", reconhece Cida. Numa ocasião, as duas resolveram caprichar no preparo de um prato de legumes. Acabaram servindo uma sopa de quiabo intragável. "Ficamos um pouco frustradas com o resultado, pois havíamos nos esforçado."

As mães das "donzelas da Torre" chegavam para as visitas nas tardes de sábado. Era o contato delas com o "mundão"

Aos 82 anos, a advogada Therezinha Zerbini, mulher do general Euryale de Jesus Zerbini, cassado em 1964, também recorda de Dilma com admiração. Presa na Torre durante o ano de 1970, Therezinha se destacava tanto pela origem quanto por ser uma senhora entre a população carcerária extremamente jovem. "As amigas dela me chamavam de 'burguesona' e ela me defendeu. Ela tinha uma liderança nata", diz Therezinha.

O Tiradentes "era o paraíso". Isso porque, ao entrar no presídio, a pessoa estava com a prisão reconhecida pelo Estado. Às vezes, era levada para interrogatórios em outras instituições, mas praticamente não corria risco de morrer ou "desaparecer".

Na escala macabra estabelecida nos porões do regime, a Operação Bandeirante (Oban) era o inferno, ficando o purgatório por conta da Delegacia Estadual de Ordem Política e Social (Deops). Como várias companheiras de cadeia, Dilma passou pelo inferno e pelo purgatório antes de chegar à Torre.

Por conta das sevícias, sofreu uma disfunção hormonal que levou anos para ser curada. Não perdeu, porém, o gosto pela vida. Com Cida, passava horas lendo os livros de ficção científica. Quando o rodízio do único aparelho de tevê da Torre caía em sua cela, entrava na madrugada vendo os filmes da sessão "Varig, a dona da noite". Aprendeu até a bordar. "Ela fez uma tapeçaria com flores coloridas, que colocamos na parede", lembra Rose.

No período em que o advogado Carlos Franklin Paixão de Araújo, seu companheiro, permaneceu encarcerado no Tiradentes, Dilma se comunicava com ele com a ajuda dos presos comuns. A rota usada por ela e outras presas políticas consistia em baixar mensagens por meio de uma corda artesanal, chamada "teresa", para a carceragem dos "comuns", que ficava embaixo da Torre. "De cela em cela, as mensagens chegavam ao destinatário, na ala dos presos políticos", comenta Guiomar. "O recurso também era fundamental para sabermos o que estava acontecendo lá fora."

Conhecidas desde os tempos em que estudavam em Belo Horizonte, Dilma e Eleonora comemoravam com as meninas da Torre o Natal, o Réveillon e o Carnaval. As fantasias eram improvisadas, é claro, mas havia até desfile no "celão".

No caso de Dilma, as estratégias para manter o moral elevado atrás das grades também passava pelo humor. "Ela pôs apelido em todas nós", conta Rita. "Uma era a Ervilha, outra a Moló, porque tinha jogado um coquetel-molotov em uma ação." Essa faceta pouco conhecida de Dilma é ressaltada por outras entrevistadas. "Ela tem um humor impagável", garante Eleonora.

Quando a hoje presidenta deixou a Torre, as companheiras de cadeia repetiram o ritual criado para o momento da libertação: cantaram "Suíte do Pescador", de Dorival Caymmi, que começa com o verso "Minha jangada vai sair pro mar".

Quase 40 anos depois, tudo o que sobrou do presídio foi o portal de pedra, tombado como patrimônio histórico. No final de 1972, a construção de 1852 começou a ser demolida, para a construção do metrô paulistano.



De: http://www.istoe.com.br/reportagens
Luiza Villaméa e Claudio Dantas Sequeira

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

BAKUNIN: O PODER CEGA

Mikhail Alexandrovich Bakunin foi um político pela própria natureza.

Apesar de brilhante teórico, não foi apenas na teoria que sustentou suas convicções. Por sua participação direta em movimentos de contestação à política de sua época, foi preso e condenado à morte na Alemanha. Só não foi executado porque a pena máxima foi trocada pela extradição à sua terra mãe, a Rússia.

Em 1868, depois de fugir da prisão na Sibéria, Bakunin fundou a Aliança Internacional da Democracia Social que sonhou unir à Associação Internacional de Trabalhadores, liderada por Karl Marx. Mas os dois geniais pensadores não conseguiram aparar suas arestas e Bakunin acabou isolado.

Mikhail Bakunin acreditava que a origem dos problemas sociais estava na centralização do poder no Estado e no conceito de autoridade.

É considerado um dos pais do anarquismo, movimento no qual tentou algum tipo de unificação, através da criação de várias associações que acabaram fracassadas.

Para ele, o desenvolvimento pleno da criatura humana e o caminho para a felicidade estavam na descentralização das organizações que detinham o poder em todas as suas diferentes esferas.

Extremamente descrente do ser humano como altruísta e democrático, escreveu: "Pegue o mais ardente dos revolucionários, dê-lhe o poder absoluto. Dentro de um ano ele poderá se tornar pior do que o próprio Czar."

Segundo ele, os partidos de esquerda que se apresentam como messias, salvadores dos oprimidos e representantes dos mais fracos, quando chegam ao poder deixam de liderar os mesmos oprimidos e mais fracos passando a cultivar o poder e a oprimir as massas, tal e qual os governos burgueses que ajudaram a derrubar.

Seus interesses se alteram e acabam reproduzindo quase à perfeição a dominação exercida pelos agentes do capital, inclusive com a repressão, a perseguição e o terror.

É da natureza humana, dizia Bakunin, e quem duvida disso, não conhece a natureza humana.

O poder cega!

Essas afirmações foram feitas pelo anarquista russo no século XIX.

Qualquer semelhança com governos pretensamente humanitários e de esquerda que chegaram ao poder nos século XX e XXI, prometendo igualdade, reforma agrária e revolução social, mas que, para se manter no poder se aliaram com as coisas mais retrógradas da política, seja das estepes ou do Maranhão, negociando seus sonhos e esquecendo suas promessas, não é mera coincidência.

Salve Mikhail Alexandrovich Bakunin!

Bem que ele nos avisou!

Prof. Péricles

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

MÚSICA BRASILEIRA E A DITADURA MILITAR - 03

Geraldo Vandré tornou-se o inimigo número um do regime militar. A sua canção “Caminhando (Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores)”, que ficou com o polêmico segundo lugar no Festival Internacional da Canção, em 1968, tornou-se um hino contra a ditadura militar, cantado por toda a juventude engajada do Brasil de 1968. Esta canção, afirmam alguns analistas de história, foi uma das responsáveis pela promulgação do AI-5.

Ficou proibida de ser cantada e executada em todo país. Só voltaria a ser ressuscitada em 1979, após a abertura política e a anistia, quando a cantora Simone a cantou em um show, no Canecão.

Perseguido pelo regime, Geraldo Vandré esteve exilado de 1969 a 1973. Após o exílio, jamais conseguiu recuperar a carreira interrompida pela censura da ditadura militar. Calava-se uma expressiva carreira emprestada ao combate à ditadura.

Taiguara, uma das mais belas vozes masculinas da MPB, interpretou com maestria diversos gêneros musicais. Foi um dos cantores que mais se opôs contra a repressão da ditadura militar. Sua obra pagou o preço da perseguição e da censura.

Deparou-se com a atenção dos censores em 1971, atentos às canções do álbum “Carne e Osso”. Em 1973 teve 11 músicas proibidas. Perseguido pela censura, Taiguara teve muitas das suas músicas assinadas por Ge Chalar da Silva, sua esposa na época.

Exilado em Londres, Taiguara gravou o álbum “Let the Children Hear the Music“, em inglês. O disco foi proibido de ser lançado, pela EMI, por decisão da polícia federal brasileira. O compositor recorreu ao Conselho Superior de Censura, em 1982, tendo o disco finalmente liberado.

Outro disco mutilado pela censura naquele ano foi “Milagre dos Peixes”, de Milton Nascimento, lançado em LP e compacto simples. Do álbum seriam vetadas as canções: “Hoje é Dia d’El Rey” (Márcio Borges – Milton Nascimento), “Os Escravos de Jó” (Milton Nascimento – Fernando Brant) e “Cadê” (Milton Nascimento – Ruy Guerra). Uma das faixas proibidas teria a participação de Dorival Caymmi, com a sua exclusão, não aconteceu esta participação. “Diálogo Entre Pai e Filho” teve uma única frase que não foi proibida: “Meu filho”. Diante da censura, Milton Nascimento gravou apenas as melodias das canções vetadas.

Foi no tumultuado ano de 1973, que a banda Secos & Molhados explodiu, conquistando o país inteiro. O público dos Secos & Molhados, devido à proposta inovadora e ao seu carisma, era composto por todas as idades, inclusive por crianças e por adolescentes. Os três integrantes da banda eram Ney Matogrosso, Gerson Conrad e João Ricardo, que se apresentavam com os rostos pintados.

Ney Matogrosso além de trazer a cara pintada, tinha uma voz de timbre totalmente diferente da de um homem cantor, um aspecto andrógeno e apresentava-se entre plumas, sem camisa. Os pêlos do peito do cantor e os seus frenéticos rebolados, incomodaram à censura, à moral e aos seus bons costumes vigentes, que proibiu que as câmeras da televisão focassem o cantor de perto, sendo permitido apenas aparecer o rosto em close. Assim apareceriam os Secos & Molhados em um clipe do recém estreado “Fantástico”, programa da Rede Globo.

Além da capa de “Calabar”, também em 1973, Gal Costa teve censurada a capa do disco “Índia”, por trazer um close frontal da cantora vestida de uma tanga minúscula, e na contra-capa fotografias da mesma de seios nus, vestida de índia. A gravadora Philips comercializou o álbum coberto por um envelope opaco, de plástico azul.

Do mesmo álbum, a música “Presente Cotidiano”, de Luiz Melodia, foi proibida de tocar em rádios e locais públicos. Em 1984, já no fim da ditadura, pós Diretas Já, Gal Costa teria outra canção proibida pela censura de ser tocada em público: “Vaca Profana” (Caetano Veloso), do álbum “Profana”.

Ainda em 1973, Raul Seixas teria 18 composições vetadas pela censura.

Luiz Melodia, além de ter “Presente Cotidiano” proibida de ser executada nas rádios, teve várias palavras excluídas ou alteradas das canções do seu disco de estréia, e várias músicas vetadas na íntegra.

Na ignorância cega da censura, sem uma lógica que a sustentasse, até o poeta Mário de Andrade foi vetado. O fato inusitado aconteceu em 1970, quando a gravadora Festa decidiu homenagear os 25 anos da morte do poeta, preparando um disco com alguns dos seus mais conhecidos poemas. Após ser submetido à censura, o projeto teve seis poemas proibidos, entre eles “Ode ao Burguês” e “Lira Paulistana”. Os vetos foram justificados pelos censores como estéticos, “falta de gosto”.

O que se concluía era que, os censores jamais tinham ouvido falar em Mário de Andrade, confundindo-o com um autor vulgar do Brasil da época.

eltheatro11@eltheatro.com
Editor: Elpídio Navarro

domingo, 20 de novembro de 2011

DILMA SANCIONA COMISSÃO DA VERDADE

A presidenta Dilma Rousseff sancionou nesta sexta-feira a lei que cria a Comissão da Verdade para apurar violações aos direitos humanosocorridas entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar. Dilma sancionou também a Lei de Acesso a Informações Públicas, que acaba com o sigilo eterno de documentos.

A Comissão da Verdade será formada por sete pessoas, escolhidas pela presidenta da República a partir de critérios como conduta ética e atuação em defesa dos direitos humanos. Ao todo, 14 servidores darão suporte administrativo aos trabalhos.

O grupo terá dois anos para ouvir depoimentos em todo o país, requisitar e analisar documentos que ajudem a esclarecer as violações de direitos. De acordo com o texto sancionado, a comissão tem o objetivo de esclarecer fatos e não terá caráter punitivo.

O grupo vai aproveitar as informações produzidas há quase 16 anos pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e há dez anos pela Comissão de Anistia.

A Lei de Acesso a Informações Públicas permite que o cidadão consulte documentos produzidos pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de forma a dar mais publicidade e transparência aos atos da administração pública.

A norma acaba com o sigilo eterno de documentos. Os documentos hoje classificados como ultrassecretos, que são aqueles com informações imprescindíveis à segurança do Estado, estarão protegidos por um prazo máximo de 50 anos. Atualmente, o documento ultrassecreto fica guardado por 30 anos, mas esse prazo pode ser prorrogado sucessivamente.

A lei abrange também estados e municípios e assim, o cidadão poderá, por exemplo, pedir dados sobre como foi empregada a verba do hospital e da merenda escolar de sua cidade. As informações solicitadas pela população devem ser respondidas em, no máximo, 20 dias.
Em seis meses, cada órgão vai ter que publicar em sua página na internetinformações sobre sua atuação, como contratos, licitações, gastos com obras, repasses ou transferências de recursos.

As entidades que recebem recursos públicos também terão que dar transparência a seus dados.

MÚSICA BRASILEIRA E A DITADURA MILITAR - 02

Os problemas de Chico Buarque com a censura começaram junto com a sua carreira. Em 1966, a música “Tamandaré”, incluída no repertório do show “Meu Refrão”, com Odete Lara e MPB-4, é proibida após seis meses em cartaz, por conter frases consideradas ofensivas ao patrono da marinha.

Exilado na Itália, de 1969 a 1970, Chico Buarque sofreria com a perseguição da censura após o retorno ao Brasil. Em 1970, recém chegado do exílio, o compositor enviou a música “Apesar de Você” para a aprovação da censura, tendo a certeza que a música seria vetada. Inesperadamente a canção foi aprovada, sendo gravada imediatamente em compacto, tornando-se um sucesso instantâneo. Já se tinha vendido mais de 100 mil cópias, quando um jornal comentou que a música referia-se ao presidente Médici. Revelado o ardil, o exército brasileiro invadiu a fábrica da Philips, apreendendo todos os discos, destruindo-os. Na confusão, esqueceram de destruir a matriz.

Em 1973 Chico Buarque sofreria todas as censuras possíveis. A peça “Calabar, ou o Elogio à Traição”, escrita em parceria com Ruy Guerra, foi vetada pela censura. As conseqüências da proibição viriam no seu álbum, “Calabar”, também daquele ano. A capa do disco trazia a palavra “Calabar” pichada num muro. Os censores concluíram que aquela palavra pichada tinha um significado subversivo, o que resultou na proibição da capa. A resposta de Chico Buarque foi lançar o álbum com uma capa totalmente branca e sem título.

O disco trazia o registro das canções da peça vetada, por isto teve várias músicas (todas elas em parceria com Ruy Guerra) censuradas:

- “Não Existe Pecado ao Sul do Equador”, que fazia parte deste disco, alcançaria grande sucesso quando gravada por Ney Matogrosso, em 1978, quando foi escolhida como tema de abertura da novela da tevê Globo “Pecado Rasgado”, na versão original da música o verso “Vamos fazer um pecado safado debaixo do meu cobertor“, foi substituído por “Vamos fazer um pecado rasgado, suado, a todo vapor“;

- “Fado Tropical” teve proibido parte de um texto declamado por Ruy Guerra, além da frase “além da sífilis, é claro”, herança portuguesa, segundo a personagem Mathias, no sangue brasileiro.

- “Bárbara”, um dueto entre as personagens Ana de Amsterdam e Bárbara, teve cortada a palavra “duas”, por sugerir um relacionamento homossexual entre elas. Tanto “Ana de Amsterdam” quanto “Bárbara”, já tinham sofrido os mesmos cortes no álbum “Caetano e Chico Juntos Ao Vivo”, ali substituídos por palmas.

Naquele ano de 1973, a música “Cálice” (Chico Buarque – Gilberto Gil), foi proibida de ser gravada e cantada. Gilberto Gil desafiou a censura e cantou a música em um show para os estudantes, na Politécnica, em homenagem ao estudante de geologia da USP Alexandre Vanucchi Leme (o Minhoca), morto pela ditadura.

Ainda naquele ano, no evento “Phono 73”, festival promovido pela Polygram, Chico Buarque e Gilberto Gil tiveram os microfones desligados quando iriam cantar “Cálice”, por decisão da própria produção do show, que não quis criar problemas com a ditadura.

Em 1974 a censura não dá tréguas ao artista. Impedido de gravar a si mesmo, Chico Buarque lança um disco, Sinal Fechado (1974), com composições de outros autores. Diante de tantas canções vetadas, a sofrer uma perseguição acirrada, Chico Buarque cria os pseudônimos de Julinho da Adelaide e Leonel Paiva. É sob o heterônimo do Julinho da Adelaide que a censura deixa passar canções de críticas inteligentes à ditadura, lidas nas entrelinhas: “Jorge Maravilha”, que trazia o verso “Você não gosta de mim mas sua filha gosta”, que era lida como uma referência ao então presidente Geisel, cuja filha Amália Lucy, teria dito em entrevista, que admirava as canções do Chico Buarque.

“Acorda Amor”, outra canção liberada do Julinho da Adelaide, era uma referência clara aos órgãos da repressão, que vinham buscar cidadãos suspeitos de subversivos em suas casas, levando-os em uma viatura, desaparecendo com eles. Diante da polícia repressiva, ele chamava pelo ladrão. “Milagre Brasileiro” também levou a assinatura de Julinho da Adelaide.

Outro clássico da MPB que sofreu uma censura moralista foi “Atrás da Porta” (Chico Buarque – Francis Hime), o verso original “E me agarrei nos teus cabelos, nos teus pêlos”, seria substituído por “E me agarrei nos teus cabelos, no teu peito”, a censura achava a palavra “pêlos” de caráter indecente.

Quando o AI-5 foi extinto, em 1978, Chico Buarque vingou-se dos anos de censura, gravou “Cálice”, regravou “Apesar de Você”, além de criar músicas provocantes, que afrontavam à moral da época, como “Folhetim“, que descrevia uma prostituta, ou “Geni e o Zepelim” e “Não Sonho Mais”, temas de dois travestis, Genivaldo da peça “A Ópera do Malandro” e Eloína, do filme “A República dos Assassinos”, respectivamente.

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Editor: Elpídio Navarro